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USO DE ROTEIROS DE AVALIAÇÃO PARA DIAGNOSTICAR VIABILIDADE FINANCEIRA DE ALTERNATIVAS DE INVESTIMENTOS DE LONGO PRAZO
USE OF ROADMAPS OF EVALUATION TO DIAGNOSE THE FINANCIAL VIABILITY OF LONG-TERM INVESTMENT ALTERNATIVES
UTILIZACIÓN DE HOJAS DE RUTA DE EVALUACIÓN PARA DIAGNOSTICAR LA VIABILIDAD FINANCIERA DE ALTERNATIVAS DE INVERSIONES DE LARGO PLAZO
Contextus – Revista Contemporânea de Economia e Gestão, vol. 15, núm. 1, pp. 34-61, 2017
Universidade Federal do Ceará



Recepção: 02 Setembro 2016

Aprovação: 28 Agosto 2017

DOI: https://doi.org/10.19094/contextus.v15i1.875

Resumo: Esta pesquisa aborda a contribuição de um roteiro padronizado para qualificar tomadas de decisão sobre a viabilidade financeira de alternativas de investimentos de longo prazo. Para isso, utiliza um estudo de caso de uma empresa de produção de vídeos promocionais para TV e Internet, reanalisado por uma empresa de consultoria internacional. A principal limitação para a reanálise do investimento foi o fato de a empresa contratante haver restringido o escopo do trabalho a um estudo de avaliação econômico-financeira, não fornecendo informações da concorrência, de pesquisas de mercado ou de estratégia comercial. Nesse contexto, foram levadas em conta informações internas questionáveis, tais como premissas, projeções e dados arbitrados para o custo do capital patrimonial (CAPM). Constata-se que a reanálise do investimento, se baseada nas etapas do roteiro de avaliação proposto e complementada por informações de estratégia mercadológica, certamente contribuiria para reduzir o risco.

Palavras-chave: Análise de investimento, Risco, Incerteza, Fluxo de Caixa, Retorno.

Abstract: This research addresses the contribution of a standardized roadmap to qualify decision-making on the financial viability of long-term investment alternatives. For this, it uses a case study of a company that produces promotional videos for TV and Internet, reanalyzed by an international consulting firm. The main limitation for the reanalysis of the investment was the contracting company having restricted the scope of the work to an economic-financial evaluation study without providing information of competition, market research or commercial strategy. In this context, questionable internal data were taken into account such as assumptions, projections and arbitrated data. Consequently, if the reanalysis of the investment were both hinged upon the stages of the proposed evaluation roadmap and complemented by market strategy information, it would certainly contribute to reducing the risk of the investment.

Keywords: Investment analysis, Risk, Uncertainty, Cash flow, Return.

Resumen: Esta investigación aborda la contribución de un itinerario estandarizado para calificar tomas de decisión sobre viabilidad financiera de alternativas de inversión a largo plazo. Para ello, utiliza un estudio de caso de una empresa de producción de videos promocionales para TV e Internet, reanudado por una empresa de consultoría internacional. La principal limitación para la reanudación de la inversión fue el hecho de que la empresa contratante restringió el alcance del trabajo a un estudio de evaluación económico-financiera, no proporcionando información de la competencia, de investigación de mercado y de estrategia comercial. En este contexto, fueron tenidas en cuenta informaciones internas cuestionables tales como premisas, proyecciones y datos arbitrados. Se concluye que la reanudación de la inversión, si fuera basada en el itinerario de evaluación propuesto y complementada por informaciones de estrategia mercadológica, ciertamente contribuiría a reducir el riesgo de la inversión.

Palabras clave: Análisis de la inversión, Riesgo, Incertidumbre, Flujo de caja, Retorno.

1 INTRODUÇÃO

Em um ambiente de riscos e incertezas, a complexidade crescente no processo decisório de empresários exige profissionais experientes e procedimentos formais que contenham roteiros de avaliação e métricas para diagnosticar a viabilidade financeira no cenário mais conservador possível. Dentre as decisões estratégicas, destacam-se aquelas relacionadas à análise de investimentos com impacto sobre: a estratégia corporativa, a geração de fluxos de caixa operacionais e o desempenho de longo prazo da firma (BOWER, 1970; HICKSON, 1986; GRUNDY & JOHNSON, 1993; ALKARAAN & NORTHCOTT, 2006).

Por isso, é fundamental que as decisões de investimento de longo prazo se sustentem em análises que levem em consideração informações tanto de natureza qualitativa, como de quantitativa. As informações qualitativas fazem parte do conhecimento detalhado da atividade operacional da empresa, relativo a reputação, idoneidade, gestão administrativa, quadro funcional, clientes, fornecedores, concorrência, tecnologia, riscos sistêmicos etc. (SANTOS, 2015). As informações de natureza quantitativa dividem-se em ex-ante e ex-post. Como exemplos das ex-ante, destacam-se aquelas extraídas das demonstrações financeiras e convertidas em índices de desempenho (ex.: liquidez, endividamento, rotatividade, lucratividade, cobertura de juros e rentabilidade). As informações quantitativas ex-post, por sua vez, baseiam-se em expectativas quanto à capacidade da empresa em gerar fluxos de caixa mais do que suficientes para atender os interesses dos supridores de capital e agregar riqueza aos detentores do capital patrimonial. Para analisá-las, destacam-se: a projeção de fluxos de caixa livres, amparada na simulação conservadora de cenários; e a atualização dos fluxos de caixa utilizando uma taxa ou custo médio ponderado de capital que seja compatível com o risco da atividade operacional da empresa (BRIGHAM; EHRHARDT, 2017; SANTOS, 2014).

Dado que as decisões de investimento envolvem amplo espectro de fatores, o tomador de decisões nem sempre domina e/ou utiliza todas as metodologias e técnicas para avaliação criteriosa de investimentos permanentes. Como consequência da inexistência de um processo formal e estruturado para avaliar investimentos, pode ocorrer a aprovação de projetos inviáveis ou a rejeição de viáveis.

