P
INFORMAÇÃO
EM PAUTA
Informação em Pauta
IP
Inf. Pauta
ISSN 2525-3468
Fortaleza
n. especial
p. 1-191
novembro 2019
Ficha Catalográfica
Informação em Pauta : IP / Universidade Federal do Ceará, Departamento de
Ciências da Informação, Programa de Pós-Graduação em Ciência da
Informação. - v. 4, n. especial (novembro 2019)-- Fortaleza : UFC, 2019 - .
v. : il. ; 27 cm.
Semestral.
Descrição baseada em: v. 2, n. 1 (jan./jun. 2017).
Disponível no Portal de Periódicos da UFC em:
<http://www.periodicos.ufc.br/index.php/informacaoempauta/index>
1. Biblioteconomia Periódicos. 2. Ciência da Informação Periódicos. I.
Universidade Federal do Ceará. Departamento de Ciências da Informação. II.
Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação.
CDD 020.5
Expediente volume 4, número especial (novembro 2019)
Reitor
José Cândido Lustosa Bittencourt de Albuquerque
Vice-reitor
José Glauco Lobo Filho
Editora
Maria Giovanna Guedes Farias, Universidade Federal do Ceará, Brasil
Editores do Número Especial
Izabel França de Lima, Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Henry Poncio Cruz de Oliveira, Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Fabiana da Silva França, Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Comitê de Política Editorial
Gabriela Belmont Farias, Universidade Federal do Ceará, Brasil
Lídia Eugenia Cavalcante, Universidade Federal do Ceará, Brasil
Luiz Tadeu Feitosa, Universidade Federal do Ceará, Brasil
Virginia Bentes Pinto, Universidade Federal do Ceará, Brasil
Corpo Editorial
Aida Varela Varela, Universidade Federal da Bahia, Brasil
Ariel Antonio Morán Reyes, Universidad Nacional Autónoma de México, México
Carlos Alberto Ávila Araújo, Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil
Cibele Araújo Camargo Marques dos Santos, Universidade de São Paulo
Fabrício Silva Assumpção, Universidade Federal do Paraná, Brasil
Fernando César Lima Leite, Universidade de Brasília
Hamilton Rodrigues Tabosa, Universidade Federal do Ceará, Brasil
Heliomar Cavati Sobrinho, Universidade Federal do Ceará, Brasil
Isidoro Gil Leiva, Universidad de Murcia, Espanha
Januário Albino Nhacuongue, Universidade Federal de São Carlos
Jefferson Veras Nunes, Universidade Federal do Ceará, Brasil
Jonathas Luiz Carvalho Silva, Universidade Federal do Cariri, Brasil
Jorge Caldera-Serrano, Universidad de Extremadura, Espanha
José Eduardo Santarém Segundo, Universidade de São Paulo, Brasil
Luciane Paula Vital, Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
Luís Fernando Sayão, Comissão Nacional de Energia Nuclear, Brasil
Marco Antonio de Almeida, Universidade de São Paulo, Brasil
Maria Cleide Rodrigues Bernardino, Universidade Federal do Cariri, Brasil
Maria das Graças Targino, Universidade Federal do Piauí/Universidade Federal da Paraíba,
Brasil
Maria de Fátima Oliveira Costa, Universidade Federal do Ceará, Brasil
Maria Nelida Gonzalez de Gomez, Universidade Federal Fluminense, Brasil
Miguel Angel Mardero Arellano, Ibict, Brasil
Miquel Termens Graells, Universitat de Barcelona, Espanha
Osvaldo de Souza, Universidade Federal do Ceará Departamento de Ciências da Informação
Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, Brasil
Peter Ingwersen, University of Copenhagen, Dinamarca
Rafael Capurro, Universidade de Stuttgart, Alemanha
Raimundo Nonato Macedo dos Santos, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil
Tomàs Baiget, El Profesional de la Información, Espanha
Vera Dodebei, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Brasil
Virgínia Alves, Universidade Federal de Alagoas, Brasil
Assistente Editorial
Juliana Soares Lima
Revisão e edição de texto
Francisco Edvander Pires Santos
Cynthia Chaves de Carvalho Gomes Cardoso
Normalização
Francisco Edvander Pires Santos
Coordenação de Suporte Técnico
Osvaldo de Souza
Capa
Conceito e criação: Editora UFPB
Copyright
© 2019 Informação em Pauta
ISSN 2525-3468
Universidade Federal do Ceará
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Informação em Pauta
Informação em Pauta (IP) é uma revista multidisciplinar da área de Ciências Sociais Aplicadas, tendo como
campos prioritários a Ciência da Informação, Biblioteconomia, Arquivologia e áreas afins. É uma publicação de
acesso aberto, e sua periodicidade é semestral. A revista é ligada ao Departamento de Ciências da Informação e
ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal do Ceará
(DECINF/PPGCI/UFC), em formato exclusivamente eletrônico. A revista publica pesquisas originais e com
elevado mérito científico, contribuições inéditas em português, inglês e espanhol, visando contribuir para o
desenvolvimento de novos conhecimentos entre pesquisadores, docentes, discentes e profissionais em Ciência
da Informação, Biblioteconomia, Arquivologia e áreas afins, desde que aprovados em revisão cega por pares
(Double Blind Peer Review) e pelo Comitê Editorial. A Informação em Pauta exige originalidade dos artigos
submetidos e que pelo menos um dos autores tenha titulação de Mestre ou de Doutor.
Editora
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Doutora em Ciência da Informação
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Telefone: (85) 3366-7700
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Acesso online
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Editorial .............................................................................................................................................................
Artigos
Hipertrofia da informação sob a ótica dos conceitos de verdade e pós-verdade ..............
Denise Braga Sampaio; Henry Poncio Cruz de Oliveira; Maria da Luz Olegário
Intersecções entre memória e feminismo ...........................................................................................
Anna Raquel de Lemos Viana; Maria Nilza Barbosa Rosa; Izabel de França Lima
Mineração de dados no contexto dos pregões eletrônicos ..........................................................
Hugo Medeiros Souto; Eduardo Martins de Arruda; Wagner Junqueira de Araújo
Arquitetura da informação pervasiva: contribuições para os ambientes virtuais de
aprendizagem ..................................................................................................................................................
Henry Poncio Cruz de Oliveira; isa Mendes Fernandes de Souza
Usabilidade dos websites dos repositórios institucionais dos IFES do Brasil nos
dispositivos móveis: o contexto das cibercidades ...........................................................................
Ronnie Anderson Nascimento de Farias; Júlio Afonso de Pinho Neto; Izabel França
de Lima
Contribuições da Rede Cariniana para a preservação digital nos repositórios digitais
institucionais: o caso da UFRN .................................................................................................................
Mayane Paulino de Brito e Silva; Rafaela Karoline Galdencio De Moura; Sandra de
Albuquerque Siebra; Virgínia Bentes Pinto
Repositórios digitais como espaços de memória e disseminação de informação .............
Isledna Rodrigues de Almeida; Bernardina Maria J. F. de Oliveira; Maria Nilza
Barbosa Rosa
Teletrabalho (Telework): uma prospecção para a editora universitária da UFPB ...........
Sâmella Arruda Araújo; José Washington de Morais Medeiros; Fabiana da Silva
França; Geisa Fabiane F. Cavalcanti
Da exclusão ao acesso à educação: o papel da informação na inclusão da PCD na
universidade ....................................................................................................................................................
Giulianne Monteiro Pereira; Izabel França de Lima
Liderança do educador e empoderamento do educando como instrumentalização no
constructo ético-moral-social sob a ótica freiriana ........................................................................
Eduardo Martins De Arruda; Hugo Medeiros Souto; Wilson Honorato Aragão
SUMÁRIO
7
Caros(as) leitores(as),
Inicialmente, agradecemos, em nome do Grupo de Pesquisa Informação,
Memória, Tecnologias e Sociedade (iMclusoS), o convite da editora da Revista
Informação em Pauta à Profa. Maria Giovanna Guedes Farias para publicar, nesse
número especial, a produção acadêmico-científica dos seus membros e convidados, com
foco nas temáticas que gravitam em torno do escopo de pesquisa do grupo.
O iMclusoS é um grupo de pesquisadores, estudantes e servidores técnico-
administrativos que atua no desenvolvimento de pesquisas científicas interdisciplinares
e interinstitucionais, com foco em questões informacionais discutidas pelo viés da
memória, das tecnologias e da inclusão. Assenta-se na grande área das Ciências Sociais
Aplicadas e tem a Ciência da Informação como área de domínio. Está vinculado ao
Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UFPB (PPGCI/UFPB). Sua
produção acadêmica e científica, na área de Ciência da Informação, abrange artigos
publicados em parceria com pesquisadores de outras instituições nacionais e
estrangeiras, frutos de orientações de graduandos, mestrandos e doutorandos.
Os artigos desse número especial abordam temáticas como Informação e pós-
verdade, memória e feminismo, tecnologias e repositórios digitais, inclusão, educação e
empoderamento.
O fascículo apresenta dez (10) artigos, inicialmente o texto Hipertrofia da
informação sob a ótica dos conceitos de verdade e pós-verdade, dos autores Denise Braga
Sampaio, Henry Poncio Cruz de Oliveira e Maria da Luz Olegário, sobre a discussão da
informação na sociedade pós-moderna e os conceitos de verdade e pós-verdade. Em
seguida, apresenta Intersecções entre memória e feminismo, dos autores Anna Raquel de
Lemos Viana, Maria Nilza Barbosa Rosa e Izabel de França Lima.
Na perspectiva das tecnologias, temos Mineração de dados no contexto dos
pregões eletrônicos, dos autores Hugo Medeiros Souto, Eduardo Martins De Arruda e
Wagner Junqueira de Araújo; Arquitetura da informação pervasiva: contribuições para os
ambientes virtuais de aprendizagem, dos autores Henry Poncio Cruz de Oliveira e Ráisa
Inf. Pauta
Fortaleza, CE
v. 4
n. especial
nov. 2019
ISSN 2525-3468
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-3468.ip.v4iEspecial.2019.42590.7-8
EDITORIAL
8
Mendes Fernandes de Souza; Usabilidade dos websites dos repositórios institucionais dos
IFES do Brasil nos dispositivos móveis: o contexto das cibercidades, dos autores Ronnie
Anderson Nascimento de Farias, Júlio Afonso De Pinho Neto e Izabel França de Lima;
Contribuições da Rede Cariniana para a preservação digital nos repositórios digitais
institucionais: o caso da UFRN, com autoria de Mayane Paulino de Brito e Silva, Rafaela
Karoline Galdencio de Moura, Sandra de Albuquerque Siebra e Virgínia Bentes Pinto;
Repositórios digitais como espaços de memória e disseminação de informação, autoras
Isledna Rodrigues de Almeida, Bernardina Maria J. F. de Oliveira e Maria Nilza Barbosa
Rosa. Para finalizar a temática, temos Teletrabalho (Telework): uma prospecção para a
Editora Universitária da UFPB, dos autores Sâmella Arruda Araújo, Jose Washington de
Morais Medeiros, Fabiana da Silva França e Geisa Fabiane Ferreira Cavalcante.
Para concluir, trazemos a temática inclusão, liderança e empoderamento, com os
artigos Da exclusão ao acesso à educação: o papel da informação na inclusão da PcD na
universidade, com autoria de Giulianne Monteiro Pereira e Izabel França de Lima, e o
artigo Liderança do educador e empoderamento do educando como instrumentalização no
constructo ético-moral-social sob a ótica freiriana, dos autores Eduardo Martins de
Arruda, Hugo Medeiros Souto e Wilson Honorato Aragão.
Desse modo, nos temas aqui apresentados os autores buscam evidenciar as
diversas abordagens teóricas e metodologias que permeiam as pesquisas desenvolvidas
no iMclusoS e instituições parceiras.
Desejamos que façam bom proveito desta edição.
João Pessoa, 1 de novembro de 2019
Izabel França de Lima
Henry Poncio Cruz de Oliveira
Fabiana da Silva França
HIPERTROFIA DA INFORMAÇÃO SOB A ÓTICA DOS CONCEITOS DE VERDADE E PÓS-
VERDADE
HYPERTROPHIC INFORMATION UNDER THE VIEW OF TRUTH AND POST-TRUTH
CONCEPTS
Denise Braga Sampaio¹
Henry Poncio Cruz de Oliveira
2
Maria da Luz Olegário
3
¹ Doutoranda em Ciência da Informação
(PPGCI/UFPB), Professora do Departamento de
Ciência da Informação da UFBA.
E-mail: denisebs23@gmail.com
2
Doutor em Ciência da Informação pela UNESP-
Marília, Professor do PPGCI/UFPB
E-mail: henry.poncio@gmail.com
3
Doutora em Educação pela UFPB, Professora do
PPGOA/UFPB
E-mail: daluzprof@gmail.com
ACESSO ABERTO
Copyright: Esta obra está licenciada com uma
Licença Creative Commons Atribuição 4.0
Internacional.
Conflito de interesses: Os autores declaram
que não há conflito de interesses.
Financiamento: Não há.
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neste artigo.
Recebido em: 20/09/2019.
Revisado em: 01/10/2019.
Aceito em: 10/10/2019.
Como citar este artigo:
SAMPAIO, Denise Braga; OLIVEIRA, Henry
Poncio Cruz de; OLEGÁRIO, Maria da Luz.
Hipertrofia da informação sob a ótica dos
conceitos de verdade e pós-verdade.
Informação em Pauta, Fortaleza, v. 4, n.
especial, p. 9-30, nov. 2019. DOI:
https://doi.org/10.32810/2525-
3468.ip.v4iEspecial.2019.42597.9-30.
RESUMO
Desvela as relações existentes entre verdade,
pós-verdade e informação na perspectiva de
conceituar a hipertrofia da informação na
Ciência da Informação. Utiliza como aporte
metodológico a pesquisa exploratória,
bibliográfica e a análise conceitual de Walker e
Avant, como forma de responder às questões: o
que é hipertrofia da informação? Quais são suas
características e implicações em uma sociedade
dita informacional? Ampara-se nos seguintes
objetivos: criar um conceito, para a Ciência da
Informação, de hipertrofia da informação, e
analisar seu relacionamento com a verdade e a
pós-verdade. A análise mostra que a hipertrofia
da informação está intimamente ligada com a
pós-verdade e a constituição de fake news, ao
que se notaram em páginas verificadoras de
fatos (fact-cheking) classificações que se
tangenciam com o conceito, comprovando sua
congruência com o tema.
Palavras-chave: Pós-verdade. Informação. Fake
News. Hipertrofia da informação.
ABSTRACT
It reflects about the relationships between truth,
post-truth and information into the perspective
of conceptualizing information hypertrophy in
Information Science. It uses as methodology the
exploratory, bibliographical research and the
conceptual analysis of Walker and Avant, to
answer the questions: what is information
hypertrophy? What are its characteristics and
Inf. Pauta
Fortaleza, CE
v. 4
n. especial
nov. 2019
ISSN 2525-3468
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-3468.ip.v4iEspecial.2019.42597.9-30
ARTIGO
10
Sampaio; Oliveira; Olegário | Hipertrofia da informação
Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
implications in a so-called informational society?
It is supported by the following objectives: to
create a concept, for Information Science, of
hypertrophic information, and to analyze its
relationship with truth and post-truth. The
analysis shows that information hypertrophy is
closely linked with post-truth and fake news
constitution, as noted in fact-checking pages
some classifications that tangent with the
concept, proving its congruence with the theme.
Keywords: Post-truth. Information. Fake News.
Hypertrophic information.
1 INTRODUÇÃO
A informação perpassa por todo o processo humano que compreende a história,
sobretudo a história registrada. Sua importância é patente desde a quebra do código
nazista, a partir de Alan Turing, até a cura de doenças, pelas descobertas científicas.
Passa também por pequenos eventos, como narrativa de fatos locais, que constituem
memórias individuais e coletivas. A informação é, portanto, não somente “seiva da
ciência” (LE COADIC, 2004), mas de um arranjo biossocial muito maior, pois
compreende a vida humana.
Destacamos, desnudando a temática aqui proposta, que a informação é a
matéria prima da verdade, que pode ser lapidada ao bel prazer do emissor. Por isso,
discussões sobre pós-verdade, fake news e mentira são cada vez mais pertinentes, dado
que a informação pulula, na atual sociedade, da multiplicidade de crenças, fatos e atos.
Ela nasce e se molda, ou, como sugere sua gênese, toma forma. Estar imergido na
Sociedade da Informação é entender a dinâmica existente entre essa matéria prima e os
processos desencadeados a partir da nossa interação com ela.
De posse dessas reflexões e do cenário que se descortina sob a perspectiva da
pós-verdade (DUNKER, et al., 2017), percebemos que a interação entre verdade, opinião
e público pertence a uma lógica contemporânea de consumo desenfreado de
informações das mais diversas fontes, cujo filtro principal é a simplicidade de ‘exposição’
dos fatos, que não lhe assegura a qualidade. As redes sociais tornam-se, invariavelmente,
uma das principais fontes de consulta e exposição de notícias (CASADEI, 2013) e de
pareceres de pessoas não doutas no assunto, ou seja, informações são consumidas e
opiniões emitidas nestes ambientes, como um ciclo retroalimentado. Vale destacar que a
pós-verdade, como ver-se-á de forma mais explícita em sua referida seção, não se trata
de mera mentira, mas se constitui de artifícios diversos para comover pessoas e
mobilizar a opinião pública em prol de determinada ação ou ideologia. A pós-verdade
Sampaio; Oliveira; Olegário | Hipertrofia da informação
11
Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
está constituída tanto dessas mentiras ‘puras’, como de um conjunto de verdades
pensadamente ordenadas para estabelecer uma narrativa desejável. Um desses artifícios
é a própria informação, que, de seiva da verdade, pode tornar-se seiva também da pós-
verdade, em suas mais variadas formas de exposição, comportando-se como uma
infotoxina (PHILLIPS, 1996). Essa infotoxina pode gerar a hipertrofia da informação,
objeto de estudo deste trabalho.
Segundo o dicionário de etimologia chileno (RODRIGUEZ, 20--), ‘hipertrofia’ é
uma palavra cuja origem se deu no seio da medicina francesa, em 1819, resultado dos
componentes léxicos gregos υπερ (hypér), que significa “acima do normal”, “em excesso”
e τροφία (trophía), que se traduz em “alimentação”, “nutrição”. Literalmente, uma
sobrealimentação ou nutrição em excesso (RODRÍGUEZ, 20--). Na comunicação, a
hipertrofia da informação é citada por alguns autores, como Marques (et al., 2009);
Muniz Sodré (BARRETO, 2012); Künsch (2006); Almeida (2010); Ferrari (2005), no
entanto, na área de Ciência da Informação o tema é, ainda, pouco discutido. O que seria
essa hipertrofia da informação? Quais são suas características e implicações em uma
sociedade dita informacional? Diante destas questões, objetivamos, portanto, criar um
conceito, para a Ciência da Informação, sobre esta hipertrofia, extensivamente, analisar
seu relacionamento com a verdade e a pós-verdade.
2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A pesquisa, sob o ponto de vista de seus objetivos, se caracteriza como
exploratória, dado que o produto gerado é a conceituação do termo ‘hipertrofia da
informação’, cuja variação é ‘informação hipertrófica’. Segundo Prodanov e Freitas
(2013, p. 51), a pesquisa exploratória trata de investigação em “[...] fase preliminar, [e
tem] como finalidade proporcionar mais informações sobre o assunto [...] possibilitando
sua definição e delineamento [...]. Assume, em geral, as formas de pesquisa bibliográfica
e estudo de caso”. Segundo Gil (2008, p. 27).
As pesquisas exploratórias têm como principal finalidade desenvolver,
esclarecer e modificar conceito e ideias [...] são desenvolvidas com o objetivo de
proporcionar visão geral, de tipo aproximativo, acerca de determinado fato.
Este tipo de pesquisa é realizado especialmente quando o tema escolhido é
pouco explorado [...]
12
Sampaio; Oliveira; Olegário | Hipertrofia da informação
Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
A conceituação do termo, dentro da Ciência da Informação (CI), faz-se necessária,
primeiramente, por se tratar de uma anomalia do objeto de estudo da área, mas também
por compor um processo hodierno de manipulação das informações (e notícias), em
uma sociedade pautada na pós-verdade advinda de interações ciberativistas e
passionais. Para melhor apreender este contexto, o estudo se valeu,
complementarmente, de levantamento bibliográfico a respeito das interações entre
verdade, pós-verdade e informação em livros, sobretudo da área de filosofia, e artigos da
área de comunicação e CI (especialmente no Portal de Periódicos da Capes), com uso dos
termos ‘verdade’, ‘pós-verdade’, fake news’, fact-chekinge “hipertrofia da informação”
(com aspas duplas). Esta última palavra não obteve nenhum resultado na plataforma, no
entanto, ao se buscar pelo termo no Google, obtiveram-se 26 resultados, todos, apenas
citando o termo, mas não o conceituando.
Como o objetivo central é a criação de um conceito, na Ciência da Informação,
para a hipertrofia da informação, utiliza-se neste estudo a análise conceitual,
entendendo que
Um conceito é uma ideia ou construção mental elaborada acerca de um
fenômeno. o termos referentes aos fenômenos que ocorrem na natureza ou
no pensamento. São representações cognitivas, abstratas, de uma realidade
perceptível formada por experiências diretas ou indiretas. Os conceitos podem
ser empíricos ou concretos (observados pelos sentidos) ou abstratos (não
observáveis). Sua função primária é permitir que indivíduos possam descrever
situações e se comunicar efetivamente (FERNANDES et al., 2011, p. 1151).
A análise conceitual, na perspectiva de Walker e Avant (apud FERNANDES,
2011), obedece a oito passos que ajudam a entender melhor dado conceito. São eles:
Quadro 1 - Passos da Análise Conceitual e aplicação
Passos
Conceitos dos passos
Passos da pesquisa segundo
método
(1) seleção do conceito
deve refletir o tópico ou a área de maior
interesse, sendo recomendável a escolha
de um conceito que esteja ligado à área
de experiência profissional (prática,
pesquisa, ensino, administração) e que
tenha despertado atenção e preocupação
na pessoa.
Hipertrofia da informação
(2) determinação dos
objetivos da análise
conceitual
finalidade da análise conceitual que se
pretende realizar
Conceituar hipertrofia da
Informação na CI
(3) identificação dos
possíveis usos do
conceito
busca na literatura para se ter uma ideia
de como o conceito em questão está
sendo enfocado ou aplicado
Buscas exploratórias nos campos
de Comunicação e Ciência da
Informação
(4) determinação dos
atributos críticos ou
se identificam palavras ou expressões
que aparecem repetidamente na
Será apresentado na
apresentação e discussão dos
Sampaio; Oliveira; Olegário | Hipertrofia da informação
13
Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
Passos
Conceitos dos passos
Passos da pesquisa segundo
método
essenciais
literatura, que mostram a essência do
conceito.
Esses atributos constituem
características que expressam o
conceito, as quais atuam como elementos
para diagnósticos diferenciais, isto é,
para discriminar o que é uma expressão
do conceito daquilo que não é. Nos casos
em que o conceito é muito abstrato, os
seus atributos, geralmente, têm também
alto grau de abstração.
resultados
(5) construção de um
caso modelo
elaboração de um exemplo, baseado na
vida real, do uso do conceito, que inclua
seus
atributos essenciais.
Será visto na apresentação e
discussão dos resultados
(6) desenvolvimento
de outros casos
limítrofes, relacionados, contrários
inventados e ilegítimos. Servem para
auxiliar na decisão quanto aos atributos
essenciais do conceito. Entre esses casos,
chamamos atenção para dois deles que,
no nosso entendimento, melhor
cumprem a meta ora exposta: o caso
contrário e o caso limítrofe. O caso
contrário provê exemplo do “não
conceito”. o caso limítrofe, constitui
aquele evento ou instância que contém
alguns dos atributos essenciais do
conceito sob análise, mas não todos eles.
Será visto na apresentação e
discussão dos resultados
(7) Identificação de
antecedentes e
consequências do
conceito
levantamento de incidentes ou eventos
que acontecem a priori ao fenômeno
(necessários para a sua ocorrência) e a
posteriori (eventos ou situações que
surgem ou resultam da presença do
fenômeno).
Desenvolvido no referencial
teórico do trabalho
(8) Definição de
referências empíricas
para os atributos
essenciais
referentes empíricos são categorias ou
classes de fenômenos observáveis que,
quando presentes, demonstram a
ocorrência do conceito, possibilitando,
assim, sua definição operacional. Em
muitos casos, os atributos são idênticos
às referências empíricas. Quando os
conceitos são abstratos (autoestima,
tristeza), seus indicadores empíricos não
são diretamente observáveis, dependem
de medidas indiretas.
-
Fonte: baseado em FERNANDES (2011).
Para melhor entender o conceito de hipertrofia da informação em uma sociedade
pós-verdadeira, é necessário que se revisite a filosofia clássica e a moderna, em suas
discussões sobre verdade, mentira e o contemporâneo entendimento de pós-verdade,
advindo do campo político e de comunicação.
14
Sampaio; Oliveira; Olegário | Hipertrofia da informação
Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
3 PERCEPÇÕES FILOSÓFICAS E POLÍTICAS SOBRE O CONCEITO DE VERDADE,
MENTIRA E PÓS VERDADE
Falar sobre verdade é fazer um exercício filosófico. Tal termo passou, ao longo do
tempo, por diferentes conceituações, teorias e divisões. Um esboço da concepção de
verdade pode ser visto em Platão, no mito da caverna (COSTA, 2010), em que a verdade
se descortina na liberdade, com o romper dos grilhões e afastamento do mundo visto
pelas sombras, para o mundo visto na perspectiva da luz. Essa iluminação é contemplada
no mundo das ideias, mundo este onde os vícios e os subterfúgios não poderiam ofuscar
os sentidos, com a expressão plena dos objetos como se apresentam. Para Platão, é na
ideia que se desvela a verdade. Ela é a própria luz. Estar iluminado, portanto, não é a
mais fácil das tarefas. Por esse motivo, aquele que conseguiu desbravar o que havia além
da caverna, na tentativa de mostrar o que vira a seus companheiros, acaba
desacreditado e ameaçada é a sua vida. Isso ocorre porque a verdade que se revela pelos
olhos de outrem torna-se uma ruptura inaceitável àquilo que antes era a expressão mais
plena do mundo, um mundo visto pelos olhos treinados para enxergar somente
sombras.
A visão platônica abriu horizontes para entender a verdade de forma metafísica,
transcendendo a experiência sensível, por meio da racionalização. dois mundos
separados no pensamento de Platão: o mundo das aparências, ligado a todos os enganos
provenientes da ordem da sensibilidade, e o mundo das Ideias, ligado à ordem da
verdade. Em suma, a ordem da sensibilidade diz respeito às experiências singulares dos
mais diversos indivíduos que se voltam para a realidade sempre em conformidade com
suas paixões ou interesses, como ocorre atualmente, com o que chamaremos de pós-
verdade (SALZTRAGER; LOURENÇO, 2017). Essa forma de pensar a verdade foi base
para o conceito de Heidegger, que associa a verdade com a liberdade.
A tarefa desse homem liberto [o que sai da caverna] não é fácil, pois ele se
encontra no risco de perder-se no interior da caverna pelo simples motivo de
ser atraído, puxado pela verdade que vige e serve de medida para todos.
Outro risco corre ainda ele, que é aquele relacionado à revolta dos que
acreditam que o que serve de medida no interior da caverna é o que aparece
para eles como o mais desvelado, de modo que o homem liberto ‘está ameaçado
pela possibilidade de ser morto’ (COSTA, 2010, p. 217).
Ou seja, essa liberdade é ameaçada não somente pelo outro, mas pela própria
fragilidade do ser humano frente àquilo que lhe é natural, que lhe é comum, habitual. Há,
Sampaio; Oliveira; Olegário | Hipertrofia da informação
15
Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
então, uma relação constante entre velar e desvelar, entre trevas e luz, entre o já
conhecido e o novo que se desnuda nessa luz. O ser humano, quando confrontado com o
novo, tende a recusá-lo em um primeiro momento, para então aceitá-lo. A esse
respeito, na perspectiva do universo ideal de Platão, é pertinente a assertiva de Bauman
(2012, p. 8), de que “é da natureza das ideias que elas nasçam como heresias
perturbadoras e morram como ortodoxias aborrecidas”. A ideia de que fala Bauman não
é perfeita, idealizada e eterna, como em Platão, mas descontínua. Ela é própria de uma
sociedade que imerge na liquidez. No entanto, a resistência ao novo é tanto presente
para os que estavam presos na caverna mitológica de Platão porque o novo, ou a
verdade revelada, neste caso, pode ser assustador, quebrando modelos, rompendo com
costumes até então consagrados como em nossa contemporaneidade.
Para filósofos como Foucault e Benjamim, a verdade é contextual. Foucault
entende a verdade como relacionada aos jogos de poder, sobretudo às narrativas das
histórias oficiais, enquanto Benjamim entende que a verdade é composta por camadas
(SALZTRAGER; LOURENÇO, 2017). No campo das ciências, a verdade está relacionada
àquilo que comprovadamente não pode ser refutado. Tal entendimento vem do princípio
da falseabilidade de Popper (1980). Este princípio versa que uma teoria é incorporada à
ciência na medida em que não é refutada a partir de experimentos verificadores de sua
invalidade. Exemplo disso, a lei da gravidade assevera que orbita sobre a terra uma
força, chamada de gravidade, que puxa os corpos para seu centro e, ignorando-se a força
do ar, todo corpo tende a cair, sempre que arremessado ou solto. Este experimento pode
ser verificado em qualquer parte do globo terrestre, conferindo sempre o mesmo
resultado: o encontro do objeto com o chão.
Segundo Descartes (1987), todo o ser humano possui bom senso, que é ter “a
capacidade de bem julgar e distinguir o verdadeiro do falso” (DESCARTES, 1987, p.30).
Ele assevera que o uso da razão faz com que o aluno alcance o conhecimento da verdade,
sem seguir as autoridades escolásticas, por meio da dúvida e do questionamento
(WATANABE; SOARES, 2011). Descartes, a partir de então, passou a distinguir o
verdadeiro do falso considerando como verdadeiro tudo quanto pudesse ser conhecido
de modo claro e distinto, e julgando falso tudo quanto não o pudesse (DESCARTES,
1987). Como é possível determinar esta clareza e esta distinção? O autor apresenta
(DESCARTES apud VILELA; IZIDORO, 2013) algumas ações que podem levar o sujeito à
verdade: (a) dúvida metódica; (b) análise; (c) síntese; (d) revisão.
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Segundo a Teoria da Correspondência, proposta por Tarski (2007), uma
proposição é verdadeira se ela corresponde à realidade, se o que ela afirma de fato é
uma proposição, um juízo ou uma sentença. É verdadeiro se, e somente se, reflete a
realidade. para os adeptos da filosofia da ação, como Nietzsche (ARENDT, 2014), a
verdade tem caráter utilitário, não contemplativo. Deste modo, a verdade, “[...] qualquer
que seja o campo a que pertença, é verdadeira pela sua efetiva utilidade, ou seja, por
ser útil para estender o conhecimento ou para, por meio deste, estender o domínio do
homem sobre a natureza, ou então por ser útil à solidariedade e à ordem do mundo
humano” (ABBAGNANO, 2007, p. 998).
Essas perspectivas desveladas pelos filósofos são um importante caminho para se
pensar não mais em verdade, mas verdades que se descortinam sob diferentes
metodologias, a depender do instituto que as defenda. Por isso, Arendt (2014) denomina
a verdade metafísica de Platão de verdade filosófica, enquanto a verdade científica, para
alcançar tal status, necessita de experimentações, método científico, comprovação e
aceitação por pares para ter validade. No campo da política, esta advém de fatos, e
Arendt (2014) a chama de verdade fatual. A autora entende que, na Modernidade, tal
verdade inexiste, por sua constante ameaça, que a fluidez dos processos e os jogos de
poder inserem sobre ela.
3.1 Verdade, mentira e opinião na Modernidade
O movimento de transição da Tradição para a Modernidade se deu por rupturas
paradigmáticas de inversões de valores e pela crise da autoridade (ARENDT, 2014).
Nietzsche (2007), um dos autores referência para este período e, como afirma Belo
(1994), extemporâneo, entende a verdade, entre outras coisas, como objetivo do
conhecimento e uma forma de ilusão, um valor, produzida pelo intelecto. O intelecto
humano difere mulheres e homens dos demais animais, conferindo-lhes a capacidade de
adaptação às situações, por meio da cognição. “O intelecto é um meio de conservação do
indivíduo, para o manter, para conservar os mais fracos; desenvolve as suas forças
capitais [...]” (BELO,1994, p. 214). Assim, na concepção nietzschiana, é da natureza
humana a dissimulação. Esta serve para conferir aos mais fracos as armas necessárias à
sobrevivência. Vale destacar que a visão de Nietzsche o carrega ideais maniqueístas
que filósofos como Platão e Heidegger defendem, sob uma divisão engessada entre bem
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e mal, certo e errado. Para Nietzsche, o que move um sujeito a falar a verdade não é ela
em si, mas as suas consequências, quando comparadas à mentira. Por existir uma moral
que defende a verdade como sendo melhor aceita que a mentira, opta-se por ela em
favor de suas benesses, não pelo ideal do ‘fazer o bem’ por meio da honestidade e da
verdade.
A perspectiva nietzschiana (BELO, 1994) obedece a três paradigmas, (1) a do
animal que luta pela vida; (2) a do conhecimento e, por fim; (3) a da linguagem. Segundo
Belo (1994), em sua releitura do filósofo alemão, o primeiro paradigma diz respeito ao
uso da dissimulação e da ilusão para garantir a sobrevivência, sendo estas duas ações
precursoras da verdade. Neste sentido, emular, disfarçar-se, criar arapucas para
capturar uma caça, fingir-se de morto, ou fingir-se adequado a determinada situação em
que ser minoria é ameaça são alguns dos subterfúgios utilizados para garantir essa
manutenção da vida. O paradigma do conhecimento pode ser melhor entendido nas
palavras de Camargo (2008, p. 98):
A vontade de verdade é a busca metafísica por um fundamento último para o
conhecimento, é acreditar que através da razão e das construções intelectuais
se atinge uma espécie de verdade primordial. A vontade de engano é a maneira
como Nietzsche enxerga esta vontade de verdade. O filósofo entende a razão e
as demais construções intelectuais como construções históricas e, neste
sentido, suas proposições são chamadas de falsas mas entende que uma
necessidade de se acreditar em tais falsificações como se fossem verdades. Esta
é a ilusão necessária que Nietzsche chama de vontade de engano. A vontade de
verdade, a busca da verdade e a crença nesta verdade decorrem da necessidade
de se acreditar nas construções históricas e culturais, ou seja, decorre da
vontade de engano.
Por fim, o paradigma da linguagem diz respeito à arbitrariedade da palavra. A
linguagem (NIETZSCHE, 2007) possui dois estágios, um individual e anárquico e outro
social, determinado sob estruturas de poder. A palavra, nessa perspectiva, é constituída
de forma normalizante, metafórica em relação ao objeto, hierarquizada e uniforme. “É a
semântica social que traz consigo a lei e a verdade” (BELO, 1994, p. 219). Por esse
motivo, Nietzsche, valendo-se de Kant, acredita que, por meio da palavra, não se pode
chegar à verdade, dado que esta é, substancialmente, a coisa em si. Ora, se a palavra é
temporal, culturalmente construída e espacialmente limitada, a verdade não pode ser
expressa por ela, não como universalizante
i
.
Tais questões evidenciam o caráter dinâmico das sociedades e instituições que a
compõem. Como falar, então, sobre uma ideia de verdade? Para Nietzsche (2007), a
sociedade, em suas formas de poder, obriga os sujeitos a mentir, “[...] o homem mente
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inconscientemente, segundo costumes centenários, costumes de longo tempo [...] [o
sentimento de verdade é o sentimento] de ser obrigado a designar [...] ao que busca a lei”
(BELO, 1994, p. 234) conforme uma convenção consolidada, mentir em rebanho num
estilo a todos obrigatório” (NIETZSCHE, 2007, p. 37).
Diante disso, o autor se pergunta então qual o impulso para a verdade e o que
seria ela. Ele mesmo responde ao afirmar que a verdade é:
Um batalhão móvel de metáforas, metonímias, antropomorfismos, enfim, uma
soma de relações humanas, que foram enfatizadas poética e retoricamente,
transpostas, enfeitadas, e que, após longo uso, parecem a um povo sólidas,
canônicas, e obrigatórias: as verdades são ilusões, das quais se esqueceu que o
são, metáforas que se tornaram gastas e sem força sensível, moedas que
perderam sua efígie e agora entram em consideração como metal, não mais
como moedas (NIETZSCHE, 2007, p. 36-37).
A verdade, então, seria uma ilusão massificante, ligada a uma vontade de
potência, a um impulso. A vontade de potência é a necessidade da vida de exercer ações
para emancipar-se, uma dessas ações pode ser a dominação do outro. Ser verdadeiro,
honesto, é, então, uma forma de colocar-se em posição superior em relação àquele que
mente, dado que o honesto não precisa mentir para sobreviver, e a moral (socialmente
construída e aceita) o coloca nessa posição de superioridade.
[...] em trabalhos posteriores, o autor [...] investiga a ligação da verdade com o
medo, ou seja, com a necessidade de manter uma realidade, um ‘mundo
verdadeiro’, por trás da aparência. A vontade de verdade seria, então, a busca
incessante pela calma e segurança de uma estrutura fixa de ‘realidade’ para se
opor ao mundo impossível de se perceber corretamente - seria uma maneira de
viver quando já não se tem vontade de potência, a coragem para encarar o
mundo de frente, com todas as suas dúvidas e desafios (SIQUEIRA, 2014, não
paginado).
Vale destacar, ainda sobre Nietzsche (2007), que o autor categoriza a verdade sob
três tipos: as verdades agradáveis, (conservadoras da vida e desejadas pelo homem); as
verdades puras ou sem consequências (que pode ser entendidas como conhecimento) e
as verdades prejudiciais, ou destruidoras. Neste ponto, fica evidente o caráter funcional
que se atribui à verdade. As verdades destruidoras, aquelas que causam rupturas
dolorosas às estruturas de poder, são, invariavelmente, invisibilizadas ou aniquiladas,
enquanto as demais são estimuladas a aparecer para manter a ordem estabelecida, dado
que a verdade só pode valer enquanto atendente às convenções que a sustentam e à lei.
Arendt (2014) faz duras críticas à visão utilitarista de Nietzsche. A autora
defende que a verdade existe, mas passa por uma crise atrelada à crise da autoridade. A
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ascensão da política burguesa na sociedade, a crise na educação e a massificação da
opinião pública abalam as estruturas de verdade, fazendo valer a forma em desfavor do
conteúdo. Para Arendt (2014), a relativizações da verdade, transformação da verdade
fatual em opinião e da opinião em fato, bem como a desqualificação de autoridades, são
as principais fontes de destruição da verdade na Modernidade em que viveu a autora e
hodiernamente.
A verdade fatual (ARENDT, 2014), residente no campo da política, não como sua
coparticipe, mas como uma inquilina indesejada e escondida que, quando aparece, é
desmoralizada, se inoportuna. Isso ocorre com grande força na modernidade, em que a
mentira se institucionaliza na política e toma proporções e status de organizada
(ARENDT, 2014). A mentira organizada reside na ação, assim como tudo que diz respeito
à política, e tem por objetivo mudar uma realidade ao bel prazer do seu portador. O
perigo da mentira está, entre outras coisas, na construção de narrativas históricas
enviesadas.
3.2 Pós-verdade
O termo ‘pós-verdade’ (em inglês, post-truth) ganhou destaque em 2016, sendo
apontado como a palavra do ano pelo Dicionário Oxford, graças às eleições americanas
do referido período, ocasião em que se elegeu presidente o empresário Donald Trump. O
termo é apontado, pelo Oxford, como “a circunstância em que fatos objetivos têm menos
influência na formação de opinião pública do que os apelos emocionais e as opiniões
pessoais” (BOLER; DAVIS, 2018, p. 75). A pós-verdade é a efetivação e ampliação do que
destacara Hanna Arendt (2014) sobre a crise da verdade. Os fatos são preteridos pelo
sentimento desperto ou pelo desejo de despertar sentimentos nos interlocutores.
Acerca disso, Christian Dunker et al. (2017, p. 17) elencam em ‘Ética e pós-
verdade’:
O relativismo cultural da verdade foi subitamente invertido pelo real da guerra
ao terror. A tolerância religiosa inverte-se na perseguição aos mulçumanos [...]
em 2011, a verdade das armas químicas que justificavam o ataque ao Iraque
mostrou-se uma ficção. O fato de que presidentes e agências de Estado
pratiquem mentiras técnicas como essa, retóricas [...], jurídicas (como a
corrupção dentro da lei), apenas replica a maquiagem de balanços (que estava
por trás das bolhas imobiliárias de 2008) e o cinismo como discurso básico do
espaço público e da vida laboral.
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A autoridade do Estado e seu status de portador da verdade são postos em xeque
pela descoberta da população a respeito destes e de outros pontos de influência das
narrativas oficiais, como forma de comoção da opinião pública para que esta apoie
determinadas ações importantes política e economicamente para os EUA, mas que, de
forma ‘crua’, não seriam aceitas pelo povo. Era necessário gerar empatia pela causa e
antipatia pelo que se punha como empecilho. Apesar de o termo ter sido posto em
destaque recentemente, tal prática é antiga, sobretudo ao rememorarmos a
historiografia, permeada por maniqueísmos e construção dos heróis e dos vilões (LE
GOFF, 1990) como forma de inspiração do orgulho nacional.
Atualmente, a pós-verdade ganhou força com a popularização das redes sociais. A
troca de informações, constituição de diálogos em tempo real, de forma incorpórea, e a
possibilidade de replicação exponencial são um forte motor da pós-verdade. Nesse
sentido, as eleições americanas de 2016 geram, até hoje, debates acalorados, uma vez
que investigações apontam o uso de robôs artificialmente inteligentes, desenvolvidos na
Rússia, que replicavam desinformação nas redes sociais como forma de gerar emoção e
comoção na opinião pública americana (BOLER; DAVIS, 2018). A proliferação de
desinformação gerou um ambiente de insegurança e descrédito das mídias (BOLER;
DAVIS 2018). O que fora verdade em dado momento, ou vendido como tal, em outro
momento passa a não mais valer. Como afirma Dunker (2017, p. 19), “a pós-verdade é
antes de tudo uma verdade contextual, que não pode ser escrita, posta no bolso e
reapresentada amanhã, como garantia de fidelidade, compromisso ou esperança gerada
pela palavra”.
No contexto da pós-verdade, o discurso atua como elemento principal das
narrativas em detrimento do que se enuncia. O ‘como’ deve ser atraente, independente
de o ‘quê’ se diz, surge assim uma espécie de avaliação permanente da retórica
empregada, que induz e valoriza declarações impactantes e menosprezo por autoridades
ou especialistas que possam desmenti-la” (DUNKER, 2017, p. 24). Nesse sentido, a
estética é mais importante do que o conteúdo. Este contexto tornou-se propício à
proliferação das fake news. Ora, se uma crise nas instituições ‘detentoras’ da verdade,
então todos tanto podem buscar como produzir suas próprias verdades. O discurso pós-
verdadeiro, para ecoar tais ‘verdades’, se vale de três traços, destacados por Dunker
(2017): a recusa do outro, uma retórica icônica e, por fim, a vida em formato de
demanda. Resumidamente, discursos de invisibilização ou recusa do outro são
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produzidos e reproduzidos com apelo imagético e linguístico (vídeos, sons, memes,
textos curtos) em pacotes de informação rapidamente consumíveis e, geralmente,
ambíguos.
A necessidade da velocidade de consumo das informações faz padecer outra
necessidade, a da qualidade da informação. Nesse sentido, as anomalias informacionais,
como em um processo de metástase, dominam as infovias e multiplicam-se como
desinformação qualificada por sua forma atraente. Nesse cenário, as fake news são
absorvidas pelos leitores de forma acrítica e replicadas rapidamente.
A pós verdade transfere a autoridade da ciência e do jornalismo sério para a
produção e as opiniões criando certos efeitos [...] nada mais tentador que pular
os dados técnicos, os detalhes e as incertezas de um problema real com uma
boa opinião de conjunto, ainda mais se ela for sancionada pela ‘razão universal’,
que limpa o terreno e dispensa de considerar certos ângulos adicionais e
excessivos [...]” (DUNKER, 2017, p. 39).
Balém (2017) entende a fake news como uma mentira em forma de notícia. O foco
das fake news são os cidadãos comuns e sua principal função é mexer com a emoção
destas pessoas, tanto gerando hate speech (discurso de ódio), como uma imagem
positiva do ator central da notícia, que pode ser um personagem, um grupo político, uma
instituição ou ideologia. As fake news, segundo Wardle (2017), são divididas em sete
categorias: (1) sátira ou paródia, (2) falsa conexão, (3) conteúdo enganoso, (4) falso
contexto, (5) conteúdo impostor, (6) conteúdo manipulado, (7) conteúdo fabricado. Para
a Agência Lupa
ii
, especialista em checagem de fatos (fact-cheking) e signatária da
International Fact-cheking Network
iii
(IFCN), as notícias são classificas em: verdadeira;
verdadeira, mas, ainda é cedo para dizer; exagerada; contraditória; insustentável; falsa;
de olho. Enquanto a Aos Fatos
iv
, também signatária da IFCN, classifica em: exagerada,
imprecisa, verdadeira e falsa. Essas divisões são importantes, pois mostram possíveis
relações da informação com o grau de verdade ou inverdade das notícias. Essas relações
são ligadas pelo grau de anomalia da informação, que tanto pode ser hipertrófica, como
pura desinformação.
4 ACEPÇÕES DA INFORMAÇÃO E DE SUA HIPERTROFIA NA CIÊNCIA DA
INFORMAÇÃO: ASPECTOS CONCEITUAIS E POLÍTICOS
Para melhor entender a verdade, é necessário que retornemos à afirmação que
fizemos na introdução, de que a informação é sua matéria-prima. Esta assertiva é, no
primeiro momento, perigosa, mas necessária à discussão. Revisando a etimologia da
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palavra informação, temos que esta deriva do verbo em latim informare/informatio, cujo
significado é dar forma ou colocar em forma (MESSIAS, 2005). A informação, a partir de
sua etimologia, pode ser entendida como uma exteriorização, sob determinada forma,
inteligível a outrem. É, nesse sentido, tornar tangível e acessível algo outrora velado não
a quem possui a informação, mas a quem se pretende expor. Voltando ao mito da
caverna, é a enunciação do sujeito que narra aos seus colegas de morada o que vira, mas
não somente ela em si, é também o processo.
Se considerar-se que o homem se utiliza da informação e da comunicação para
travar relações entre si e o meio em que vive, pode-se inferir que a informação
pode dubiamente representar o momento em que o homem delimita o
pensamento/ideia (substância imaterial) e molda-o, transmuda-o para uma
forma simbólica, capaz de ser apreendida e comunicada. Paralelamente, indica
o “conteúdo” propriamente dito da mensagem, nesse sentido, tem-se que a
informação é o resultado do ato de informar (conteúdo) e o próprio ato (forma)
(MESSIAS, 2005, p. 21).
O ato de informar é carregado de símbolos, da perspectiva do emissor e do
repertório cultural e ideológico que o permeia. Mas não é mera representação, ela é, “[...]
mais precisamente, a articulação de uma compreensão pragmática de um mundo
comum compartilhado” (CAPURRO, 1992 apud GÓMEZ, 2002, p. 32). Esse entendimento
pressupõe que receptor e emissor devem compartilhar do mesmo repertório linguístico
para que haja intercâmbio de informações e de suportes que possibilitem esse
intercâmbio. Por exemplo, a inteligibilidade deste artigo para você que é possível
por compartilharmos do mesmo universo simbólico e linguístico e pela existência de
próteses comunicacionais, como a escrita e o suporte, no caso, o próprio artigo, que
tanto pode estar em meio eletrônico, como físico. Essa extensão da inteligência pela
materialização é uma das perspectivas de entendimento da informação. No entanto, a
informação não é isenta, pura e perfeita, como pensa o paradigma platônico da Ciência
da Informação (CAPURRO, 1985 apud GÓMEZ, 2002), e não o é justamente pela
falibilidade, pelos desejos e pela finitude de quem as apreende, o próprio ser humano,
além de seu caráter político (CAPURRO; HJORLAND, 2007). “A informação não é um
artefato estável e passivo, é interativa, coletiva e performativa. A informação é, portanto,
política na medida em que serve como meio para decidir em quem se pode, ou não
confiar [...]” (KLINGEL; BOYD, 2013, p. 989, tradução nossa
v
).
Pensando nisso, Demo (2000) assevera que a informação não é sinônimo de
conhecimento e que a oferta demasiada deste produto não implica em uma sociedade
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bem informada, muito pelo contrário. O pensamento de Demo é consoante com o
entendimento de neofilia, evidenciado por Almeida (2010), que trata do desejo
incontrolável pelo novo e por conhecer tudo. O autor entende que as informações, para
aplacar esse desejo pelo novo, são consumidas como pílulas, e que a humanidade se
torna dependente ‘química’ delas (ALMEIDA, 2010). Este processo de consumo anômalo
de informações pode gerar um comportamento informacional também anômalo, e o que
antes era entendido como constituinte da construção de conhecimentos passa a ser o da
atrofia do intelecto.
Paradoxalmente, vivemos na sociedade do conhecimento, sociedade
tecnológica ou sociedade da informação, mas, se informação é o princípio do
