SEGURANÇA, PRIVACIDADE E CONFIDENCIALIDADE DOS REGISTROS EM SAÚDE
SECURITY, PRIVACY AND CONFIDENTIALITY OF HEALTH RECORDS
Margarete Moraes¹
¹ Doutora em Educação pela Universidade
Federal do Espírito Santo (UFES).
E-mail: margamoraes@gmail.com
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Internacional.
Conflito de interesses: A autora declara que
não há conflito de interesses.
Financiamento: Não há.
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neste artigo.
Recebido em: 01/10/2019.
Revisado em: 20/10/2019.
Aceito em: 31/10/2019.
Como citar este artigo:
MORAES, Margarete. Informação em Pauta,
Fortaleza, v. 5, n. especial, p. 23-35, março 2020.
DOI: https://doi.org/10.36517/2525-
3468.ip.v5iespecial1.2020.43509.9-22.
RESUMO
As organizações de saúde são instituições
complexas e as informações registradas
produzidas por elas, principalmente aquelas
relacionadas à assistência ao paciente, são
consideradas sensíveis na medida em que se
referem à intimidade e a privacidade das
pessoas. Desta forma, entende-se que a gestão
destas informações registradas deva acontecer
em nível de excelência. Este trabalho pretende
apresentar as soluções intrínsecas (resoluções
do CFM e padrões de gestão em saúde) e
extrínsecas (SIGAD e RDC-Arq) ao sistema de
saúde, para garantir que estas informações
cumpram seu papel, mas também sejam
protegidas do acesso inadequado e preservadas
para posteridade.
Palavras-chave: Informações sensíveis. SIGAD.
RDC-Arq. Organização Nacional de Acreditação.
ABSTRACT
Health organizations are complex institutions
and the information they produce, especially
those related to patient care, are considered
sensitive insofar as they relate to the privacy and
privacy of individuals. In this way, it is
understood that the management of this
registered information must happen at the level
of excellence. This work intends to present the
intrinsic solutions (CFM resolutions and health
management standards) and extrinsic (SIGAD
and RDC-Arq) to the health system, to ensure
that this information fulfills its role,
but also be protected from improper access and
preserved for posterity.
Keywords: Sensitive information. SIGAD. RDC-
Arq. Organização Nacional de Acreditação.
Inf. Pauta Fortaleza, CE
v.5 n. especial
março 2020
ISSN 2525-3468
DOI: 10.36517/2525-3468.ip.v5iespecial 1.2020.43510.23-35
ARTIGO
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1 INTRODUÇÃO
Quando seres humanos se organizam no intuito de atingir certos resultados,
indubitavelmente produz-se volumes consideráveis de informações, especialmente
informações registradas. Estas informações produzidas neste contexto possibilitam a
garantia de melhor desencadeamento e eficiência das atividades planejadas e
perseguidas, para o atingimento do resultado desejado. Elas também auxiliam na prova
da execução destas atividades, de forma a subsidiar litígios jurídicos, produção de
narrativa histórica e resgate de memória das organizações artificiais humanas, as
organizações.
Como todo trabalho coletivo humano, o empreendimento organizacional é
complexo e difícil, na medida em que pessoas possuem histórias, formações, valores e
comportamentos diferentes, e mesmo que estejam imbuídas nos mesmos objetivos,
estas diferenças se refletirão no trabalho coletivo e consensual, que o empreendimento
organização demanda.
As informações orgânicas registradas funcionariam como um porto seguro para o
bom caminhar de um empreendimento organizacional. Elas fazem funcionar a máquina,
provam o que aconteceu e ajudam a lembrar de fatos e decisões tomadas. Sem estas
prerrogativas, os empreendimentos organizacionais não poderiam existir.
Entretanto estas informações orgânicas registradas carecem de ser estudadas,
organizadas, armazenadas, representadas e publicizadas, para que de fato, cumpram o
seu papel dentro e fora das organizações que as produziram. Estas informações são
fundamentais e cumprem melhor seu papel se incluídas em uma gestão de informações
e documentos séria e responsável. Os resultados dos empreendimentos organizacionais
são proporcionais ao nível de sua competência de organização, e neste sentido estão as
informações orgânicas registradas. Elas trabalharão melhor e cumprirão as funções para
as quais foram criadas, se bem gerenciadas.