Nesse sentido, a contribuição desta pesquisa é apresentar o processo sistematizado de um roteiro para avaliar projetos de investimentos baseado na metodologia de fluxo de caixa descontado. O objetivo é descrever as etapas essenciais de avaliação de investimentos, através de um estudo de caso real reanalisado por uma empresa de consultoria internacional, vinculando aspectos relevantes da teoria e da prática para dar sustentação à tomada de decisão. Além disso, apresenta-se o diferencial de comentar e apontar as vantagens do uso do roteiro para avaliar projetos de investimentos.

Vale destacar que o foco da pesquisa não é meramente apresentar as principais métricas de avaliação de investimentos (valor presente líquido, taxa interna de retorno, índice de lucratividade e período payback) como recursos únicos para tomadas de decisão, mas defender que o diagnóstico de viabilidade financeira também deve amparar-se em informações de estratégia corporativa, pesquisa de mercado e indicadores da concorrência.

O desenvolvimento da pesquisa pressupõe que as decisões de investimento permanente nem sempre seguem todos os procedimentos formais indispensáveis, mas podem ser influenciadas por fatores subjetivos. Isso pode prejudicar o diagnóstico de viabilidade de projetos de investimento, ao apresentar métricas de análise (valor presente líquido, taxa interna de retorno e período payback) incompatíveis com a efetiva capacidade de geração de fluxos de caixa para a empresa.

2 METODOLOGIA DE PESQUISA

Para que os objetivos propostos fossem atingidos, realizou-se primeiro uma pesquisa exploratória, de cunho qualitativo, empregando-se como procedimentos técnicos a pesquisa bibliográfica e a documental. Em seguida, realizou-se um estudo de caso suscetível de elucidar o problema levantado e mostrar a aplicabilidade da teoria estudada. As informações foram extraídas do relatório de avaliação de uma empresa internacional de consultoria, referente ao exercício de 2009, do qual foram suprimidas ou descaracterizadas as informações consideradas sensíveis ou sigilosas, de forma a preservar a identidade da empresa, doravante designada simplesmente como “Grupo”.

O projeto analisado, de empresa que vem atuando na produção de vídeos promocionais para TV e reanálise, atingiu um estágio considerado estável, típico de um produto maduro. O Grupo avaliou que, com novos investimentos, poderia expandir sua atuação por meio da reanálise, com toda sua linha de produtos, a qual inclui: vídeos para a TV, e-fotos, e-vídeos, banners, SMSs, visualização de ofertas e venda de desejos como leads e como links abertos.

Para avaliação do projeto de investimento, foram selecionadas as seguintes etapas, a serem descritas na seção 5:

  1. 1. 1) identificação da oportunidade;

    2) enquadramento estratégico da oportunidade;

    3) identificação das opções capazes de satisfazer as necessidades do projeto;

    4) análise preliminar de riscos;

    5) detalhamento da opção escolhida;

    6) definição das hipóteses econômico-financeiras;

    7) determinação do horizonte do projeto;

    8) modelagem dos fluxos de caixa;

    9) determinação da estrutura de capital do projeto;

    10) determinação do custo de capital;

    11) cálculo das métricas de avaliação econômica;

    12) análise das flexibilidades do projeto e opções reais;

    13) análise de sensibilidade;

    14) análise de cenários;

    15) recomendações.

3 REFERENCIAL TEÓRICO

3.1. Projetos de investimento

A União Europeia, em seu Guide of Cost Benefit Analysis of Investment Projects (2008), define projeto como uma série de tarefas economicamente indivisíveis relacionadas a uma função técnica específica, com objetivos identificáveis. Em termos gerais, pode-se definir um projeto de investimento como o dispêndio de recursos no presente com a finalidade de gerar benefícios no futuro.

Investimentos realizados segundo estratégias adequadamente formuladas tendem a gerar um fluxo de benefícios. É importante salientar, no entanto, que os benefícios futuros não precisam ser em dinheiro e podem nem sempre ser identificáveis e fáceis de definir.

A necessidade de conhecer de antemão os possíveis resultados de um investimento levou ao desenvolvimento de metodologias e métricas de avaliação de investimentos. Seu estudo se refere basicamente às decisões de investimento de capital em projetos que prometem retornos por vários períodos consecutivos.

Conforme Souza e Clemente (2009), sempre que houver mais de um projeto de investimento competindo pela aplicação de capital por parte do investidor, um pré-requisito essencial em sua análise – que condicionará a decisão de investimento – será sua classificação em uma das três seguintes categorias: a) projetos de investimento independentes; b) dependentes; ou c) mutuamente exclusivos.

3.2. Avaliação de investimento

Avaliação de investimentos consiste no processo de determinar o valor atual de um ativo ou empresa. Ela se dá, conforme Damodaran (1996), por meio de quatro abordagens distintas. A primeira avalia o fluxo de caixa descontado e relaciona o valor de um ativo ao valor presente dos fluxos de caixa futuros esperados desse ativo. A segunda trata da liquidação e avaliação contábil e constrói-se em torno da valorização dos recursos existentes numa empresa por meio das estimativas contábeis ou dos registros em livros. A terceira diz respeito à avaliação relativa, em que se estima o valor de um ativo ao precificá-lo em relação a outro, um “ativo comparável”. Este, por sua vez, relaciona-se com uma variável comum, como lucro, fluxos de caixa, valor contábil ou vendas. A quarta e última abordagem trata da avaliação por modelos de precificação de opções para medir o valor de ativos que compartilham características de opção e geralmente se encaixam na rubrica de opções reais.

No caso de aquisição de empresas, todas as quatro abordagens são aplicáveis, podendo, de qualquer modo, haver situações com insuficiência de dados para uma ou outra das abordagens descritas. A empresa alvo da aquisição pode, por exemplo, não ter seu capital aberto em bolsa e não tornar públicos seus dados contábeis, de modo que os interessados devam inferir seu valor por mais de uma abordagem se quiserem diminuir as chances de erros de estimação. Enquanto, por um lado, qualquer avaliador pode projetar fluxos de caixa estimados e calcular seu valor presente (1ª abordagem), por outro, pode ser impossível realizar avaliações contábeis quando nem mesmo o balanço da empresa é disponível (2ª abordagem). Nesse caso, o avaliador lançará mão de avaliações relativas, procurando encontrar “ativos comparáveis” de características similares ao da empresa (3ª abordagem), como por exemplo capacidade de produção e faturamento dentro do mesmo setor da economia. A abordagem por opção real (4ª abordagem) complementa as demais, nos casos em que os fluxos de caixa são estimados. Ela permite o cálculo do valor das flexibilidades gerenciais que o negócio apresenta, cuja importância dependerá da existência de flexibilidade gerencial e do conhecimento da volatilidade dos fluxos de caixa.

