OS ASPECTOS RESIDUAIS MEDIEVOS DO CORPO GROTESCO NA RELAÇÃO COMER/AMAR EM DONA FLOR E SEUS DOIS MARIDOS, DE JORGE AMADO
Resumo
Há nos textos de Jorge Amado uma arte dessacralizada, ligada ao popular, o que aproxima a sua obra da literatura “carnavalizada”, típica da Idade Média, estudada por Bakhtin (2010), pois, além da linguagem irreverente, os “tipos”, cenários e motivos, geralmente criados pelo autor baiano, são traços da cultura extraoficial que caracteriza a estética de contestação de normas do carnaval e faz aparecer corpos-signos grotescos que geram o disparate e invertem os sentidos. A fim de estudar esses corpos grotescos, busca-se no presente trabalho analisar o romance "Dona Flor e seus dois maridos", no que concerne à relação estabelecida entre comida e amor na narrativa. No intuito de compreender como a mentalidade medieval acerca do grotesco manifesta-se ativamente nesse romance, utilizamos a Teoria da Residualidade Cultural e Literária, proposta teórico-investigativa sistematizada por Roberto Pontes e certificada junto à Universidade Federal do Ceará e ao Diretório de Pesquisa do CNPq. Os resultados apontam que a protagonista dona Flor é portadora de um corpo grotesco pleno de exuberância que busca a comunhão com outros corpos e não se molda às convenções sociais. Ademais, há nessa obra uma complementariedade entre o comer e o amar como uma das manifestações fundamentais da vida do corpo "carnavalizado". Tal associação, pertencente a formas remotas da cultura popular-carnavalesca, atravessa os séculos, cristalizando-se ainda hoje na mentalidade e no discurso de vários segmentos sociais. Conclui-se, então, que os aspectos da representação do grotesco observados no romance em análise são resíduos da mentalidade medieva, cristalizados na escrita de Jorge Amado, sendo possível estabelecer uma ligação entre o imaginário nordestino e os substratos mentais do homem medieval no que respeita ao tema.Publicado
2019-01-01
Edição
Seção
XII Encontro de Pesquisa e Pós-Graduação
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