No caso das informações em saúde, os registros da assistência são tão antigos
quanto a própria medicina. Eles precedem às próprias organizações em saúde, tal qual
conhecemos hoje. os utilizavam os antigos egípcios. Segundo Carvalho (1977), o
primeiro relatório médico, data de 3000 a 2500 a.C. e foi produzido pelo médico egípcio
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Imhotep
, que registrou 48 casos cirúrgicos em um papiro, hoje expostos na Academia
de Medicina de Nova York.
De acordo com Marin; Massad; Azevedo Neto (2003), Hipócrates, no século V a.C.
estimulava os médicos a fazerem registros escritos, pois tais registros possuíam dois
propósitos básicos, refletir de forma exata o curso da doença e indicar suas possíveis
causas. E Florence Nightingale 1820-1910, precursora da enfermagem moderna, nos
tempos em que tratou os doentes da guerra da Criméia (1853-1856), também detectou a
necessidade da existência de registros das informações relativas aos doentes.
Através dos registros assistenciais foi possível divulgar e melhor estudar as
técnicas terapêuticas médicas da antiguidade ocidental e oriental. Entretanto foi o início
da atuação dica no ambiente hospitalar que possibilitou a organização destes
registros. A disciplina imposta pelo profissional médico introduziu a cultura da
vigilância constante aos pacientes e de seus registros, que normalmente eram coletivos e
por evento.
Apesar da longa história dos registros médicos e de sua organização, a ideia de
que a avaliação da qualidade do atendimento médico era condição básica para
padronização dos serviços de saúde, principalmente hospitais, e que a análise das
informações contidas nos registros do prontuário do paciente, o único meio para esta
avaliação, é recente, data das primeiras décadas do século XX. Foi precursada pelo
Colégio Americano de Cirurgiões, que estabeleceu normas para classificação de
hospitais. E que na década de 1920, estabelecia requisitos de qualidade de hospitais,
onde requisitava os registros precisos e completos dos atendimentos e arquivamento
dos prontuários para conceder-lhes credenciamento (FELDMAN, GATTO e CUNHA,
2005).
As organizações de saúde são extremamente complexas, gerando quantidade
brutal de informações registradas. E como organizações de prestação de serviços, são
extremamente dependentes da informação para operar suas atividades e manterem-se
ativas. Os registros da assistência hoje, conjuntamente com outras informações
orgânicas, proporcionam certo patamar seguro de gestão clínica e administrativa, além
de atenderem as necessidades do sistema complexo que é o da saúde na atualidade.
Imhotep foi um misto de arquiteto, médico e mago. Os antigos egípcios o identificaram a Esculápio, deus
da medicina, sendo sua tumba local de peregrinação religiosa na antigüidade.
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As necessidades mais fundamentais seriam a possibilidade de continuidade da
assistência ao paciente e a comunicação entre os profissionais de saúde. O registro da
assistência, principalmente manifestado através do prontuário do paciente, permite que
as equipes acompanhem a evolução e o resultado do planejamento de tratamento
proposto. Dia após dia, no contexto hospitalar, por exemplo, as informações registradas
das avaliações do paciente darão aos profissionais, a exata medida do que ainda fazer ou
o que deu certo ou não. Subtrair tais informações é um alto risco para o tratamento do
paciente porque interrompe a sequência dos cuidados ao paciente.
Da mesma forma que, sem tais informações, profissionais não poderiam se
comunicar eficazmente, visto que somente as informações registradas da assistência são
validadas para tomada de decisões dos profissionais. É importante frisar que falhas de
comunicação entre os diversos profissionais que compõem a equipe de saúde, são
consideradas umas das mais importantes causas de incidentes no cuidado ao paciente.
O não acesso ao prontuário do paciente e outras informações registradas
relevantes, impacta também em aumento dos custos dos processos assistências. O não
acesso aos resultados de exames prescrições e registros do cuidado incorre em
retrabalho da equipe e uso desnecessário de recursos materiais e tecnológicos.