Tal multiplicidade de maneiras de abordar valores reflete-se nas palavras de Pratt (2002): “[m]uitas pessoas têm a noção equivocada de que só pode haver um ‘valor’ [...] há muitas definições de valor, e o propósito da avaliação geralmente determina a definição adequada de valor”.

3.3. Metodologia do fluxo de caixa descontado

A metodologia do fluxo de caixa descontado (FCD) avalia um negócio com base em seus futuros fluxos de caixa esperados e descontados a uma taxa que reflita o grau de risco de realização deles. Assaf Neto (2008) pontua que, diante das várias metodologias disponíveis para avaliar ativos, o método do FCD é amplamente reconhecido pelo mercado por seu maior rigor técnico e conceitual, apresentando-se, em consequência, como o mais indicado nas avaliações. Além de permitir explicar e simular as principais variáveis e premissas macroeconômicas, estratégicas, operacionais e financeiras que compõem a metodologia de avaliação, o FCD incorpora em seus cálculos as preferências do investidor em relação ao conflito risco-retorno e à taxa de remuneração adequada para os proprietários de capital.


Figura 1
Etapas da metodologia do fluxo de caixa descontado

Simplificadamente, a metodologia do FCD envolve as seguintes etapas:

Fonte: autores, adaptado de Stearns (2005)

3.4. A incerteza e o risco

Quando se projetam no futuro os dados do fluxo de caixa, o administrador considera a probabilidade não desprezível de que os números estimados não se materializem. Por isso, a taxa de desconto a trazer os fluxos de caixa a valor presente deverá levar em conta os riscos a que o projeto de investimento está sujeito.

Frank Knight (1921, p. 20) escreveu:

Incerteza deve ser entendida num sentido radicalmente distinto da familiar noção de risco, da qual nunca foi convenientemente separada (...) Incerteza mensurável, ou risco no sentido próprio do termo, é tão diferente de incerteza não mensurável que, de fato, não é, de modo algum, uma incerteza (...) Em consequência, vamos restringir o termo “incerteza” aos casos não quantitativos. Esta é a verdadeira incerteza e não o ato de correr o risco [...] que constitui a base de uma teoria válida de lucro [Tradução livre].

O autor distingue claramente entre risco e incerteza. Enquanto o primeiro se refere àqueles eventos de alguma forma mensuráveis por métodos estatísticos ou pela busca de padrões com eventos semelhantes, o segundo, chamado pelo autor de “verdadeira incerteza”, refere-se aos eventos que não podem ser medidos de forma alguma, inclusive por analogias com outros eventos conhecidos.

Para Keynes (1937, p. 113-114), a incerteza consiste em uma característica do conhecimento dos eventos futuros que, pela própria natureza, não pode ser expresso em termos de uma distribuição de probabilidade quantificável.

Stiglitz (1993) aborda os conceitos de incerteza e risco sob a ótica de mercados expostos à assimetria de informações. Esta não exclui nem contrapõe incerteza a risco, pois nenhuma das duas coisas é condição necessária para supor vantagens informacionais na interação entre os agentes. Pelo contrário, risco em um modelo com assimetrias de informações irredutíveis, como é o caso do de Stiglitz, é o custo a ser assumido por um agente econômico pelo fato de não ter certeza quanto às consequências de suas ações e à incerteza associada ao valor dos vários ativos.

Para Dias (2005), a incerteza pode ser classificada em três distintas categorias:

  • · econômica: correlacionada aos movimentos gerais da macroeconomia. Implica a existência de informações externas à organização. Ex.: oscilação de preço do petróleo;

    · técnica: não correlacionada aos movimentos macroeconômicos. Induz o investimento sequencial como recurso para reduzir a variância da incerteza sobre o projeto. Ex.: volume de petróleo numa jazida; tecnologia jamais experimentada em grande escala;

    · estratégica: relacionada à ação de outras empresas no mercado. Pode tanto induzir o adiamento quanto a antecipação de um investimento. Ex.: leilões de privatização/concessões; ameaça de entrada de concorrentes (ou de sucedâneos); jogos de espera na exploração e/ou revelação de uma jazida.

3.5. Custo médio ponderado de capital

Para Santos (2014), o custo médio ponderado de capital (CMPC) corresponde à média ponderada das taxas de custo das diversas fontes de financiamento de longo prazo que integram a estrutura de capital da empresa. Em termos de balanço patrimonial, os recursos injetados na empresa para financiar seus projetos de investimento se classificam como exigíveis de longo prazo.

O CMPC pode ser calculado por meio da seguinte fórmula: (1),

3.6. Considerações sobre as métricas tradicionais de avaliação de projetos de investimento

Práticas em investimento de capital que reconhecem o valor do dinheiro no tempo e utilizam técnicas de fluxo de caixa descontado são as preferidas pela maioria dos tomadores de decisão (JACKSON; SAWYERS, 2008). Na metodologia do FCD, modelados os fluxos de caixa e definido o CMPC, o próximo passo será o cálculo do valor presente líquido (VPL) ou a taxa interna de retorno (TIR) ou, ainda, a taxa interna de retorno modificada (TIRM). Esta difere da anterior apenas por adotar uma taxa de reinvestimento das sobras do fluxo de caixa a uma taxa predeterminada em vez de considerar a TIR do projeto para esse cálculo. Ainda, há aqueles que utilizam como métrica o período de payback descontado (PPD) ou o índice de lucratividade (IL).

Analisando-se as vantagens e inconvenientes dessas métricas de avaliação de investimento, pode-se presumir que – na prática da avaliação de projetos de investimento e, sobretudo, como consequência do conhecimento das características de seus projetos – os gestores tendem a preferir a métrica que lhes garanta suficiente confiabilidade em suas decisões com o menor trabalho e a maior rapidez possíveis.