conhecimento, a hipertrofia da informação se traduz na incapacidade de
produção do conhecimento e, consequentemente, da experiência com o
conhecimento. Então, uma sociedade hipertrofiada pela informação é uma
sociedade atrofiada de experiência. A velocidade e a superficialidade com que a
informação é veiculada nos diferentes meios de comunicação (internet,
televisão, rádio, revistas) o permitem que a experiência aconteça (RANGEL,
2009, p. 222).
Complementa este raciocínio a enumeração das cinco características que
evidenciam o caráter manipulativo da informação, apontadas por Demo (2000, p. 40).
Primeiro, a sociedade continua bastante ‘desinformada’, seja porque lhe chega
tendencialmente informação residual, ou porque se lhe impõe
informação oficial, ou porque se entope atabalhoadamente. Segundo,
informação de classe superior e inferior, cuja variação está em função como
regra do poder aquisitivo de cada um. [...] Terceiro, abunda na praça
informação imbecilizante, seja por conta da distorção por vezes clamorosa, mas
igualmente pela exploração das futilidades da mídia [...] Quarto, a mídia está
muito distante de sua função pública, porque corresponde a um estilo afrontoso
de apropriação privada, dirigida por trâmites comerciais estritos. Não existe
qualquer controle público digno de nota que preserve os interesses do público.
Sem recair na “censura”, sempre impertinente e no fundo equivocada, é preciso
que a sociedade possa pressionar adequadamente a mídia, para que os
interesses comerciais não sejam os únicos. Quinto, a potencialidade informativa
dos novos meios de comunicação está ainda presa a acessos elitistas, e quando
traduzida em teleducação, tende fortemente ao instrucionismo. Como bem
mostra igualmente a biologia, o instrucionismo é intrinsecamente
imbecilizante.
De posse dos conceitos acima, de informação, verdade, pós-verdade, pode-se
agora tecer o conceito de informação hipertrófica, ou hipertrofia da informação, a partir
do entendimento do termo “hipertrofia”, que já fora introduzido, mas que pode ser
melhor apreciado na seção que segue.
24
Sampaio; Oliveira; Olegário | Hipertrofia da informação
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5 UM CONCEITO DE HIPERTROFIA DA INFORMAÇÃO PARA CIÊNCIA DA
INFORMAÇÃO
Na fisiologia, o termo hipertrofia significa uma adaptação das células e tecidos
diante de uma maior exigência de trabalho, seja fisiológica (esperada, normal) ou
patológica. No que tange aos nossos músculos, é quando a massa muscular total
aumenta, daí chama-se hipertrofia muscular (HALL; GUYTON, 2017). Hipertrofia, desta
forma, é o “crescimento de um órgão ou tecido [...] causado pelo aumento de tamanho
das células, enquanto a hiperplasia [...] é o crescimento anormal de um tecido, mas
produzido pelo aumento do número de células, não por seu tamanho” (RODRÍGUEZ, 20--
, não paginado). A hiperplasia é também conhecida como hipertrofia numérica. De posse
disso, ao se analisar o entendimento de hipertrofia da informação na Comunicação, tem-
se, de forma recorrente, a ideia de grande quantidade de informações. Nas palavras de
Guerra (2003, não paginado),
[...] hoje vivemos em um mundo de muitas conexões e poucos vínculos. Vivemos
os excessos da modernidade, informação, imagens, individualismo, com
hipertrofia da informação e atrofia do entendimento. Porque ‘de tantas árvores,
já não se consegue ver o bosque’.
Barreto (2012, não paginado) evidencia a crença de Muniz Sodré de que:
[...]a ‘hipertrofia da informação’ leva a um ‘desaparecimento da cultura’ e a uma
‘informação como mera quantidade ou dado’, resultando em uma ‘cultura como
produção mercantil’. De acordo com o homenageado, ‘o principal objetivo da
‘mídia’ atual é se apropriar do tempo do outro’, transformando-se em uma
‘mídia conectiva, mas não informativa.
Künsch (2006) crê que a hipertrofia da informação está ligada à necessidade
de tudo ver (onividência), de estar em toda parte (onipresença), sendo, as pessoas,
assediadas por câmeras, imagens, informações. O ser humano, em suas palavras, torna-
se um devorador dessas imagens, um “devorador devorado [...] De tanto ver, às vezes,
não vemos” (KÜNSCH, 2006, p. 41).
Os autores acima convergem no entendimento de uma oferta e consumo
exagerados de informação, ou, utilizando-se da alusão de Almeida (2010), - da
informação como pílula - uma superdosagem. Como toda superdosagem, o consumo
exagerado de informações causa o efeito oposto do que versa suas recomendações. O
que era seiva do conhecimento e da verdade torna-se fonte de ignorância e falsas
certezas. O processo de dúvida e crítica é posto de lado em nome da velocidade e da
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facilidade de apreensão, gerando o que Almeida (2010) chama de ‘bulimia intelectual’,
como se fossemos acometidos pelo que o autor chama de Síndrome de Fausto (desejo de
conhecer tudo). A forma de manter este vício é pela atualização constante de
Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC) que propiciem uma gama maior de
informações, em tempo hábil, fazendo os aplicativos e páginas de portais serem
executados de forma ótima, mesmo que nosso processamento intelectual não
acompanhe o processamento das máquinas. Nesse sentido, a hipertrofia da informação,
a priori, pode ser entendida como a manifestação assediante e em grande escala de
informações e meios para sua propagação em consonância com o desejo de seu
consumo. Essa ideia de quantidade parece ser mais aproximativa do entendimento de
hiperplasia (ou hipertrofia numérica) do que de hipertrofia, ao se levar em consideração
as informações como células, dado que a hipertrofia é o aumento da célula, que faz
aumentar o órgão, e não o aumento do conjunto de células.
A partir disso, outra possibilidade conceitual para o termo, tomando por base
o entendimento primário e biológico de hipertrofia, no sentido não de várias
informações, mas de uma única que é construída de forma imoderada. A hipertrofia da
informação, nesse sentido, seria a construção da narrativa de um fato de forma
hiperbólica e sensacionalista, não se constituindo em mentira, ou fake news, mas no fato
em si, cuja possibilidade futura soe nebulosa, implicando em ação necessária do
interlocutor. Exemplos, os mais diversos, podem ser verificados na rede, como na greve
da Polícia Militar (PM) do Estado do Ceará, deflagrada em 2012, perto do réveillon de
Fortaleza, um dos maiores do país.
Relatos de violência, verdadeiros ou não, difundiram-se pelas redes sociais,
sobretudo no Twitter. Vídeos de crimes de anos anteriores e fotos de
ocorrências em outros estados foram difundidos como se fossem no Ceará.
Houve também ocorrências reais. O POVO confirmou ter havido arrastões na
Vila Velha, no Henrique Jorge e na Varjota. Comerciantes fecharam as lojas mais
cedo. [...] Havia rumores de arrastões - não confirmados - em municípios
vizinhos, como Acarape e Barreira. No dia 3 de janeiro, a crise chegou ao ápice.
Boatos que começaram no dia anterior se massificaram em redes sociais e no
boca-a-boca da população. O medo foi legitimado quando empresas e a
órgãos públicos começaram a fechar as portas por temor de arrastões. Feriado
informal foi instituído. Na Internet, imagens falsas mostrando ações de
criminosos na Cidade se multiplicavam. Avenida ficaram desertas em pleno
segundo dia útil do ano. Supermercados, hospitais colégios, restaurantes,
academias, lotéricas, consultórios médicos, bancas de revista e padarias, cada
minuto um novo estabelecimento supostamente era tima dos criminosos. O
que antes era uma queda de braço entre Governo e manifestantes passou a ter
impactos econômicos e sociais. No fim da tarde, poucos estabelecimentos se
mantiveram abertos. [...] A insatisfação com o impasse tomou conta da
população e foi determinante para que o governador Cid Gomes cedesse e
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aceitasse as reivindicações impostas pelo comando de greve (CAVALCANTE;
FIRMO, [2018]).
Percebe-se, pelo relato acima, que, além da circulação massiva de fake news,
outro ponto culminante para a preocupação da população foi a possibilidade de
acontecerem os arrastões, e não sua efetivação. Essa possibilidade vem da existência da
greve dos policiais que, em teoria, desemboca nesse tipo de crime. Exemplo semelhante
e recente foi o da paralisação dos caminhoneiros (ocorrido em 2018). O fato de estes
pararem seus veículos nas rodovias, com a retenção dos produtos, gerou na população o
medo de que faltassem mercadorias nas prateleiras dos supermercados, o que a fez
estocar gêneros alimentícios e combustíveis. Nenhum veículo oficial de comunicação ou
a imprensa recomendou que as pessoas aderissem a tal prática, no entanto, a
possibilidade de esgotamento gerou a efetiva carência, tanto de gasolina, como de
determinados alimentos, além dela, a circulação de notícias falsas
vi
. A hipertrofia da
informação, portanto, apoia e é apoiada pela geração de fake news. Ambas atuam para
que a população aja em resposta a um acontecimento de potencial interferência em sua
vida. O fato é narrado dentro da possibilidade de caos (hipertrofia da informação) e se
consuma a necessidade de ação por meio de notícias falsas (fake news). Em suma, a
hipertrofia da informação, nesse sentido, é uma forma de espetacularização pautada em
especulação.
Sítios que trabalham com a checagem de fatos já classificam fake news dessa
natureza em suas verificações, mesmo que de forma indireta, como é o caso da Agência
Lula. Nela, pode-se perceber a hipertrofia da informação nas etiquetas: informação
exagerada (notícias cujas informações estão no caminho correto, mas há exagero); ainda
é cedo para dizer (a informação pode vir a ser verdadeira, mas ainda não é) e
insustentável (quando não dados públicos que comprovem a veracidade da
informação). Na página Aos fatos, a etiqueta que evidencia a hipertrofia da informação,
também de forma indireta, é a de conteúdo ‘exagerado’. Interessante destacar o uso
destas etiquetas (ou tags) como forma de evidenciar que as notícias que compõem as
fake news não são formadas exclusivamente por fatos inexistentes, mas pelo
enviesamento de fatos. Esses enviesamentos passam despercebidos na medida em que o
leitor apresenta pouca familiaridade com estratégias e ferramentas de checagem de
fatos, bem como pela oferta massiva de informações diversas a respeito de outros temas,
ou do mesmo tema, mas que tratam de desdobramentos diferentes. A hipertrofia da
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27
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informação passa despercebida por seus leitores, dado que a hiperplasia de informações
(ou hipertrofia numérica da informação), atrelada à neofilia, dificulta uma apreciação
cautelosa do que se lê.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ambas as hipertrofias, a espetacularizada e a numérica (hiperplasia),
demonstram a fragilidade e inabilidade com que as pessoas lidam com a informação,
mesmo em uma sociedade dita informacional. A informação, insumo para o
conhecimento e para a verdade, torna-se, neste contexto, uma ferramenta de
manipulação, quando em seu estado anômalo ou quando utilizado em hiperdosagem.
Este produto, portanto, na atual sociedade, comporta-se como um pharmakon, que tanto
tem a capacidade de curar a ignorância como promovê-la.
O desafio está justamente em como perceber a informação nos ambientes e
espaços de comunicação. Não é à toa que estudos a respeito do tema fake news têm
surgido no meio científico, e propagandas a respeito de seu combate m aparecido nos
meios de comunicação de massa, como a televisão
vii
. Outros atores comunicacionais,
como o WhatsApp
viii
, têm se preocupado com a temática, elaborando políticas de
combate à fake news e incentivando usuários a pensarem formas de evitar sua
propagação, bem como de elaborar estratégias que podem ser utilizadas de forma
automatizada.
Para além dessas reflexões, o olhar atento, investigativo e perspicaz, antes da
replicação é, ainda hoje, o método mais eficaz de não propagação de notícias falsas. Esta
forma de ação se por meio da educação dos consumidores e produtores de
informação. A hipertrofia da informação é apenas uma das anomalias informacionais
que a atual sociedade enfrenta. O analfabetismo informacional e digital e o acirramento
político são outras formas de dificuldade que as pessoas encontram e que tornam a
internet espaço propício à propagação das fake news.
Esse campo de estudo é, nesse sentido, terreno fértil para a Ciência da
Informação, que tanto pode desvelar este universo por uma abordagem tecno-social da
interação dos usuários com esses replicadores de informações falsas, como pela
abordagem da genuinamente social, a partir do estudo do comportamento dos usuários
de redes sociais e suas habilidades frente a informações anômalas.
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NOTAS
i
A mesma fragilidade é percebida ao se falar no conhecimento como fonte da verdade. Basta revisitar a ciência em suas descobertas e
seus paradigmas, evidenciados por Kuhn (1998). A ciência normal de outrora não se compara com a ciência moderna, tanto pelos
processos, quanto pelas ferramentas utilizadas para que as descobertas sejam feitas. O átomo como esfera indivisível já não atende à
química atual, tampouco, a ideia de homossexualidade é tida hoje como patologia.
ii
Ver em: https://piaui.folha.uol.com.br/lupa/. Acesso em: 10 out. 2018.
iii
Ver em: https://www.youracclaim.com/badges/57582456-db4d-4541-beb0-eeb05d8ada75. Acesso em: 10 out. 2018.
iv
Ver em: https://aosfatos.org/. Acesso em: 10 out. 2018.
v
Texto original: Information is not a stable, passive artifact in accounts from our participants; it is interactive, collective, and
performative. Information is thus political in that it serves as the means of deciding who can be trusted and who cannot, who is a
member and who is not
vi
Matéria G1 dia 24 maio 2018. Ver em: https://g1.globo.com/economia/noticia/estoquem-comida-abastecam-seus-carros-
noticias-falsas-alimentam-panico-em-meio-a-greve-de-caminhoneiros.ghtml.
vii
Ver mais em: Link de acesso. Acesso em: 23 ago. 2016.
viii
Ver mais em: Link de acesso. Acesso em: 23 ago. 2016.
INTERSECÇÕES ENTRE MEMÓRIA E FEMINISMO
INTERSECTIONS BETWEEN MEMORY AND FEMINISM
Anna Raquel de Lemos Viana
1
Maria Nilza Barbosa Rosa
2
Izabel de França Lima
3
¹ Mestranda em Ciência da Informação
(PPGCI/UFPB),
E-mail: annaraquellemoss@gmail.com
2
Doutora em Letras pela UFPB, Pós-doutoranda
em Ciência da Informação (PPGCI/UFPB)
E-mail: nilzasor@yahoo.com.br
3
Doutora em Ciência da Informação pela UFMG,
Professora do PPGCI e do PPGOA/UFPB
E-mail: belbib@gmail.com
ACESSO ABERTO
Copyright: Esta obra está licenciada com uma
Licença Creative Commons Atribuição 4.0
Internacional.
Conflito de interesses: As autoras declaram
que não há conflito de interesses.
Financiamento: Não há.
Declaração de Disponibilidade dos dados:
Todos os dados relevantes estão disponíveis
neste artigo.
Recebido em: 20/09/2019.
Revisado em: 01/10/2019.
Aceito em: 10/10/2019.
Como citar este artigo:
VIANA, Anna Raquel de Lemos; ROSA, Maria
Nilza Barbosa; LIMA, Izabel de França.
Intersecções entre memória e feminismo
Informação em Pauta, Fortaleza, v. 4, n.
especial, p. 31-46, nov. 2019. DOI:
https://doi.org/10.32810/2525-
3468.ip.v4iEspecial.2019.42602.31-46.
RESUMO
Surgindo no contexto de ideais iluministas e
transformadores da Revolução Francesa e
Americana, posteriormente se espalhando no
mundo todo, o feminismo, como movimento
social, é essencialmente moderno e faz críticas à
estrutura de poder patriarcal existente na
sociedade através de discussões por direitos
sociais e políticos. Atua em multiplicidade de
relações, construindo articulações e se
ampliando dentro do contexto mundial. Nessa
perspectiva, esse artigo se propõe a percorrer a
trajetória histórica por onde transitaram as
dinâmicas políticas dos feminismos, refletindo
sobre as intersecções da memória como fio
condutor para o empoderamento,
fortalecimento da identidade e a conquista dos
direitos das mulheres.
Palavras-chave: Feminismo. Movimentos
Sociais. Memória. Direitos. Política.
ABSTRACT
Arising in the context of "the age of
enlightenment" and transforming ideals from
the French/American Revolution and later
spreading worldwide, feminism as a social
movement is essentially modern and criticizes
the existing patriarchal power structure in
society, through discussions for social and
political rights. It acts in a multiplicity of
relationships, building articulations and
expanding inboard the world context. Within
this perspective, this article intends to go
through the historical trajectory of the political
dynamics of feminism, reflecting on the
intersections of memory as a leader for women's
empowerment, strengthening of identity and
acquisition of women's rights.
Keywords: Feminism. Social Movements.
Memory. Rights. Politics.
Inf. Pauta
Fortaleza, CE
v. 4
n. especial
nov. 2018
ISSN 2525-3468
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-3468.ip.v4iEspecial.2019.42602.31-46
ARTIGO
32
Viana; Rosa; Lima | Intersecções entre memória e feminismo
Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
1 INTRODUÇÃO
Questões de gênero sempre permearam acontecimentos históricos. Dentre elas,
destaca-se o movimento feminista, que surge como crítica à modernidade, promovendo
um questionamento político, cultural e moral. Além disso, apresenta, ao âmbito político,
questões até então consideradas apenas de esfera privada, a saber: sexualidade, direito
ao corpo, maternidade, aborto, violência contra a mulher, contracepção e maternidade.
Aliadas a isso, as mulheres expõem assuntos do dia a dia e denunciam as desigualdades
de uma cultura patriarcal, que valoriza a figura do homem em detrimento da mulher, e
coloca em pauta o salário inferior comparado ao dos homens, a falta de divisão dos
afazeres domésticos, a criação dos filhos, a participação política, entre outros aspectos.
Por meio de uma reflexão analítica, entende-se que o poder não é uma
propriedade que pertence exclusivamente a um grupo ou uma classe (FOUCAULT,
1979), ou seja, não existem aqueles que detêm o poder (dominantes) e os que são
dominados. uma rede, práticas de relações de poder. Sendo assim, o poder se
constitui como algo que se exerce, se efetua, funcionando como estratégias, isto é,
“formas díspares, heterogêneas, em constante transformação. O poder não é um objeto
natural, uma coisa; é uma prática social e, como tal, constituída historicamente”
(FOCAULT, 1979, p. 10).
Ainda segundo (FOCAULT, 1987), esse tipo de poder foi disseminado por todo o
tecido social, ampliando-se e tornando- se “capilarizado”. Ou seja, ao invés de o poder
atuar de forma maciça e geral, acontece muitas vezes com mecanismos de poder,
alicerçados por micropoderes, de forma sutil e distribuída. Vale ressaltar que os
micropoderes não cessam os macropoderes, mas servem para sustentar ou multiplicar
os efeitos deles. Percebe-se que as relações de poder ultrapassam o nível estatal e se
estendem por toda a sociedade, evidenciando que, na modernidade, não é o Estado o
centro de formação e controle de sociabilidade. Como complementa Agamben (2009),
existem os dispositivos que se constituem como algo além das instituições (governo,
escolas, manicômios), mas que têm a capacidade de capturar, orientar, determinar,
assegurar os gestos e condutas, opiniões dos seres viventes, como a literatura, escritura,
computadores. Sendo assim, considera-se tudo que exerce poder, de menor ou maior
escala.
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Para melhor compreensão da estrutura do poder, Focault (1979) propõe analisar
em suas extremidades, em suas formas e instituições mais regionais e locais, sobretudo
indo além das regras de direito e que se organizam e delimitam, penetrando em
intuições, virtualizando técnicas que passam a ser instrumentos de interação material,
por vezes, violentos.
Tal perspectiva deve levar em consideração os movimentos sociais, que buscam,
em ação coletiva, provocar mudanças sociais, dentro de um embate político, em um
determinado contexto. Dentre eles, observa-se o movimento feminista como um
movimento moderno, que surge a partir do contexto das ideias iluministas (1680-1780),
com a Revolução Francesa (1789-1799) e Americana (1775-1781), reivindicando
direitos sociais e políticos, com maior ênfase para a luta sufragista, através da
mobilização de mulheres de vários países, afirma Oliveira (2014). Com características
muito particulares, atentando-se para sua história e processos, “é um movimento que
produz sua própria reflexão crítica, sua própria teoria” (PINTO, 2010, p. 12).
Ao dar visibilidade a reivindicações à esfera pública, o movimento feminista se
mostra como interlocutor junto ao Estado, legitimando os direitos e denunciando a
opressão cultural construída historicamente para silenciar as mulheres. Além disso,
utiliza a memória coletiva como forma de construção social para fundamentar e reforçar
os sentimentos de pertencimento e coesão dos grupos feministas.
Justifica-se a importância de reconstruir a história sobre as mulheres, a partir de
lembranças, experiências e vivências dos movimentos feministas, e seu papel na
organização e constituição de uma história que teve como protagonistas as mulheres.
Estas deixaram suas marcas nas lutas cotidianas em suas várias dimensões e níveis,
assim como em diferentes lugares e momentos históricos.
Le Goff (1990) aponta que a memória coletiva é posta como forma de luta pelas
forças sociais de poder. Aqueles indivíduos que dominaram e desejam dominar as
sociedades históricas se preocupam com a memória e o esquecimento das classes,
grupos e indivíduos, como mecanismo de manipulação da memória coletiva.
Ademais, ao incorporar o direito à memória, o movimento feminista propõe
reflexões sobre o discurso histórico, científico e político que privilegia o sujeito
masculino, e promove a desconstrução dos modelos sociais tradicionais, em troca da
construção da alteridade e inclusão das mulheres historicamente apagadas.
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Com a possibilidade de alterar e modificar fatos descritos a partir de novas
percepções, os estudos sobre memória promovem mudanças sociais, pois permitem
reconstruir o fenômeno, em função das preocupações éticas, pessoais, políticas e
culturais de vários momentos vivenciados por diferentes sujeitos.
Neste artigo, busca-se discutir as bases em que se assentam os feminismos,
levando em consideração o desconhecimento da sociedade acerca da história, evolução e
articulação do feminismo, destacando participações de mulheres excluídas
historicamente, bem como problematizando as práticas e discursos do uso da memória
pelo movimento feminista, em suas constituições identitárias em busca de
reconhecimento.
2 MEMÓRIAS: REFLEXÃO DAS FEMINISTAS
Do direito a estudar políticas públicas voltadas para a mulher, podem-se citar
vários exemplos de conquista e institucionalização de pautas feministas, tanto no espaço
público quanto no privado, que permitem o reconhecimento da capacidade feminina. No
entanto, ainda um desconhecimento da história do feminismo, em parte, pela
limitação de bibliografia e reflexão teórica ao longo dos anos.
Para fins didáticos, o estudo sobre o feminismo divide-se em ondas feministas
(the waves terminology), que, embora apresentem algumas controvérsias tanto no nível
teórico quanto prático, elas são parâmetro cronológico e teórico. Uma “onda” feminista
foi um momento histórico relevante de efervescência militante e/ou acadêmica em que
determinadas pautas e questões das mulheres se insurgiram e dominaram o debate.
(FRANCHINI, 2019).
Diferenciados por conjunturas, os feminismos são vistos, em geral, como
irrupções em que, de repente, não mais que de repente, mulheres diversas se
juntam, mostramse “irmanadas” na agitação de “causas” ou motivações políticas
que se avolumam e que avançam como onda. Esta, depois de atingir um ponto
alto, desce, invadindo os mais variados territórios, em diversos tempos; em
seguida, tudo parece dissiparse. Diria que um maior rigor na produção do
conhecimento dessas causas” /motivações depende, sim, de pesquisa de fontes,
mas sob uma leitura orientada por conceitos que admitam esses movimentos
conjunturais como partes de um vasto tecido social, em grande medida,
submersas, vindas de diferentes tempos históricos, trançadas entre si e que
avançam em infinitas combinações de “ramificações”, continuadas ou não,
sinalizando movi mentos e transformações de visões de mundo (FRANCHINI,
2009, p. 4).
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Cada onda tem suas particularidades e facilita as formas de agrupar as mulheres
de acordo com suas demandas e momentos históricos. “Assim, apesar de não haver um
único posicionamento do movimento feminista, é possível identificar certos paradigmas
ou ideologias predominantes que se revelam em reivindicações e pautas de determinada
época”. (SAFFIOTI, 1986, p. 105).
Entende-se que há, nas ondas feministas, uma síntese hegemônica de
determinado período histórico demarcado por enfoques, estratégias e posições políticas.
Dessa forma, são feitos recortes espaciais, temporais e teóricos dos movimentos
feministas ao longo da história da organização de mulheres.
2.1 Primeira Onda
Inicialmente, nas últimas décadas do século XIX, na Inglaterra, as mulheres se
juntaram para lutar por direito ao voto e ficaram popularmente conhecidas como
sufragistas. A mulher, antes vista como ser do lar e feita para procriar, tem questionado
a imposição dos papéis submissos destinados a elas. Portanto, como observa Pinto
(2010), as primeiras reivindicações surgem com pedidos básicos, como direito ao voto e
a participação política. Para isso, as mulheres promoveram grandes manifestações, e
muitas, inclusive, foram presas ou fizeram greve de fome.
no Brasil, o feminismo surge posteriormente, também com a luta pelo direito
ao voto. “As sufragistas brasileiras foram lideradas por Bertha Lutz, bióloga, cientista de
importância, que estudou no exterior e voltou para o Brasil na década de 1910, iniciando
a luta pelo voto” (PINTO, 2010, p. 16). Elas defendem que homens e mulheres são iguais
em relação à capacidade moral e intelectual, e, portanto deveriam ter as mesmas
oportunidades para trabalhar, estudar e participar da esfera pública, predominando,
nesse período de militância, a defesa da igualdade.
Segundo Saffioti (1986, p. 107), a proposta fundamental era ampliar o que se
entende por democracia, tornando iguais perante a lei os crescentes contingentes
humanos das sociedades competitivas. Nesta concepção, cabe reivindicar para as
mulheres igualdade de direitos com relação aos homens no plano de jure”.
Porém, a crítica a esse período consiste em afirmar que as pautas estavam ligadas
a interesse de mulheres brancas e de classe média, e, por isso, eram pautas
generalizadas de inclusão formal, não adentrando profundamente a estrutura patriarcal
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e machista construída. Mesmo que tenha se restringindo a conquistas “formais”, é
inegável o impacto causado na estrutura de poder patriarcal, por se constituir de um
movimento massivo, em que a coletividade de mulheres ocupou espaços públicos (ruas,
praças), causou tensões e consequentemente mudanças.
Marcam-se também as ideologias nazistas e fascistas deste período que
culminavam num maior controle feminino e na tentativa de reforçar os papeis sociais
como inerentes e naturais, marcando o arrefecimento das mobilizações populares como
um todo (ALVES; PITANGUY, 1985, p. 49-50).
Ainda segundo (ALVES; PITANGUY, 1985, p. 50), “o papel estatal e midiático teve
fundamental influência no retorno da mulher ao espaço doméstico e domesticado. As
propagandas neste período exaltam a figura dona-de-casa servil ao marido, do papel de
esposa e mãe e do fomento à indústria de beleza e estética.”
Nesta reflexão, percebe-se a estrutura patriarcal predominante, e a forma como
as mulheres lutaram para ter direitos e garantias em uma sociedade com cultura
predominantemente masculina e machista. Ao fazer uma crítica cultural e questionar
valores tradicionais, o feminismo entende que a cultura é dinâmica e pode sofrer
alterações devido a eventos históricos, ou conflituoso contrato cultural, pois a cultura
condiciona a visão do mundo do homem (LARAIA, 2001).
Construindo articulações e ampliando para um contexto mundial, como
corroboram Bandeira e Melo (2010, p. 8), “o movimento feminista nasceu das lutas
coletivas das mulheres contra o sexismo, contra as condições de aversão e inferiorização
feminino, transformadas em práticas rotineiras de subordinação”.
A luz disso, o direito à memória se estabelece como pauta primordial das
mulheres, e nesta relação começa a constituição de uma subjetividade política e social,
optando por táticas e estratégias de conscientização por meio de atividades coletivas,
proporcionando o maior empoderamento do movimento. Da mesma forma que a
memória e a cultura nos modelam, ela também é modelada por nós, sendo preciso um
reconhecimento do valor dessa memória pelo grupo.
Em consequência dessa relação de disputa de poder, durante muito tempo as
realizações femininas e a memória permaneceram em silêncio, pois, pensando
politicamente, não interessava essa história ser contada (PERROT, 2012, p. 114). O uso
da memória passa a ser um instrumento de controle, servindo de controle para a
construção de uma história que limita os comportamentos dos sujeitos envolvidos,
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delimitando à mulher apenas o espaço privado para criação dos filhos e cuidado do lar,
isto é, um papel de invisibilidade em relação ao homem, sempre destacado no espaço
público.
2.2 Segunda Onda
Nas décadas entre 60 e 70, grandes revoluções aconteceram no cenário mundial:
manifestações estudantis, movimentos de resistência contra a Ditadura Militar,
movimento hippie e manifestações contra a guerra do Vietnã.
“A segunda onda do feminismo na América Latina nasceu nos anos 1970, em
meio ao autoritarismo e à repressão dos regimes militares dominantes e das falsas
democracias claramente autoritárias.” (UNESCO, 2009).
Em meados dos anos 50 até meados dos anos 90, iniciam estudos centrados na
origem da condição da mulher, apresentando questionamentos sobre o porquê de as
mulheres serem consideradas em situação inferior a dos homens. Nesse período
também começou a se construir uma base teórica sobre a opressão contra a mulher,
justificada pela condição biológica e função reprodutiva.
Ao lembrar-se da estrutura patriarcal que a sociedade se constitui ao longo dos
anos, o coletivo feminista se articula, unindo as experiências individuais e coletivas e
questionando a situação de várias experiências de mulheres espalhadas no mundo.
Hallbwacks (2013) diz que o indivíduo que lembra está inserido na sociedade na qual
sempre possui um ou mais de um grupo de referência. Por isso, a memória é sempre
construída em grupo, e “cada memória individual é um ponto de vista sobre a memória
coletiva.”
Entendem-se as lembranças como resultado de um processo coletivo, ou seja,
estão inseridas em um contexto social específico, como afirma (HALBWACHS, 2013, p.
30): lembranças permanecem coletivas e nos são lembradas por outros, ainda que trate
de eventos em que somente nós estivemos envolvidos e objetos que somente nós vimos.
Isso acontece porque jamais estamos sós”. As mulheres ativistas que participaram da
chamada segunda onda enxergavam as relações entre desigualdades culturais e
políticas. Através da memória, encorajavam os sujeitos a refletirem sobre suas histórias
e sobre os aspectos de suas vidas pessoais, relacionando ao poder - estrutura de poder
sexista.
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Assmann (2011) indica dois modos de recordação: memória funcional e memória
cumulativa. A memória funcional é responsável por assegurar a identidade do grupo, ou
seja, é seletiva e remete a um grupo, indivíduo, estabelecendo uma conexão entre
passado e futuro. A memória cumulativa é caracterizada por ser histórica, e por isso não
depende de um sujeito específico, não é seletiva, não critérios, tudo é importante.
Com isso, Assmann (2011) compara a memória funcional à memória coletiva, e a
memória cumulativa à memória histórica, a qual separa o presente, passado e o futuro,
sendo a primeira habitada, e a segunda inabitada.
A memória habitada é possível alterar e ser utilizada de diversas formas. Destaca-
se a legitimação e a deslegitimação, processo em que existe a alteração da memória,
confirmando ou anulando, de acordo com propósitos políticos. a memória cumulativa
funciona como reservatório para armazenamento de memórias funcionais, portanto não
é natural, é necessário o apoio de instituições para preservá-las. Por fim, a autora afirma
que “a dimensão memorial e a dimensão científica da historiografia não se excluem, pois
se liga uma à outra, de maneira complexa” (ASSMANN, 2011, p. 158), sugerindo que se
utilizem as duas formas para reorientar o projeto de escrita da história.
É importante, neste período de busca por uma política de igualdade de direitos,
fundamentada no reconhecimento entre equidade entre os gêneros, a utilização da
memória, pois “a memória se orienta para o passado e avança o passado adentro por
entre o véu do esquecimento. Ela segue os rastros soterrados e esquecidos, e reconstrói
provas significativas para a atualidade.” (ASSMANN, p. 53. 2011).
Prova disto são expressões e slogans que se tornaram bastantes conhecidos
nessa segunda onda, por exemplo, o slogan “O pessoal é político”, idealizado pela
feminista e autora Carol Hanish. Ela problematiza a desigualdade de união com
problemas culturais e políticos, incentivando as mulheres a terem sua liberdade política
para combater as estruturas sexistas de poder. Outro exemplo foi a “Liberação das
mulheres” com os protestos e queima de sutiãs, com participação de cerca de
quatrocentas ativistas do WLM (Women´s Liberation Movement), em 1968, durante a
realização do concurso de Miss América.
A crítica feminista durante esse período é o principal movimento a influenciar a
história das mulheres e o amadurecimento das pautas e debates sobre a afirmação da
igualdade entre os sexos, em oposição à visão parcial da história. Segundo Joan Scott: “as
feministas começaram a utilizar a palavra “gênero” mais seriamente, no sentido mais
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literal, como uma maneira de referir-se à organização social da relação entre os sexos.”
(SCOTT,1989). Uma das estratégias foi a utilização da palavra gênero como forma de
suprimir os termos mulher, mulheres e estabelecer uma nomenclatura de relação entre
os sexos, de forma que não fossem acusadas de reconstruir uma história parcial.
A segunda onda é caracterizada, portanto, no avanço de percepção e análise do
movimento de forma holística, incorporando em suas pautas diversas posições,
denunciando a estrutura de patriarcado exercido como poder político através da
dominação masculina e subversão das mulheres, além do âmbito privado, invadindo
todos os espaços da sociedade (SAFFIOTI, 2004).
Fazendo crítica ao caráter burguês-liberal da primeira onda, o próprio
movimento acrescenta reinvindicações acerca de classe e raça, relações de poder e
transversalidade de opressões estruturais, transcendo as questões de gênero.
Destacam-se nesse período as primeiras discussões e problematizações sobre a
diferença entre gênero, sexo e orientação sexual, denunciando o errado das
naturalizações de papéis sociais impostos a homens e mulheres.
2.3 Terceira Onda do Feminismo
Como citado, na segunda onda do feminismo, uma das principais preocupações
era o fim da discriminação e desigualdade entre os sexos. Como forma de responder as
supostas falhas e preencher lacunas das ondas anteriores, a terceira onda, iniciada em
meados da década de 80 e 90, objetivava ressignificar as definições e evitar estereótipos
essencialistas acerca da mulher.
Violência, sexualidade, direito ao trabalho, igualdade no casamento,
direito à terra, direito à saúde maternoinfantil, luta contra o racismo,
orientações sexuais. Esses grupos organizavamse, algumas vezes, muito
próximos dos movimentos populares de mulheres, que estavam nos
bairros pobres e favelas, lutando por educação, saneamento, habi tação
e saúde, fortemente influenciados pelas Comunidades Eclesiais de Base
da Igreja Católica. (PINTO, 2010, p. 17).
Abordam temas sobre micropolítica e questões relativas a aspectos culturais,
sociais, políticos e de cor, sobretudo o movimento feminista intersecional. Entre as
principais discussões, existe a defesa da participação da mulher negra na sociedade.
Buscaram, então, mudar os modelos como a mídia e a linguagem retratavam e definiam
as mulheres.
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o próprio questionamento do padrão branco de classe média-alta das feministas,
mulheres negras começaram a se destacar no movimento e negociar seus
espaços para revelar as diferenças vividas por mulheres com diferentes
condições sociais e étnicas. (FARIA, 1997, p. 23).
O objetivo passa a ser então o reconhecimento de diversas identidades femininas
e olhar crítico sobre as estratégias e organização das pautas feministas, entendendo as
diferenças significativas sobre o sexo.
Fica evidente a importância de aprender sobre a vida e luta de mulheres
antepassadas, como forma de legitimação e reconhecimento da estrutura patriarcal na
qual estamos inseridos, valorizando a memória como instrumento no avanço da
conquista de direitos. Majoritariamente, a produção histórica foi feita por homens, a
partir de experiências e pontos de vista vividos por eles.
Mas, [para Foucault] a história é um jogo de forças, sem fio condutor,
sem a trama de um sujeito transcendental a percorrê-la inteiramente,
tornando-a inteligível, destrinçando seu sentido, buscando suas leis
progressivas e evolutivas. A história não tem por detrás de si fios
causais, não é a busca da origem e nem de um fim remoto. No lugar do
retorno a um começo feliz, a temporalidade anônima, dispersa, sem
volta. Cada trama histórica desenha uma disposição na ordem do saber,
não há um sujeito soberano acima dessas disposições. Ele é tramado por
elas. (...) não um sujeito supra-histórico e sim posições possíveis de
subjetividades constituídas, diferentes, porém nunca indiferentes
(ARAÚJO, 2008, p. 99-100).
Implica-se, com o entendimento de história por Focault, o rompimento de uma
percepção de história linear, casual e diacrônica, com base em convicção de origem e
fim, a partir de rupturas e descontinuidades.
Benjamim (1994, p. 231), em seu texto sobre o conceito de história, apresenta a
necessidade de narrar a experiência e afirma que o historicismo “culmina legitimamente
na história universal”, cujo “procedimento é aditivo”. Isto é, o historicismo privilegiaria a
“história dos vencedores” e acabaria apagando a memória dos excluídos, ou seja, dos
esquecidos pela memória oficial. Esse papel relegado ao público feminino de
insignificância foi responsável para que se entendam as razões das faltas de fontes
históricas sobre sua existência concreta e sua história singular (PERROT, 2012, p. 22).
Percebe-se a necessidade de construir uma história e uma memória capazes de atender
as necessidades e as vivências das mulheres em sua constituição de valor,
diferentemente dos papéis estereotipados.
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Assmann (2011) aponta que não ingenuidade no rememorar. Sempre existem
interesses políticos e sociais que envolvem as questões de compartilhamento, guarda e
preservação, que vão além das questões práticas e tecnológicas.
Prova disto é a crescente centralização de poder pela Igreja e Estados nos
“processos de coleta, armazenamento, recuperação, uso e supressão de diferentes tipos
de informação” (BURKE, 2003, p. 110). Havia uma censura aos livros como forma de
evitar a leitura de determinadas obras. A partir do século XV, ao lado do registro do
“tempo da igreja” e do “tempo dos negociantes”, surge o “tempo dos arquivistas,
cronistas e historiadores”. A invenção da imprensa ajudou no desenvolvimento desta
nova memória desvinculada da igreja.
Por isso, além de construir uma nova consciência, é necessário reconhecer e
entender o contexto histórico, os silenciamentos, as vivências e conquistas de mulheres
de décadas anteriores. Não basta reconstituir pedaço por pedaço a imagem de um
acontecimento passado para obter uma lembrança. É preciso que esta reconstituição
funcione a partir de dados ou de noções comuns que estejam em nosso espírito e
também no dos outros, porque elas estão sempre passando destes para aqueles e vice-
versa, o que será possível se somente tiverem feito e continuarem fazendo parte de uma
mesma sociedade, de um mesmo grupo (HALBWACHS, 2013, p. 39).
É fundamental que as lembranças sejam reconstruídas e reconhecidas pelas
mulheres à sociedade, em especial o grupo feminista, através do compartilhamento de
informações e lembranças para o fortalecimento do grupo social.
2.4 Quarta Onda do Feminsmo
Apesar de não haver consenso entre os estudiosos, parte da academia afirma
existir uma quarta onda do feminismo. Tais lutas são engendradas
contemporaneamente pelos chamados coletivos, organizações fluidas, discursivamente
distantes da política parlamentar e das organizações tradicionais (PEREZ; SOUZA, 2017).
Atualmente, os debates em torno das questões femininas estão cada vez mais
fortes, permitindo a reflexão sobre as experiências sociais e pessoais dos sujeitos
masculinos e femininos, caracterizada principalmente pela possibilidade do uso das
redes sociais e tecnologias da informação e comunicação (TIC’s). As feministas
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encontram um espaço para produzir, disseminar informação para mulheres em todo o
mundo, sem barreiras geográficas e com facilidade de conexão.
Dessa forma, as questões feministas ocupam espaço na academia, na política e
apresentam pautas de discussões mundiais, interferindo e questionando os sistemas
democráticos, políticos e morais, levantando novas propostas e dando continuidade às
conquistas das femininas das décadas anteriores.
As principais palavras dessa nova onda são “liberdade” e “igualdade”. Essa
liberdade, de acordo com Arendt (1979, p. 192), é dimensão da política. "O campo em
que a liberdade sempre foi conhecida, não como problema, mas como fato da vida
cotidiana, é o âmbito da política". Portanto, requer um espaço politicamente organizado,
demonstrando "algo tangível em palavras que podemos escutar, em feitos que podem
ser vistos e em eventos que podem ser comentandos, relembrados e transformados em
estórias antes de serem incorporados, por fim, ao grande livro da história humana"
(ARENDT, 1979, p. 201).
A liberdade se manifesta de forma concreta e tangível, revelada através da ação e
do discurso de "criar seu próprio espaço concreto onde possa, por assim dizer, sair do
esconderijo e fazer sua aparição" (ARENDT, 1979, p. 218). Porém, atualmente, pouca
representatividade feminina no cenário político, muita dificuldade para ocupação em
cargos de poder, pouco espaço de fala e tomada de decisão. Isso se devido à exclusão
das mulheres na política e na história que reverbera até hoje.
Por vários lados, as feministas passavam a feminizar-se valorizando a
linguagem feminina, os atributos e os temas femininos, o que significava
mais do que um simples retorno aos seus valores próprios, um
alargamento do campo conceitual, através do qual teciam suas críticas à
sociedade patriarcal capitalista, revelando suas armadilhas e limitações.
Mais do que nunca, passaram a pensar em si mesmas sob uma ótica
própria, dando visibilidade ao que antes fora escondido e recusado, o
que inevitavelmente levou a uma radicalização da potencialidade
transformadora da cultura feminista em contato com o mundo
masculino. Tratava-se então, não mais de recusar o universo feminino,
mas de incorporá-lo renovadoramente na esfera blica, o que se
traduziu ainda por forçar um alargamento e uma democratização desse
mesmo espaço. (Os feminismos no Brasil: dos “anos de chumbo” à era
global (RAGO, 2003, p. 6).
A disputa pela memória e a luta por visibilidade são urgentes no momento atual
da nossa sociedade, principalmente no contexto brasileiro, pois, em meio a onda
conversadora que se destaca, estamos vivendo uma tentativa de apagamento da
memória da resistência política e da leitura crítica da história. Como observa Assmann
(2011), é fundamental, nesse contexto, saber o que será armazenado e o que será
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descartado. Anteriormente, até mesmo o lixo do passado era fonte de informação
cultural sobre os hábitos de um povo, porém, na era das mídias digitais, a fronteira entre
o que se deve lembrar e o que deve ficar esquecido é cada vez mais tênue. Nesse
momento, é necessário retomar a história como pauta prioritária e utilizar a memória
como objeto de disputa, pois evidencia experiências sociais diferentes por partes dos
atores envolvidos e apresenta manifestações de cada grupo.
Os elementos que constituem a memória coletiva permitem que os fenômenos
históricos em que as mulheres vivenciaram, de maneira individual ou coletivamente,
construam uma narrativa histórica em que as feministas apresentaram novas práticas
políticas e novas visões de sociedade na qual a mulher é sujeito.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao se revisar a historiografia dos movimentos feministas, podem-se perceber as
principais características e algumas distinções em relação à periodização por ondas. É
notório, também, o papel de esquecimento e subordinação da figura feminina em relação
à figura masculina ao longo dos anos.
Por isso é tão importante entender as relações de poder e o uso da memória por
toda a sociedade, para que possa servir como forma de liberdade e não de domínio de
um grupo específico, valorizando dessa forma a democratização da memória.
Com mais liberdade, as mulheres descobrem a sua história e o seu papel além da
procriação e afazeres domésticos a que sempre estiveram condicionadas, modificando a
visão e a configuração da sociedade. Consequentemente, buscando a efetivação do seu
papel a partir de registros, obras de arte e ocupação, aliadas a transformações que
ocorreram no âmbito político e econômico em que o poder político estava estruturado.
Apesar de ainda não alcançarmos uma sociedade justa e igualitária, com o fim da
hierarquização dos sexos, a inserção da memória ocupou um novo âmbito, possibilitou
que vozes femininas nãos fossem silenciadas, sendo possível ouvir com mais frequência
sobre suas participações na ciência, na história, na mídia e na participação política.
Exemplo disso é o Dia Internacional da Mulher, que se tornou um dos grandes
símbolos da luta do movimento feminista, proposto por Clara Zetkin, no II Congresso
Internacional das Mulheres Socialistas, em Copenhagen, em 1910 (BLAY, 2001, p. 602),
comemorado até os dias de hoje em quase todos os países. Esse dia ainda é momento de
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luta e organizações de protestos, fóruns, eventos feministas contra a discriminação de
sexo, e momento de propostas de reinvidicações, consolidando uma coordenação de
mulheres e laços de solidariedade, oportunidade para o encontro e fortalecimento das
mulheres, favorecendo para que a memória feminina não seja silenciada. (SOARES,
1994, p. 14).
Explorando essas transformações ocorridas ao longo da história, constatam-se as
mudanças também no uso da memória ocorridas na contemporaneidade, e as influências
exercidas sobre o jogo de poder e o convívio social. A memória tem função social nos
grupos principalmente minoritários, pois sensibiliza sobre a questão do passado, da
formação e construção de uma identidade coletiva.
Discutir sobre memória e movimentos sociais, sobretudo o feminista, permite
ampliar a visão de pertencimento entre os sujeitos, na medida em que está inserido em
um contexto social. Dessa forma, é possível valorizar fenômenos e a construção de
conhecimento que esclarece e enriquece novas formas de enxergar e refletir sobre a
realidade.
O desafio de estudos sobre memórias concentra-se em apresentar as experiências
muitas vezes silenciadas e suprimidas de sujeitos, em geral, marginalizados da
sociedade, para que possam se reencontrar com a dimensão histórica, a partir do
discurso não hegemônico, com participações coletivas, abrindo oportunidades para
constituição de espaços públicos diferentes, a partir de espaços de memória e de
experiências vividas e partilhadas. Isto a fim de não somente “registrar fatos, à maneira
da historiografia oficial, mas de contribuir ativamente para que no nosso presente não
ocorra o esquecimento da tragédia” (BRUNI, 2007, p. 17).
Portanto, na medida em que a memória coletiva oferece um suporte social,
promovendo a participação das mulheres, novas significações do vivido, os estudos
permitem também a democratização e pluralização, através da coletivização dos fatos e
reconstrução da então considerada história oficial e original, carregada do discurso de
história dos que detêm o poder e, por isso, são vencedores, reproduzindo a visão dos
dominadores.
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MINERAÇÃO DE DADOS NO CONTEXTO DOS PREGÕES ELETRÔNICOS
DATA MINING IN THE CONTEXT OF THE ELECTRONIC AUCTIONS
Hugo Medeiros Souto
1
Eduardo Martins de Arruda
2
Wagner Junqueira de Araújo
3
1.
Mestrando Profissional em Gestão nas
Organizações Aprendentes (PPGOA/UFPB)
E-mail: hugomsouto@gmail.com
2.
Mestre Profissional em Gestão nas Organizações
Aprendentes (PPGOA/UFPB)
E-mail: eduardo.arruda73@gmail.com
3.
Doutor em Ciência da Informação pela UNB,
Professor do PPGCI e do PPGOA/UFPB
E-mail: wagnerjunqueira.araujo@gmail.com