Neste sentido é imprescindível o gerenciamento adequado das informações
registradas em saúde. Somente um nível ótimo deste gerenciamento poderá garantir a
rastreabilidade das atividades clínicas e administrativas, a avaliação da qualidade dos
serviços, assim como a geração de conhecimento em saúde, que contribua para a
melhoria da saúde de indivíduos e populações.
Para tanto, a gestão destas informações requer metodologias e técnicas que
garantam a segurança de informações e registros, em todo o seu ciclo de vida, a
confidencialidade das informações e a privacidade das pessoas, pois as informações em
saúde, registradas ou não, e principalmente aquelas produzidas pela assistência ao
paciente, que são consideradas sensíveis, pois referem-se à dimensão crítica e íntima,
que é a saúde dos indivíduos
.
A confidencialidade pode ser entendida como a garantia de que as informações e
dados não sejam divulgadas ou estejam disponíveis para consulta, sem autorização do
De acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais LGPDP (Lei 13.709/2018), dado pessoal
sensível refere-se à [...] origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou
a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado
genético ou biométrico, quando vinculado a uma pessoa natural”.
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indivíduo que a forneceu em confiança. Já a privacidade é o direito constitucional, que os
indivíduos têm de não terem sua intimidade, ou informações acerca de si, expostas sem
sua autorização. A privacidade não é uma prerrogativa da informação e dados, mas
estão incluídos o corpo e a imagem dos indivíduos. Gerir informações registradas em
saúde é, além de outras questões importantes, preservar e proteger as informações, os
dados, o corpo e a imagem dos pacientes, profissionais e instituições.
2 A SAÚDE E SUAS SOLUÇÕES PARA A GESTÃO DAS INFORMAÇÕES
REGISTRADAS
Entretanto o sistema de saúde e quem o pensa e o representa tem trabalhado,
faz um tempo, para assegurar maior segurança e qualidade às informações registradas
da assistência, impactando na garantia da confidencialidade das informações do
paciente e sua privacidade. Estas ações variam entre determinações de conselhos de
categoria, Leis e regulamentações oficiais às normas de boas práticas de gestão de
organizações civis ligadas ao sistema.
As determinações de conselhos de categoria referem-se fundamentalmente à
confiabilidade, qualidade e confidencialidade das informações registradas em saúde.
Equivale-se aos procedimentos para gestão da produção de documentos, se
compararmos à Gestão de Documentos Arquivísticos. O Conselho Federal de Medicina,
no Art. 87, de seu Código de Ética dica (2009) indica que o médico não pode [...]
deixar de elaborar prontuário legível para cada paciente” e no inciso primeiro deste
mesmo artigo, o código afirma que:
[…] O prontuário deve conter os dados clínicos necessários para a boa condução
do caso, sendo preenchido, em cada avaliação, em ordem cronológica com data,
hora, assinatura e número de registro do médico no Conselho Regional de
Medicina. Código de Ética Médica (CFM 1931/2009).
Esta prescrição para os profissionais dicos pretende garantir que as
informações registradas da assistência sejam de qualidade e confiram um caráter de
confiabilidade, creditando verdade a elas. No referido código é obrigatório o registro dos
dados clínicos, que devem conter sempre metadados como data, hora e identificação do
profissional. Estas prescrições de produção do registro da assistência apresentam os
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mesmos objetivos dos procedimentos do gerenciamento da produção do documento
arquivístico, a autenticidade.
No que tange à confidencialidade e privacidade, o mesmo código, no artigo 102º
afirma que […] é vedado ao médico revelar fato de que tenha conhecimento em virtude
do exercício, salvo por justa causa, dever legal ou autorização expressa do paciente.
E na Resolução 1605 de 2000 do CFM, em seus artigos e 7º, prescrevem que
mesmo:
[...] na investigação da hipótese de cometimento de crime, o médico está
impedido de revelar segredo que possa expor o paciente a processo criminal
mesmo que seja para sua defesa pessoal... o médico poderá apresentar a ficha
ou prontuário médico à autoridade competente, solicitando que a matéria seja
mantida em segredo de justiça.
