O PROBLEMA DAS RELAÇÕES INTERESTATAIS NO PENSAMENTO POLÍTICO DE ROUSSEAU

Autores

DOI:

https://doi.org/10.30611/2019n15id43141

Palavras-chave:

Rousseau, Direito natural, Relações interestatais, Corpo político, Estado de guerra

Resumo

O objetivo do presente artigo é explicar o que leva J.-J. Rousseau a afirmar que o conflito é inerente às relações entre Estados. Trata-se, pois, de elucidar o que fundamenta o diagnóstico disposto em seus Principes du droit de la guerre, segundo o qual “o estado de guerra é natural entre as potências”. Para tanto, avançamos uma hipótese que pode ser desmembrada em dois eixos interligados. Se o genebrino sustenta que a condição originária das soberanias é de hostilidade mútua – ainda que não deflagrada –, isso se deve (i) a um marcado questionamento da efetividade, se não da possibilidade mesma, de uma regulação jurídica do plano interestatal e (ii) à natureza peculiar do ente político. O primeiro momento desta hipótese irá nos conduzir ao diálogo crítico que Rousseau estabelece com a tradição jusnaturalista, uma vez que o direito natural, pelo menos em sua acepção canônica, impõe-se como princípio de obrigação tanto para os indivíduos quanto para os seres coletivos. Desde essa perspectiva, portanto, as relações interestatais contariam, ab ovo, com um dispositivo normativo. Disso se segue que a guerra seria, invariavelmente, o produto de um desvio, de uma ruptura daquela ordenação preestabelecida; jamais o estado originário do sistema internacional, como pretende Rousseau. Contudo, a recusa de uma normatividade natural não explica, por si, a belicosidade da dinâmica interestatal. É sabido que, sob a ótica rousseauniana, os indivíduos no puro estado de natureza – isto é, aquém do discernimento de quaisquer normas de justiça arrazoada – desconhecem a guerra. Daí o segundo momento de nossa hipótese: é preciso explicitar a profunda diferença entre a natureza humana e aquela dos corpos políticos, de modo a esclarecer por que, deixados a si, os indivíduos dispõem de uma existência pacífica, enquanto as potências tendem ao conflito.