ACESSO ABERTO
Copyright: Esta obra está licenciada com uma
Licença Creative Commons Atribuição 4.0
Internacional.
Conflito de interesses: Os autores declaram
que não há conflito de interesses.
Financiamento: Não há.
Declaração de Disponibilidade dos dados:
Todos os dados relevantes estão disponíveis
neste artigo.
Recebido em: 20/09/2019.
Revisado em: 01/10/2019.
Aceito em: 10/10/2019.
Como citar este artigo:
SOUTO, H. M.; ARRUDA, E. M.; ARAÚJO, W. J.
Mineração de dados no contexto dos pregões
eletrônicos. Informação em Pauta, Fortaleza, v.
4, n. especial, p. 47-64, nov. 2019. DOI:
https://doi.org/10.32810/2525-
3468.ip.v4iEspecial.2019.42603.47-64.
RESUMO
O governo tem buscado acompanhar as
evoluções e tendências das tecnologias da
informação e comunicação no contexto do
processo licitatório. Dessa forma, o pregão
eletrônico surge como um dos produtos desses
esforços, caracterizando-se como uma
modalidade que apresentou soluções estruturais
para reduzir o excesso de burocracia na
aquisição de bens e serviços comuns. Sua
implantação contribuiu para o aumento da
participação de fornecedores e da
competitividade nos certames, pois reduziu e a
eliminou, em alguns casos, a necessidade da
presença física dos fornecedores. A modalidade
representa hoje mais de 94% das licitações
ocorridas no país, somando mais de 84% do
volume de recursos gastos por meio de
licitações. Apesar de seus benefícios, têm sido
identificadas falhas de diversas formas, sendo
uma delas a possibilidade de utilização de bots,
softwares programados para se conectarem nas
plataformas de pregões eletrônicos e emitirem
lances de forma imediata e automatizada,
obtendo vantagens desproporcionais em relação
a seres humanos. Um segundo produto resultado
dos esforços governamentais em busca da
modernização das compras é a ampliação da
transparência através da disponibilização de
dados abertos das licitações e contratos,
incluindo dados dos pregões eletrônicos, como
parte do contexto de Governo Aberto e
transformação digital. O objetivo geral desse
estudo é discorrer como a análise de dados pode
ser útil na prevenção de fraudes em processos
de pregão eletrônico, fundamentada na premissa
de dados abertos do Governo Federal. Por fim,
conclui-se que esse estudo apoia a importância
de se discutir os efeitos do uso de bots em
pregões eletrônicos e acredita-se no potencial de
Inf. Pauta
Fortaleza, CE
v. 4
n. especial
nov. 2019
ISSN 2525-3468
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-3468.ip.v4iEspecial.2019.42603.47-64
ARTIGO
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Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
maior controle social por parte do cidadão por
meio do acesso e análise dos dados abertos do
Governo.
Palavras-chave: Mineração de dados. Governo
Eletrônico. Pregão Eletrônico. Bots. Dados
abertos.
ABSTRACT
The government has sought to follow
developments and trends in information and
communication technologies in the context of
the bidding process. Thus, electronic trading is
one of the products of these efforts, being
characterized as a modality that presented
structural solutions to reduce the excess of
bureaucracy in the acquisition of common goods
and services. Its implementation contributed to
increase the participation of suppliers and
competitiveness in the fairs, as it reduced and
even eliminated, in some cases, the need for
physical presence of suppliers. The modality
represents today more than 94% of the tenders
that took place in the country, totaling more
than 84% of the amount of resources spent
through tenders. Despite their benefits, failures
have been identified in a number of ways, one of
which is the possibility of using bots, software
programmed to connect to electronic trading
platforms and bidding immediately and
automatically, obtaining disproportionate
advantages over humans. A second product of
government efforts to modernize procurement
is increased transparency through the
availability of open bidding and contract data,
including e-bidding, as part of the Open
Government and digital transformation context.
The overall purpose of this study is to discuss
how data analysis can be useful in preventing
fraud in electronic trading processes, based on
the Federal Government's open data premise.
Finally, it is concluded that this study supports
the importance of discussing the effects of the
use of bots in electronic trading sessions and
believes in the potential for greater social
control by citizens through access and analysis
of government openings.
Keywords: Data Mining. Electronic Government.
Electronic trading floor. Bots Transparent data.
1 INTRODUÇÃO
Entre as diferentes formas de interação do Governo com a sociedade, seja em
formato digital ou analógico, os processos de compras governamentais estão entre os
principais, pois mantêm o suprimento de materiais e serviços necessários para o
funcionamento adequado das instituições da administração pública. Diante dessas
características, o interesse na ampliação e na efetividade da transparência dos dados
governamentais ganha relevância perante o impacto negativo para a Administração
Pública e para toda sociedade, nos casos de fraudes em processos de compras realizadas
pelo Governo Federal. No entanto, acredita-se que a maior parte das fraudes não são
descobertas a tempo de serem combatidas, e aquelas que vêm ao conhecimento público
podem ser apenas a ponta do iceberg, baseadas em denúncias e/ou resultados de ações
pontuais. Dessa forma, constitui como problemática deste artigo a seguinte questão: é
possível ter mais controle social nos pregões eletrônicos por meio da análise de dados
governamentais abertos?
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O objetivo deste trabalho foi ampliar o entendimento sobre o cenário atual de
possíveis ocorrências de bots em pregões eletrônicos e sobre como a análise de dados
abertos pode ajudar no combate às fraudes.
Esse estudo traz como ideia central a possiblidade de procedimentos que podem
ser replicáveis, para fins de identificação de padrões e anomalias em pregões
eletrônicos, com os dados fornecidos pelo Governo Federal. Justifica-se em possíveis
ganhos para administração pública e economia aos cofres públicos. Aponta como
benefícios à sociedade a possibilidade de qualquer cidadão ser capaz de exercer controle
social de forma autônoma e gratuita, desde que tenha acesso à internet e um software de
análise de dados, viabilizando, desta forma, a contínua investigação sobre os efeitos e
impactos reais do uso de bots e de outros fenômenos.
Trata-se de uma pesquisa de natureza descritiva, pois busca revelar a situação
atual do uso de bots em pregões eletrônicos de uma forma objetiva. Metodologicamente,
segue uma abordagem descritiva, tendo como intuito lançar ideias iniciais que podem
ser mais bem exploradas em estudos futuros de cunho mais empírico e aplicado, como a
averiguação de casos de uso ou testes de variáveis e análise de parâmetros sobre uma
massa de dados coletados para constatação de evidências atuais do uso de bots nos
pregões eletrônicos.
2 COMPRAS GOVERNAMENTAIS
As compras governamentais afetam a vida de todos os cidadãos através da
qualidade dos serviços prestados e da infraestrutura oferecida à sociedade. São
determinantes para a eficiência da alocação de recursos públicos e injetam dinheiro no
mercado através de pagamentos aos fornecedores contratados. O termo “compras
governamentais”, segundo Amorim (2017, p.2), abrange todas as formas de contratação
possíveis à Administração Pública, tais como aquisição de bens, contratação de serviços,
alienação de bens móveis e imóveis, concessões de serviços públicos, permissões de uso
de bem público, entre outras.
O conceito de compra governamental está estritamente relacionado ao de
licitação. Mello (2015, p.536) relata o “certame que as entidades governamentais devem
promover e no qual abrem disputa entre os interessados em com elas travar
determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais
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vantajosa às conveniências públicas”. O autor segue ressaltando que “estriba-se na ideia
de competição, a ser travada isonomicamente entre os que preencham os atributos e
aptidões necessários ao bom cumprimento das obrigações que se propõem assumir”
(MELLO, 2015, p. 536). Tem-se então a isonomia, a igualdade e a impessoalidade como
pilares das licitações.
Por trás da necessidade da realização de processo licitatório no âmbito das
compras públicas, não há apenas a preocupação em garantir a integridade das disputas e
a eficácia dos resultados, mas também a concretização de um objetivo ético e moral para
com os cidadãos. Com isso, fomenta-se o desenvolvimento sustentável do país e torna-se
a licitação um meio para alcance de políticas públicas de incentivo a economias locais,
sustentabilidade ambiental, inclusão social, regularização fiscal, entre outras.
Justen Filho (2012) ressalta outros aspectos da relevância do contrato
administrativo, sendo este o instrumento de formalização dos procedimentos de
compras governamentais. O autor traz a noção de que íntima relação entre a
democratização do Estado e a ampliação da utilização do contrato administrativo, por
meio da observância de certos procedimentos e atuação dentro de limites específicos,
em detrimento à requisição compulsória de bens e serviços por um Estado autoritário.
Vinculada ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão MP, a plataforma
digital Comprasnet (Disponível em: https://www.comprasgovernamentais.gov.br/)
constitui-se como módulo do Sistema Integrado de Administração de Serviços Gerais
(SIASG) do Governo Federal, onde são operacionalizados e divulgados os pregões,
demais licitações e divulgadas as contratações diretas. Além disso, esclarecimentos e
divulgação dos casos de dispensa e inexigibilidade de licitação previstos em lei. Para os
potenciais fornecedores de serviços e produtos, a plataforma representa um conjunto de
facilidades que desburocratiza a participação em processos licitatórios.
Vale destacar que a plataforma não se restringe apenas ao uso dos fornecedores
credenciados. Ela pode ser acessada por qualquer pessoa que tenha interesse em
acompanhar os avisos de licitação, as contratações realizadas, a execução de processos
de aquisição pela modalidade de pregão e outras informações relativas às contratações
realizadas pela Administração Federal. Além disso, é possível encontrar na plataforma
do SIASG toda legislação que regula o processo de serviços gerais e de contratação,
publicações relativas ao assunto, manuais relativos aos serviços oferecidos pelo Portal,
além de suporte técnico e ajuda no uso da ferramenta.
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2.1 Pregões eletrônicos
O pregão é uma modalidade de licitação recente, criada quase uma década após a
publicação da Lei de Licitações, através da Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002,
conhecida como Lei do Pregão. Surgiu como uma alternativa de processo licitatório mais
eficiente na aquisição de serviços e bens. O art. da Lei do Pregão diz que são bens e
serviços “cujos padrões de desempenho e qualidade admitam definição objetiva no
edital, por meio de especificações usuais de mercado” (BRASIL, 2002).
As despesas licitadas através de pregão eletrônico corresponderam a mais de
94% das licitações executadas pela esfera federal entre 2012 e 2017 (PAINEL DE
COMPRAS, 2018), representando mais de 84% dos gastos totais com licitações no
mesmo período. Seu crescimento foi possibilitado principalmente pelos benefícios e
facilidades advindos da operacionalização através da internet. Esses quantitativos se
mostram ainda mais relevantes quando comparamos o volume da realização de pregões
com as demais licitações, representando 94,1% do total, configurando um percentual de
85,8% de todo o gasto com licitações pelo Governo Federal no período indicado.
Vale destacar que o procedimento do pregão eletrônico, regulamentado pelo
Decreto 5.450 de 2005, é composto por duas fases, interna e externa. A fase interna
corresponde à fase preparatória e abrange a identificação da demanda, elaboração de
todos os documentos necessários ao detalhamento da contratação e das regras do
pregão propriamente dito. A fase externa tem como núcleo o que ocorre na chamada
sessão pública, liderada pelo pregoeiro e realizada em conjunto com uma equipe de
apoio, todos devidamente nomeados por alguma autoridade regimentalmente
competente. É então iniciado um processo de várias etapas, conforme descrito no
Quadro 1, simultaneamente ou não, pois os itens, em regra, são independentes entre si.
Quadro 1 - Fase Externa do Pregão Eletrônico
Módulo/Fase
Procedimentos e Ações Possíveis
Operar
Início: A partir do horário previsto no edital, tem início a Sessão Pública, quando
é disponibilizado chat de comunicação com os fornecedores para mensagem de
abertura da Sessão Pública, que permanece disponível ao Pregoeiro por toda a
sessão;
Abrir item para lances: é realizada a análise, classificação e desclassificação das
propostas para cada item. Em seguida o item é aberto para lances.
Suspender Item: opção disponível na etapa de lances e poderá ser utilizada em
situações de dúvida sobre um determinado item. A suspensão do item impedirá o
envio de lances enquanto perdurar tal situação;
Excluir Lance: tal procedimento não impedirá a continuidade do envio de lances
pelos fornecedores;
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Módulo/Fase
Procedimentos e Ações Possíveis
Encerrar o Item para Lances: um item encerrado não pode ser reaberto. Ao
clicar em encerrar item, o pregoeiro deve informar o tempo de iminência, entre 1
e 60 minutos, em formato numérico. Após esse tempo, os itens entram no horário
de encerramento aleatório do sistema no período de 1 a 30 minutos. Após o
encerramento aleatório, os itens passam a constar na situação de “encerrado”,
devendo o pregoeiro ir para a fase de aceitação.
Aceitar
Nesta fase, o pregoeiro analisa as propostas de melhor lance, relativamente ao
objeto e o valor, decidindo por sua aceitação ou recusa.
Habilitar
Destina-se a fornecedores que tiveram suas propostas aceitas para o item.
Fechar/Reabrir
Prazo de
Intenção de
Recurso
Nesta funcionalidade o pregoeiro informa o prazo para os fornecedores
manifestarem a intenção de recurso.
Juízo de
Admissibilidade
Nesta fase o pregoeiro deve acatar ou recusar a intenção de recurso do licitante.
Havendo intenção de recurso aceita, o sistema disponibiliza tela própria para que
o pregoeiro informe os prazos para registro da razão, da contrarrazão e da
decisão do recurso.
Encerrar Sessão
O sistema eletrônico gera a Ata da Sessão Pública do pregão, com indicação do
lance vencedor e demais informações relativas à Sessão Pública.
Decidir Recurso
Caso tenha sido aceito alguma intenção de recurso, findos os prazos legais para
registro das razões do recurso e das contrarrazões dos licitantes, o pregoeiro
informa à autoridade competente da sua decisão, que acatará ou o, emitindo
sua decisão final.
Adjudicar
Decididos os recursos e constatada a regularidade dos atos praticados, a
autoridade competente adjudicará o procedimento licitatório.
Homologar
É um procedimento da autoridade competente que equivale à decisão final e/ou à
ratificação dos atos do pregoeiro.
Fonte: adaptado de Brasil, 2005b.
Além de facilitar a participação dos fornecedores, o pregão eletrônico gera menos
desconfiança ao mitigar algumas das práticas tradicionais de conluio e fraudes em
licitações presenciais. Entre os benefícios dos pregões eletrônicos está o aumento da
competitividade nos certames e consequentemente a redução dos preços praticados nas
compras governamentais e dos riscos de fraudes relacionadas a combinações entre
fornecedores e licitantes.
No entanto, surgiram outras formas de desequilibrar a disputa, relacionadas à
tecnologia utilizada na plataforma Comprasnet. Uma das questões tecnológicas
discutidas atualmente é o uso de bots pelos fornecedores na fase de lances, a etapa
competitiva de um pregão eletrônico.
Quadro 2 Formas de fraude em leilões eletrônicos
Forma de fraude
Descrição
Deturpação de um produto para
venda
Utiliza descrição falsa de características ou condições do produto
Não entrega de mercadorias ou
serviços vendidos
Burla os mecanismos de proteção das plataformas
intermediárias para receber o pagamento sem que haja produto
ou serviço real a ser comercializado
Vendendo bens do mercado negro
Comercialização de bens ilícitos ou com venda proibida
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Triangulação
Os fraudadores compram itens usando um cartão de crédito
roubado, vendendo os itens a compradores não iniciados,
retendo assim o dinheiro e transferindo o risco de apreensão
para o destinatário final
Cobrança de taxas
Cobrando dinheiro extra após o término de um leilão
Lances múltiplos
Os compradores aumentam os preços usando pseudônimos, o
que frustra os concorrentes e, no último momento, os lances
altos são retirados para garantir um lance baixo
Figurante (shill bidding)
Vendedores ou seus associados fazem lances em seus próprios
leilões para fins fraudulentos
Fonte: Adaptado de Dong; Shatz e Xu, 2009 [tradução livre].
Aplicada à realidade das licitações brasileiras, mais especificamente à dos
pregões eletrônicos, as duas últimas formas listadas Quadro 2, pois são as mais
recorrentes e podem ser potencializadas pelo uso de bots como será melhor explicado a
seguir.
2.2 Uso de bots em pregões eletrônicos
Os bots, no contexto da Internet, são software de computador que são
programados para um conjunto de tarefas automatizadas (MONAHAN, 2018). Na
literatura nacional, o termo “robô eletrônico” é amplamente utilizado como um
sinônimo de bot. Será adotado o termo original em inglês por trazer consigo significado
mais específico, podendo o termo “robô eletrônico” ser utilizado, eventualmente, em
contextos diferentes do aqui estudado.
No pregão eletrônico, os bots atuam geralmente gerenciando a emissão de lances
simultaneamente nos itens que estiverem disputando, de acordo com a programação
definida e como se fossem os próprios representantes das empresas. A questão principal
relacionada à sua utilização é que eles podem tornar a disputa desequilibrada,
favorecendo quem os utiliza, em detrimento da capacidade humana limitada de resposta
durante a disputa de lances. Ao mesmo tempo, não norma que a proíba
explicitamente. O que são, em sua maioria, algumas fundamentações jurídicas que se
valem de princípios que versam sobre o equilíbrio entre as chances de participação em
licitações e pregões, porém ainda não trata a questão dos bots com clareza.
De forma a se proteger dos malefícios do uso de bots em pregões, a plataforma
Comprasnet sofreu implementação de dispositivos que buscam inibir os efeitos deste
tipo de tecnologia ao longo da última década, mas não foram suficientes para impedir
totalmente sua prática. Continuam, assim, sendo cada vez mais aperfeiçoados e
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utilizados em concorrências públicas. Uma das barreiras no desenvolvimento de
mecanismos eficazes que impedem a utilização de bots é a dificuldades de detecção. Os
lances emitidos por pessoas naturais e os emitidos por bots são indistinguíveis do ponto
de vista de seu registro no sistema, ou seja, não nada que indique que um lance foi
emitido por um humano ou um software robô, tornando a investigação por indícios uma
das únicas formas possíveis.
Nesse sentido, alguns desses indícios baseados em comportamentos anômalos
por parte dos licitantes se caracterizam pela:
a) alta quantidade de participação em pregões eletrônicos;
b) alta frequência de lances emitidos por item que participa;
c) alta frequência de participação simultânea em vários itens de um mesmo
pregão;
d) habitualidade no registro de lances com intervalos similares de tempo e/ou
valor em relação a novos menores lances de cada item;
e) alto índice de sucesso nas disputas em relação ao número de itens que
participa.
Conforme Dong, Shatz e Xu (2009), algumas estratégias mais conhecidas do uso
de bots em leilões e concorrências eletrônicas são:
Quadro 3 - Cinco estratégias comuns de lances
Tipo
Comportamento
Skeptico (Cético)
Dá vários lances, mas aumentando o valor o mínimo possível.
Proxy bidding
(Licitante por procuração)
Dá quantos lances forem necessários até atingir o máximo previamente
especificado.
Sniping (Atirador de
precisão)
Dá lance nos últimos segundos, não dando tempo para outros cobrirem.
Unmasking
(Desmascarador)
Dá vários lances em um curto espaço de tempo com o objetivo de expor o
lance máximo ou os participantes mais competitivos.
Evaluator (Avaliador)
Dá apenas um lance no início com um valor alto.
Fonte: Dong, Shatz e Xu, 2009 [tradução livre].
Por fim, fica evidenciado que os bots procuram replicar o comportamento
humano a todo custo, porém, podem ser identificados pelo tempo de resposta e pela
capacidade de carga de trabalho que são incompatíveis com o ser humano. Encontrar
outras formas de identificar e restringir tais práticas é um desafio. Neste estudo, um dos
caminhos trilhado foi trabalhar com a análise dos dados produzidos durante os pregões.
O uso dos dados governamentais abertos auxilia no controle de fraudes. Apesar de este
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estudo não produzir instrumentos para bloquear os bots durante o pregão, permitirá
que as empresas que fazem uso desta tecnologia sejam identificadas. Para isso, o
primeiro passo é entender o que são os dados abertos e como acessá-los.
3 DADOS GOVERNAMENTAIS ABERTOS
O programa de desenvolvimento e implementação de estratégias de governo
digital, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE),
apresenta 12 princípios fundamentais para o êxito, dentre os quais está a criação de uma
cultura orientada a dados no setor público (OCDE, 2018). Aponta que os governos
devem desenvolver uma cultura de análise e uso de dados públicos que ajude a prever
novas necessidades e tendências e a entender como melhorar os processos e dinâmicas
existentes.
No Brasil, isso tem sido reforçado por meio de políticas de dados abertos no
âmbito do e-government (e-gov), ou governo eletrônico. Segundo definição da Open
Knowledge Internacional, organização global sem fins lucrativos focada em fomentar a
cultura de dados abertos, dados são considerados abertos quando qualquer pessoa pode
livremente acessá-los, utilizá-los, modificá-los e compartilhá-los para qualquer
finalidade, estando sujeito a, no máximo, exigências que visem preservar sua
proveniência e sua abertura (OPEN KNOWLEDGE INTERNACIONAL, 2019). Na prática,
esses critérios têm sido satisfeitos pelas entidades governamentais através da criação de
portais que disponibilizam conjuntos de dados estruturados (linhas de dados dispostos
em colunas pré-determinadas) e organizados sob uma licença aberta.
O Governo Federal, através do agora denominado Ministério da Economia, vem
expandindo e aprimorando suas estratégias de governança digital, incluindo ações
voltadas à ampliação da transparência e à abertura dos dados. Publicou em 2016 a
Estratégia do Governança Digital, o EGD (BRASIL, 2016), para o período de 2016 a 2019,
alinhado com a Política de Governança Digital (instituída pelo Decreto nº 8.638, de 15 de
janeiro de 2016) e com o Plano Plurianual (PPA) 2016-2019. O documento é composto
por três eixos, dez objetivos e 51 iniciativas que visam integrar a atuação governamental
na vida das pessoas através da tecnologia. Um dos desafios a serem enfrentados é o de
“mitigar as vulnerabilidades de segurança nos sistemas de informação governamentais”
(BRASIL, 2016, p. 12).
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A transparência, a segurança e a integridade das informações que se encontram
nos sistemas do governo são aspectos fundamentais para que todos os esforços em
governança digital se transformem em confiabilidade para a sociedade. Destacam-se
tanto que uma das iniciativas da EGD 2016-2019 (a IE.03.06) é “promover cooperação
nacional e internacional com setor produtivo e academia, visando à troca de
experiências e o fortalecimento dos temas de Segurança da Informação e Comunicação e
de Segurança Cibernética” (BRASIL, 2016, p. 29), indicando ser um dever de todos, como
cidadãos, contribuir para a promoção da consolidação do Governo Eletrônico.
Segundo a CGU (2018), na divulgação do Plano de Ação Nacional em Governo
Aberto, este é um conceito que:
se refere a uma nova visão da Administração Pública, que promove projetos e
ações voltados ao aumento da transparência, à luta contra a corrupção, ao
incentivo à participação social e ao desenvolvimento de novas tecnologias que
tornem os governos mais responsáveis por suas ações e preparados para
atender às necessidades dos cidadãos. (CGU, 2018, p. 6).
Como efeito, busca trazer ferramentas que possam ser utilizadas pelo cidadão em
uma perspectiva de participação ativa, trazendo-o ao foco das políticas públicas.
Considerando o cenário histórico político nacional, representa uma profunda quebra de
paradigmas. Neste novo cenário, alguns princípios ganham ênfase, tais como a
Accountability aplicada ao conceito de Governo Aberto:
Accountability (prestação de contas e responsabilização) um governo
responsivo estabelece normas, regulamentos e mecanismos que obrigam atores
governamentais a justificar ações, agir de acordo com as críticas ou exigências
colocadas e aceitar a responsabilidade no cumprimento de seus deveres.
Participação social um governo participativo promove a participação ativa da
sociedade nos processos de formulação das políticas públicas e a criação de
novos espaços de interlocução que favoreçam o protagonismo e o envolvimento
dos cidadãos. Além disso, viabiliza que as administrações públicas se
beneficiem do conhecimento, das ideias e da experiência dos cidadãos.
Transparência um governo transparente proporciona informações sobre o
que está fazendo, sobre seus planos de ação, suas fontes de dados e suas
atribuições perante a sociedade. Além disso, estimula a prestação de contas da
administração e as ões permanentes de controle social. Tecnologia e
Inovação um governo inovador entende o papel das novas tecnologias na
inovação e busca assegurar aos cidadãos a capacidade de utilizarem novas
ferramentas de desenvolvimento disponíveis e o acesso a elas. (CGU, 2018, p.
6).
O tema traz uma forte relação com as compras e contratações governamentais.
Nesse sentido, o Governo Federal publicou no ano de 2017 o Referencial de Governança
e Gestão do Sistema de Serviços Gerais SISG (2017). Um dos sistemas que compõem o
SISG é o Comprasnet. Os indicadores divulgados na referida publicação (Quadro 4)
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ilustram o volume das transações realizadas em alguns módulos do sistema, e revelam a
importância de se garantir a integridade de suas informações:
Quadro 4 - Dados da utilização do SISG
Descrição
Valor
UASG (ativas)
5.033 SISG e 5.067 Não SISG;
Usuários ativos
109.361;
Fornecedores Cadastrados (ativos)
367.403;
Pregoeiros cadastrados
18.840;
Processos de Compras em 2016
105 mil (órgãos SISG);
Valores Homologados em 2016
R$ 35 bilhões (órgãos SISG) até
02/12/2016;
Contratos Assinados em 2016
17.896 (órgãos SISG) até 02/12/2016;
Valores Contratos em 2016
R$ 30 bilhões (órgãos SISG) até
02/12/2016.
Fonte: Brasil (2017, p. 15).
Nesse contexto, a política de dados abertos do Governo Federal pode e deve se
tornar fonte de buscas e pesquisas em compras governamentais, pois é uma ferramenta
de controle social que alcança volumes financeiros representativos. Na prática, esta
política permite que qualquer cidadão tenha acesso aos dados governamentais, basta
solicitar ao órgão responsável pela guarda dos dados.
Para que isso se torne uma realidade, faz-se necessário intensificar campanhas de
conscientização da população sobre temas como dados abertos, governança e controle
social. Além disso, é preciso implementar mais obrigatoriedade e rigidez na divulgação
dos dados abertos por parte de diferentes instâncias do Governo Federal. Considera-se
que isso proporcionará mais alinhamento com diretrizes internacionais e princípios
mundiais de governança.
4 MINERAÇÃO DE DADOS GOVERNAMENTAIS ABERTOS
Ter acesso aos dados é uma etapa deste trabalho, tratar e encontrar as
informações nesse contexto é a outra parte. As ferramentas para tratamento e
mineração de dados podem ser uteis nestas atividades. Segundo Lin (2005), a mineração
de dados é um processo que desenha padrões úteis de dados e busca expor quatro
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questionamentos fundamentais: (1) quais os dados, (2) quais os padrões, (3) qual a
lógica para desenhar os padrões dos dados e (4) como os padrões estão relacionados ao
mundo real (sua utilidade).
para Hand, Mannila e Smyth (2001), Mineração de Dados pode ser entendida
como a análise de conjuntos de dados (geralmente grandes volumes) observacionais
para encontrar relações não previsíveis numa análise comum e resumir os dados de
maneiras novas que sejam compreensíveis e úteis para o proprietário dos dados.
Edelstein (1999) diz que a mineração de dados é um processo que usa uma variedade de
ferramentas de análise de dados para descobrir padrões e relacionamentos em dados
que podem ser usados para fazer previsões válidas.
Diante das definições apresentadas, podemos compreender que a mineração de
dados configura-se com um processo apoiado por ferramentas tecnológicas, como
softwares que possuem alta capacidade de processamento e reestruturação dos dados
impossíveis de serem alcançada pelo ser humano. Tais ferramentas conseguem
identificar padrões e relações não facilmente identificados de outra maneira. A área de
mineração tem inúmeras possíveis aplicações, como: padrão de consumo, mercado de
ações e capitais, dados espaciais, análise de riscos, segurança, catástrofes naturais, entre
tantas outras.
Sendo assim, a mineração de dados apresenta-se como um meio para a
investigação da problemática levantada neste estudo. Um primeiro ponto que deve ser
considerado é que o Comprasnet possui uma base de dados que concentra grande parte
das compras governamentais em âmbito nacional, o que gera um grande volume de
dados estruturados. O segundo ponto é devido a essa base de dados se enquadrar nos
princípios dos dados abertos, o que possibilita amplo acesso por qualquer cidadão
interessado. Em terceiro, a identificação do uso de bots é um problema passível de ser
detectado, através da análise dos dados, usando campos como tempos de resposta entre
lances, diferença de valor entre lances ou licitações vencidas pelos mesmos fornecedores
No contexto da identificação do uso de bots em pregões eletrônicos, a mineração
pode ser utilizada principalmente no rastreamento de padrões repetitivos, que
caracterizem um comportamento não humano, através do processo sistemático
chamado Descoberta de Conhecimento em Bases de Dados (do inglês Knowledge
Discovery in Databases, ou KDD). Neste estudo, adotamos mineração de dados e KDD
como sinônimos.
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Han, Kamber e Pei (2012, p. 6/8, grifo dos autores, tradução nossa) descrevem o
processo de descoberta de conhecimento como uma sequência interativa das seguintes
etapas:
1) Limpeza de dados: para remoção de ruído e dados inconsistentes;
2) Integração de dados: onde várias fontes de dados podem ser combinadas;
3) Seleção de dados: onde os dados relevantes para a tarefa de análise são
recuperados do banco de dados;
4) Transformação de dados: em que os dados o transformados e
consolidados em formulários apropriados para mineração, executando
operações de resumo ou agregação;
5) Mineração de dados: processo essencial em que métodos inteligentes são
aplicados para extrair padrões de dados;
6) Avaliação de padrões: para identificar os padrões verdadeiramente
interessantes que representam o conhecimento com base em medidas de
interesse);
7) Apresentação do conhecimento: onde técnicas de visualização e
representação de conhecimento o usadas para apresentar conhecimento
minado aos usuários.
para os autores De Castro e Ferrari (2017, l. 660-673, grifos dos autores), o
processo de KDD possui quatro etapas:
1) Base de dados: coleção organizada de dados, ou seja, valores quantitativos
ou qualitativos referentes a um conjunto de itens, que permite uma
recuperação eficiente dos dados. Conceitualmente, os dados podem ser
entendidos como o nível mais básico de abstração a partir do qual a informação
e, depois, os conhecimentos podem ser extraídos [...];
2) Preparação ou pré-processamento de dados: são etapas anteriores à
mineração que visam preparar os dados para uma análise eficiente e eficaz.
Essa etapa inclui a limpeza (remoção de ruídos e dados inconsistentes), a
integração (combinação de dados obtidos a partir de múltiplas fontes), a
seleção ou redução (escolha dos dados relevantes à análise) e a transformação
(transformação ou consolidação dos dados em formatos apropriados para a
mineração);
3) Mineração de dados: essa etapa do processo corresponde à aplicação de
algoritmos capazes de extrair conhecimentos a partir dos dados pré-
processados. [...] [Inclui] técnicas de análise descritiva (medidas de
distribuição, tendência central e variância, e métodos de visualização),
agrupamento (segmentação de bases de dados), predição (classificação e
estimação), associação (determinação de atributos que concorrem) e detecção
de anomalias;
4) Avaliação ou validação do conhecimento: avaliação dos resultados da
mineração objetivando identificar conhecimentos verdadeiramente úteis e não
triviais.
Para realizar análise dos pregões eletrônicos, a primeira tarefa é realizar o
cadastro solicitando acesso aos dados ao Governo, através do Sistema Eletrônico do
Serviço de Informação ao Cidadão (e-SIC), mantido pelo Ministério da Transparência e
Controladoria Geral da União (CGU). Outro ponto é conhecer a API (em português:
Interface de Programação de Aplicativos) da plataforma Comprasnet (Disponível em:
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http://compras.dados.gov.br/docs/home.html). Em termos simples, API pode ser
considerada como a documentação de um aplicativo, plataforma ou sistema que permite
o usuário buscar dados a respeito das regras de negócio e possibilidades previstas de
uso do sistema. Desse modo, qualquer pessoa pode solicitar as extrações de dados do
Comprasnet. É importante ressaltar que ainda um espectro limitado das informações
disponibilizadas sobre os eventos de pregões eletrônicos no âmbito do Governo,
principalmente referentes aos metadados, variedades de atributos e dicionário de
dados. Ou seja, uma possível ampliação dos dados disponíveis para autoextração
também poderia contribuir com a melhoria da transparência dos dados das compras
governamentais federais.
A mineração de dados se fundamenta em dados guardados em Banco de Dados
(Database ou simplesmente DB). Para fins práticos deste estudo, DBs podem ser
entendidos como repositórios onde todas as informações sobre um processo, inclusive
metadados, podem ser gravadas e mantidas para consulta posterior. Geralmente os
dados são armazenados em um DB do tipo relacional e estão estruturados em tabelas.
Por sua vez, as tabelas possuem linhas e colunas sobre um determinado objeto
(entidade) analisado. As colunas representam as características deste objeto e as linhas
representam o conjunto dessas características para uma determinada ocorrência do
objeto. As tabelas podem ser cruzadas entre si, revelando novos fatos e padrões entre os
dados analisados.
Para exemplificar, no caso de dados de um pregão eletrônico, podemos imaginar
a existência de uma tabela com fornecedor que possui N atributos (CNPJ, endereço,
telefone, data de cadastro, etc.), em que cada linha representa um conjunto de
informações sobre determinado fornecedor cadastrado.
No processo de mineração de dados, o termo atributos representa as palavras
que aparecem numa base de dados coletada. Nesse sentido, De Castro e Ferrari (2017)
consideram que ferramentas simples, como histogramas ou gráficos, que possibilitem a
visualização da distribuição de valores de um atributo, ou que permitam a comparação
entre vários atributos, são bastante úteis para um entendimento inicial da base de
dados. Para o pré-processamento, recomenda-se que, na importação dos dados, todas as
colunas sejam tratadas como nominais, facilitando a visualização das informações
relacionadas à distribuição, quantidade e frequência de valores, assim como a incidência
de valores idênticos, entre outros, pois em colunas do tipo numéricas apresentam
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métricas como dia aritmética, mínimo, máximo, média, entre outros. A análise inicial
de distribuição dos valores pode facilitar uma melhor compreensão do que representa
cada atributo e sua utilidade para uma pesquisa a ser realizada, assim como contribui
com a eliminação de duplicidades nos atributos.
Atualmente, uma série de ferramentas que realizam mineração de dados,
muitas delas voltadas para fins específicos ou focadas em etapas específicas da análise
de dados. Algumas outras são aplicadas mais amplamente. São exemplos dessas
ferramentas: WEKA, Lucene, RapidMiner, DataMelt, OpenRefine, Tableau, Orange, Knime
Analytics Platform, entre tantas outras. soluções tanto pagas como gratuitas, e
ferramentas que podem exigir um conhecimento mais avançado dos usuários, como
domínio de linguagem de programação específica, como Java, Python, R, etc. outras
exigem apenas conhecimentos básicos em análise estatística de dados e manuseio do
computador, sem necessidade de conhecimento em programação.
Dessa forma, uma ferramenta bastante conhecida e com licença educacional
gratuita de um ano é a RapidMiner (Disponível em:
http://www.belge.com.br/rapidminer.php), a qual pode ser uma opção para quem
deseja analisar os dados governamentais abertos, tais como dados dos pregões. Além
disso, não é necessário saber linguagem de programação nem conhecimento específico
para operar na ferramenta e alcançar resultados satisfatórios.
Iniciativas de mineração de dados aplicadas em processos de pregões eletrônicos
podem também ser de muita valia para funcionários/servidores que trabalham em
organizações Estatais vinculadas à Administração Pública Federal, na identificação de
padrões de anormalidades em compras públicas, evitando assim beneficiamento de
fornecedores fraudulentos, em prejuízo ao erário e toda sociedade. Vale ressaltar que,
embora o foco deste trabalho tenha sido a base de dados do Governo Federal, o uso de
análise de dados abertos a favor da construção de uma sociedade mais justa e consciente
dos seus deveres pode ocorrer em qualquer esfera do poder executivo (estadual,
municipal, federal), assim como nos demais poderes (judiciário e legislativo), além de
organizações paraestatais e do terceiro setor.
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ressalvadas as hipóteses legais, através das licitações são selecionados os
fornecedores para as contratações na esfera pública, seja para aquisição de bens,
fornecimento de serviços ou realização de obras. Os recursos que custeiam essas
despesas são públicos e executados através de agentes de governo, por isso é necessário
que sejam estabelecidos princípios e regras que busquem garantir a integridade e
finalidade desses processos.
princípios constitucionais que podem ser evocados para garantir mais
controle sob os processos licitatórios, assim como leis específicas que versam sobre o
tema Licitação e contratos públicos (Lei 8.666) e a Lei do Pregão Eletrônico (Lei
10.520), entre outras. Mesmo assim, constatamos muitos aspectos ainda tratados sem a
clareza necessária para o discernimento sobre questões polêmicas, como o exemplo
abordado neste trabalho que apura a utilização bots de em pregões eletrônicos.
Com isso, percebe-se que a mineração de dados pode ajudar na solução de alguns
problemas referentes à análise de grandes volumes de dados, identificando
conhecimentos úteis e não triviais, que seriam dificilmente observados por uma análise
puramente humana. Assim, pode exercer papel fundamental na identificação de
anomalias e indícios do uso de bots em pregões eletrônicos.
Apesar da complexidade e quantidade de massa de dados com que as ferramentas
de mineração de dados conseguem trabalhar, o uso e a compreensão dessas ferramentas
podem estar ao alcance de qualquer cidadão, não necessitando ser um pesquisador nem
um especialista em análise de dados. Em muitos casos, nem mesmo é necessário ter
domínio de alguma linguagem de programação, o que ajuda bastante na difusão dos
benefícios a serem obtidos com análise desse tipo de dados.
A ausência do fornecimento de um dicionário de dados pode gerar como
resultado uma extração de dados de baixa qualidade, o que evidencia a característica de
um serviço não orientado ao usuário. Dessa forma, a necessidade de um
comprometimento maior por parte dos órgãos governamentais na disponibilização de
dados e metadados decorrentes dos processos de pregões eletrônicos.
Por fim, verifica-se que o objetivo deste estudo de identificar o uso de bots foi
alcançado, tendo em vista que ficou evidenciado o potencial da análise de dados
extraídos de pregões. Estes podem ser submetidos ao tratamento e análise por
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ferramentas de mineração de dados, ajudando a identificar ações fraudulentas, ou na
obtenção de vantagens indevidas, como no uso dos bots.
Destaca-se a função de controle social apoiada por uma política estruturada de
dados abertos, estabelecendo-se uma via de mão-dupla: à medida que entendermos a
importância dos dados abertos e os reflexos em suas vidas, enquanto cidadãos,
poderemos melhor cobrar e apontar irregularidades na gestão dos recursos públicos.
Por outro lado, à medida que os Entes Públicos disponibilizarem dados com mais
qualidade e precisão, ajudarão a motivar que novos estudos e padrões sejam
identificados em várias vertentes do conhecimento, por um número cada vez maior de
pessoas, desde pesquisadores e acadêmicos, até cidadãos comuns.
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http://paineldecompras.planejamento.gov.b
r. Acesso em: 26 nov. 2018.
ARQUITETURA DA INFORMAÇÃO PERVASIVA: contribuições para os ambientes virtuais de
aprendizagem
PERVASIVE INFORMATION ARCHITECTURE: contributions to the learning virtual
environments
Henry Poncio Cruz de Oliveira
1
Ráisa Mendes Fernandes de Souza
2
1.
Doutor em Ciência da Informação pela UNESP-
Marília, Professor do PPGCI/UFPB
E-mail: henry.poncio@gmail.com
2.
Doutoranda em Ciência da Informação
(PPGCI/UFPB),
E-mail: raisamendess@gmail.com
E-mail: raisamendes@yahoo.com.br
ACESSO ABERTO
Copyright: Esta obra está licenciada com uma
Licença Creative Commons Atribuição 4.0
Internacional.
Conflito de interesses: Os autores declaram
que não há conflito de interesses.
Financiamento: Não há.
Declaração de Disponibilidade dos dados:
Todos os dados relevantes estão disponíveis
neste artigo.
Recebido em: 20/09/2016.
Revisado em: 01/10/2016.
Aceito em: 10/10/2016.
Como citar este artigo:
OLIVEIRA, Henry Poncio Cruz de; SOUZA, Ráisa
Mendes Fernandes de. Arquitetura da
informação pervasiva: contribuições para os
ambientes virtuais de aprendizagem.
Informação em Pauta, Fortaleza, v. 4, n.
especial, p. 65-83, nov. 2019. DOI:
https://doi.org/10.32810/2525-
3468.ip.v4iEspecial.2019.42604.65-83.
RESUMO
A Arquitetura da Informação é uma área do
conhecimento que fornece uma base teórica
para estruturação e organização informacional
dos ambientes digitais. Baseada nos princípios
dessa área, esta investigação tem como objetivo
geral entender como a Arquitetura da
Informação Pervasiva pode contribuir para a
elaboração de ambientes virtuais de
aprendizagem. Após a apresentação dos
conceitos que permeiam o universo dos
ambientes virtuais de aprendizagem e da
Arquitetura da Informação, concluiu-se que a
aprendizagem colaborativa pode ser
potencializada por meio da criação de estruturas
ecológicas intuitivas, práticas e funcionais. É
essencial a preocupação para que o AVA esteja
customizado de acordo com seu público,
garantindo melhor estruturação dos links e o
acesso às informações e ao próprio conteúdo
postado. A principal contribuição desta pesquisa
é a proposta de uma discussão que sirva como
insumo para o posterior desenvolvimento de
ambientes informacionais educacionais e
digitais, levando em conta princípios da
Arquitetura da Informação.
Palavras-chave: Arquitetura da Informação
Pervasiva. Ambientes virtuais de aprendizagem.
Ciência da informação. Ecologias Informacionais
Complexas.
ABSTRACT
Information architecture is a knowledge area
which provides a theoretical basis to structuring
and arranging information in digital
environment. Based on these area principles,
this investigation tries to understand how
information architecture can help in the
elaboration of learning digital environments
Inf. Pauta
Fortaleza, CE
v. 4
n. especial
nov. 2019
ISSN 2525-3468
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-3468.ip.v4iEspecial.2019.42604.65-83
ARTIGO
66
OLIVEIRA; SOUZA. / Arquitetura da informação pervasiva: contribuições para os ambientes [...]
Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
(LDE). After the presentation of concepts
included in the universes of learning virtual
environment and information architecture, then
binding together both worlds, it is concluded
that the collaborative learning can only be
achieved through the creation of a soft, intuitive,
practical and functional environment. The LDE
must be customized considering its users, thus
ensuring a better link structuring, as well as the
access to information and to the published
content. The most relevant contribution of this
research is the proposal of a discussion that will
be useful on the later development of
educational and digital information
environments that consider informational
architecture principles.
Keywords: Information Architecture. Virtual
learning environments. Information Science.
Education in cyberspace.
1 INTRODUÇÃO
É possível perceber uma evolução significativa no campo das Tecnologias de
Informação e Comunicação (TIC), com impacto significativo no âmbito acadêmico.
Investigações e pesquisas científicas culminaram na elaboração de tecnologias que
servem de apoio ao professor e auxiliam o aluno na apreensão dos conteúdos.
Nesse contexto surgiram os Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA),
plataformas que visam aperfeiçoar o processo de aquisição de informação, trazendo um
novo olhar sobre a relação aluno/professor e aluno/aluno. De acordo com Jacoboski e
Maria (2014, p. 30), os AVA são
softwares que funcionam em servidores web, que podem ser acessados pela
Internet, por usuários distribuídos geograficamente, formando comunidades
virtuais com objetivos definidos, geralmente o de aprendizagem de
determinado conteúdo, onde se interagem com diversas ferramentas
disponibilizadas no próprio ambiente virtual.
Trata-se de uma ferramenta tecnológica que vem sendo adotada tanto na esfera
pública quanto na esfera privada de ensino.
Pereira, Schmitt e Dias (2007) acrescentam que, por meio dos AVA, o processo de
ensino-aprendizagem tem potencial para tornar-se mais ativo, dinâmico e
personalizado. Para as autoras, essas ferramentas do ciberespaço têm o potencial de
promover a interação e a colaboração à distância entre os atores do processo e a
interatividade com o conteúdo a ser aprendido.
A Ciência da Informação, enquanto área que se debruça sobre a organização,
acesso e uso, armazenamento, disseminação e encontrabilidade da informação, se
preocupa também com a Arquitetura da Informação (AI) dos diversos ambientes de
informação, o que inclui os AVA. Lazzarin et al. (2012) reforçam tais dizeres ao
OLIVEIRA; SOUZA. | Arquitetura da informação pervasiva: contribuições para os ambientes [...]
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afirmarem que a CI tem como objeto de estudo a própria informação, estando ela
inserida em uma dimensão social e centrada no usuário. Considerando a abrangência
das pesquisas realizadas na Ciência da Informação, destacamos os estudos sobre
Arquitetura da Informação, aplicados numa perspectiva interdisciplinar, para gerar
benefícios estruturais e navegacionais aos ambientes analógicos, digitais ou híbridos de
informação (OLIVEIRA, 2014).
Com o crescimento do número de dispositivos móveis usados atualmente,
considerando as modificações nos processos de interação constante entre sistemas e
pessoas, criando-se ambientes dinâmicos, surgiu a Arquitetura da Informação Pervasiva
(AIP), considerara por Lacerda (2015) uma subdisciplina e por Oliveira (2014) uma
abordagem da AI.
O presente artigo tem como objetivo geral: dimensionar diretrizes de como a
Arquitetura da Informação Pervasiva pode contribuir para a construção de ambientes
virtuais de aprendizagem.
Trata-se de uma pesquisa bibliográfica que explora tanto as conceituações
inseridas na Informática na Educação quanto as definições da Ciência da Informação e
Arquitetura da Informação, construindo assim um lugar comum entre essas disciplinas.
2 OS AMBIENTES VIRTUAIS DE APRENDIZAGEM
Os Ambientes Virtuais de Aprendizagem também recebem outras nomenclaturas,
como Ambientes Hipermidiáticos de Aprendizagem (AHA), Ambientes Virtuais de
Ensino e Aprendizagem (AVEA), Ambientes Digitais de Aprendizagem (ADA), Learning
Management System (LMS) ou mesmo Sistemas de Gestão de Aprendizagem (SGA)
(COSTA, 2015; LIMA, 2016).
Quanto à pluralidade terminológica envolvendo os AVA, no que tange ao uso do
termo “gestão”, Lima (2016) esclarece sobre a distinção entre os SGA e AVA,
considerando o primeiro como um sistema construído especificamente para propiciar
processos de educação a distância (EaD) mediados por computadores. O uso corrente do