A proteção da pessoa e de sua intimidade e neste contexto, as informações
registradas de sua assistência, sempre foram preocupações dos que pensam, atuam e
gerem a saúde, pelo menos desde a constituição de 1988. A ideia de que os pacientes
precisam ter suas informações e corpos protegidos e sobre sigilo, é um pressuposto
fundamental da assistência à saúde e também de todo o sistema, de forma que
resoluções e diretrizes foram estabelecidas prioritariamente.
Sobre a qualidade das informações registradas, o CFM, através de sua resolução
1638/2002, estabelece a obrigatoriedade em todos os estabelecimentos de saúde, da
implantação da Comissão de Revisão de Prontuários. Esta Comissão é um grupo
multidisciplinar que avalia a completude, a acurácia, a lógica e a qualidade das
informações da assistência registradas no prontuário do paciente.
No seu artigo 5º, a resolução define que todos os prontuários, digitais ou
analógicos, independentemente do nível e tipo da assistência prestada, devem conter
obrigatoriamente:
Identificação do paciente nome completo, data de nascimento (dia, mês e ano
com quatro dígitos), sexo, nome da mãe, naturalidade (indicando o município e
o estado de nascimento), endereço completo (nome da via pública, número,
complemento, bairro/distrito, município, estado e CEP);
Anamnese, exame físico, exames complementares solicitados e seus respectivos
resultados, hipóteses diagnósticas, diagnóstico definitivo e tratamento
efetuado;
Evolução diária do paciente, com data e hora, discriminação de todos os
procedimentos aos quais o mesmo foi submetido e identificação dos
profissionais que os realizaram, assinados eletronicamente quando elaborados
e/ou armazenados em meio eletrônico;
Nos prontuários em suporte de papel é obrigatória a legibilidade da letra do
profissional que atendeu o paciente, bem como a identificação dos profissionais
prestadores do atendimento. São também obrigatórios a assinatura e o
respectivo número do CRM;
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Nos casos emergenciais, nos quais seja impossível a colheita de história clínica
do paciente, deverá constar relato médico completo de todos os procedimentos
realizados e que tenham possibilitado o diagnóstico e/ou a remoção para outra
unidade.
O estabelecimento de informações nimas obrigatórias que todo prontuário
deve conter, além de definir que os estabelecimentos de saúde devam garantir que elas
estejam sempre completas e adequadas, através de auditorias de prontuário, é um
mecanismo, que não padroniza as informações do prontuário, como também garante
a qualidade das informações registradas nele.
Com a necessidade de garantir a mesma qualidade, segurança e confidencialidade
das informações registradas em saúde, o CFM estabeleceu em 2007 as normas técnicas
para digitalização e uso de sistemas informatizados para a guarda e manuseio dos
documentos dos prontuários dos pacientes, com isso autorizando a eliminação dos
prontuários em suporte papel, desde que respeitados os requisitos desta norma.
Desta forma, através da resolução 1821
de 23 de novembro de 2007, o CFM, em
parceria com a Sociedade Brasileira de Informática em Saúde - SBIS lançou o Manual de
Certificação para Sistemas de Registro Eletrônico em Saúde, que hoje está na versão
4.3/2019. Apesar da parceria SBIS/CFM está estabelecida mais de uma década, o
volume de certificações ainda é baixo e inclusive ainda não incluiu nenhum sistema de
gerenciamento de prontuários digitalizados.
De qualquer forma, a Resolução CFM 1821/2007 estabeleceu critérios
escalonados para certificar sistemas de prontuário eletrônico. Assim os sistemas podem
ser certificados no nível de garantia de segurança 1 ou no nível de garantia de segurança
2 (NGS1 e NGS2). Os sistemas certificados no NGS1 não podem eliminar o papel, ou seja,
os processos assistenciais podem operar, registrando e consumindo informação no
sistema, mas ao final do atendimento é necessário imprimir e autenticar o prontuário
com assinaturas tradicionais. Entretanto se o sistema for certificado no NGS2, não
necessidade de impressão. No certificado no NGS2, que exige o uso das chaves públicas
para assinatura digital, o prontuário eletrônico, de acordo com os requisitos do manual,
A primeira iniciativa do CFM em estabelecer critérios para o uso de prontuários eletrônicos foi a
aprovação da Resolução 1639 de 2002. A Resolução 1821/2007 que revogou a 1639/2002 ampliou o
escopo do manual da parceria CFM/SBIS. Agora o manual certifica o que se consensou chamar Registro
Eletrônico em Saúde - RES, um conceito que inclui, além do prontuário eletrônico, sistemas de informação
que permitem a troca de informações entre estabelecimentos e operadoras de saúde.