Referências

ARISTOTLE. Politics. Trad. Benjamin Jowett. Oxford: Clarenton Press, 1920.
BACHOFEN, Blaise. “Les raisons de la guerre, la raison dans la guerre. Une lecture des Principes du droit de la guerre”. In: ROUSSEAU, Jean-Jacques. Principes du droit de la guerre; Ecrits sur la paix perpétuelle. Paris: Vrin, 2008.
BÉLISSA, Marc. Fraternité universelle et intérêt national (1713-1795). Les cosmopolitiques du droit des gens. Paris: Kimé, 1998.
BOUCHER D’ARGIS. “Sociedade (Moral)”. In: DIDEROT, Denis & d’ALEMBERT, Jean le Rond (Eds.). Enciclopédia, ou Dicionário razoado das ciências, das artes e dos ofícios (vol. 4 – Política). Trad. Maria das Graças de Souza. São Paulo: Editora UNESP.
BERNARDI, Bruno. La fabrique des concepts: Recherche sur l’invention conceptuelle chez Rousseau. Paris: Honoré Champion, 2006.
DERATHÉ, Robert. Rousseau e a ciência política de seu tempo. Trad. Natália Maruyama. São Paulo: Discurso Editorial/Barcarolla, 2009.
DAMILAVILLE, Étienne. “Paix (Droit naturel, droit moral, droit politique)”. In: DIDEROT, Denis & d’ALEMBERT, Jean le Rond (Eds.). Encyclopédie, ou dictionnaire raisonné des sciences, des arts et des métiers. University of Chicago: ARTFL Encyclopédie Projet (Winter 2008 Edition), Robert Morrissey (Org.). Disponível on-line em: http://encyclopedie.uchicago.edu/
DERRIDA, Jacques. Gramatologia. Trad. Miriam Chnaiderman e Renato Janine Ribeiro. São Paulo: Perspectiva, 2006.
DIDEROT, Denis. “Direito natural (moral)”. In: _____ & d’ALEMBERT, Jean le Rond (Eds.). Enciclopédia, ou Dicionário razoado das ciências, das artes e dos ofícios (vol. 4 – Política). Trad. Maria das Graças de Souza. São Paulo: Editora UNESP.
FABRE, Jean. “Deux frères ennemis: Diderot et Jean-Jacques”. In: Diderot Studies, vol. III, n. 1. Paris: Librairie Droz, 1961.
FRINGS, Manfred. “Zur Idee des Friedens bei Kant und Max Scheler”. In: Kant-Studien, vol. 66, n. 1, 1975.
GOYARD-FABRE, Simone. La construction de la paix, ou le travail de Sisyphe. Paris: Vrin, 1994.
__________. “La guerre et de droit international dans la philosophie de Rousseau”. In: Études J.-J. Rousseau, n. 7. Montmorency: Musée Jean-Jacques Rousseau, 1995.
HOBBES. Thomas. Leviathan or the matter, forme, & power of a common-wealth ecclesiasticall and civill. Londres: Andrew Crooke, 1651 (Edição eletrônica preparada por Rod Ray para o McMaster University Archive of the History of Economic Thought).
JACOURT, Louis de. “Lei natural (Direito natural)”. In: DIDEROT, Denis & d’ALEMBERT, Jean le Rond (Eds.). Enciclopédia, ou Dicionário razoado das ciências, das artes e dos ofícios (vol. 4 – Política). Trad. Maria das Graças de Souza. São Paulo: Editora UNESP.
LASSUDRIE-DUCHÈNE, Georges. Jean-Jacques Rousseau et le droit des gens. Paris: Henri Jouve, 1906.
LEPAN, Géralidine. Jean-Jacques Rousseau et le patriotisme. Paris: Honoré Champion, 2007.
PUFENDORF, Samuel. Le droit de la nature et des gens ou système général de la morale, de la jurisprudence et de la politique. Traduzido do latim por Jean Barbeyrac. Amsterdam: Pierre de Coup, 1734 (Edição reimpressa pela University of Toronto).
RADICA, Gabrielle. L’Histoire de la raison. Anthropologie, morale et politique chez Rousseau. Paris: Honoré Champion, 2008.
RAMEL, Frédéric & JOUBERT, Jean-Paul. Rousseau et les relations internationales. Paris: L’Harmattan, 2000.
ROOSEVELT, Grace. Reading Rousseau in the nuclear age. Philadelphia: Temple University Press, 1990.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. “Idée de la méthode dans la composition d’un livre (Mélanges de littérature et morale)”. In: Oeuvres Complètes, vol. II. Paris: Gallimard (Bibliothèque de la Pléiade), 1964.
_________. “Discours sur l’origine et les fondemens de l’inégalité parmi les hommes”. In: Oeuvres Complètes, v. III. Paris: Gallimard (Bibliothèque de la Pléiade), 1964a.
_________. “Du contract social ou Essai sur la forme de la République (Première version)”. In: Oeuvres Complètes, vol. III. Paris: Gallimard (Bibliothèque de la Pléiade), 1964b.
ROUSSEAU, Jean-Jacques. “Du contract social ou principes du droit politique”. In: Oeuvres Complètes, vol. III. Paris: Gallimard (Bibliothèque de la Pléiade), 1964c.
_________. “Emile ou de l’éducation”. In: Oeuvres Complètes, vol. IV. Paris: Gallimard (Bibliothèque de la Pléiade), 1969.
_________. Principes du droit de la guerre. Paris: Vrin, 2008.
SILVESTRINI, Gabriella. Diritto naturale e volontà generale. Il contrattualismo repubblicano di Jean-Jacques Rousseau. Torino: Claudiana, 2010.
SPECTOR, Céline. “De Diderot à Rousseau: la double crise du droit naturel moderne”. In: BACHOFEN, Blaise, BERNARDI, Bruno & OLIVO, Gilles (éds.) Rousseau, Du contract social, ou Essai sur la forme de la République (Manuscrit de Genève). Paris: Vrin, 2012.
VAUGHAN, Charles Edwin. “Introduction”. In: The political writings of Jean-Jacques Rousseau, vol. I. Cambridge: Cambridge University Press (Edição digitalizada pela Open Library of Liberty), 1915.

Downloads

Publicado

2019-12-24

Edição

Seção

Dossiê Jean-Jacques Rousseau