termo AVA no Brasil passou a ser utilizado como sinônimo para SGA. Trata-se de um
espaço formal importante para a condução de cursos, disponibilizando recursos,
monitorando processos sistemáticos e controlando a ação educativa. Esse mesmo
espaço permite a gestão do processo educacional, possibilitando a interação do discente
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OLIVEIRA; SOUZA. / Arquitetura da informação pervasiva: contribuições para os ambientes [...]
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com o conteúdo. Neste trabalho usaremos o termo Ambientes Virtuais de Aprendizagem
(AVA).
Os AVA são sistemas que se fundamentam nas Tecnologias de Informação e
Comunicação (TIC), são recursos que visam a aperfeiçoar a mediação no processo
educativo. A disponibilização dos recursos de interação e de comunicação nos AVA
obedece, em princípio, aos princípios objetivos e orientações definidas nos projetos
pedagógicos dos cursos (ALONSO; SILVA; MACIEL, 2012).
Completando os dizeres acima, Bertini et al. (2015, p. 139) afirmam que os AVA
“são softwares que possibilitam a elaboração de cursos para serem disponibilizados pela
internet e permitem o gerenciamento dos conteúdos para os estudantes, assim como o
acompanhamento constante do seu progresso e a administração do curso”.
Pereira, Schmitt e Dias (2007) apresentam uma conceituação mais sucinta do que
seriam os AVA, assegurando que consistem em mídias entendidas como conjunto de
ferramentas e recursos tecnológicos resultantes da evolução das TIC, que permitem a
emissão e a recepção de mensagens. Tais mídias utilizam o ciberespaço para veicular
conteúdos e permitir interação entre os atores do processo educativo.
Almeida (2003) explica que os recursos que compõe um AVA são basicamente os
mesmos existentes na internet: correio, fórum de discussão, chats ou salas de bate-papo,
recursos de conferência, bancos de dados, etc., com o benefício de proporcionar a gestão
da informação, segundo critérios preestabelecidos de organização, definidos de acordo
com as características de cada software. Essas plataformas normalmente possuem
bancos de dados e informações representadas em diferentes formatos: textos, imagens,
vídeos, animações e áudio, interligadas por meio de links internos ou externos ao
sistema, gerando uma teia hipertextual.
Jacoboski e Maria (2014) discorrem sobre as aplicações práticas dos AVA,
afirmando que, por meio deles, é possível localizar, produzir e disponibilizar
informações de forma otimizada. De acordo com as autoras, essa tecnologia apresenta
alguns aspectos básicos e primordiais:
a) Um AVA possui um objetivo que se baseia nas necessidades comuns do
grupo a ser atendido e que não deve conflitar com os objetivos individuais.
b) A ação de aprender é voluntária.
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c) cooperação ativa entre os professores, alunos, tutores e demais
usuários dos grupos para atingir um objetivo comum que é o
conhecimento e a dinâmica.
d) A plataforma precisa ser utilizada frequentemente para que as discussões
e atividades estejam sempre atualizadas.
e) O AVA é um ambiente que propicia a produção e compartilhamento de
conhecimento.
f) Trata-se de uma plataforma intuitiva e fácil de usar que incentiva a
colaboração entre os colegas, a reflexão sobre os conteúdos e a construção
de saberes. Ela possibilita também o esclarecimento de eventuais dúvidas.
Lima (2016) se alinha à Jacoboski e Maria (2014), afirmando que os AVA também
favorecem:
a) A disponibilização dos conteúdos de aprendizagem.
b) A organização dos estudantes em cursos ou turmas ou grupos.
c) Os processos de comunicação do docente com estudantes e dos estudantes
entre si.
d) O controle do acesso e da utilização de recursos.
e) O acompanhamento e a avaliação acadêmicos, bem como a integração com
outros sistemas de gestão acadêmica.
Menegotto, Becker e Marques (2014) afirmam que os AVA podem ser
considerados como mais uma alternativa para colaborar e dar apoio ao desenvolvimento
dos processos de ensino e de aprendizagem, atendendo às dificuldades de cada sujeito e
contemplando o ritmo individual do aluno. Esses ambientes funcionam na internet,
como forma de mediar as metodologias educacionais, tanto como apoio à educação
tradicional, presencial-física, quanto para o desenvolvimento da EaD.
Ressalta-se que os AVA não são ferramentas exclusivas da educação à distância,
pois trata-se de uma plataforma que tem como objetivo mediar o ensino, seja ele à
distância, semipresencial ou presencial.
De acordo com Felipe (2013, p. 888), “um AVA pode ser utilizado tanto para
ampliar espaços de interação em cursos na modalidade presencial quanto para
gerenciar cursos ofertados na modalidade semipresencial ou totalmente à distância”. O
mesmo autor acrescenta que esses ambientes virtuais promovem a interação e a
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colaboração informacional entre os alunos, tendo como objetivo o compartilhamento de
conhecimentos e de competências intelectuais (FELIPE, 2011).
Almeida (2003, p. 332) afirma que as tecnologias AVA podem ser utilizadas
como suporte para sistemas de educação à distância realizados exclusivamente
on-line, para apoio às atividades presenciais de sala de aula, permitindo
expandir as interações da aula para além do espaço-tempo do encontro face a
face ou para suporte a atividades de formação semipresencial nas quais o
ambiente digital poderá ser utilizado tanto nas ações presenciais como nas
atividades à distância.
Para Pereira, Schmitt e Dias (2007), como a demanda pelo uso dos AVA vem
crescendo vertiginosamente nos âmbitos acadêmico e corporativo, é necessário destacar
a importância de uma reflexão mais aprofundada sobre o conceito que orienta o
desenvolvimento ou o uso dessas plataformas, assim como o tipo de estrutura humana e
tecnológica que oferece suporte ao processo ensino-aprendizagem. É preciso lembrar
que a qualidade do processo educativo depende de fatores, tais como: envolvimento do
aprendiz, proposta pedagógica, materiais instrucionais veiculados, estrutura e qualidade
de professores, tutores, monitores e equipe técnica, bem como das ferramentas e
recursos tecnológicos utilizados no ambiente em termos de Arquitetura da Informação.
Santos (2002) colabora com a presente discussão ao debater as formas de
interação entre os sujeitos envolvidos nesses ambientes. Para o autor, é possível
argumentar que um AVA é um espaço de significação, no qual tanto os participantes
quanto os próprios objetos teóricos interagem, potencializando, assim, a aprendizagem
e a construção de conhecimentos. Além do acesso e das possibilidades variadas de
leituras, o aluno que interage com o conteúdo digital poderá também se comunicar com
outros participantes de forma síncrona e assíncrona em modalidades variadas de
interatividade. Esses tipos de interação seriam: um-um e um-todos, comuns das
mediações estruturadas por suportes como os impressos, vídeo, rádio e TV; e
principalmente todos-todos, própria do ciberespaço e das redes virtuais. As
possibilidades de comunicação todos-todos caracterizam e diferem os AVA das
ferramentas/platafomas tecnológicas de educação e comunicação. Por meio de
interfaces, o ambiente digital possibilita a hibridização e a permutabilidade entre os
sujeitos (emissores e receptores) da comunicação.
Por meio da literatura levantada, é possível perceber benefícios relacionados ao
uso dos AVA no ensino, seja ele à distância ou presencial. Nesse sentido, é necessário
atentar para a construção e customização desses ambientes, visto que tais tecnologias
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possuem atores envolvidos e um público-alvo que precisa ser atendido. Para tanto,
estuda-se sobre as contribuições da Arquitetura da Informação Pervasiva aos ambientes
digitais de aprendizagem.
3 A ARQUITETURA DA INFORMAÇÃO
O termo Arquitetura da Informação foi destacadamente divulgado pelo arquiteto
Richard Saul Wurman que, de acordo com Ribeiro e Vidotti (2009), foi percebendo que
os conceitos da arquitetura podiam ser aplicados em espaços informacionais como uma
maneira de aperfeiçoar o acesso à informação. Nos dizeres dessas autoras, a AI, ao longo
do tempo, foi ganhando destaque no meio acadêmico e também entre os projetistas de
ambientes web. Essa conquista está relacionada com a aplicabilidade dos conceitos e
recursos que tornam os ambientes informacionais digitais mais compreensíveis e
agradáveis para os usuários. Para as autoras, a AI objetiva o acesso sem obstáculos e
satisfatório em ambientes informacionais pelos seus usuários.
Rosenfeld, Morville e Arango (2015) discorrem sobre o papel do arquiteto da
informação como profissional com a missão de organizar padrões dos dados e de
transformar o que é complexo ou confuso em algo mais claro. Trata-se da pessoa que
organiza informações, disponibilizando assim uma espécie de estrutura, de modo que
todos possam trilhar seus próprios caminhos em direção à informação demandada.
De acordo com Rosenfeld, Morville e Arango (2015), a arquitetura da informação
significa:
1) O design estrutural de ambientes de informação compartilhada.
2) A combinação de organização, rotulagem, busca e sistemas de navegação
em sites e intranets.
3) A arte e a ciência de moldar produtos e experiências de informação para
dar suporte à usabilidade e à capacidade de busca.
4) Uma disciplina emergente e uma comunidade de práticas focada em trazer
princípios de design e arquitetura para a paisagem digital.
Para Dillon e Turnbull (2006), a ideia central seria a de estruturar espaços de
informação para gerenciamento e uso, que podem ser interpretados de várias maneiras,
indo desde a preocupação com a rotulagem, até algo complexo e mais amplo, como uma
preocupação com a facilitação da interação. Os autores prosseguem afirmando que os
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arquitetos da informação normalmente executam, dentre muitas outras, as seguintes
tarefas:
1) Delineamento de conceitos-chave ou passos a serem seguidos por meio de
gráficos.
2) Criação de mapas do ambiente digital.
3) Elaboração de termos para criar conteúdo e promover a navegação.
4) Desenvolvimento de modelos de estilo e formatação para elementos de
informação.
5) Realização de estudos de usuários.
6) Criação de cenários e quadros.
7) Construção de taxonomias e índices.
8) Experimentações de experiências do usuário.
9) Programação e design de banco de dados.
10) Gerenciamento de conteúdo e código-fonte.
Para Burford (2011), um ambiente digital sempre terá, obrigatoriamente, uma
estrutura informacional, independente do fato de a organização criadora ter ciência ou
não da arquitetura da informação e de sua implementação. Logo, as estruturas de
informação de um ambiente digital podem se tornar um espaço ideal de busca e
compartilhamento de informações, ou podem se tornar uma experiência frustrante e
malsucedida para seus usuários.
Barker (2005) afirma que a AI é o termo usado para descrever a estrutura de um
sistema ou ambiente, ou seja, a maneira como a informação é agrupada, os métodos de
navegação existentes e a terminologia utilizada no sistema. Para ele, uma Arquitetura de
Informação eficaz permite que as pessoas avancem logicamente através de um sistema,
se aproximando assim da informação que eles precisam. A maioria das pessoas apenas
percebe a importância da arquitetura da informação quando se depara com dificuldades
para encontrar a informação desejada.
Agner (2009) traz importantes elucidações para a presente discussão,
argumentando que a AI é a profissão do novo milênio, pois abarca o design, a análise e a
implantação de espaços informacionais, bancos de dados, bibliotecas, sites, etc. O autor
diz que a AI pode ser percebida como a junção de três campos tradicionais: o
jornalismo/redação, a tecnologia e o design. Agner (2009) também propõe um modelo
conceitual de arquitetura da informação, mostrando que a AI pode ser considerada
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como um termo “guarda-chuva”, em que coexistem preocupações de diferentes
pesquisadores, com diversas autodenominações. É possível observar que a AI relaciona-
se, segundo Agner (2009), com a Educação, Ciências Sociais, Engenharia de Software,
Psicologia, Ciência da Informação, Ciências Cognitivas, Ergodesign e Ciência da
Computação.
Camargo (2010) afirma que o termo “Arquitetura da Informação” surgiu antes da
Internet, podendo ser utilizado no contexto de ambientes informacionais off-line e
tradicionais como bibliotecas e empresas. A AI deve ser usada para ajudar no tratamento
de conteúdo, independentemente do tipo do ambiente, seja ele analógico, digital ou
híbrido.
Garrett (2011) explica que, no desenvolvimento de conteúdo, estruturar a
experiência do usuário também é uma questão de AI. Este campo baseia-se em uma série
de disciplinas que historicamente m se preocupado com a organização, reunião,
necessidade e apresentação informacional: biblioteconomia, jornalismo, comunicação,
entre outros.
O autor faz alguns paralelos entre AI e design de interação, explicando que
compartilham uma ênfase em definir padrões e sequências nas quais as opções serão
apresentadas aos usuários. O design de interação diz respeito às opções envolvidas na
realização e execução de tarefas. A AI aborda as opções envolvidas na transmissão de
informações para um usuário. Design de interação e AI são áreas se preocupam com as
pessoas a maneira como elas se comportam e pensam.
A categorização de Morville, Rosenfeld e Arango (2015), utilizando uma
abordagem sistêmica e informacional (OLIVEIRA, 2104), dividem a AI nos seguintes
sistemas:
1) Sistema de Organização define o agrupamento e a categorização de todo
o conteúdo informacional.
2) Sistema de Navegação especifica as maneiras de navegar, de se mover
pelo espaço informacional.
3) Sistema de Rotulagem estabelece as formas de representação e da
apresentação da informação, definindo signos para cada elemento
informativo.
4) Sistema de Busca determina as perguntas que o usuário pode fazer e o
conjunto de respostas que irá obter.
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3.1 A Arquitetura da Informação Pervasiva
Com a evolução das TIC, surgiram tecnologias interligadas e interfaces
sincronizadas, em que a informação é transmitida o tempo inteiro, principalmente via
web. Smartphones que respondem e-mails, TVs que acessam a internet, movimentações
bancárias que são monitoradas pelos celulares são exemplos de situações comuns
atualmente e que formam uma teia de interações. Lacerda (2015) explica que esses
sistemas interligados em diferentes escalas formam um ecossistema, em que a
informação flui em toda parte. Essa comunicação tem sido chamada de Internet das
Coisas, ou Internet Ubíqua.
O extraordinário potencial da Internet das Coisas é o poder que confere aos
objetos de uso cotidiano de capturar, processar, armazenar, transmitir e
apresentar informações. Interligados em rede, os objetos o capazes de
realizar ações de forma independente e gerar dados em quantidade e variedade
exponenciais, como produto das interações. Nesse contexto, a informação passa
a fazer parte do ambiente, e configuram-se novas formas de atuação das
pessoas no mundo (LACERDA, 2015, p. 159).
Esse novo contexto de comunicação em uma rede tecnológica impactou
diretamente os estudos sobre AI, representando uma nova abordagem (OLIVEIRA,
2014). A Arquitetura da Informação Pervasiva (AIP) é considerada por Resmini e Rosati
(2011) como uma resposta aos novos problemas informacionais que ultrapassavam a
web, os quais a AI clássica não conseguia mais solucionar.
De acordo com Sousa e Pádua (2014), diversas áreas do conhecimento,
disciplinas e até práticas profissionais estão convergindo para a região de fronteira em
que o design digital, recursos de rede, interações sociais e acesso aos dispositivos móveis
se combinam, conduzindo a uma abordagem orientada pela informação, sendo
justamente neste ponto que se iniciam as discussões sobre uma AIP.
O que Lacerda (2015), em diálogo com Resmini e Rossati (2011), denomina
ecossistemas de informação, Oliveira (2014) denomina ecologias informacionais
complexas (OLIVEIRA, 2014). Este autor desenvolve uma modelagem conceitual para
AIP, conforme figura 1.
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Figura 1 Modelo conceitual para Arquitetura da Informação Pervasiva
Fonte: Extraído de Oliveira (2014)
A contribuição de Oliveira, no aprofundamento teórico e epistemológico da AIP,
responde sobre:
a) O status científico da AIP;
b) Do que trata a AIP;
c) O que ela deve possibilitar;
d) Como ela se materializa na práxis de pesquisa científica e de projeto de
Arquitetura da Informação.
A AIP tem, de acordo com a literatura científica levantada por Oliveira (2014), um
viés teórico e outro prático, tratando de ecologias informacionais complexas, que
integram e articulam, de forma holística, espaços, ambientes, artefatos tecnológicos e
sujeitos. A AIP também possibilita o desenvolvimento de pesquisas sobre ambientes
informacionais híbridos, colaborando para que o sujeito permaneça orientado dentro da
ecologia, além de contribuir para o funcionamento convergente das partes da ecologia e
de seu todo em relação a outras ecologias. A AIP também considera a adaptabilidade das
partes da ecologia a novos contextos e aos comportamentos dos sujeitos, sem
negligenciar o aspecto da interoperabilidade entre os sistemas; a atenção às questões
semânticas, de acessibilidade, de usabilidade e de encontrabilidade.
Como observam Resmini e Rosati (2011), na ecologia, os usuários tornam-se
também intermediários da informação, o que é estático torna-se dinâmico e o que é
dinâmico torna-se híbrido (na convergência entre espaços físicos e digitais). Interações
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horizontais prevalecem sobre as verticais, o design de produtos passa a ser design de
experiências e, por fim, as experiências passam a acontecer em múltiplos canais.
Após a tessitura das considerações sobre os universos do presente artigo, parte-
se para uma análise de possíveis contribuições da AIP para a elaboração e evolução dos
AVA.
4 A ARQUITETURA DA INFORMAÇÃO PERVASIVA E AS ECOLOGIAS HÍBRIDAS DE
APRENDIZAGEM: CONTRIBUIÇÕES POSSÍVEIS
A partir das considerações sobre os AVA discutidas anteriormente, optou-se
pelos modelos de Wagner (2001) e McGreall (2004) para demonstrar de forma mais
dinâmica como os materiais podem estar dispostos dentro de um AVA (FIG. 2 e 3).
Figura 2 Modelo de Conteúdo de Aprendizagem
Fonte: Extraído de Wagner (2002)
O Modelo de Conteúdo de Aprendizagem mostrado na FIG. 2 também considera
os tipos, tamanhos de arquivos e a forma como esses conteúdos podem ser pulverizados,
transformando-se em outros menores. Conforme mostrado neste modelo, os menores
dos arquivos são os chamados ativos de conteúdo, constituídos de mídia bruta, como
fotografias, ilustrações, diagramas, arquivos de áudio e vídeo e animações.
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Os objetos de informação compreendem o próximo nível neste modelo, que pode
ser classificado como um conceito, um fato, um processo, um princípio, um exercício ou
um procedimento.
Os Objetos de informação individuais podem ser combinados para formar uma
estrutura de dados mais conceitualmente completa, sendo ela o objeto de aprendizagem.
Os objetos de aprendizagem são formados pela montagem de uma coleção de
objetos de informação reutilizáveis, relevantes para ensinar uma tarefa de trabalho
comum em um único objetivo de aprendizagem.
Em seguida, os objetos de aprendizagem podem ser sequenciados e agrupados
para formar Componentes de Aprendizagem maiores, como "Lições" e "Cursos". Quando
esses Componentes de Aprendizagem estão envolvidos com funcionalidades adicionais,
como ferramentas de comunicação, computação que abarca conversas em tempo real e
outras práticas de comunidade, existe então um ambiente de aprendizagem (WAGNER,
2002).
Figura 3 Disposição de conteúdo em AVA
Fonte: Adaptado de McGreall (2004)
Nota-se que, para McGreall (2004), um conjunto de objetos de informação resulta
em um objeto de aprendizagem e, por sua vez, seu conjunto forma um tópico. Um
conjunto de tópicos forma um componente de aprendizagem, podendo ser ele uma
simulação. Vários componentes formam uma lição, e várias lições um módulo, até
formar um curso completo e, por fim, um programa (FIG. 3).
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Observa-se certa preocupação de alguns autores em definirem os objetos digitais
pertencentes ao acervo do AVA, mostrando a hierarquização de conteúdo e
nomenclaturas para cada um deles, por exemplo: um componente de aprendizagem não
é sinônimo de um objeto de aprendizagem.
Por meio dos modelos de AVA mencionados no presente artigo, é possível
entender um pouco a respeito da dinâmica desses ambientes de aprendizagem e como
se estruturam enquanto Ecologias Informacionais Complexas.
Com a criação de plataformas de compartilhamento de conteúdo, como o
Youtube, e de portais científicos, como o Portal Capes, dos repositórios institucionais,
das redes sociais, assim como aplicativos, cujo objetivo é o ensino de alguma habilidade,
próprios para smartphones e tablets, observa-se que o processo de aprendizagem
mediado pelas tecnologias transcende os AVA.
Nesse sentido, percebemos que a experiência a partir do AVA se estrutura numa
teia de ambientes distintos e interligados pela navegação, sugerindo uma estrutura
semelhante ao que Oliveira (2014) chama de Ecologia Informacional Complexa.
Considera-se também a importância dos ambientes analógicos, não os digitais,
como produtores de conhecimento, podendo ser salas de aula, bibliotecas, cafeterias, etc.
Fazendo um paralelo com os conceitos abordados anteriormente sobre ambientes
informacionais híbridos, é possível afirmar que o usuário navega em uma ecologia
híbrida de aprendizagem, mesclando digital e analógico, humano e não humano, ou seja,
em Ecologias Informacionais Complexas.
Algumas considerações podem ser feitas no que tange o desenvolvimento de um
AVA guiado pelos elementos essenciais da AIP. O que trazemos aqui é, a partir da
triangulação teórica entre os modelos de AVA e o modelo de AIP, um conjunto de
diretrizes para construção de AVA dentro de parâmetros essenciais da AIP:
1) No processo de projeto e/ou customização de um AVA deve-se realizar um
mapeamento de todos os ambientes, softwares, tecnologias e pessoas
envolvidas no contexto de uso, mapeando também os ambientes e ecologias
complementares, externas ao AVA.
2) Os AVA podem ser compreendidos como uma Ecologia Informacional
Complexa, com foco nos processos navegacionais e de aprendizagem.
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3) Uma Ecologia Informacional Complexa agrega e articula ambientes digitais,
analógicos ou híbridos, tecnologias digitais, analógicas e ubíquas, e todos os
sujeitos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem.
4) A experiência de navegação em um AVA deve ser compreendida como uma
navegação ecológica, onde o usuário interage fazendo pontes entre
ambientes intrínsecos e extrínsecos ao AVA.
5) Em vista da multiplicidade de objetos presentes nos AVA, é preciso decidir
com precisão sobre os processos de representação dos objetos digitais,
padrões de metadados e padrões de interoperabilidade, numa perspectiva
sistêmica, que viabilize a encontrabilidade dos objetos digitais, por meio das
ferramentas de busca ou dos processos de navegação.
6) Sugere-se a construção de uma taxonomia de objetos de aprendizagem,
criando assim categorias exclusivas para que não haja nenhuma repetição na
organização dos links/pontes e na criação das categorias mencionadas nos
modelos de McGreall (2004) e Wagner (2002).
7) Deve haver uma comunicação direta entre os alunos e a equipe educacional,
para que assim eventuais demandas sejam supridas, uma vez que, ao longo
da evolução do aluno na plataforma e na interação com os demais colegas,
suas demandas vão também se alterando naturalmente.
8) O arquiteto da informação é ator imprescindível para o êxito no projeto de
AIP de um AVA.
9) Os AVA permitem a postagem de objetos digitais tanto por parte do professor
quanto por parte dos alunos. O bom funcionamento desse recurso depende
dos metadados usados para a descrição dos materiais. Percebe-se, então, a
necessidade de optar por padrões de metadados obrigatórios, a fim de que,
em outro momento, o material possa ser recuperado pelo usuário através do
recurso de busca ou pela própria navegação entre os índices das coleções.
10) Normas de acessibilidade digital para usuários deficientes devem ser
atendidas, transformando a ecologia de AVA em estruturas democráticas e
inclusivas.
11) Repositórios contendo objetos de aprendizagem que podem ser coletados,
transformados pelos professores em outros objetos e depositados novamente
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são também ferramentas a serem integradas aos AVA, pelo seu potencial de
compartilhamento de informação e conhecimento.
12) A AIP deve ser aliada no processo do ensino e aprendizagem, desenvolvendo
conceitos, instrumentos e estratégias que propiciem a manutenção da
navegabilidade.
13) O usuário precisa estar conectado com o conhecimento que o interessa,
evitando-se, por meio da característica de redução na AIP, o excesso de
informações com as quais ele tem contato minuto a minuto, sem filtro.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em termos gerais, este artigo discutiu a relevância da aplicação dos princípios da
AI e da AIP para os AVA, potencializando as experiências navegacionais ecológicas no
contexto dos AVA.
Nota-se uma simbiose interdisciplinar, no contexto dos AVA com AIP, entre
Informática na Educação, a Arquitetura da Informação e a Ciência da Informação.
Observando a literatura levantada, ressalta-se como os AVA se desprenderam do
seu contexto de origem, no caso, a EaD, tornando-se plataformas tecnológicas mais
estruturadas, superando a noção simplificada de ferramenta mediadora da educação à
distância.
É possível afirmar que os AVA estão nos mais diversos e plurais contextos
educacionais, sejam presenciais, semipresenciais ou à distância. Os AVA têm o potencial
de favorecer a aprendizagem colaborativa. A simplicidade e a eficiência preconizadas
pela AI devem nortear a construção de AVA, contribuindo para a motivação e interação
dos envolvidos.
Salienta-se a presença do professor como elemento chave para que essa ecologia
Informacional Complexa com foco na aprendizagem contribua para o ensino.
Os AVA e a AIP, integrados ao ensino, seja ele básico, médio, superior ou de
aperfeiçoamento, têm o potencial produzir aprendizagem.
Igualmente, é necessário lembrar que nenhuma ferramenta tecnológica alcança
seu objetivo se é utilizada por sujeitos que não conseguem manuseá-la nem criar
significado a partir das informações ali compartilhadas.
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USABILIDADE DOS WEBSITES DOS REPOSITÓRIOS INSTITUCIONAIS DOS IFES DO
BRASIL NOS DISPOSITIVOS MÓVEIS: o contexto das cibercidades
USABILITY OF THE WEBSITES OF INSTITUTIONAL REPOSITORIES OF BRAZILIAN IFES
IN MOBILE DEVICES: the context of cybercities
Ronnie Anderson Nascimento de Farias
1
Júlio Afonso Sá de Pinho Neto
2
Izabel França de Lima
3
1
Doutorando em Ciência da Informação
(PPGCI/UFPB),
E-mail: ronnieufrn@yahoo.com
2
Doutor em Comunicação pela UFRJ, Professor
do PPGCI e do PPGOA/UFPB
E-mail: sadepinhojulio@gmail.com
3
Doutora em Ciência da Informação pela UFMG,
Professora do PPGCI e do PPGOA/UFPB
E-mail: belbib@gmail.com
ACESSO ABERTO
Copyright: Esta obra está licenciada com uma
Licença Creative Commons Atribuição 4.0
Internacional.
Conflito de interesses: Os autores declaram
que não há conflito de interesses.
Financiamento: Não há.
Declaração de Disponibilidade dos dados:
Todos os dados relevantes estão disponíveis
neste artigo.
Recebido em: 20/09/2019.
Revisado em: 01/10/2019.
Aceito em: 10/10/2019.
Como citar este artigo:
FARIAS, Ronnie Anderson Nascimento de;
PINHO NETO, Júlio Afonso Sá de; LIMA, Izabel
França de. Usabilidade dos websites dos
repositórios institucionais dos IFES do Brasil nos
dispositivos móveis: o contexto das
cibercidades. Informação em Pauta, Fortaleza,
v. 4, n. especial, p. 84-98, nov. 2019. DOI:
https://doi.org/10.32810/2525-
3468.ip.v4iEspecial.2019.42605.84-98.
RESUMO
A disponibilização das informações produzidas
pelos usuários das instituições acadêmicas por
repositórios institucionais pode ser atribuída
aos dispositivos móveis no contexto das
cibercidades. Objetiva identificar a usabilidade
dos websites dos repositórios institucionais das
Universidades Federais do Brasil, nos
dispositivos móveis, pela análise dos softwares
Sitechecker, Seoptimer e ISO/IEC 9126:1. É uma
pesquisa explicativa e descritiva, com análises
quantitativa e qualitativa desses 62 websites, no
período de 01 a 25 de janeiro de 2019. Conclui
que apenas 17% dos websites dos repositórios
institucionais das universidades do Brasil têm
atributos de usabilidade.
Palavras-chave: Comunicação científica.
Publicações de acesso livre. Recursos de
informação na Internet. Repositórios
institucionais. Dispositivos móveis.
ABSTRACT
The provision of information produced by users
of academic institutions by institutional
repositories can be attributed to mobile devices
in the context of cybercities. It aims to identify
the usability of the websites of institutional
repositories of Federal Universities of Brazil, on
mobile devices, through the analysis of
Sitechecker, Seoptimer and ISO / IEC 9126:1
software. It is an explanatory and descriptive
research, with quantitative and qualitative
analysis of these 62 websites, from 01 to 25
January 2019. It concludes that only 17% of the
Inf. Pauta
Fortaleza, CE
v. 4
n. especial
nov. 2019
ISSN 2525-3468
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-3468.ip.v4iEspecial.2019.42605.84-98
ARTIGO
Farias; Pinho Neto; Lima | Usabilidade dos websites dos repositórios institucionais dos IFES
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Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
websites of institutional repositories of
universities in Brazil have usability attributes.
Keywords: Scientific communication. Free
access publications. Information resources on
the Internet. Institucional repositories. Mobile
devices.
1 INTRODUÇÃO
A necessidade cada vez maior de acesso à informação e ao conhecimento alavanca
o investimento da sociedade pós-industrial. Assim, as cibercidades surgem a partir da
evolução urbana moderna como espaços com grande concentração de tecnologia
avançada, onde a comunicação e as informações estão presentes em vários segmentos,
como a cibercultura. As diversas práticas sociais da cibercultura, como chat, listas, blogs,
e-mails, por exemplo, transformam e reestruturam os espaços de fluxos de informação,
resultando na mudança de velocidade desse fluxo e rompendo as barreiras geográficas.
Nessa nova ordem digital, cabe perguntar: como disponibilizar de modo
produtivo as informações produzidas pelos usuários das instituições acadêmicas? Os
dispositivos que respondem a essa demanda, com relativa eficiência de acesso, são os
repositórios institucionais (RIs). Esses instrumentos atendem ao universo da
informação e comunicação digital que se materializa na internet, e vêm promovendo
uma abrangente transformação no modo de pesquisa contemporâneo. Eles apresentam
as universidades como um centro de produção intelectual e devem ser constituídos de
uma natureza acadêmico-científica. São atribuídos de interoperabilidade, protocolos e
padrões preconizados pelo Open Archive Initiative (OAI) e da participação da rede de
comunicação científica. Por isso, ao lado do necessário movimento “disseminador” de
lançar objetos na rede mundial de computadores, emergem os repositórios
institucionais, preocupados com a qualidade da informação, com o acesso e com a
preservação do patrimônio intelectual digital.
O objetivo da pesquisa foi identificar a usabilidade dos sites dos repositórios
institucionais das Universidades Federais de Ensino Superior do Brasil, nos dispositivos
móveis, pela análise dos softwares Sitechecker, Seoptimer e da ISO/IEC 9126:1. A
metodologia consiste em uma pesquisa explicativa e descritiva estando dentro das
abordagens quantitativas e qualitativas. O universo da pesquisa foram os 62 websites
dos repositórios institucionais das universidades federais do Brasil no Cadastro
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Nacional de Cursos e Instituições de Educação Superior (e-MEC), analisados no período
de 01 a 25 de janeiro de 2019.
As práticas de busca de informação científica nos RIs das universidades federais
nacionais pelos dispositivos móveis ainda não são dotadas de atributos de usabilidade.
Como resultado, apenas 11 universidades alcançaram êxito na capacidade do produto de
software de ser compreendido, aprendido, operado e atraente ao usuário.
2 CIBERCIDADES E O CONTEXTO DA INFORMAÇÃO DOS REPOSITÓRIOS
INSTITUCIONAIS
Na transformação da sociedade industrial na pós-industrial” - que é a sociedade
da informação -, o centro da vida económica e social não reside na produção de bens
materiais, mas na informação ou saber. A informação como fonte de valor, sendo o
recurso que está na base da produtividade e do crescimento econômico, acaba por
substituir o trabalho. Deste modo, o conhecimento e a informação tornam-se o
verdadeiro motor da sociedade “pós-industrial”. Com isso, a educação age como o
processo de interação e de comunicação recíproca, porque, desde o seu nascimento, o
indivíduo vai aprendendo com as diversas instâncias e agentes do seu meio sociocultural
(BELL, 1977).
Para não haver desinformação, o indivíduo precisa desenvolver capacidades,
como a compreensão e a análise crítica da informação. Isso pode esclarecer que as redes
de comunicação, os livros e a escola, em conjunto, permitirão evitar os efeitos adversos
que cada um deles isoladamente comporta. O excesso de informação, o qual gera muitos
materiais sem credibilidade, poderia sufocar o bem-estar da sociedade, ofuscando a
verdade (SERRA, 1998).
Nessa sociedade pós-industrial, as pessoas vivem certa insatisfação constante, no
sentido de estarem sempre em busca de algo novo, seja um novo desafio, novos
equipamentos eletrônicos, nova aparência, novas formas de se relacionar etc. Para cada
cidadão, um produto que o identificará e suprirá sua necessidade de comunicação,
como relata Bauman (2001):
[...] a capacidade de ‘ir às compras’ no supermercado das identidades, o grau de
liberdade genuína ou supostamente genuína de selecionar a própria identidade
e de mantê-la enquanto desejado, que se torna o verdadeiro caminho para a
realização das fantasias de identidade. Com essa capacidade, somos livres para
fazer e desfazer identidades à vontade (BAUMAN, 2001, p. 98).
Farias; Pinho Neto; Lima | Usabilidade dos websites dos repositórios institucionais dos IFES
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Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
Com suas identidades e os produtos de comunicação, ao longo do tempo, o
homem vem construindo novas tecnologias que construirão novos homens e novos
espaços, para que consiga conectar o local ao global, ou seja, “o homem constrói
tecnologias que constroem o homem e seus espaços.” Consideram-se responsáveis por
possibilitar essa constante conexão, mudança da sociabilidade no espaço urbano e
redefinição dos espaços: a tecnologia de internet wi-fi, internet móvel, os celulares e
outros equipamentos portáteis que possuem acesso à internet (DUARTE, 2006, p. 112).
Nas cibercidades, a informática da simulação e da visualização é uma tecnologia
intelectual e funciona como um módulo externo e suplementar para a faculdade de
pensamento humano. “As tecnologias intelectuais permitem que algumas fraquezas do
espírito humano sejam corrigidas” [...] (LÉVY, 1993, p. 154), pois as informações ficam
armazenadas e podem ser reprocessadas e redistribuídas.
A revolução digital
i
afetou o modo como os acadêmicos criam, comunicam e
preservam o conhecimento produzido. Com a facilidade de publicação em websites, blogs
e outros lugares virtuais, os pesquisadores disseminam sua produção sem a
preocupação com a proteção dos conteúdos, em longo prazo. De acordo com Davis e
Connolly (2007), é preciso que as instituições garantam essa preservação. Nesse sentido,
os RIs assumem essa responsabilidade ao extinguir os direitos autorais das editoras
tradicionais, e assumem para si a tarefa de garantir o conhecimento produzido por seus
pesquisadores.
Um repositório institucional é uma base de dados digital e virtual (web-based
database) de caráter coletivo e cumulativo (memória da instituição), de acesso
aberto e interoperável que coleta, armazena, dissemina e preserva digitalmente
a produção intelectual da instituição. (SAYÃO, 2009, p. 91).
Os repositórios institucionais tiveram importante papel na mencionada crise
da comunicação científica, quando se apresentaram como indicadores tangíveis da
qualidade da universidade, demonstrando a relevância científica, social e econômica de
suas pesquisas e aumentando a sua visibilidade e seu valor público (WARE, 2004).
Então, os Repositórios Institucionais (RI) são os veículos para a guarda, armazenamento,
divulgação e autoarmazenamento das produções científicas institucionais para acesso
aberto on-line, em todos os lugares, pela rede mundial, a Internet.
O cliente de serviços na teoria das capacidades é denominado como “usuário”,
pois o está à procura de bens materiais e de adquirir experiências profissionais, mas
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intenta ampliar suas próprias capacidades, ou seja, alcançar os próprios fins, por meio
das bibliotecas digitais e, por consequência, dos repositórios digitais. Com o objetivo de
atender aos usuários que buscam por informações universais e especializadas, as novas
tecnologias vêm se aprimorando para “resolver ou atenuar os possíveis estados
conflitivos entre os diversos usuários (partes interessadas) dos modelos gerenciais”
(TAMMARO; SALARELLI, 2008, p. 164). Segundo Lévy (2000), os recursos digitais
poderiam se mesclar aos físicos e serem heterogêneos, visto que deveria se investir mais
em organização, podendo se estender à da informação.
O contexto social do indivíduo também influenciará o modo de pesquisa
apresentado aos repositórios digitais. Por isso, essas ferramentas devem ser construídas
para estimular uma mudança pessoal quanto aos hábitos de acesso e uso da informação.
Atribuindo um olhar empírico diante do quadro brasileiro de repositórios institucionais
e sua utilização, pode-se encontrar a explicação para sua baixa procura na cultura de
desvalorização dos meios virtuais, como mecanismos verossímeis de encontrar
informações científicas (FARIAS; GALINDO, 2017).
Como foi relatado no artigo de Ribeiro e Vidotti (2009, p. 8), é necessário atentar
à customização do ambiente digital, afirmado pelas mesmas autoras, visto que “(...) esses
ambientes possuem um público-alvo e precisam atingi-lo, aumentando as possibilidades
de acesso e uso às informações disponibilizadas” (RIBEIRO; VIDOTTI, 2009, p. 8). Por
isso, estuda-se a aplicabilidade da arquitetura da informação em repositórios digitais.
Nesse sentido, a arquitetura da informação, de acordo com Lazzarin et al. (2012, p. 8):
(...) contempla a intersecção “usuário-conteúdo-contexto”. No que tange ao
usuário, o foco está nas necessidades, hábitos e comportamentos em seu processo
de busca e recuperação da informação; o conteúdo por sua vez, está relacionado ao
volume, formato, estrutura, ou seja, a forma como a informação será apresentada,
e por fim, não menos importante, o contexto, que se refere ao objetivo do website,
política interna da empresa, restrições tecnológicas entre outros fatores
condicionantes e pontuais.
Não se pode esquecer que o fundamental é o ser humano, agente efetivo situado
no tempo e no espaço, como lembra Lévy: "a técnica é apenas uma das dimensões destas
estratégias que passam por atores não humanos" (LÉVY, 1993, p. 14). Uma característica
que distingue os Repositórios Institucionais de outras bases de dados é a
disponibilidade de ferramentas que viabilizem a interação e a troca de ideias entre
usuários, mediadas por moderador ou o (MARCONDES; SAYÃO, 2009). Portanto,
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Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
devem-se ouvir os usuários e desenvolver o sistema informacional da forma mais
amigável possível na usabilidade dessas ferramentas tecnológicas.
3 A MOBILIDADE E USABILIDADE DOS REPOSITÓRIOS INSTITUCIONAIS
As tecnologias móveis de comunicação possibilitam quebrar a barreira
espaço/tempo e agilizar/acelerar o processo de comunicação dos usuários. Com essas
tecnologias, houve o controle da informação pelos usuários, independentemente do local
físico ou virtual, segundo Fontes, Lima e Gomes (2013), concorda Lemos (2007, p.11):
Qualquer espaço pode transformar-se no ‘meu território’ que passo a controlá-lo
informacionalmente.”
Conforme Fontes, Lima e Gomes (2013, p.73): o uso dessas tecnologias móveis de
comunicação está modificando o modo de viver das pessoas nas cibercidades, alterando
velhos hábitos e criando novos”. Essas novas tecnologias estão inseridas numa sociedade
que tem sua atenção voltada para a comunicação e informação, e o ensino à distância via
internet é um exemplo. Nesse contexto, o uso dos RIs pode se destacar como ensino e
pesquisa da informação, ao alcance dos usuários em seus locais remotos de acesso, pelo
uso aparelho celular e/ou tablet de acesso à internet. Segundo Fontes, Lima e Gomes
(2013, p. 73)
[...] não seria muita ousadia dizer que as cidades “travariam” sem os diversos
equipamentos e ferramentas que hoje a caracterizariam como uma cibercidade e
que tendo à mão um celular com capacidade de acesso à internet, uma pessoa pode
se sentir, praticamente, em casa, mesmo estando longe dela.
Para esta pesquisa, foi utilizado um modelo comparativo da usabilidade e da
portabilidade de software, proposto pela ISO/IEC 9126:11, que diz que a usabilidade é a
capacidade do produto de software de ser compreendido, aprendido, operado e atraente
ao usuário, quando usado sob condições especificadas” (ABNT, 2003). a atualização da
ISO 9241-11:2018 inclui a perspectiva do usuário, e relata que a medida em que um
sistema, produto ou serviço pode ser usado por usuários específicos para atingir metas
especificadas com eficácia, eficiência e satisfação em um contexto específico de uso(ISO,
2018, não paginado). Entende-se que:
Eficácia - precisão e integridade com as quais os usuários atingem as metas
especificadas;
Eficiência - recursos utilizados em relação aos resultados alcançados;
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Farias; Pinho Neto; Lima | Usabilidade dos websites dos repositórios institucionais dos IFES
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Nota 1 para entrada: Recursos típicos incluem tempo, esforço humano, custos e
materiais.
Satisfação - até que ponto as respostas físicas, cognitivas e emocionais do
usuário que resultam do uso de um sistema, produto ou serviço atendem às
necessidades e expectativas do usuário. (ISO, 2018, não paginado).
A ISO 9241:11 também relata que, na Interação Humano-Computador (IHC), a
usabilidade aborda a forma como o usuário se comunica com a máquina e como a
tecnologia responde à interação do usuário, considerando as seguintes habilidades:
Facilidade de aprendizado: a utilização do sistema requer pouco treinamento;
Fácil de memorizar: o usuário deve lembrar como utilizar a interface depois de
algum tempo;
Maximizar a produtividade: a interface deve permitir que o usuário realize a
tarefa de forma rápida e eficiente;
Minimizar a taxa de erros: caso aconteçam erros, a interface deve avisar o
usuário e permitir a correção de modo fácil;
Maximizar a satisfação do usuário: a interface deve dar-lhe confiança e
segurança (PARANÁ, 2019, não paginado).
Diante dessas premissas, a mobilidade e a usabilidade se constituem fatores de
eficácia e eficiência na utilização do RI nos dispositivos móveis de comunicação. A ISO/IEC
9126:11 categoriza os atributos de qualidade de software em seis características
(funcionalidade, confiabilidade, usabilidade, eficiência, manutenibilidade e portabilidade),
que se subdividem em subcaracterísticas (figura 1), medidas por meio de métricas
externas e internas
ii
.
Figura 1 - Modelo de Qualidade da Norma ISO 9126-1.
Fonte: ABNT (2003).
Esse modelo categoriza os atributos de qualidade de software para a usabilidade, a
qual será fonte para análise das páginas dos RIs.
A) Inteligibilidade - Capacidade do produto de software de possibilitar ao usuário o
uso para tarefas e condições de uso específicas e as impressões iniciais oferecidas pelo
software;
Farias; Pinho Neto; Lima | Usabilidade dos websites dos repositórios institucionais dos IFES
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Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
B) Apreensibilidade - Capacidade do produto de software de possibilitar ao usuário
aprender sua aplicação;
C) Operacionalidade - Capacidade do produto de software de possibilitar ao usuário
operá-lo e controlá-lo. Tem os aspectos de adequação, modificabilidade, adaptabilidade e
capacidade para ser instalado, os quais podem afetar a operacionalidade;
D) Atratividade - Intenção de tornar o software mais atraente para o usuário, como
o uso de cores e a natureza do projeto gráfico;
E) Conformidade - Relacionada à usabilidade, de acordo com normas, convenções,
guias de estilo ou regulamentações (ABNT, 2003).
4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A pesquisa foi classificada como explicativa e identifica fatores que determinam
ou contribuem para a ocorrência e o motivo do fenômeno. Nas definições de Boente e
Braga (2004), e segundo os objetivos da pesquisa, ela será descritiva estando dentro
de análises quantitativas e qualitativas, quando um levantamento de dados e o
porquê destes dados. O universo da pesquisa foram os websites dos repositórios
institucionais das universidades federais do Brasil, analisados no período de 01 a 25 de
janeiro de 2019.
Os endereços eletrônicos dos sites dos RIs foram selecionados pelos nomes das
Universidades no Cadastro Nacional de Cursos e Instituições de Educação Superior (e-
MEC), sendo utilizados os seguintes parâmetros na opção de Consulta Avançada:
Instituição de Ensino Superior + Categoria Administrativa: Pública Federal +
Organização Acadêmica: Universidade, no site: http://emec.mec.gov.br/. A Universidade
que não apresentou o link foi porque não foi encontrado (NE), e a identificação da
Instituição foi mantida para busca e atualização futura (APENDICE A).
As ferramentas escolhidas para análise seguiram as prioridades de consultas
gratuitas e contemplaram maior análise dos atributos sugeridos. Foram elas:
A) Sitechecker - Consultar Score gratuito de SEO de site - https://sitechecker.pro/pt/
A empresa se propõe a resolver o problema de website com especialistas de
Tecnologia da Informação - como melhorar o seu site. Hoje em dia, milhões de pessoas
preferem usar dispositivos móveis para pesquisar as informações necessárias. Assim, é
melhor tornar o website otimizado para celular. A possibilidade de acessar o recurso a
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partir de um telefone celular é um problema a ser considerado, pois os usuários devem
ter acesso conveniente à fonte de informação, e o website deve ser fácil de navegar
(SITECHECKER, 2019).
B) Seoptimer - Ferramenta de Relatórios e Auditoria de SEO -
https://www.seoptimer.com/repositorio.ufrn.br#recommendation.
O SEOptimer é uma plataforma de auditoria e relatórios de sites que pode analisar
de forma a melhorar seus rankings e presença online. “Analisamos e relatamos os
fatores importantes aos quais os mecanismos de pesquisa se preocupam ao classificar
uma página, bem como as coisas importantes para os usuários, como a velocidade de
carregamento da página e a facilidade de uso em dispositivos móveis” (SEOPTIMER,
2019, não paginado).
Foram inseridos os endereços dos sites da página principal dos RIs nos campos
de análise dos SEOptimer e Sitechecker. Após a consulta, foram identificados os campos
User Experience (Experiência de usuário). Os tópicos especificados por eles foram
analisados junto aos sites do RIs (APÊNDICE B).
5 ANÁLISES E DISCUSSÕES
As 62 universidades e os sites dos seus respectivos RIs foram consultadas pelo
relatório do e-MAC, mas em 15 universidades não foi possível identificar o site do RI,
ficando a sugestão de pesquisas futuras.
A usabilidade foi boa em 31 universidades, ou seja, em 49% dos sites do RI. Dessas,
20 não ofereceram a totalidade dos itens analisados para ter a mobilidade e a usabilidade
em sua forma eficaz, pois barreiras - descritas abaixo que trazem dificuldades aos
usuários para atingir as metas especificadas, como a pesquisa científica nos RIs. Também a
eficiência, o alcançada pela dificuldade de leitura, causada pelo tamanho das letras e da
página nos dispositivos móveis, diminui a atuação de recursos, como o tempo e esforço
humano, o atingindo os resultados almejados. Por fim, a satisfação, pois o uso de um
sistema de informação RIs, o produto - deveria atender às necessidades e expectativas do
usuário em sua busca e necessidade de informação; o serviço (ISO, 2018).
Dos RIs, 16 sites demostraram adaptados ao tamanho apropriado dos pontos de
toque, em que os usuários não têm dificuldade para teclar, e ofereceram uma melhor
experiência do usuário. Os outros 32 possuem alguns links/botões na sua página que
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estavam muito pequenos para que um usuário toque com facilidade no touchscreen (tela