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passa ser a base informacional assistencial legal do estabelecimento proprietário do
sistema.
Como o manual da parceria CFM/SBIS, foi lançado anos antes do Conselho
Nacional de Arquivos - CONARQ emitir os requisitos para os sistemas informatizados
para a gestão arquivísticas de documentos - SIGAD (2009) e dos repositórios
arquivísticos digitais confiáveis - RDC-Arq (2014), ainda não houve revisão dos
requisitos do manual do CFM/SBIS para se adaptarem. Na verdade, apesar de alguns
pesquisadores já apontarem divergências tanto conceitual, como procedimental entre os
três conjuntos de requisitos, ainda é necessário a intensificação do diálogo.
Sobre a gestão da qualidade e segurança das informações, instâncias do sistema
de saúde brasileiro produziram uma série de manuais com modelos de gestão de
qualidade e segurança para estabelecimentos de saúde, que possuem um conjunto de
padrões exclusivamente para a gestão da informação.
Estes manuais, organizados pela Organização Nacional de Acreditação - ONA e no
contexto dos movimentos nacionais e internacionais sobre a segurança do paciente,
pretendem elevar o nível de qualidade da saúde brasileira e fomentar as Acreditações,
que são certificações de qualidade voluntárias dos estabelecimentos de saúde.
Os manuais de Acreditação da ONA, são constituídos de capítulos para gestão
clínica e capítulos para gestão administrativa. Os requisitos contidos nestes capítulos se
apresentam em 3 níveis. Os de nível 1 relacionam-se à segurança do paciente e
adequação estrutural da organização de saúde. Os de nível 2, além de atenderem aos
critérios de segurança, devem cumprir requisitos de gestão integrada dos processos de
trabalho. E nos de nível 3 indicam excelência em gestão.
Nestes manuais encontra-se um capítulo específico para um padrão de gestão da
informação. O capítulo Gestão de Informação e Comunicação tem seu escopo e conceito
definido pelo manual da ONA (2018, p. 45) como:
Conjunto da segurança dos dados e informações, em meio físico e digital,
considerando a coleta, a integração e a organização, o controle, a
disponibilização, a movimentação, o recebimento, o armazenamento, a
conservação e o descarte das informações. Estabelecimento de meios de
comunicação interna e externa contemplando paciente/cliente e familiares,
profissionais de serviços de saúde, fontes pagadoras, sociedade, órgãos de
classe e terceiros e para situação de crise.
Este capítulo possui 19 requisitos para nível 1 e 5 para o nível 2, ou seja, 19
estruturantes do processo, ou requisitos básicos e 5 de gerenciamento, ou para seu
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gerenciamento. Dos 19 requisitos de nível 1, 10 são exclusivos às informações do
prontuário do paciente ou acerca de informações assistenciais e 9 atingem também
outras informações. Dos 5 requisitos do vel 2, 3 são exclusivos e outros 2 impactam
também outras informações.
Dentre os 10 requisitos de nível 1 que se referem exclusivamente ao
gerenciamento do prontuário, estão:
Organiza e integra as informações do paciente/cliente permitindo acesso ao
histórico dos atendimentos realizados;
Estabelece método para registro do paciente/cliente, permitindo a
continuidade do cuidado e assistência adequada pela equipe multiprofissional;
Estabelece mecanismos visando à qualidade e a integridade dos registros e
informações dos pacientes/clientes;
Estabelece mecanismos e procedimentos para movimentação,
disponibilização, rastreabilidade, sigilo, segurança, conservação e descarte da
informação do paciente/cliente;
Estabelece mecanismos e procedimentos para gerenciar a segurança e o sigilo
das informações do paciente/cliente sejam por meios físicos ou virtuais;
Estabelece diretrizes para o uso e acesso do prontuário visando à privacidade
e confidencialidade das informações.