Folta e O’Brien (2002) explicam que a teoria de investimento tradicional prediz que uma empresa entrará em atividade nova quando o VPL dos fluxos de caixa esperados for maior que zero, não havendo a influência da incerteza com precisão na entrada, pois a teoria não considera a irreversibilidade, nem mesmo parcial, da maioria dos investimentos.

Assim, levadas em consideração as precauções quando do uso de cada métrica e o contexto no qual a decisão deve ser tomada, poder-se-ão encontrar casos onde um simples cálculo de IL ou de PPD dará ao gestor o subsídio necessário a sua tomada de decisão. Entretanto, decidir sobre projetos classificados como mutuamente exclusivos demandará o emprego do VPL, uma vez que as demais métricas não apresentam ao gestor de forma inequívoca qual projeto resulta em maior riqueza para a empresa.

Com os recursos computacionais de hoje, torna-se extremamente simples para os gestores a construção de modelos de avaliação de investimento em planilhas de cálculo, como o Excel da Microsoft, nos quais se podem calcular com pouca ou nenhuma adaptação, a cada caso, as várias métricas de avaliação de investimento, simultaneamente. Com isso, ganham-se tempo e precisão nas tomadas de decisão, e por mais simples o projeto, o uso de modelos com as várias métricas de avaliação evita que o gestor se sujeite ao emprego de uma ou outra que não capture com a devida acurácia as nuances modeladas em seu fluxo de caixa e o contexto no qual a decisão precisa ser tomada.

3.7. Teoria das Opções Reais (TOR)

O conceito de opções reais provém diretamente da teoria de opções financeiras (TOR), surgida no final dos anos 1970. Myers, em 1977, foi quem cunhou o termo “opções reais”, considerando que uma empresa se compõe tanto de ativos reais, voltados às atividades nela existentes, quanto de opções reais, oportunidades para investir em ativos reais se as circunstâncias se mostrarem favoráveis.

Myers (1977) demonstrou que essas oportunidades de crescimento, embora não documentadas em contrato específico, tinham o mesmo perfil de uma opção financeira de investimento. Depois de fazer pequeno investimento inicial, a empresa poderia investir de forma mais significativa nas oportunidades de crescimento se as condições fossem favoráveis. Assim, Myers (1977) chamou de “reais” as opções derivadas de oportunidades de investimento de uma empresa, em oposição às opções “financeiras”, cujo valor está ligado à evolução de ativos financeiros.

O grande interesse na análise de investimentos baseada na TOR reside no estudo da valorização da flexibilidade gerencial existente em cada projeto. Para Damodaran (2013), existem opções reais quando se tem o direito, e não o dever, de comprar ou vender algo por um valor claramente determinado até uma data em que o direito deixa de existir. As opções reais serão mais valiosas quanto mais exclusivos forem os direitos de seu detentor sobre ela. Em um mercado perfeitamente competitivo, nada vale para seu detentor a opção que todos podem exercer a qualquer tempo. Numa lógica onde se tem o direito e não o dever de fazer algo, o direito é obviamente exercido de forma exclusiva quando traz vantagens a seu detentor. A consequência é crucial quando se considera que o valor dos ativos varia no tempo, para cima e para baixo, e seu detentor pode exercer a venda ou compra, segundo a característica de sua opção, somente quando seu valor for favorável. Logo, quanto mais volátil for o comportamento do ativo, maior será o valor implícito da opção, pois seu detentor terá maiores chances de lucrar com ela.

Segundo a mesma lógica, as opções reais, quando existentes, acrescentam um prêmio sobre o VPL. Portanto, o VPL de um projeto de investimento, quando analisado sob a ótica das opções reais, pode ser representado pela seguinte equação:

3.8. Análise de sensibilidade

Nas empresas cuja rotina inclui avaliar investimentos, são corriqueiros os modelos com planilhas de avaliação. A necessidade de analisar vários projetos de investimento em pouco tempo obriga os gestores a ter seus modelos preferidos. Essas ferramentas são muitas vezes protegidas por senhas para evitar alterações e, além de permitirem o cálculo rápido e inequívoco de métricas tais como o IL, VPL, PPD, TIR e TIRM, possuem quadros que para analisar a sensibilidade do projeto em questão relacionando as consideradas principais variáveis independentes do projeto.

A técnica usada para determinar como diferentes valores de uma variável independente vão impactar a variável dependente sob determinado conjunto de pressupostos é conhecida justamente como análise de sensibilidade. Essa técnica é usada dentro de limites específicos que dependem de uma ou mais variáveis ​​de entrada, como por exemplo o impacto do custo de energia elétrica numa fábrica de alumínio, cuja tecnologia de produção é considerada eletrointensiva. A análise de sensibilidade revela-se uma forma de antever os possíveis resultados de uma decisão de investimento quando uma ou outra daquelas variáveis independentes cruciais para o projeto vierem a sofrer alterações significativas em comparação a seus valores disponíveis no momento da decisão.

No que diz respeito às práticas em análise de risco, Ryan e Ryan (2002) argumentam que a análise de sensibilidade é predominantemente utilizada nas empresas. Intuitivamente, assume-se que tal prática decorra da maior simplicidade de utilização e da indisponibilidade de dados da concorrência para avaliar o impacto de alterações simultâneas em múltiplas variáveis, como preço, custo e despesas.

3.9. Análise de cenários

Enquanto a análise de sensibilidade estuda o comportamento de uma única variável independente sobre o resultado econômico de um projeto de investimento, a análise de cenários propõe a criação de cenários suscetíveis de ocorrer, nos quais um conjunto de variáveis cruciais para o projeto evoluirão caso determinado fenômeno de fato ocorra.

Nos processos de análise de risco de projetos de investimento, nem sempre há dados históricos sobre eventos de baixa frequência e alta gravidade, o que dificulta a tarefa de estimar sua probabilidade de ocorrência e efeitos. Para superar tais dificuldades, muitas vezes faz-se necessário incluir a análise de cenários no modelo de quantificação do risco (BOCK; TRÜCK, 2011).

Bock e Trück (2011) mencionam haver pelo menos oito categorias de técnicas de análise de cenários, cada uma delas com duas ou três variações, resultando em um número significativo de técnicas. Segundo os autores, a mais comumente utilizada é a matriz GBN (Global Business Network), criada por Pierre Wack na década de 1970 para a Royal Dutch Shell.