sensível ao toque). O Sitechecker detectou que determinados pontos de toque (por
exemplo, botões, links ou campos de formulário) eram muito pequenos ou muito próximos
para que um usuário tocasse facilmente em uma tela sensível ao toque (SITECHECKER,
2019).
Em 29 sites houve o texto da página legível nos dispositivos móveis e a configuração
do visor adequada à leitura. Entretanto, em 18 sites o Sitechecker relatou que o texto da
página foi muito pequeno para ser legível na tela do dispositivo móvel (SITECHECKER,
2019).
Em 40 sites a página especificou um visor que corresponde ao tamanho do
dispositivo. Isso permite que ela seja exibida apropriadamente em todos os dispositivos.
Nos outros 04 sites não havia janela de visualização, que controla como uma página da web
deve ser exibida em um dispositivo móvel. Sem uma janela de visualização, os dispositivos
móveis redimensionarão a página em uma largura de tela típica da área de trabalho,
dimensionada para caber na tela dos dispositivos sem os ajustes. A janela de visualização
fornece controle sobre a largura e o dimensionamento da página em diferentes
dispositivos (SEOPTIMER; SITECHECKER, 2019).
O conteúdo foi dimensionado para se ajustar à janela de visualização dos
dispositivos em apenas 40 sites, e “a página especifica um visor que corresponde ao
tamanho do dispositivo. Isso permite que ela seja exibida apropriadamente em todos os
dispositivos móveis” (SITECHECKER, 2019, sem paginação). Em 04 sites, o conteúdo da
página foi muito largo para a janela de visualização, “e isso faz com que o usuário role a
página horizontalmente” (SEOPTIMER, 2019, sem paginação).
Os 44 sites consultados não usaram plug-ins, o que previne o uso de conteúdos em
muitas plataformas, pois os plug-ins ajudam o navegador a processar tipos especiais de
conteúdo da Web, como Flash, Silverlight e Java. “A maioria dos dispositivos móveis não
oferece suporte a plug-ins e os plug-ins são a principal causa de travamentos, falhas e
incidentes de segurança em navegadores que fornecem suporte” (SITECHECKER, 2019,
sem paginação).
Os sites dos RIs que alcançaram boa performance em todos os itens analisados
foram das seguintes universidades: UFRA, UFT, UFRGS, UFRB, UFMA, UFC, UFS, UFG,
UFPB, UFPEL e UFVJM (Apêndice B). Assim, apenas 11 RIs foram aptos a transmitir aos
seus usuários a mobilidade de seus serviços associada à usabilidade, como esclarece o
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item da usabilidade da ISO 9241:11 - maximizar a produtividade: a interface deve
permitir que o usuário realize a tarefa de forma rápida e eficiente (PARANÁ, 2019).
A análise por região do Brasil mostrou que o Nordeste apresentou 05 RIs com
usabilidade alcançada, seguida das regiões Sul 02, Sudeste 02, Norte 01 e Centro-oeste
com 01. Dos 30 RIs que precisaram de ajustes em suas páginas, na região sudeste
concentrou maior número, visto que mais RIs em funcionamento. No Nordeste houve
maior número de websites não encontrados, ou estavam em construção ou desativados
no período da pesquisa, válido para as outras regiões. Os que não alcançaram os
atributos foram 03 (UFBA, UFMG e UFSC), pois em todos os quesitos foram necessários
ajustes para usabilidade e foram considerados negativos. A região Centro-oeste e a Sul
tiveram todos os seus websites dos RIs em funcionamento e foram passíveis de análise
(Tabela 1).
Tabela 1 - Total de Websites avaliados por região do Brasil
Região
Atributos da usabilidade
Websites não
encontrados
Total dos
avaliados
Alcançados
Ajustes no website
Não
alcançados
Norte
UFRA
UFAM, UNIR
-
UNIFAP, UFAC,
UFRR, UFOPA
03
Nordeste
UFRB, UFC
UFMA, UFS
UFPB
UFRN, UFRPE,
UFPI, UFPA, UFPE, UFAL,
UFERSA
UFBA
UNIFESSPA, UFCA
UFCG, UFCSPA
UFOB, UFSB
UNIVASF
13
Centro oeste
UFT
UNB, UFGD
UFMS
-
-
04
Sudeste
UFVJM,
UFF
UFRRJ, UFRJ, UFPR, UFES,
UFV, UFU, UFSCAR, UFLA,
UFJF, UNILA, UFFS, UFOP,
UNIFEI, UNIFESP
UFMG
UFSC
UFTM, UFABC
UNIFAL
UFSJD
18
Sul
UFRGS,
UFPEL
UTFPR, UFRG,
UNIPAMPA, UFSM
-
-
06
Total
11
30
03
15
44
Fonte: o autor (2019).
Dos atributos dados de qualidade de software para a usabilidade pela norma ISO
9126-1(ABNT, 2003), 61% dos RIs não apresentaram, aos dispositivos móveis:
A) Inteligibilidade Não possibilitaram ao usuário o uso para tarefas, por não terem
conteúdo adaptado, letras visíveis, adaptação à tela e ao toque;
B) Apreensibilidade A tela, as letras e o toque reduzido foram mais uma barreira
para o usuário aprender sua aplicação, além da compreensão da utilização do RI;
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C) Operacionalidade A falta de adequação, modificabilidade, adaptabilidade e
capacidade para ser instalado nos dispositivos móveis pode afetar a operacionalidade,
como foi a adaptação da tela em 04 sites;
D) Atratividade - A intenção de tornar o software mais atraente para o usuário
faltou na adaptação do conteúdo à tela, para que os usuários não tenham que rolar a página
horizontalmente quando acessam as páginas dos RIs;
E) Conformidade Foram apenas 11 sites aprovados sem restrição de usabilidade,
segundo os softwares avaliadores desta pesquisa. Nos outros sites ainda faltam melhorias
em suas páginas, sugeridas pelos técnicos em Tecnologia da Informação e pelas normas da
ISO (ABNT, 2003).
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a mobilidade proporcionada pelos dispositivos das cibercidades, os projetos
das ferramentas de busca tornam-se adaptados a partir da compreensão do contexto
mobile (como as buscas são feitas no celular). Começar os projetos pensando na versão
desktop e, depois, adaptar para o celular, já está em fase de mudança.
No entanto, as adaptações para essa realidade ainda estão sendo feitas nos sites
dos repositórios Institucionais das universidades federais do Brasil. Das 62 páginas
iniciais dos RIs dadas pelo IFES (e-MEC) e analisadas pelos sites SEOPTIMER e
SITECHECKER, apenas 11 foram consideradas adaptadas para os dispositivos móveis no
quesito “experiência do usuário”, que avaliou: boa usabilidade, tamanho da fonte,
adequação do conteúdo, do visor, do toque na tela sensível e o uso de plug-ins.
Os outros websites ainda precisam de ajustes em seu software para cumprir
sugestões de usabilidade, pela ISO 9241:11(2018), de metas especificadas, com eficácia,
eficiência e satisfação, em um contexto específico de uso. Ou seja, 61% dos RIs não
apresentaram aos dispositivos móveis os atributos dados de qualidade de software, do
modelo de qualidade para a usabilidade, pela norma ISO 9126-1 (ABNT, 2003), cujos
conceitos foram: inteligibilidade, apreensibilidade, operacionalidade, atratividade e
conformidade. Foram relatadas 101 alterações para que esses sites pudessem alterar
seus atributos de usabilidade identificados na análise e discussão, dentre elas: conteúdo
adequado ao tamanho da tela, evitar o uso de plug-ins, tamanho apropriado dos pontos
de toque e tamanhos de fonte legíveis.
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Por fim, as cibercidades, por meio de comunicação com infraestrutura altamente
veloz e com grande capacidade de penetração são a reconfiguração dos centros urbanos.
Os dispositivos móveis se propõem a ser a ferramenta que possibilita o rompimento de
barreiras físicas e do tempo, e as universidades federais do Brasil no desempenho da
funcionalidade dos seus RIs devem proporcionar aos seus usuários essa forma de
pesquisa científica, com todo desempenho de usabilidade.
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NOTAS
i
Revolução Digital, conhecida como a Terceira Revolução Industrial, é a mudança do analógico, mecânico
e eletrônico tecnologia para a tecnologia digital, que começou em qualquer lugar a partir do final dos anos
1950 para a década de 1970 com a adopção e a proliferação de computadores digitais e arquivo digital
que continua até os dias atuais. A revolução digital conduzida pela microelectrónica, optoeletrônica,
multimídia, compressão digital de dados em pacotes de informação acelera a convergência entre as
telecomunicações, os computadores e os “média”, uma das características mais marcantes da Sociedade da
Informação.
AMARAL, Luis Mira. A Sociedade da informação. JD Coelho, A sociedade da informação-O percurso
português, p. 85-92, 2007.
ii
Qualidade interna é a totalidade das características do produto de software do ponto de vista interno. A
qualidade interna é medida e avaliada com relação aos requisitos de qualidade interna. Detalhes da
qualidade do produto de software podem ser melhorados durante a implementação do digo, revisão e
teste, mas a natureza fundamental da qualidade do produto de software representada pela qualidade
interna mantém-se inalterada, a menos que seja reprojetada.
Qualidade externa é a totalidade das características do produto de software do ponto de vista externo. É
a qualidade quando o software é executado, o qual é tipicamente medido e avaliado enquanto está sendo
testado num ambiente simulado, com dados simulados e usando métricas externas. Durante os testes,
convém que a maioria dos defeitos seja descoberta e eliminada. Entretanto, alguns defeitos podem
permanecer após o teste. Como é difícil corrigir a arquitetura do software ou outro aspecto básico do
projeto do software, a base do projeto usualmente permanece inalterada ao longo do teste (ABNT, 2003, p.
6).
CONTRIBUIÇÕES DA REDE CARINIANA PARA A PRESERVAÇÃO DIGITAL NOS
REPOSITÓRIOS DIGITAIS INSTITUCIONAIS: o caso da UFRN
CARINIAN NETWORK CONTRIBUTIONS TO DIGITAL PRESERVATION IN
INSTITUTIONAL DIGITAL REPOSITORIES: the UFRN case
Mayane Paulino de Brito e Silva
1
Rafaela Karoline Galdencio de Moura
2
Sandra de Albuquerque Siebra
3
Virgínia Bentes Pinto
4
1
Doutoranda em Ciência da Informação
(PPGCI/UFPB),
E-mail: mayanepaulino.b@gmail.com
2
Mestranda em Ciência da Informação
(PPGCI/UFPB),
e-mail: rafalalala22@gmail.com
3
Doutora em Ciências da Computação pela
UFPE, Professora do PPGCI/UFPE
e-mail: profa.ssiebra@gmail.com
4
Doutora em Ciência da Informação pela
Université Stendhal-Grenoble-3-França
E-mail: vbentes@ufc.br
ACESSO ABERTO
Copyright: Esta obra está licenciada com uma
Licença Creative Commons Atribuição 4.0
Internacional.
Conflito de interesses: A autora declara que
não há conflito de interesses.
Financiamento: Não há.
Declaração de Disponibilidade dos dados:
Todos os dados relevantes estão disponíveis
neste artigo.
Recebido em: 20/09/2019.
Revisado em: 01/10/2019.
Aceito em: 10/10/2019.
Como citar este artigo:
SILVA, Mayane Paulino de Brito; MOURA,
Rafaela Karoline Galdencio de; SIEBRA, Sandra
de Albuquerque; PINTO, Virgínia Bentes.
Contribuições da Rede Cariniana para a
preservação digital nos repositórios digitais
institucionais: o caso da UFRN. Informação em
Pauta, Fortaleza, v. 4, n. especial, p. 99-116, nov.
2019. DOI: https://doi.org/10.32810/2525-
3468.ip.v4iEspecial.2019.42607.99-116.
RESUMO
Discute sobre as contribuições da Rede
Cariniana no âmbito da preservação digital em
Repositórios Digitais Institucionais. Utiliza como
metodologia instrumentos necessários para o
desenvolvimento de uma pesquisa bibliográfica,
exploratória e descritiva, com uma abordagem
qualitativa. Faz uso de um estudo de caso no
Repositório Digital Institucional da UFRN por
meio de uma coleta de dados feita através da
realização de uma entrevista semiestruturada.
Aborda reflexões e conceitos relacionados à
preservação digital, que é entendida como um
conjunto de ações e técnicas responsáveis
quanto à informação digital, permitindo que ela
seja preservada e recuperada ao longo do tempo.
Menciona a Rede Cariniana, que oferece diversas
alternativas para que as entidades brasileiras
possam colecionar, armazenar e promover o
acesso ao conteúdo selecionado por meio de
cópias autorizadas. Aponta que o processo de
conexão entre a ciência eletrônica e a
necessidade de preservação dos dados digitais
estaria baseado nos Repositórios Digitais
Institucionais. Apresenta como resultados a
garantia da guarda como principal interesse na
adoção de ferramentas dirigidas à preservação
Inf. Pauta
Fortaleza, CE
v. 4
n. especial
nov. 2019
ISSN 2525-3468
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-3468.ip.v4iEspecial.2019.42607.99-116
ARTIGO
100
Silva; Moura; Siebra; Pinto | Contribuições da Rede Cariniana para a preservação digital
Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
digital de documentos; a UFRN faz parte do
estudo realizado pela Rede Cariniana, a qual
abriga a tipologia científica, cujo crescimento
documental chega a 3000 por ano e visa a
congregar todo o material científico nos
próximos 5 anos, levando em consideração os
aspectos tecnológicos, humanos e a ação prática
de uma política de preservação digital. Sob este
viés, a pesquisa finaliza que o propósito de
enriquecer e contribuir para as iniciativas e
práticas sobre a preservação digital brasileira é
bastante promovido pela Rede Cariniana, por
meio de uma infraestrutura descentralizada.
Palavras-chave: Preservação digital.
Repositórios Digitais Institucionais. Rede
Cariniana. Repositório Institucional UFRN.
ABSTRACT
It discusses about the contributions of the Rede
Cariniana in the range of digital preservation on
Institutional Digital Repositories. It uses as
methodology the instruments which are
necessary to the development of a bibliographic,
exploratory and descriptive research, with a
qualitative approach. It uses a study case in the
Institutional Digital Repository from UFRN
through a data collection that was made through
a semistructured interview. It approaches
reflections and concepts related to the digital
preservation, which is understood as a set of
actions and techniques responsible in the scope
of digital information, by allowing that it can be
preserved and recovered throughout time. It
mentions the Rede Cariniana, which offers
diverse alternatives to Brazilian entities in order
to collect, store and promote the access to the
selected content through authorized copies. It
points that the process of connection between
the electronic science and the need of digital
data preservation would be based on the
Institutional Digital Repositories. It presents as
results the guaranty of the storage as the main
interest in the adoption of tools directed to the
digital preservation of documents; the UFRN is
part of the study realized by the Rede Cariniana,
which hosts the scientific typology, whose
documental growth may come to be 3000 per
year and aims to gather all the scientific material
in the next 5 years, considering the technological
and human aspects, as well as the practical
action off a digital preservation policy. Thus, the
research concludes that the purpose of enriching
and contributing to the initiatives and practices
about the Brazilian digital preservation is very
much promoted by the Rede Cariniana, through
a decentralized infrastructure, by using
resources of distributed computing.
Keywords: Digital preservation. Institutional
Digital Repositories. Rede Cariniana.
Institutional Repository UFRN.
1 INTRODUÇÃO
O uso intensivo das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) no
cotidiano das pessoas, instituições e empresas, modifica processos informacionais, tais
como produzir, armazenar, disseminar e recuperar informações. Além disso, coloca em
foco a preocupação em como preservar as informações produzidas/manipuladas para
acesso e uso futuro. Isso devido à possibilidade de obsolescência tecnológica, assim
como de perda dessa informação. De fato, nos dias atuais, a quantidade de informação
em meio digital tem aumentado exponencialmente, englobando a informação nascida
digital, como também a que vem sendo digitalizada. Isto engloba acervos e documentos
diversificados e conjuntos de dados, sejam eles arquivísticos, científicos, educacionais,
históricos ou que integrem o patrimônio cultural.
Silva; Moura; Siebra; Pinto | Contribuições da Rede Cariniana para a preservação digital
101
Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
Nesse contexto, a Carta para a Preservação do Patrimônio Digital da United
Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO) manifesta a
necessidade de os Estados membros, incluindo o Brasil, estabelecerem políticas e ações
para proteger o patrimônio digital (UNESCO, 2003). Assim, pode-se afirmar que existe a
necessidade urgente de preservar o patrimônio digital, a fim de promover o acesso a
esses recursos em longo prazo, o que remete à preservação digital. Esta é definida pelo
Glossário da Câmara Técnica de Documentos Eletrônicos do Conselho Nacional de
Arquivos, o qual a preservação digital como: “Conjunto de ações gerenciais e técnicas
exigidas para superar as mudanças tecnológicas e a fragilidade dos suportes, garantindo
o acesso e a interpretação de documentos digitais pelo tempo que for necessário”
(CONSELHO NACIONAL DE ARQUIVO, 2014, p. 29).
Dentre as estratégias encontradas na literatura, encontra-se a replicação do
objeto digital em vários lugares (computadores), fazendo uso do modelo de preservação
em redes colaborativas (ARELANNO, 2004). Esse modelo propõe que diferentes
instituições armazenem, ofereçam acesso e criem cópias digitais atualizadas. Um
exemplo disso é o projeto Lots of Copies Keep Stuff Safe (LOCKSS), direcionado para
conservar a integridade das publicações eletrônicas, mantendo cópias em vários
endereços eletrônicos, averiguando periodicamente todas as cópias, a fim de verificar a
congruência da informação armazenada, segundo Arelanno (2004). Nesse sentido,
nacionalmente, o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT),
preocupado especialmente com a preservação da informação digital dos periódicos das
instituições brasileiras, criou a Rede Brasileira de Serviços de Preservação Digital (Rede
Cariniana).
A Rede Cariniana oferece diversas alternativas para que as entidades brasileiras
possam colecionar, armazenar e promover o acesso ao conteúdo selecionado por meio
de cópias autorizadas. Seu projeto de implantação foi elaborado baseando-se numa
infraestrutura descentralizada, utilizando artifícios de computação distribuída e fazendo
uso da Aliança Internacional LOCKSS (ARELANNO, 2004). Anteriormente a essa
iniciativa e, depois, em paralelo a ela, houve o incentivo do IBICT, no contexto do
movimento de acesso aberto à informação (INSTITUTO BRASILEIRO DE INFORMAÇÃO,
CIÊNCIA E TECNOLOGIA, 2014), de criação de Repositórios Digitais Institucionais (RDI).
Dessa forma, atualmente, as universidades e os centros de pesquisa têm planejado e
implantado RDI.
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No contexto da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), o
repositório institucionalizou-se através da Resolução 059/2010-CONSEPE, de 13 de
abril de 2010 (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE, 2010), que
designa as normas referentes à Política Institucional de Informação Técnico-Científica,
na UFRN.
O Repositório Digital Institucional (RDI) da UFRN reúne a produção intelectual da
comunidade universitária (docentes, cnicos e alunos de pós-graduação) da
universidade e tem como missão armazenar, preservar e disponibilizar na internet
textos completos e de acesso livre. De fato, espera-se com o RDI potencializar o
intercâmbio da UFRN com outras instituições, acelerando o desenvolvimento de suas
pesquisas, ampliando o acesso, a visibilidade e a recuperação da produção técnico-
científica da instituição. Porém, como o uso de uma ferramenta de repositório apenas
não garante a preservação da informação digital nele contida, fez-se necessário pensar
sobre a adoção de estratégias de preservação que contribuíssem nesse sentido.
Dessa forma, esse artigo objetiva descrever a contribuição que o ingresso da
UFRN na Rede Cariniana trouxe para a preservação digital do conteúdo de seu RDI.
Espera-se com esse artigo contribuir para que outras instituições compreendam
o benefício de ingresso na Rede Cariniana.
2 METODOLOGIA
Essa é uma pesquisa bibliográfica e descritiva, com uma abordagem qualitativa,
que fez uso de um estudo de caso no Repositório Digital Institucional da UFRN (GIL,
2008). A coleta de dados foi feita por meio da realização de uma entrevista
semiestruturada (TRIVIÑOS, 1987), com a profissional responsável pelo Setor de
Repositório Digital da referida universidade, em julho de 2018. A análise dos dados da
entrevista foi realizada por meio da análise de conteúdo (BARDIN, 2011).
Para o embasamento teórico, foi realizada pesquisa bibliográfica fazendo uso dos
termos de busca “preservação digital”, “rede cariniana”, “repositório digital” e
“repositório institucional” em livros, periódicos e bases de dados oriundos da área da
Ciência da Informação (CI) e de áreas afins, durante o recorte temporal de abril a julho
de 2018. Em seguida, foi feita a análise dos títulos para saber quais deles se
enquadravam diretamente na temática desta pesquisa.
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3 PRESERVAÇÃO DIGITAL
Com a popularização dos computadores, o surgimento da internet, a globalização
e as constantes mudanças e avanços nas Tecnologias Digitais de Informação e
Comunicação, surgiu uma nova forma de guardar a informação: o meio digital (GRÁCIO,
2012). Isto é, a informação, que antes tinha seu registro majoritário em papel, passou
também a ser produzida e registrada em formato digital. Neste sentido, surgiu a
necessidade de tratar da informação nesse novo formato, que trouxe benefícios, como a
facilidade de acesso e possibilidades diversas de disseminação, mas também trouxe
diversas ameaças e desafios a serem enfrentados, conforme apontam Grácio e Fadel
(2010, p. 61):
mudanças e avanços muitos rápidos nas tecnologias de acesso à informação
digital, causados especialmente pelo surgimento da internet;
obsolescência do hardware e do software, que com os avanços tecnológicos
se tornam ultrapassados muito rapidamente;
a explosão da quantidade de informação armazenada em meio digital, que
cresce a cada dia, substituindo os meios de armazenamento tradicionais;
as mudanças no formato dos arquivos e das mídias de armazenamento;
custo elevado das novas tecnologias.
Márdero Arellano (2012) endossa a dinamicidade desse cenário em que a
informação digital pode estar em qualquer lugar e em qualquer mídia, sendo
fundamentais novas práticas na gestão do seu ciclo de vida, que se modifica
incessantemente. Assim, com a percepção do risco de perder o registro da produção
acadêmica, arquivística, histórica, científica e cultural em meio digital, as instituições e
indivíduos passaram a se preocupar com formas de garantir a manutenção e acesso em
longo prazo, gerando a emergência de se pensar sobre a preservação digital.
Ferreira (2006) define preservação digital como a capacidade de garantir que a
informação digital continue acessível e com qualidade de autenticidade para que, no
futuro, possa ser interpretada por uma tecnologia diferente daquela utilizada em sua
origem. Para Márdero Arellano (2004), preservação digital trata de assegurar aos
objetos digitais sua integridade física (relacionada aos conteúdos armazenados nos
distintos suportes, como CD-ROM, DVD, pendrive, etc), lógica (compreende atividade de
conversão dos formatos originais em novos formatos) e intelectual (seu foco são os
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mecanismos que garantem a integridade e autenticidade da informação nos documentos
eletrônicos).
Um dos aspectos importantes que envolvem a preservação digital diz respeito às
estratégias que deverão ser adotadas para cada tipo de objeto. Thibodeau (2002)
apresenta, como mostra a Figura 1, adaptada por Ferreira (2006), diferentes estratégias
de preservação.
Figura 1 Classificação das diferentes estratégias de preservação digital
Fonte: Thibodeau (2002), adaptado por Ferreira (2006).
A preservação da tecnologia consiste em preservar o meio tecnológico usado
para a criação e manutenção do objeto digital e tem por objetivo conservar todo
hardware e software necessários para o acesso à informação preservada. Com a
obsolescência das mídias e com possíveis mudanças de programas de leitura dos
conteúdos dos documentos, esse tipo de preservação apresenta problemas, pois é
inevitável que uma tecnologia se torne arcaica e deixe de existir (FERREIRA, 2006).
O refrescamento consiste em transferir a informação digital de um suporte físico
de armazenamento para outro mais atual, antes que o primeiro se extinga. A dificuldade
dessa estratégia está em garantir que o hardware utilizado para a leitura do suporte de
armazenamento permaneça confiável com o passar do tempo (GRÁCIO; FADEL, 2010).
A emulação baseia-se na utilização de um software, chamado de emulador, que
reproduz o comportamento de uma plataforma de hardware e/ ou software numa outra
que, a princípio, seria incompatível (FERREIRA, 2006).
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A migração realiza uma transferência periódica de material digital de uma dada
configuração de hardware/ software para outra, ou de uma geração de tecnologia para
outra mais atual (THE COMMISSION ON PRESERVATION AND ACCESS AND THE
RESEARCH LIBRARIES GROUP, 1996).
A normalização tem como objetivo simplificar o processo de preservação, por
intermédio da redução do número de formatos distintos que os objetos encontram em
seu repositório, garantindo um número controlado de formatos e conduzindo a uma
redução generalizada dos custos de preservação (FERREIRA, 2006).
O encapsulamento preocupa-se em preservar, juntamente com o objeto digital,
toda a informação necessária e suficiente para possibilitar o futuro desenvolvimento de
conversores, visualizadores ou emuladores, segundo Ferreira (2006).
Lorie (2002) explica que, em uma Máquina Virtual Universal, um
decodificador que tem como finalidade apresentar uma visão lógica do objeto digital,
permitindo uma navegação simples através das suas propriedades.
Na estratégia da Pedra de Rosetta digital, em vez de preservar as regras que
permitem decodificar o objeto digital, são reunidas amostras de objetos que sejam
representativas do formato que se pretende recuperar (HEMINGER; KELLEY, 2004).
Márdero Arellano (2004) complementa categorizando os principais métodos
recomendados para a preservação dos objetos digitais em dois tipos: os estruturais e os
operacionais. Os primeiros tratam dos investimentos por parte das instituições que
buscam implementar algum processo de preservação, tais como adoção de padrões,
elaboração de normas, definição de metadados de preservação, montagem da
infraestrutura e formação de consórcios. Os métodos estruturais, por sua vez, referem-
se às medidas concretas aplicadas aos objetos digitais, como a conservação de software/
hardware, a migração de suporte, a conversão de formatos, a emulação e a preservação
do conteúdo. Adicionalmente, Márdero Arellano (2012) diz que, entre os métodos
estruturais atuais, o modelo de preservação em redes colaborativas. O modelo de
rede de preservação distribuída propõe que diferentes instituições armazenem,
ofereçam acesso e criem cópias digitais atualizadas de um acervo digital. Esse método
tem avançado em vários países principalmente por causa da adoção de uma ferramenta
que possibilita a criação de Redes Privadas Locais (PLN), o LOCKSS (“Lots Of Copies Keep
Stuff Safe”). O LOCKSS é um software livre e disponível para a comunidade de usuários,
embora seu desenvolvimento seja restrito à equipe do LOCKSS, da Universidade de
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Stanford, nos Estados Unidos, como explica Márdero Arellano (2012).
Nesse contexto, o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia
(IBICT), preocupado com a preservação da informação digital das instituições
brasileiras, criou a Rede Cariniana, baseada na experiência do projeto LOCKSS
(MÁRDERO ARELLANO, 2012).
4 REDE CARINIANA
O projeto da Rede Cariniana, criado pelo IBICT, conta com a parceria de
instituições de ensino e pesquisa e de especialistas brasileiros, com o objetivo de
garantir o acesso contínuo em longo prazo aos documentos eletrônicos nacionais
(MÁRDERO ARELLANO, 2012).
A Rede Cariniana oferece diversas alternativas para que as entidades brasileiras
possam colecionar, armazenar e promover o acesso ao conteúdo selecionado por meio
de cópias autorizadas. Seu projeto de implantação foi elaborado baseando-se numa
infraestrutura descentralizada, utilizando recursos de computação distribuída. Assim,
com a responsabilidade de adotar medidas para a salvaguarda e acesso da produção
científica, a Cariniana aderiu à Aliança Internacional LOCKSS, a maior e mais antiga rede
de preservação digital, abrindo as possibilidades de compartilhamento de experiências
com instituições internacionais reunidas em redes colaborativas.
Destaca-se que, graças à adoção da ferramenta LOCKSS, existe a integração dos
sistemas recomendados e disseminados pelo IBICT (Biblioteca Digital de Teses e
Dissertações, Sistema Eletrônico de Editoação de Revistas, Sistema Eletrônico de
Administração de Conferências e DSpace), para que os padrões de interoperabilidade do
modelo Open Archives Initiative (OAI) (metadados, protocolo de coleta OAI-PMH), entre
eles, não se percam no futuro (ARELANNO, 2012).
De acordo com o IBICT (2014), desenvolver uma rede de serviços de preservação
digital promove o compartilhamento de estudos e pesquisas, bem como a integração de
conteúdos da memória institucional digital de maneira consorciada e partilhada.
Para assegurar o funcionamento da Rede, foi estabelecido um acordo de
cooperação, de forma que cada instituição participante se responsabilizaria pela
aquisição e configuração do equipamento localmente. Dessa forma, inicialmente, as
atividades da Rede foram desenvolvidas conjuntamente com cinco universidades
brasileiras (Universidade de São Paulo, Universidade Estadual de Campinas,
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Universidade Federal da Paraíba, Universidade Federal de Santa Maria e Universidade
Estadual do Maranhão), com o suporte de seus respectivos centros de informação e de
informática. A princípio, foi estruturado o serviço de armazenamento dos periódicos
eletrônicos das instituições parceiras do projeto, porém, o objetivo de ampliar os
serviços oferecidos, incluindo a preservação de publicações eletrônicas no software
DSpace, como livros, teses e dissertações em formato eletrônico.
Nos dias atuais, as atividades da Cariniana estão sendo desenvolvidas em
parceria com onze instituições brasileiras de ensino e pesquisa, além da colaboração das
Universidades de Stanford, de Edimburgo e de Harvard (IBICT, 2018). A equipe do IBICT
trabalha diretamente com os técnicos de cada instituição, contatando os responsáveis
pelos portais de revistas, bibliotecas e repositórios digitais. A Figura 2 ilustra a estrutura
de funcionamento da Rede Cariniana.
Figura 2 Sub-redes da Cariniana
Fonte: Márdero Arellano (2014)
Ressalta-se que a estrutura da Rede Cariniana incentiva a cooperação,
construindo uma comunidade dedicada à preservação digital. Para isso, é fundamental
que cada instituição colaboradora tenha comprometimento na manutenção de sua
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infraestrutura local nos próximos anos e que o IBICT permita que sua equipe desenvolva
habilidades necessárias para continuar coordenando o suporte a todos os parceiros da
rede (MÁRDERO ARELLANO, 2012).
De fato, o projeto de implantação da Rede foi elaborado baseando-se em uma
infraestrutura descentralizada, utilizando recursos de computação distribuída. Para a
preservação distribuída, é preciso a participação das instituições detentoras dos
documentos eletrônicos e de sua infraestrutura, em um ambiente padronizado e de
segurança, garantindo o acesso permanente e o armazenamento monitorado dos
materiais digitais.
Adicionalmente, de acordo com Messerschmitt (2003), o processo de conexão
entre a ciência eletrônica e a necessidade de preservação dos dados digitais estaria
baseado nos Repositórios Digitais Institucionais (RDIs), que possibilitariam a estrutura
para as atividades de preservação e curadoria digital. Esta pode ser entendida como a
“gestão ativa e preservação de recursos digitais ao longo do seu ciclo de vida completo”
(TIBBO; HANK; LEE, 2008, p. 235)
5 REPOSITÓRIOS DIGITAIS INSTITUCIONAIS
Na era digital, os RDIs simbolizam uma memória eletrônica que, de acordo com
Ware (2004), surgiu durante 2002, com o início do desenvolvimento do software
DSpace, construído pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT). Nos últimos anos,
as universidades e os centros de pesquisa têm planejado e implantado repositórios
digitais institucionais. Isto ocorre porque as comunidades acadêmicas estão
participando de um movimento coletivo que busca explorar as possibilidades oferecidas
pelas TDICs para a criação de serviço de informação inovadores, por meio dos quais as
novas mídias digitais possibilitam otimizar o ensino, a pesquisa e a comunicação
científica (SAYÃO; MARCONDES, 2009). Logo, destacamos o movimento do acesso
aberto (do inglês open access), que emerge por volta do final da década de 90, frente à
conjuntura dos periódicos científicos que estavam em fase de crise financeira. Na
perspectiva de solucionar essas dificuldades, são desenvolvidas ferramentas de
softwares, dentre elas, a criação de repositórios digitais e as bases de periódicos
científicos. Destarte, esse movimento tem como princípio norteador o acesso livre a
todas as pesquisas, cujo financiamento provém de recursos públicos (KURAMOTO,
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2006). Os repositórios digitais institucionais configuram-se como a estratégia adotada
por instituições para a execução da responsabilidade de custódia, promovendo a guarda
dos conteúdos produzidos e permitindo que eles estejam disponíveis para seu acesso,
para a sua preservação em longo prazo (LYNCH, 2003).
Os RDIs retiram a exclusividade das editoras de periódicos e passam para a
instituição a tarefa de promover a guarda e o acesso à parte da massa de informação
produzida no contexto das instituições. Ademais, quebram o monopólio que as editoras
possuíam durante anos com a propriedade dos direitos autorais. Da perspectiva
conceitual, pode-se compreender um repositório digital institucional como:
[...] uma base de dados na Web na qual uma instituição de pesquisa deposita
sistematicamente sua produção acadêmica e a disponibiliza de forma ampla
para as comunidades interessadas. Sobre essa base de dados é oferecido um
conjunto de serviços voltados para a gestão e para a disseminação de
informações em formato digital. Esses serviços incluem captura,
armazenamento, tratamento técnico, organização, preservação e entrega de
conteúdos digitais de toda a natureza texto, imagens, vídeo, áudio,
apresentações, programas de computador, datasets etc (SAYÃO; MARCONDES,
2009, p. 23).
Sayão e Marcondes (2009) ainda colocam que, como o próprio nome faz lembrar,
os repositórios digitais institucionais estão ligados naturalmente aos seus ambientes
institucionais, tendo um evidente compromisso com a formação da memória digital
acadêmica e com a preservação de materiais em longo prazo. Para isso, esses
repositórios utilizam um suporte tecnológico de sistemas abertos e interoperáveis, bem
como a aplicação de padrões das áreas de Biblioteconomia, Ciência da Informação e
Tecnologia da Informação.
5.1 RDI da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
O RDI da UFRN reúne a produção intelectual da comunidade universitária
(docentes, técnicos e alunos de pós-graduação) e foi criado por meio do Edital de
Chamada FINEP/PCAL/XBDB 003/2009, lançado pelo Instituto Brasileiro de
Informação, Ciência e Tecnologia (IBICT). Este edital teve como objetivo apoiar projetos
de implantação de Repositórios Digitais nas instituições públicas federais, estaduais e
municipais de ensino e pesquisa, visando o registro e a disseminação da produção
científica dessas instituições (SILVA, 2018).
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O Repositório da UFRN tem como objetivos (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO
GRANDE DO NORTE, 2018, não paginado):
Gerir e disseminar a produção técnico-científica em meio digital;
Proporcionar maior visibilidade dessa produção institucional;
Preservar a memória intelectual da universidade; e
Servir como indicador tangível de qualidade e de relevância científica,
econômica e social.
O acesso ao RDI é feito por meio do endereço www.repositorio.ufrn.br , no qual
os usuários podem ter acesso aos materiais que ele abriga.
Ao criar o RDI, a UFRN estabeleceu a Resolução 059/2010-CONSEPE, de 13 de
abril de 2010 (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE, 2010), que
normatizou diretrizes sobre a Política Institucional de Informação Técnico-Científica na
universidade. Nesta Resolução foi definida a criação de uma Comissão Gestora
constituída por cinco membros da comunidade: um representante da Pró-Reitoria de
Pesquisa, um do Sistema de Bibliotecas da instituição, um da Superintendência de
Comunicação, um da Superintendência de Informática e um do Departamento de
Biblioteconomia (que hoje é nomeado como Departamento de Ciência da Informação).
Pontua-se que essa comissão operou na gestão do repositório até 2011. A partir de
então, a Biblioteca Central Zila Mamede (BCZM), principal unidade de informação da
universidade, assumiu a gestão do repositório.
Em 2013, foi criado o Setor de Repositórios Digitais (SRD), que passou a ser
responsável pelo gerenciamento do RDI, do Portal de Periódicos, da Biblioteca Digital de
Monografias (BDM) e da Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD). Em
dezembro de 2014, a BDTD foi desativada, devido à descontinuidade das atualizações, e
foi migrada para o RDI da UFRN. Em seguida, ela passou a ser uma comunidade dentro
do RDI (SILVA, 2018).
O servidor que hospeda o RDI da UFRN foi virtualizado em dezembro de 2014 no
datacenter da Superintendência de Informática (SINFO) da universidade, garantindo a
segurança dos dados por meio de uma política de backup, que define cópias diárias e
quinzenais, segundo estudo de Silva (2018).
O gerenciamento e a manutenção do RDI na UFRN são executados por uma
equipe de colaboradores composta por três bibliotecários, três bolsistas, um funcionário
de apoio cnico, além de um analista de sistemas e um técnico de Tecnologia da
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Informação (TI). O Repositório ainda conta com o suporte da SINFO, que é responsável
por manter o servidor virtual.
O software utilizado para a gestão e manutenção do RDI é o DSpace. Este é um
software open source, criado com base em padrões internacionalmente aceitos, como o
OAIS (Open Archival Information System) e o Dublin Core, e tem implementado o
protocolo OAI-PMH (Open Archives Initiative Protocol for Metadata Harvesting) (SILVA,
2018).
O DSpace admite múltiplos tipos de materiais, podendo ser arquivos de texto, de
som e de imagem, por exemplo, e em diferentes formatos de arquivos, como pdf, doc,
jpeg, entre outros.
O sistema é estruturado de modo que permite a esquematização dos conteúdos
por meio de uma disposição hierárquica composta por Comunidades, Coleções e Itens.
Hierarquicamente, a Comunidade representa o nível mais alto, podendo ser subdividida
em Subcomunidades, apresentando-se como uma espécie de estruturas organizacionais.
As Coleções agregam os Itens ou arquivos e podem estar relacionadas a uma ou várias
Coleções. Assim, no RDI as Comunidades dizem respeito aos centros, unidades
suplementares e unidades acadêmicas especializadas. As Subcomunidades são os
departamentos, cursos e programas de pós-graduação, e as Coleções são os artigos
publicados em periódicos, trabalhos completos apresentados em eventos, dissertações,
teses, livros eletrônicos e capítulos de livros. A distribuição da quantidade desses
materiais até a data em que este artigo foi construído é mostrada na Figura 3.
Figura 3 Quantidade de documentos no RDI da UFRN
Fonte: Repositório Institucional UFRN (2018).
-se que as dissertações e teses são a grande maioria dos documentos, com uma
quantidade de 8987 dissertações (67,6% do total de submissões) e 2642 teses (19,9%).
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Em seguida, tem-se 1398 artigos (10,5%), 192 livros (1,41%), 63 trabalhos completos
apresentados em eventos (0,47%) e 6 capítulos de livro (0,0004%), representando aqui
uma quantidade muito pequena. Ao total, o Repositório tem 13.288 documentos.
Para os arquivos relativos aos itens que compõem as coleções, de forma
padronizada, o DSpace aceita uma grande variedade de formatos. Todavia, no RDI da
UFRN encontram-se somente arquivos nos formatos PDF, ePub e doc.
Em relação ao depósito de informação referente à produção técnico-científica, a
Resolução estabelece que ele deve ser registrado no RDI pela comunidade universitária
(autoarquivamento) e que deverá ter seu acesso livre nacional e internacionalmente.
Por outro lado, também é determinado na Resolução que a BCZM tem o poder de
realizar o depósito designado, através da autorização dos autores ou por meio da
importação de informações disponibilizadas em outros repositórios.
Considera-se importante mencionar que o Repositório da UFRN está cadastrado
nos diretórios OPEN DOAR (Directory of Open Access Repositories) e OPEN ROAR
(Registry of Open Access Repositories), que são diretórios que m o objetivo de
potencializar as possibilidades de visibilidade e fluxo da informação científica.
No que concerne à preservação digital de seus documentos, em meados de 2014,
ao ser planejada a salvaguarda dos conteúdos armazenados em seus repositórios
digitais, garantindo seu acesso contínuo de longo prazo, a universidade iniciou estudos
para aderir à Rede Cariniana (SILVA, 2018).
6 ADESÃO DA UFRN À REDE CARINIANA: O CASO DO RDI
O interesse da gestão do RDI da UFRN na adoção de ferramentas dirigidas à
preservação digital de documentos tem como questão fundamental a garantia da guarda.
Ao se tratar de preservação de documentos, a motivação central é permitir a
possibilidade de sua recuperação e de seu acesso por longa data.
Sobre a situação do RDI em relação à sua inclusão na Rede Cariniana, a UFRN tem
ofício integrando-a à rede em questão desde 2015. A partir de então, atualmente, os
artigos de periódicos disponíveis do RDI da UFRN através do DSpace ainda não foram
considerados preservados pela Cariniana, tendo em vista que esta resolveu priorizar
inicialmente as revistas existentes no Portal de Periódicos da UFRN. Mas isso é algo
pensado para o futuro.
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A Cariniana está com um projeto piloto de preservar dissertações e teses e a
UFRN está fazendo parte desse projeto, participando de estudos em conjunto com a
Rede e com outras universidades, para se chegar à preservação efetiva desses tipos de
materiais. O esperado é, no fim da realização desses estudos, compreender as estratégias
necessárias para a preservação de teses e dissertações de todas as instituições
colaboradoras da Rede.
No que tange ao sistema de arquivamento digital, para o RDI da UFRN existem 2
(duas) caixas LOCKSS instaladas na Superintendência de Informática, de modo que se
preserva tudo que a Rede Cariniana solicita, não somente a produção da UFRN, mas
também, como prega a filosofia da Rede, de outras instituições que fazem parte da
colaboração.
Na visão da profissional responsável pelo RDI, entrevistada nesta pesquisa, é de
suma necessidade a instituição se sentir segura quanto à preservação digital dos
materiais dispostos no seu Repositório, de forma que seja possível o acesso em tempos
futuros, quando os documentos forem necessitados.
Em termos quantitativos, a estimativa anual referente ao crescimento do volume
de produção de arquivos digitais na UFRN, com base nos relatórios produzidos pelo
setor de RDI, apresenta uma média crescente de três mil documentos por ano, tanto no
contexto dos arquivos digitais da instituição no geral, como no RDI, especificamente, em
que as dissertações e teses compõem sua maioria.
Se tratando da atuação dos bibliotecários na comunicação do valor da
preservação digital para a comunidade universitária, foi colocado em pauta que a
preocupação ainda é incipiente, mesmo que sejam frequentes as discussões referentes
ao fomento de RDIs e Portais de Periódicos.
Uma questão fundamental colocada pela profissional refere-se à importância de
uma política de preservação digital instaurada nas instituições. Respondendo pela
própria UFRN, onde existem iniciativas e estratégias, ainda não existe uma política
integralizada e concreta de preservação digital para ser divulgada e que desperte a
preocupação não só da classe bibliotecária, mas das pessoas de um modo geral.
Em relação à produção da UFRN, é enfatizada a tipologia científica como a mais
adequada para a inclusão da Rede Cariniana, mesmo que existam as coleções voltadas à
memória, à cultura e a outras especialidades documentais. Como os repositórios estão
mais preparados para abarcar a produção científica, em vistas de acompanhar a
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perspectiva da Rede Cariniana, é pensada a produção científica como a prioritária do
repositório para entrar na rede, pelo menos inicialmente.
O RDI da UFRN coloca a Rede Cariniana como a principal estratégia de
preservação digital para os próximos 5 (cinco) anos, haja vista que a UFRN faz parte do
estudo, assim como a pretensão de que a Rede venha preservar todos os tipos de
documentos inseridos no RDI. Dessa forma, para os próximos 5 (cinco) anos, a
perspectiva de congregar toda a informação científica do RDI na Rede Cariniana e deixar
isso definido na Política de Preservação Digital da UFRN, que ainda não foi estabelecida
de forma oficial.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Visando promover o acesso, a preservação e o uso da informação, a Rede
Cariniana vem realizando parcerias com várias instituições de ensino e pesquisa e de
especialistas brasileiros.
No contexto da UFRN, a partir do estudo realizado pela Rede com seu Portal de
Periódicos, todos os periódicos passaram a integrar a Rede Cariniana, tendo a garantia
de sua preservação. Porém, os documentos que se encontram no DSpace, ferramenta
usada na construção de seu RDI, ainda não tiveram seus estudos na Cariniana
finalizados, com uma perspectiva de que a Rede possa contribuir para a preservação de
todos os materiais, prioritariamente os científicos, nos próximos cinco anos.
A partir das informações coletadas na realização desta pesquisa, o crescimento
dos documentos no âmbito da UFRN e no RDI chama a atenção sobre a reflexão de ações
práticas no segmento da preservação digital. Também vale ressaltar que, mesmo que
existam as medidas de segurança, como as caixas LOCKSS e os backups, assim como as
medidas preventivas, é fundamental que a Política de Preservação Digital seja instituída,
sob um espectro social e científico. Isso é importante para documentar as iniciativas
adotadas e para que essas iniciativas sejam divulgadas e conhecidas por todos que fazem
parte da instituição.
Assegura-se que o propósito de enriquecer e contribuir para as iniciativas e
práticas sobre a preservação digital brasileira são bastante promovidos pela Rede
Cariniana. A UFRN, a partir de seu ingresso na Rede Cariniana, tem participado
ativamente dessa preservação distribuída. Assim, percebeu-se a importância da reflexão
Silva; Moura; Siebra; Pinto | Contribuições da Rede Cariniana para a preservação digital
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Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
sobre a constante busca pelo domínio do conhecimento e das melhores práticas por
parte dos pesquisadores e responsáveis pela preservação digital de repositórios. Neste
sentido, acreditamos que o presente estudo possa contribuir juntamente às demais
pesquisas, cujo escopo volta-se à preservação digital, assim como possam emergir
trabalhos futuros, com vistas a fortalecer as discussões no âmbito da Ciência da
Informação.
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2019.
REPOSITÓRIOS DIGITAIS COMO ESPAÇOS DE MEMÓRIA E DISSEMINAÇÃO DE
INFORMAÇÃO
DIGITAL REPOSITORIES AS MEMORY AREAS AND DISSEMINATION OF
INFORMATION
Isledna Rodrigues de Almeida
1
Bernardina Maria J. F. de Oliveira
2
Maria Nilza Barbosa Rosa
3
1
Doutorando em Ciência da Informação
(PPGCI/UFPB), Professora da UFRPE
e-mail: isledna@gmail.com
2
Doutora em Letras pela UFPB, Professora do
PPGCI e do PPGOA/UFPB
E-mail: bernardinafreire@gmail.com
3
Doutora em Letras pela UFPB, Pós-doutoranda
em Ciência da Informação (PPGCI/UFPB)
E-mail: nilzasor@yahoo.com.br
ACESSO ABERTO
Copyright: Esta obra está licenciada com uma
Licença Creative Commons Atribuição 4.0
Internacional.
Conflito de interesses: As autoras declaram
que não há conflito de interesses.
Financiamento: Não há.
Declaração de Disponibilidade dos dados:
Todos os dados relevantes estão disponíveis
neste artigo.
Recebido em: 20/09/2019.
Revisado em: 01/10/2019.
Aceito em: 10/10/2019.
Como citar este artigo:
ALMEIDA, I. R.; OLIVEIRA, B. M. J. F.; ROSA, M. N.
B. Repositórios digitais como espaços de
memória e disseminação de informação.
Informação em Pauta, Fortaleza, v. 4, n.
especial, p. 117-131, nov. 2019.
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-
3468.ip.v4iEspecial.2019.42609.117-131.
RESUMO
Os Repositórios Digitais (RD) surgiram no
contexto do movimento do acesso livre à
informação, sendo uma forma de disseminação
da produção do conhecimento. Dentre os tipos
de RD, estão os Repositórios Digitais
  que se tornaram
instrumentos populares no meio acadêmico por
assegurar o acesso rápido e prático às produções
científicas de qualidade associadas à marca
institucional, garantir a memória institucional e
prover dados para os serviços oferecidos pelas
redes sociais acadêmicas, ou seja, são espaços
memorialísticos para preservação da
informação. Este artigo tem como objetivo
realizar uma pesquisa documental para coletar
       