Observa-se que este recorte de requisitos específico para o gerenciamento do
prontuário, inclui um conjunto de prescrições para a garantia da qualidade das
informações e de seu suporte, sigilo, acesso, segurança das informações e de seu suporte
e conservação.
O manual não prescreve técnicas ou métodos e sim diretrizes para uma eficiente
gestão das informações nas instituições de saúde. Desta forma, complementam-se a
estas diretrizes, as técnicas e métodos da Arquivologia, elevando a gestão do prontuário
a um nível de excelência, na qual o sistema de saúde muito necessita e demanda
(MORAES, 2018).
3 A ARQUIVOLOGIA E A SAÚDE
Toda problemática envolvendo os ativos informacionais em saúde,
principalmente no que tange às informações registradas, vai de encontro com os
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princípios, métodos e técnicas da Arquivologia, pois ela é a área do conhecimento que
estuda as funções dos arquivos e os princípios e cnicas a serem observados na
produção, organização, guarda, preservação e utilização dos documentos arquivísticos.
O documento arquivístico é uma unidade de registro de informações,
independente do suporte, produzido e acumulado no contexto organizacional humano.
Sendo assim, o sistema e suas unidades de saúde produzem e consomem documentos
arquivísticos, que os fazem funcionar, provam suas atividades, permitem a avaliação de
seus resultados e possibilitam a geração de conhecimento nas ciências da saúde e áreas
relacionadas.
A Arquivologia apresenta soluções para o gerenciamento dos documentos
arquivísticos em saúde, sejam eles assistenciais ou administrativos. Soluções que
produzirão a melhor gestão do acesso, do trâmite, do arquivamento, da temporalidade,
da preservação e consequentemente a confidencialidade das informações senveis e a
privacidade das pessoas.
A gestão de documentos arquivísticos é uma metodologia que pretende geri-los
em todo seu ciclo vital, da produção à destinação final. Entretanto a gestão de
documentos em organizações de saúde precisa levar em consideração as especificidades
operacionais e consequentemente as especificidades documentais ou de seus tipos
documentais.
As atividades em saúde apresentam uma organização operacional que podem
configurar-se em linhas de cuidados (processos transversais, que inclui todas as
instâncias no cuidado do paciente), protocolos clínicos (padronização de condutas
clínicas), políticas, programas, projetos, entre outros, que produzem, além do prontuário
do paciente, uma vasta variedade de tipologias documentais, analógicos e/ou digitais.
Os Sistemas Informatizados para a Gestão Arquivísticas de Documentos SIGAD
são valiosas ferramentas para a árdua tarefa de dar acesso seguro aos documentos
digitais ou analógicos de qualquer instituição, principalmente para as complexas
instituições de saúde. O Conselho Nacional de Arquivos - CONARQ, através da Câmara
Técnica de Documentos Eletrônicos - CTDE, elaborou um modelo de requisitos para os
SIGADs, o e-ARQ Brasil,
Estes requisitos abrangem todas as atividades e procedimentos da gestão
arquivística de documentos, como produção, tramitação, uso, arquivamento e destinação
final dos documentos. Tais requisitos devem ser seguidos na produção de qualquer
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SIGAD, caso se queira gerir documentos arquivísticos digitais e analógicos em nível de
excelência, como demandam as instituições de saúde,
Na sequência do uso de um SIGAD, que respeite os parâmetros do e-ARQ Brasil,
as instituições de saúde, para garantirem de forma segura, confidencialidade,
autenticidade, preservação e acesso aos seus documentos digitais de longa guarda e
guarda permanente, podem utilizar sistemas e estruturas que respeitem o RDC-ARq.
O RDC-Arq é um conjunto de padrões para implementação de repositórios
arquivísticos digitais confiáveis. Pretende ser uma solução para subsidiar o
gerenciamento de materiais digitais, por tempo indeterminado, garantindo sua
autenticidade, preservação e acesso de longo prazo. Segundo CONARQ (2015, p. 15), um
repositório digital é:
[...] um ambiente de armazenamento e gerenciamento de materiais digitais.