Para Porter (2004), cenários são visões parciais e internamente consistentes de como o mundo será no futuro, que podem ser escolhidas de modo a limitar o conjunto de circunstâncias possíveis. Segundo Porter (1999), a análise de cenários baseia-se em um conjunto de suposições plausíveis sobre as incertezas importantes que, de alguma forma, poderiam influenciar a estrutura setorial e a concorrência. Para o autor, a unidade apropriada para a análise de cenários é o setor ou indústria, pois as incertezas em nível macroeconômico, político e tecnológico são analisadas em busca de implicações para a concorrência. Nesse contexto de incertezas, as ações de empresas concorrentes voltadas a ajustar as variáveis custo, preço e mark-up tendem a influenciar, de forma positiva ou negativa, a análise da viabilidade de projetos de investimentos.

4 ROTEIROS PARA AVALIAÇÃO EX-ANTE DE PROJETOS DE INVESTIMENTO

Um roteiro para avaliação de projetos de investimento pode ser entendido como a identificação de uma sucessão de etapas de análise cujo objetivo final é chegar à conclusão sobre a viabilidade de um projeto de investimento. Dentro das organizações, tal roteiro assume um caráter canônico, assegurando ao gestor que os projetos de investimento serão analisados da mesma maneira e com a devida imparcialidade, de forma a evitar que preferências pessoais interfiram na qualidade da decisão.

Para isso, Pike (1988) sugere o uso de um manual de investimento contendo roteiro de avaliação que oriente a elaboração do orçamento de capital e possibilite o diagnóstico correto de alternativas de investimento de longo prazo. O roteiro aqui apresentado em seguida resulta de uma síntese efetuada com base no levantamento de vários guias de avaliação de projetos de investimento, de várias organizações empresariais e não empresariais, como a Comunidade Europeia, o Ministério da Defesa do Reino Unido, o IFAC – International Federation of Accounts, o BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, o Banco do Brasil, dentre outros.

A necessidade de avaliar projetos de investimento vai bem além das organizações empresariais. Países, estados, ministérios e organismos internacionais avaliam, desenvolvem e executam projetos de investimento e, por isso, estabelecem seus próprios critérios e rotinas para avaliá-los.

4.1. Etapas de um roteiro para avaliação ex-ante de projetos de investimento

A partir das pesquisas nos relatórios do IFAC, do BNDES e do Banco do Brasil, foram selecionadas as seguintes etapas como roteiro para a avaliação ex-ante de um projeto de investimento:

  1. 1. 1 identificação da oportunidade;

    2 enquadramento estratégico da oportunidade;

    3 identificação das opções capazes de satisfazer as necessidades do projeto;

    4 análise preliminar de riscos;

    5 detalhamento da opção escolhida;

    6 definição das hipóteses econômico-financeiras;

    7 determinação do horizonte do projeto;

    8 modelagem dos fluxos de caixa;

    9 determinação da estrutura de capital do projeto;

    10 determinação do custo de capital;

    11 cálculo das métricas de avaliação econômica;

    12 análise das flexibilidades do projeto e opções reais;

    13 análise de sensibilidade;

    14 análise de cenários;

    15 recomendações.

5 ESTUDO DE CASO – ANÁLISE CRÍTICA DA AVALIAÇÃO DE UM PROJETO DE INVESTIMENTO NO MERCADO DE TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO E MÍDIA ELETRÔNICA

Trata-se de um projeto real, avaliado em 2009 por uma empresa internacional de consultoria, do qual foram suprimidas ou descaracterizadas as informações consideradas sensíveis ou sigilosas de forma a preservar a identidade da empresa, doravante designada simplesmente como “Grupo”.

Segue descrição do roteiro de avaliação de investimento apresentado no item anterior.

5.1. Identificação da oportunidade

O Grupo vem atuando na produção de vídeos promocionais para TV e reanálise, o qual atingiu um estágio considerado estável, típico de um produto maduro. Pesquisas de mercado realizadas pelo Grupo em 2009 demonstraram haver um mercado significativo para produtos e serviços veiculados pela reanálise.

O Grupo avaliou que poderia, com novos investimentos, expandir sua atuação por meio da reanálise, com toda sua linha de produtos, a qual inclui: vídeos produzidos para TV, e-fotos, e-vídeos, banners, SMSs, visualização de oferta, produção de mídia, produção de e-vídeos, produção de e-fotos e venda de desejos como leads e como links aberto.

5.2. Enquadramento estratégico da oportunidade

O Grupo possuía toda a tecnologia necessária para dar suporte à análise de mercado e lançar os produtos novos, além de conhecer parcialmente o potencial do mercado brasileiro.

5.3. Identificação das opções capazes de satisfazer as necessidades do projeto

O plano de investimentos do Grupo contemplaria o desenvolvimento de softwares que permitiriam a venda automatizada de anúncios por e-fotos. Os clientes poderiam acessar o site do Grupo e nele carregar fotos que permaneceriam on-line. Outros produtos, os e-vídeos, seguiriam a mesma tendência de crescimento das e-fotos, porém com menor penetração geográfica devido aos custos envolvidos e à estrutura requerida em sua produção.

O Grupo já possuía um mapeamento, por categoria de produtos, dos usuários cujos desejos se manifestavam por leads e links abertos, mostrando que os principais segmentos eram:

O Grupo já possuía um mapeamento, por categoria de produtos, dos usuários cujos desejos se manifestavam por leads e links abertos, mostrando que os principais segmentos eram: (1) eletrônicos e informática; (2) imóveis; (3) veículos; e (4) viagens e turismo, dentre 12 categorias de produtos analisados.

Fazia parte do plano de investimentos uma poderosa campanha de marketing, em nível nacional, promovendo a marca e os produtos do Grupo.

5.4. Análise preliminar de risco

O prêmio sobre o capital decorrente dos riscos sistemáticos foi levado em conta para calcular o CAPM – Capital Asset Pricing Model. Os riscos inerentes à entrada, em nova área geográfica, de uma empresa sediada em país considerado desenvolvido (Country Risk Premium) e o tamanho relativo da empresa em seu mercado de atuação (Size Risk Premium), no entanto, foram analisados separadamente e determinaram prêmios específicos, onerando o custo do capital próprio. O resultado de tal análise está apresentado mais adiante na etapa de determinação do custo de capital do projeto de investimento.