Memória.
Palavras-chave: Informação. Repositório.
Memória Institucional. Espaços de Memória.
ABSTRACT
Digital Repositories (RD) emerged in the context
of the movement of free access to information,
being a form of dissemination of knowledge
production. Among the types of RD, there are the
Institutional Digital Repositories (RDIs) that
have become popular tools in academia for
ensuring fast and practical access to quality
scientific productions, associated with the
institutional brand, ensuring institutional
memory and still providing data for the services
offered by academic social networks, ie, they are
memorial spaces for information preservation.
This article aims to conduct a desk research to
collect information about RD, RDIs and Memory
Space.
Inf. Pauta
Fortaleza, CE
v. 4
n. especial
nov. 2019
ISSN 2525-3468
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-3468.ip.v4iEspecial.2019.42609.117-131
ARTIGO
118
Almeida; Oliveira; Rosa / Repositórios digitais como espaços de memória
Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
Keywords: Information. Repositories.
Institutional Memory. Memory Space.
1 INTRODUÇÃO
A informação tem se tornado algo importante para a sociedade. Considerada
elemento fundamental da comunicação, ela atinge os diferentes tipos de pessoas, as
diversas classes sociais, faixas etárias, graus de escolaridade e identidades culturais.
Para cada informação, de cunho científico ou não, existe um usuário interessado em
utilizá-la, a fim de realizar alguma tarefa, obter conhecimento e tomar decisões. Porém,
quando o usuário busca essa informação, encontra algumas dificuldades na seleção e
recuperação, devido à grande quantidade de informação disponível, seja virtual ou
impressa, e devido à instantaneidade com que essas informações se modificam. Dessa
forma, se torna primordial, para qualquer usuário, saber quais atendem as suas
necessidades e identificar onde buscá-las, seja para solucionar uma curiosidade,
aprimorar seus conhecimentos ou embasar uma pesquisa.
Existem fontes e recursos informacionais disponíveis de forma oral, impressa,
digital e multimídia, que possuem funções e conteúdos distintos. Dentre as diversas
fontes de informação estão os Repositórios Digitais Institucionais (RDI). Eles surgiram
como uma ferramenta que possibilita o agrupamento de diversos tipos de produção e a
disponibilização democrática dessa produção para a academia e a sociedade em geral,
fazendo jus à responsabilidade social de contribuir com o desenvolvimento científico do
país.
Este artigo propõe analisar o conceito de repositório digital e seus tipos, entre
eles, o RDI, e a sua utilização como espaço memorialístico. Trata-se de um artigo
elaborado utilizando as cnicas da pesquisa exploratória e bibliográfica, além do
método de investigação de análise documental. O levantamento bibliográfico foi
realizado na literatura a respeito dos conceitos de repositórios e memória aqui
apresentados.
No entendimento de Cervo e Bervian 
elaboram hipóteses a serem testadas no trabalho, restringindo-se a definir objetivos e