Esse ambiente constitui-se de uma solução informatizada em que os materiais
são capturados, armazenados, preservados e acessados. Um repositório digital
é, então, um complexo que apoia o gerenciamento dos materiais digitais, pelo
tempo que for necessário, e é formado por elementos de hardware, software e
metadados, bem como por uma infraestrutura organizacional e procedimentos
normativos e técnicos. Tal ambiente tem sido empregado em diversas
situações, tais como: arquivo corrente e intermediário (em associação com um
SIGAD); arquivo permanente; biblioteca digital; acervo de obras de arte digitais;
depósito legal de material digital; e curadoria de dados digitais de pesquisa.
O RDC-Arq pretende preservar os documentos arquivísticos digitais no longo
prazo, mantendo a sua autenticidade. Na medida em que os formatos de arquivo
tornam-se obsoletos, o RDC-Arq executa conversões e migrações para novos formatos
de acordo com a política de preservação definida para a instituição, para garantir que o
acesso aos documentos se mantenha ao longo do tempo. A preservação por intermédio
do RDC-Arq admite diversos formatos de arquivo, sejam documentos textuais, sonoros,
multimídia, iconográficos etc. O que implica que a produção documental digital, nos mais
variados formatos, pode ser preservada nesta plataforma. Além do recolhimento dos
documentos de caráter permanente, podem também ser transferidos para um RDC-Arq
de guarda temporária, os documentos correntes e intermediários.
A combinação do SIGAD com o RDC-Arq são indicados para os documentos
administrativos e prontuários digitalizados. No caso dos prontuários nato digitais, a
solução é o uso do RDC-Arq na fase onde as informações registradas necessitam de
guarda de longo prazo.
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4 CONCLUSÃO
A qualidade, segurança e confidencialidade de informações e documentos são
imprescindíveis para gerir a saúde do ponto de vista clínico e administrativo.
Informações e documentos são seus ativos mais preciosos, depois do conhecimento
científico gerado e apropriado da e para a saúde. As informações e documentos gerados
pela assistência ao paciente são caracterizados como sensíveis, na medida em que
revelam e expõem uma das mais íntimas e frágeis facetas da vida humana, a saúde.
A urgência e importância de gerir suas informações e documentos fizeram com
que o sistema de saúde no Brasil e obviamente no mundo, empreendesse iniciativas para
garantir a qualidade, a segurança e a confidencialidade. Questões tão caras ao sistema,
de vários pontos de vista, assistencial, jurídico, ético e administrativo. Esta
suscetibilidade do sistema de saúde e suas instâncias precisam ser mais analisadas e
consideradas para uma maior integração da área com a Arquivologia.
Soluções para o gerenciamento das informações registradas em saúde, que
garantam fundamentalmente o sigilo das informações e a privacidade dos pacientes,
além de garantir autenticidade, segurança, acesso e preservação, precisam advir da
integração das diretrizes do próprio sistema de saúde, integradas às metodologias e
técnicas que a Arquivologia tem para oferecer.
As iniciativas apresentadas neste artigo se concentraram em resoluções de
conselhos de categoria, mas especificamente o de medicina e nas normas de gestão de
qualidade em saúde baseado nos padrões do Manual de Acreditação da Organização
Nacional de Acreditação. Ao discorrer sobre os requisitos foi possível concluir que
muitos se aproximam dos procedimentos de gerenciamento de produção, uso e
preservação da gestão de documentos arquivísticos.
Por outro lado, no que tange aos requisitos de sistemas de prontuário eletrônico,
preconizados pelo sistema de saúde, advindos da parceria CFM/SBIS seria necessário
que houvesse ajustes e integração aos requisitos para o SIGAD e RDC-Arq. Integração
que garanta ao mesmo tempo, a autenticidade e acesso dos documentos arquivísticos
em saúde de longo prazo de guarda e o atendimento às especificidades de produção e
consumo de informações e documentos na saúde.
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