Os riscos não sistemáticos, por outro lado, devem ser analisados individualmente nessa etapa. Como são diversificáveis, cabe ao gestor propor medidas de contingência que visem mitigar tais riscos, como o tecnológico, de construção, operacional, financeiro, legal, etc.

Tendo em vista a insuficiência de dados ou de tempo demandado para a análise frente à necessidade de tomada de decisões, os administradores do Grupo optaram por onerar o capital próprio em 5% como forma de proteger o capital a ser investido contra os riscos não sistemáticos, em vez de propor um plano de mitigação de risco específico para cada risco identificado.

5.5. Detalhamento das opções escolhidas

Desenvolvimento de softwares: os principais investimentos específicos para o projeto dizem respeito aos softwares e sistemas automatizados necessários ao funcionamento dos produtos do Grupo.

Plataforma de celulares e smartphones: os investimentos em sistemas e aplicativos para a plataforma de celulares e smartphones visam melhorar a conectividade entre os aplicativos acessórios. Além dos investimentos realizados para desenvolver novos sistemas, considerou-se a recuperação da respectiva depreciação residual até a data do projeto, de forma a poder contemplar seu impacto fiscal no resultado da empresa.

5.6. Definição das premissas e hipóteses econômico-financeiras do projeto

Na ocasião da realização das pesquisas de mercado para o estudo da viabilidade econômica do projeto, as seguintes projeções macroeconômicas foram consideradas:

Crescimento populacional e PIB (Produto Interno Bruto): 4,0% a.a. entre 2010 e 2014;

Moeda: o Real, para expressar todos os valores considerados nas projeções;

Inflação: valores não inflacionados durante o período de projeção;

Depreciação: para os ativos existentes no Grupo, bem como para os novos investimentos previstos com o projeto, aplicadas regras de depreciação já praticadas pelo Grupo para ativos de mídia eletrônica, que estão de acordo com a legislação fiscal aplicável e condizentes com as características dos ativos;

Impostos: Imposto de Renda (IR) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) com as alíquotas exigidas pela legislação fiscal vigente para empresas sob o regime do lucro real: 25% para o IR e 9% para a CSLL, perfazendo total de 34% sobre o lucro tributável;

Capital de giro: com variação positiva dentro do período de projeção – embora toda a receita proveniente de leads e links abertos seja antecipada, 50% dela é paga por meio de cartão de crédito em 30 dias, e a outra metade, de outras formas, cujo prazo médio foi estimado em 15 dias. As principais contas a pagar possuem prazo de 30 dias, assim como o pagamento dos salários e impostos. As despesas de marketing têm prazo de 15 dias;

Contingências: não consideradas as fiscais, cíveis e trabalhistas porventura existentes e incidentes no decorrer do projeto.

5.7. Determinação do horizonte de projeção

Para fins de cálculo dos fluxos de caixa, considerou-se um período explícito de 10 anos mais um valor residual equivalente à perpetuidade do fluxo, calculada com base no último ano do fluxo de caixa, com crescimento estimado de 2%, em parte sustentado por um crescimento populacional de 0,9%. Para calcular o valor residual no final do último ano projetado, utilizou-se a fórmula do modelo de crescimento de Gordon (SANTOS, 2014).

5.8. Modelagem dos fluxos de caixa

Os dados apresentados nas etapas anteriores permitiram a modelagem dos fluxos de caixa, com um plano de contas completo e detalhado das receitas, custos e despesas operacionais, de onde se extraíram os dados para a preparação do demonstrativo do fluxo de caixa que se apresenta a seguir:


Tabela 1
Demonstrativo dos fluxos de caixa
Fonte: autores com dados da empresa de consultoria

5.9. Determinação da estrutura de capital do projeto

O Grupo não considerou captar dinheiro no mercado na forma de empréstimos para financiar o capital necessário aos investimentos descritos no projeto.

5.10. Determinação do custo de capital do projeto

Como 100% dos recursos necessários ao projeto provieram de capital próprio, o custo do capital do projeto se confunde com o custo do capital próprio, calculado com base na fórmula tradicional do modelo de precificação de ativos de capital (CAPM):

CAPM = TLR + b(TRM – TLR) (3),

onde:

TLR: taxa livre de risco

b: coeficiente beta

TRM: taxa de retorno da carteira referencial de mercado

Na composição do CAPM, além dos componentes usualmente encontrados na fórmula, como a taxa livre de risco, o prêmio de mercado e o beta, o Grupo adotou os seguintes componentes de precificação de ativos: risco-país, prêmio de risco pelo tamanho relativo da empresa e risco específico relacionado, este último como forma de compensar riscos não sistemáticos não mitigados, além de descontar a projeção da inflação norte-americana, uma vez que esta afeta o cálculo: da taxa de retorno livre de risco, do prêmio pelo risco de mercado e do prêmio pelo tamanho da empresa.

Dessa forma, passou a ser a seguinte a fórmula do CAPM adotada especificamente para esse projeto (PRATT; NICULITA, 2007; MOHENDROO, 2014):

[fórmula do CAPM]

5.11. Cálculo das métricas de avaliação financeira

Para o cálculo das métricas de avaliação financeira do projeto (VPL, TIR, IL e PB), os fluxos de caixa projetados foram descontados pelo CAPM do projeto calculado para o ano base de 2009. Ao VPL do fluxo de caixa do período explícito de 10 anos foi acrescentado o valor residual, representado pela perpetuidade do fluxo de caixa calculado pelo modelo de crescimento de Gordon (SANTOS, 2014).

Para o cálculo do VPL (Tabela 2), foi adotada a convenção do desconto de meio do ano (mid-year discount rate), prática comum para descontar os fluxos de caixa futuros – quando esses são recebidos de forma homogênea ao longo de todo o período – e trazê-los a valor presente. É bem verdade que, nas fórmulas para calcular o desconto nos fluxos de caixa, todos os valores do fluxo de caixa para determinado ano é creditado apenas no final do mesmo ano – o que não traduz com precisão o que ocorre na prática, já que o dinheiro ingressa na empresa e é aplicado a cada momento durante o ano inteiro. No entanto, a prática de desconto de meio do ano reduz essa imprecisão.