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As fontes de estudos para elaboração do artigo são vastas. Livros, artigos
          
tanto pode ser um trabalho independente como se constituir no passo inicial de outra

Na compreensão de Gil (2002, p. 44),     
com base em material elaborado, constituído principalmente de livros e artigos
científicos [...]. Boa parte dos estudos exploratórios pode ser definida como pesquisa

Os repositórios digitais tornaram-se instrumentos populares no meio acadêmico
por garantirem o acesso ágil às produções científicas de qualidade associados à marca
institucional. Trabalham com a preservação da informação em longo prazo, garantem a
memória institucional e são provedores de dados para os serviços oferecidos pelas redes
sociais acadêmicas.
2 REPOSITÓRIOS DIGITAIS
Com o surgimento da Internet na segunda metade do século XX, houve muitas
mudanças significativas no modo de comunicação e no fluxo informacional,
possibilitando a transmissão informacional mais ampla, mais rápida e atingindo uma
maior quantidade de usuários. Essas mudanças atuaram de forma pragmática no âmbito
acadêmico, permitindo o aumento da disseminação da produção científica para todos os
indivíduos.
Para Campello, Cendón e Kremer (2000), as tecnologias de informação e
comunicação causaram mudanças nos canais formais e informais, que se modificaram,
ampliaram e diversificaram, tornando a transmissão da informação mais rápida e
eficiente.
Neste contexto, as fontes de informação aparecem como uma ferramenta de
auxílio para recuperação de informações para usuários inseridos em diferentes