Tabela 2
Cálculo do VPL e o efeito do mid-year discount factor

Observação: taxa de desconto (CAPM) de 20,84%.

Fonte: autores

O CAPM adotado foi o da ocasião em que o projeto foi analisado (2009), ou seja, 20,84% e não o valor de 21,71% encontrado em 2014, quando da realização do estudo de caso (Quadro 1). Como se verá na análise de sensibilidade efetuada mais adiante, essa variação no CAPM não implica qualquer mudança na decisão quanto à viabilidade do projeto.

Quadro 1
CAPM – Comparativo dos Cálculos Realizados em 2009 e 2014

Fonte: autores

5.12. Análise das flexibilidades do projeto e opções reais

Uma técnica de orçamento de capital é incorporar as opções reais cuja abordagem tem o potencial de avaliar o valor do projeto proveniente de uma administração ativa e das interações estratégicas (TRIGEORGIS, 1996). Essa técnica vê o projeto como possibilidade futura e então o avalia com as técnicas usadas pelas opções financeiras.

A consciência sobre a irreversibilidade dos projetos reais e a incerteza sobre o futuro são importantes indutores de busca por flexibilidade gerencial nos projetos de investimento. Considerando que todo projeto real tem parte de seus custos irreversivelmente perdida e, que à medida que novas informações vão surgindo, as incertezas sobre o fluxo de caixa vão se revelando, o gestor do projeto de investimento tem a oportunidade de adotar ações de ajuste visando tomar decisões capazes de impactar positivamente o valor de seu projeto (DIXIT e PINDYCK, 1994).

Parece sensato afirmar que, quanto maior for a parte dos custos do projeto considerada irreversível, maior será a motivação gerencial de refletir sobre as flexibilidades do projeto, de forma a reduzir as incertezas existentes quanto à materialização dos valores modelados no fluxo de caixa. No estudo de caso em questão, na etapa de enquadramento estratégico da oportunidade, descrita na seção 5.2, observa-se que o Grupo já possuía toda a tecnologia necessária e conhecimento do potencial do mercado brasileiro para iniciar o desenvolvimento dos produtos novos. Portanto, as incertezas técnicas não pareciam estar no centro das preocupações dos gestores do Grupo no momento da decisão.

No que concerne às incertezas estratégicas, o Grupo privou a empresa de consultoria de maiores subsídios sobre o posicionamento de seus concorrentes e tampouco disponibilizou dados sobre a volatilidade do mercado de seus principais produtos – dados essenciais à avaliação do impacto do ingresso do Grupo no mercado. Em relação às incertezas econômicas, o Grupo decidiu interpretá-las como risco específico, precificando-as com um acréscimo de 5 pontos percentuais no CAPM do projeto.

Não obstante a análise das incertezas, que se considera realizada pelo Grupo, adotou-se a diminuição nos ajustes de flexibilidades gerenciais considerando dois fatores. Em primeiro lugar, o investimento necessário à execução do projeto era considerado relativamente pequeno em relação a sua magnitude. Trazido a valor presente, o capital investido equivalia a apenas 13% do lucro operacional e 4% dos custos e despesas operacionais. Depois, o capital não era investido no início do projeto e sim distribuído uniformemente ao longo de todo o período explícito do fluxo de caixa.

Assumindo uma considerável proporcionalidade entre os custos operacionais e o volume de vendas, bem como considerando a baixa relevância e a distribuição uniforme do valor investido, pode-se afirmar que foi também baixa a sensação de perda por irreversibilidade do projeto em relação a suas incertezas, o que justificou, em parte, o comportamento gerencial do Grupo sobre as flexibilidades gerenciais do projeto.

Desse modo, ressalvada a inexistência de subsídios para um estudo mais consequente das incertezas estratégicas, o fato de não haver um cálculo do valor das flexibilidades gerenciais do projeto não modificou a conclusão sobre sua viabilidade, resultante da análise das demais métricas de avaliação calculadas.

5.13. Análise de sensibilidade

O primeiro reflexo da consultoria em relação à análise de sensibilidade do projeto concentrou-se em avaliar o impacto da variação do CAPM. Assim, a Tabela 3 abaixo mostra a variação das métricas de avaliação do projeto em função de uma oscilação de 2 pontos percentuais em torno do valor calculado do CAPM.

Tabela 3
Variação das métricas em função do CAPM

Fonte: autores.

Pôde-se concluir que uma variação de 2 pontos percentuais no CAPM de 20,84% não seria suficiente para mudar as conclusões sobre o resultado econômico-financeiro do projeto, podendo-se afirmar igualmente que, se os cálculos tivessem sido realizados com o CAPM recalculado em 2014, de 21,71%, isso tampouco modificaria as conclusões sobre a viabilidade do projeto.

Poder-se-ia indagar o porquê de se considerar uma variação de 2% e não 5% ou 10% para o cálculo da sensibilidade do projeto quanto ao CAPM. Embora a viabilidade do projeto não mude para qualquer uma dessas variações, em virtude da importância do LAJIDA (lucro antes dos juros, impostos, depreciação e amortização) frente aos investimentos necessários, cabe levar em conta o contexto no qual o projeto foi analisado. Uma variação maior na análise de sensibilidade de uma variável independente calculada pela empresa de consultoria sugeriria a possibilidade de erro significativo no cálculo da referida variável.

Complementarmente, observa-se que todo o risco não sistemático atribuído ao projeto foi traduzido pelo Grupo em apenas 5 pontos percentuais. Logo, não pareceria adequado atribuir variações muito maiores na análise de sensibilidade do CAPM.

Em seguida, passou-se a avaliar o impacto das principais variáveis independentes do projeto, quais sejam: o volume de venda, que impacta diretamente a receita, os custos totais e o investimento. Os gráficos a seguir permitem visualizar o impacto de cada uma das variáveis: receita bruta; custos e despesas; e investimentos no projeto.


Gráfico 1
Variação do período de payback descontado (em anos)
Fonte: autores


Gráfico 2
Variação do valor presente líquido (em milhões de reais)
Fonte: autores


Gráfico 3
Variação da taxa interna de retorno (em %)
Fonte: autores

Pela observação dos gráficos, conclui-se que a receita bruta é a variável de maior impacto sobre o projeto, seguida dos custos e despesas, enquanto o investimento tem impacto irrelevante sobre a variação de qualquer uma das métricas. A análise indica claramente que a receita é a variável na qual o gestor deveria concentrar esforços para melhorar o conhecimento de sua volatilidade. Com efeito, apesar de haver VPL positivo mesmo com 20% de queda de receita, a análise mostra que, a cada 1% de queda na receita, há uma perda de R$ 3,1 milhões de VPL – este passaria a ser negativo perto de 30% de queda de receita.

5.14. Análise de cenários

Para Bock e Trück (2011), na análise de riscos dos projetos de investimento, não raramente, os dados históricos sobre eventos de baixa frequência e alta gravidade não estão disponíveis, o que torna recomendável incluir a análise de cenários no modelo para quantificar o risco. No caso em estudo, o Grupo decidiu, a priori, precificar as incertezas classificando-as como riscos específicos do projeto, majorando em 5% o custo do capital próprio a ser investido. No entanto, o reconhecimento de insuficiência de dados sugere não a simples adoção de um maior custo de capital, mas a aplicação da análise de cenários, em que a falta de dados cede lugar à análise de situações capazes de ocorrer e impactar negativa ou positivamente o projeto. O Grupo não ofereceu à consultoria elementos sobre o contexto concorrencial a que o projeto estaria sujeito. Contudo, considerando a amplitude de +/-20% utilizada para o cálculo de análise de sensibilidade, é bem provável que a ocorrência simultânea de queda de volume com queda de preço, provocada por uma eventual disputa concorrencial, pudesse provocar um impacto considerável na rentabilidade do projeto.

5.15. Recomendações

Tendo em conta as hipóteses econômicas consideradas, bem como as informações transmitidas pelo Grupo sobre a projeção de sua receita, custos e despesas, depreende-se que seu projeto de investimento é viável. Essa inferência pressupõe que os dados permitiram a modelagem dos fluxos de caixa e a determinação do CAPM.

Contudo, vale ressalvar a importância do impacto do volume de vendas sobre a receita bruta e seu consequente reflexo nas métricas adotadas. Ademais, muito embora o escopo do estudo não tenha incluído a análise mercadológica e estratégica do projeto, cabe recomendar a revisitação dos dados mercadológicos da empresa em venda de desejos por lead e link aberto, que juntas representam mais de 90% das receitas do Grupo no horizonte do projeto.

Nessas circunstâncias, o que se pode afirmar inequivocamente é apenas que, no cenário de base, isto é, naquele adotado pelo Grupo para realizar os cálculos de viabilidade econômica, o projeto é viável, como mostram os dados apresentados anteriormente. Contudo, recomendar-se-ia vivamente que a análise fosse revista tendo em conta um cenário de disputa concorrencial e, de acordo com seus resultados, a análise fosse complementada com as medidas de mitigação de risco cabíveis.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A natureza complexa da decisão de investimento, com um largo espectro de fatores, implica que o empresário nem sempre domina e/ou utiliza todas as metodologias e técnicas para validar a tomada de decisão. A inexistência de um processo formal e estruturado de avaliação de investimentos pode acarretar a aprovação de projetos inviáveis ou a rejeição de projetos viáveis.

O objetivo da pesquisa centrou-se em fundamentar a importância da análise de projetos de investimentos utilizando informações extraídas de relatórios técnicos de mercado, convertidas em um roteiro para avaliação de investimentos utilizando a metodologia de fluxo de caixa descontado. Para a aplicabilidade do roteiro e validação parcial dos resultados, baseiou-se em um estudo de caso real, reanalisado por uma empresa internacional de consultoria.

Com isso, o estudo não abrangeu as análises estratégica e mercadológica, não se baseou em um processo formal sistematizado de avaliação de projetos de investimento, nem apresentou os procedimentos técnicos para validar o custo de capital – os administradores do Grupo arbitraram um prêmio de risco, majoraram em 5% o custo do capital próprio a ser investido e consideraram uma variação de 2% para o cálculo da sensibilidade do projeto quanto ao CAPM.

Outros aspectos importantes relacionados às premissas assumidas pelos profissionais da área financeira do Grupo para projeção de resultados inspiram cuidado. A projeção do PIB realizada na ocasião do projeto, por exemplo, carrega certo clima de entusiasmo e excesso de otimismo da administração do Grupo: a projeção das vendas com a inclusão dos novos serviços para o último ano projetado (2019: R$146.471 mil) é 85 vezes superior à receita projetada para o primeiro ano (2010: R$1.732 mil). Outra evidência do excesso de otimismo do Grupo foi considerar o crescimento do PIB.

A principal restrição para a empresa de consultoria foi o foco exclusivo, por parte da empresa contratante, sobre a avaliação de natureza econômico-financeira, não fornecendo informações da concorrência, de pesquisa de mercado e de estratégia comercial. Tal contexto, em parte, dificultou a tarefa de reanálise do investimento, por levar em conta premissas, projeções e dados arbitrados questionáveis, sem a presença de documentação robusta. Esse tipo de limitação também é destacado por Carr, Kolehmainen e Mitchell (2010), que criticam o caráter fragmentário como a literatura por eles analisada associa discussões estratégicas e financeiras dentro de um instrumento mais amplo de planejamento formal, destinado a avaliar a viabilidade financeira de investimentos.

Os resultados da pesquisa sugerem que, se a avaliação de investimento selecionada também fosse sustentada em informações disponibilizadas da empresa (ex. estratégia comercial e pesquisa de mercado) e do desempenho da concorrência, e conduzida por um roteiro de avaliação por etapas, como o proposto na pesquisa, certamente se reduziria parte do risco de efetivação dos resultados projetados. Outra constatação é que todas as etapas do processo de avaliação poderiam ter sido aplicadas integralmente para avaliar o projeto de investimento, com ligeiras adaptações, como, por exemplo, a adoção do mid-year discount rate e a metodologia de cálculo do CAPM, pela forma de inclusão de componentes como o prêmio de risco-país.

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