de informação por parte dos usuários, incluindo produtos e serviços de informação,

Brum e Barbosa (2009, p. 60) dividem as fontes de informação na Internet em
diversos setores:
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a) Listas de discussão,
b) Correio eletrônico (e-mail),
c) Informativos via correio eletrônico (newsletter),
d) Informativos comerciais via correio eletrônico (e-mail marketing),
e) Salas de bate-papo virtual (chat),
f) Mensageiros instantâneos (instant messengers),
g) Sítios de busca ou ferramentas de busca,
h) Intranets, extranets, os próprios sítios disponíveis na web.
Essas fontes e recursos informacionais estão disponíveis na forma oral, impressa,
digital e multimídia, que possuem funções diferentes e se diferenciam por meio do seu
conteúdo, que consequentemente se direcionam a usuários específicos. Dentre essas
fontes, têm-se os Repositórios Digitais (RD).
Na visão de Murakami e Fausto (2013), os repositórios digitais representam a
rápida evolução da comunicação científica no ambiente virtual. Essa evolução partiu de
iniciativas como a Iniciativa Arquivos Abertos (Open Archive Initiative - OAI) e o
Movimento de Acesso Aberto (Open Access Movement - OAM  
modelos eficientes de armazenamento, disseminação, visibilidade e acesso aos

Viana e Arellano (2006, p.2) conceituam repositórios digitais como forma de
armazenamento de objetos digitais que têm a capacidade de manter e gerenciar material
por longos períodos de tempo e prover o acesso apropriado. Desse modo, os
repositórios incentivam e gerenciam a publicação pelo pesquisador, utilizam tecnologia
aberta e podem ser acessados por diversos provedores de serviços nacionais e
internacionais.
         
 (FERREIRA, 2006, p. 71).
Para Costa (2008, p. 225) os repositórios representam uma espécie de revolução
de disseminação da pesquisa, pois o
[...] autoarquivamento em repositórios institucionais ou temáticos de trabalhos
publicados ou aceitos para publicação em periódicos ou outros veículos de
comunicação. Isto é, de trabalhos avaliados por pares. [...] maximiza o acesso,
a visibilidade e o progresso da pesquisa. Não se trata de substituir nenhum
outro estágio do processo de comunicação, principalmente, o estágio da
publicação formal, mas de uma instância eficaz de disseminação ampla e
irrestrita, livre de barreiras de preço e de permissão de uso. Desse modo, os
repositórios devem conter uma cópia de todo trabalho publicado ou aceito para
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publicação em periódicos, livros ou outro veículo, em ambiente interoperável e
aberto.
Segundo Leite (2009, p. 22), os repositórios m como finalidade, além de
gerenciar a informação científica, [...] melhorar a comunicação científica interna e
externa à instituição; maximizar a acessibilidade, o uso, a visibilidade e o impacto da
produção científica da instituição; retroalimentar a atividade de pesquisa científica e
apoiar os processos de ensino e aprendizagem; apoiar as publicações científicas
eletrônicas da instituição; contribuir para a preservação dos conteúdos digitais
científicos ou acadêmicos produzidos pela instituição ou seus membros; contribuir para
o aumento do prestígio da instituição e do pesquisador; oferecer insumo para a
avaliação e monitoramento da produção científica; reunir, armazenar, organizar,
recuperar e disseminar a produção científica da instituição.
Os RDs atendem determinado público alvo, e, de acordo com Sayão e Sales
(2015), existem diferentes tipos de RD para a hospedagem de objetos digitais, como:
a) Repositórios temáticos ou disciplinares: agregam trabalhos de uma área
específica do conhecimento, ou seja, particularizam a produção intelectual em
função das áreas do conhecimento;
b) Repositório de teses e dissertações: lidam exclusivamente com teses e
dissertações defendidas de programas de pós-graduação das diversas áreas
do conhecimento;
c) Repositório Institucional (RI) ou Repositório Digital Institucional (RDI):
voltados à produção intelectual de uma instituição, especialmente
universidades e institutos de pesquisa.
d) Repositórios Governamentais - Repositórios de dados apoiados por agências
governamentais. Por exemplo: DATA.GOV (www.data.gov).
Nesse artigo serão abordados os Repositórios Digitais Institucionais (RDI),
definidos por Leite (2012) c     
preservação, recuperação e, sobretudo, a ampla disseminação da informação cientifica

Em relação aos RDI, o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia
(2012, p. 
ciência e no modo como a informação aquela que alimenta e resulta das atividades
acadêmicas e científicas 
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         igitais de produtos
intelectuais de caráter acadêmico e acessíveis aos usuários, interoperáveis e

Os repositórios digitais surgiram como uma resposta à industrialização da
comunicação científica, que dificulta o progresso científico. Além dos movimentos de
acesso livre, citados por Bomfá et al. (2008 apud Avila et al., 2017), tais como as
Declarações de Budapest e Berlim
i
, Open Archives Initiative (OAI)
ii
e o Manifesto
Brasileiro de apoio ao acesso livre à informação científica
iii
, três outros fatores
contribuíram de forma significativa para o crescimento do número de repositórios
(AVILA et al., 2017):
1. Primeiro, a modificação em relação ao uso de novas formas de direitos
autorais para publicação das obras, pois poderia representar uma ameaça ao
livre acesso. A licença Creative Commons (http://creativecommons.org/), por
exemplo, permite maior flexibilidade para copiar e reusar diferentes tipos de
trabalhos intelectuais sob determinadas condições.
2. Segundo, o desenvolvimento tecnológico é importante para viabilizar novos
repositórios que utilizam softwares de código aberto, de caráter regulatório e
legal, e de sustentabilidade, que impactam a criação, manutenção e uso de
repositórios de objetos de aprendizagem.
3. Terceiro, a adoção por vários países, inclusive pelo Brasil, de políticas para o
depósito, em repositórios institucionais, dos trabalhos científicos produzidos
em instituições de ensino e pesquisa, o que incentiva tanto a criação de
repositórios quanto o depósito de obras neles.
Esses fatores foram verificados na maioria dos repositórios institucionais dos
países ibero-americanos (COCCO; RODRIGUES, 2014).
Entre as características destes arquivos/repositórios de acesso aberto, estão
(Moreno, 2006):
i) Processo automático de comentários;
ii) Geração de versões de um mesmo documento: uma vez que o documento
seja comentado, o autor pode gerar novas versões do mesmo, atualizando
a informação;
iii) Heterogeneidade dos formatos contemplados no sistema: inicialmente
concebido para servir à divulgação de pré-prints1, os arquivos de acesso
Almeida; Oliveira; Rosa | Repositórios digitais como espaços de memória
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aberto ampliaram sua tipologia de documentos que podem ser
arquivados;
iv) Autoarquivamento, que devolve o direito ao autor de enviar seu texto para
publicação onde este decidir e sem intermediação de terceiros: os
documentos eletrônicos são inteiramente gerenciados pelos cientistas e
são suficientemente flexíveis tanto para coexistir com os sistemas de
publicação tradicional como para auxiliar os editores a se envolverem com
algo mais próximo das necessidades dos pesquisadores, e
interoperabilidade no funcionamento dos arquivos de acesso aberto: os
arquivos/repositórios de acesso aberto envolvem um conjunto mínimo de
metadados, um tipo de arquitetura subjacente ao sistema, com abertura
para a criação de serviços de bibliotecas digitais compartilhados e
medidas de uso e de citação.
Os RDI´s m como objetivo principal o aumento da divulgação das pesquisas e
produções intelectuais das instituições de ensino e pesquisa, alcanç
oportunidade de se fortalecerem institucionalmente a partir da visibilidade de sua
produção acadêmica organizada e disponível, como um retrato fiel de sua instituição, a
et al., 2009, p. 19).
Conhecer fontes confiáveis, especializadas ou não, e aplicar critérios de seleção,
pode garantir a qualidade da informação a ser recuperada. Tanto no caso da pesquisa
científica, como empresarial ou comercial, as informações recuperadas devem ser de
qualidade, ter confiabilidade e credibilidade, contribuindo para a excelência no repasse
de informação.
3 ESPAÇOS MEMÓRIALÍSTICOS
Espaços ou lugares de memória são definidos por Nora (1997, p. 
a unidade significativa, de ordem material ou ideal, da qual a vontade dos homens ou o
trabalho do tempo fez um elemento simbólico do patrimônio da memória de uma
comunidade qua
Alguns problemas podem ocorrer com esses lugares de memória, dentre eles, a
perda, alteração, dano, destruição e até mesmo esquecimento. Um dos meios mais
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produtivos de evitar alguns desses problemas é a escrita. Ela permanece inalterada por
muito tempo, mesmo depois da morte de seu autor.
A memória existe com os artifícios da linguagem e escrita, pois não é possível
reter ou recuperá-la sem suporte técnico. A memória não pode existir como algo
puramente cerebral, e o passado não pode sobreviver sem os suportes que nos
inscrevem em nossas culturas e tradições (FERREIRA; AMARAL, 2004).
Assmann (2001) propõe quatro estágios evolutivos e, atualmente, simultâneos da
escrita: a escrita iconográfica, a alfabética, a analógica do vestígio e a digital,
confirmando sua importância como suporte da memória.
Os tempos da memória são marcados pela passagem entre a oralidade e a escrita,
e são divididos em cinco períodos (LE GOFF, 1990):
1) a memória étnica nas sociedades sem escrita, consideradas selvagens;
2) o desenvolvimento da memória, da oralidade à escrita, da Pré-história à
Antiguidade;
3) a memória medieval, em equilíbrio entre o oral e o escrito;
4) os progressos da memória escrita, do século XVI aos nossos dias; e
5) os desenvolvimentos atuais da memória.
Com os progressos da memória escrita, os suportes continuaram a se renovar, até
se tornarem acessíveis por meios eletrônicos, impulsionados pelas Tecnologias Digitais
da Informação e Comunicação. O conteúdo informativo, presente em um meio
eletrônico, disponível através do uso de um computador conectado à Internet, pode ser
acessado a qualquer hora, de qualquer lugar.
Com o avanço das Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação e a
velocidade com que as informações estão sendo propagadas, o tema memória vem
ganhando destaque. De acordo com Oliveira e Rodrigues (2012):
As limitações da memória humana levaram o homem a buscar em
recursos externos, as chamadas memórias artificiais, a compensação
para o esquecimento. A necessidade de possibilitar o acesso aos
registros por ele produzidos ao decorrer do tempo levou à criação das
chamadas instituições de memória que deveriam preservar os registros
do conhecimento humano nas suas mais diversas formas de
materialização [...] (OLIVEIRA; RODRIGUES, 2012, p. 495).
Na era das Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação, um dos pontos
fundamentais é saber o que será armazenado e o que será descartado da memória.
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Antes, tudo que se via e se produzia eram fontes de informações. Atualmente, uma
seleção do que deve ser lembrado e o que deve ser esquecido.
O interesse pela propriedade da memória é semelhante à necessidade de ter
acesso à informação. Com a capacidade de reter a memória, uma facilidade na
recuperação da informação nela contida, que também se pode designar como a própria
memória, pois a informação/memória continuará intacta, disponível para uso a
qualquer tempo.
Segundo Monteiro, Carelli,         
associado, especialmente na arquivologia, biblioteconomia e museologia, ao conjunto
das informações registradas, isto é, aos documentos e representações que podem ser
consultados, servindo de memória social 
Conforme citado por Indolfo (2007), a construção da memória pode ser definida
como a estruturação da lembrança através dos documentos.
Lembrar é uma necessidade prática da vida cotidiana de qualquer
pessoa ou instituições, é o resultado da necessária continuidade da vida
dos indivíduos como organismos, isto é, a continuidade de cada uma de
suas ações. Em qualquer época, tanto na administração quanto nas
empresas ou nas profissões liberais, uma sucessão ou uma transferência
de atribuições é acompanhada pela transmissão dos registros e dos
documentos, numa palavra: dos arquivos. (DELMAS, 2006, p. 27 apud
SILVA E GODOY, 2017, p. 9).
A produção científica compõe o acervo da memória social da comunidade
científica, e se verte numa memória própria a esse grupo: a memória científica. Por meio
dessa memória, a ciência se preserva com a possibilidade de ser acessada em espaços de
memória, reproduzidos por suportes e lugares de memória.
Com o surgimento da era da informação e o crescimento das ferramentas
tecnológicas de comunicação e entretenimento - redes sociais, acessibilidade e
portabilidade de informações , se proporcionou ao cidadão a utilização dos meios
eletrônicos de informação, tanto para a busca de informações do dia-a-dia, como para
informações de caráter técnico-científico. Após o evento das publicações eletrônicas, a
comunicação acadêmica passou a contar com os repositórios como novo instrumento
para disseminação da informação científica.
Essa produção científica está voltada para as instituições nas formas de lidarem
com a informação, nas ferramentas utilizadas, em suas práticas de gestão da informação
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e de gestão do conhecimento no âmbito institucional. Essas novas abordagens e formas
de tratar a informação institucional dão ênfase aos novos meios de aplicação e manuseio
das inovações tecnológicas de organizações oriundas da internet. Os RDIs são utilizados
para disseminação democrática, em rede, da produção do conhecimento.
Nora (1993) explica que os lugares da memória surgem como fruto do advento e
do avanço tecnológico, os quais devem ser gerenciados como suportes da memória
coletiva. Nessas condições, tem-se que os repositórios institucionais servem como
auxílio na democratização de acesso às informações na sociedade moderna. Um grande
salto qualitativo para a democratização do acesso ao conhecimento se dá quando a rede
permite um alcance mundial de trocas de conhecimento científico (NORA, 1993).
Dessa forma, a internet se torna uma ferramenta de guarda da nossa memória,
que possibilita um mecanismo para recuperá-la, construir e conservar, visto que é a
ferramenta principal para o uso dos RI. Por isso, os resultados das pesquisas podem ser
divulgados e consultados, que os RI representam uma forma de preservar a memória
coletiva da instituição e de organização do conhecimento para a memória científica.
Eles também constituem lugares onde se gerencia a memória científica. Assim, as
instituições inseridas na sociedade, como lugares de memória social registrada, agem,
reagem e interagem às tecnologias e à ciência, constituindo a exomemória de diversas
instituições (GARCÍA GUTIÉRREZ, 2001).
Segundo Bosi (2012), os meios eletrônicos de informação foram inventados para
poupar tempo das pessoas, algo sempre muito exigido na era das tecnologias de
informação e comunicação. Os meios eletrônicos aceleram os movimentos de
transmissão de sinais até o limite da instantaneidade.
am de volume, os
registros passaram a precisar de repositórios especiais, os arquivos, com guardiões

Segundo Assmann (2011), a memória não é considerada como vestígio ou
armazenamento, mas como uma massa plástica constantemente reformulada sob as
diferentes perspectivas do presente, pois se pode pensar na coexistência de diversas
formas de se conceber e usar a memória atualmente.
Para Bosi (2012), a memória, saltando sobre a cronologia, recupera o tempo
perdido, enquanto anula o passado-como-passado e o chama para a consciência viva do
presente.
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De acordo com Miranda, Galindo e Vila Nova (2011), a memória institucional tem,
como papel fundamental, contribuir para o resgate e preservação da memória de uma
organização, colaborando para a construção da identidade coletiva, que se forma a partir
da convergência de esforços para realização do interesse comum, onde a história de
cada um se confronta e se enriquece com a história de outros.
A memória institucional tem a possibilidade de ser preservada quando iniciativas
de institucionais buscam projetos de valorização dessa produção como patrimônio da
humanidade, como é o caso singular da Biblioteca Digital Mundial e dos Repositórios
Institucionais (DODEBEI, 2009).
A memória institucional ou o centro de memória possui diversos elementos que
os consolidam e os definem como memórias. Entre eles, se destacam: histórico
institucional/local; identidade da instituição; formação/definição/consolidação da
instituição; geração de informação decisional; suas relações sociais; e a gestão da
informação e do conhecimento.
Dessa forma, as pesquisas relatam que uma das funções da Memória institucional,
quando bem documentada e organizada, é garantir a perpetuação da memória para as
próximas gerações e torná-la mais um instrumento que agregue valor a instituição. Por
isso, proporciona às organizações um melhor entendimento de suas origens e de sua
história e um senso importante de identidade.
Segundo Rueda et al. (2011), a partir de 1970 se valorizou a memória
institucional com uma maior utilização de tecnologias que proporcionam aos usuários

sua trajetória uma vasta quantidade de documentos fundamentais para a preservação da
Memória Institucional (RUEDA et al., 2011, p.78).
Além disso, Ruedas et al. (2001) defendem que a preservação desta memória
garante informações confiáveis sobre a entidade, que podem ser utilizadas nas tomadas
de decisão diariamente, conseguindo, desta maneira, manter uma coerência dos atos
institucionais.
Os repositórios digitais institucionais promovem a valorização, reconstrução e
divulgação da memória institucional das universidades. A cada dia essas ferramentas se
integram no cotidiano dos ambientes acadêmicos, contribuindo para a construção do
conhecimento e satisfação das necessidades informacionais dos usuários.
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Desta forma, os repositórios institucionais estão no caminho de retratar a
trajetória experimentada pela instituição, pois permitem recuperar a informação com
relação ao registro e à busca da informação.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os Repositórios Digitais m se tornado instrumentos populares no meio
acadêmico por garantirem o acesso rápido às produções científicas de qualidade
associadas à marca institucional, por preservar a informação ao longo prazo, garantir a
memória institucional e por serem provedores de dados para os serviços oferecidos
pelas redes sociais acadêmicas.
          
necessidades dos usuários e disseminar o conhecimento científico produzido pela
comunidade acadêmica.

compor o acervo da memória institucional. Ressalta-se ainda a importância dos
repositórios institucionais pelo potencial que apresentam como ferramenta de acesso
aberto que permite organizar, disseminar e preservar a memória institucional.
Assim, os RDIs podem colaborar com uma das missões da universidade, que é ser um
centro de produção intelectual, devendo, assim, preservar sua memória e contribuir
para o avanço da ciência, tecnologia e humanidade.
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ii
Open Archives Initiative (OAI) iniciativa que estabelece, além de padrões de interoperabilidade, alguns princípios e ideais, como o
uso de software open source e o acesso livre à informação.
iii
Manifesto Brasileiro de apoio ao acesso livre à informação Científica Disponível em: http://livroaberto.ibict.br/Manifesto.pdf
TELETRABALHO (TELEWORK): uma prospecção para a Editora Universitária da UFPB
TELEWORK: a prospect for UFPB University Press
Sâmella Arruda Araújo
1
Fabiana da Silva França
2
Geisa Fabiane Ferreira Cavalcante
3
Izabel França de Lima
4
José Washington de Morais Medeiros
5
1
Mestranda Profissional em Geso nas
Organizações Aprendentes (PPGOA/UFPB)
E-mail: samella.dsn@gmail.com
2
Doutora em Ciência da Informação
(PPGCI/UFPB) e Pesquisadora - colaboradora de
projeto do Universitat Pompeu Fabra, Espanha
E-mail: fabiana21franca@gmail.com
3
Mestre Profissional em Gestão nas Organizações
Aprendentes (PPGOA/UFPB)
E-mail: gefabiane@gmail.com
4
Doutora em Ciência da Informação pela UFMG,
Professora do PPGCI e do PPGOA/UFPB
E-mail: belbib@gmail.com
5
Doutor em Educação (PPGE/UFPB), Professor
do IFPB e do PPGOA/UFPB
E-mail: washi_med@yahoo.com.br
ACESSO ABERTO
Copyright: Esta obra está licenciada com uma
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Internacional.
Conflito de interesses: Os autores declaram
que não há conflito de interesses.
Financiamento: Não há.
Declaração de Disponibilidade dos dados:
Todos os dados relevantes estão disponíveis
neste artigo.
Recebido em: 20/09/2019.
Revisado em: 01/10/2019.
Aceito em: 10/10/2019.
Como citar este artigo:
ARAÚJO, Sâmella Arruda Araújo; FRANÇA,
Fabiana da Silva; CAVALCANTE, Geisa Fabiane
Ferreira; LIMA, Izabel França de; MEDEIROS,
José Washington de Morais. Teletrabalho
(telework): uma prospecção para a editora
universitária da UFPB. Informação em Pauta,
Fortaleza, v. 4, n. especial, p. 132-151, nov. 2019.
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-
3468.ip.v4iEspecial.2019.42611.132-151.
RESUMO
Com o avanço das Tecnologias de Informação e
de Comunicação (TIC) e as mudanças que
acompanham a sociedade, novas formas de
flexibilização das relações de trabalho têm se
disseminado. Entre elas, destaca-se o
teletrabalho, em que o indivíduo executa as
atividades no home office, mantendo o vínculo de
emprego formal com a organização. Neste
sentido, este artigo tem como objetivo investigar
a viabilidade da implantação do teletrabalho
para os servidores da Editora Universitária da
Universidade Federal da Paraíba (EDUFPB), a
partir da análise do fluxo que inicia com o
recebimento do arquivo enviado pelo autor para
a revisão textual até o envio para a impressão
final do livro, ou até a publicação on-line, isto no
caso dos e-books. Nesta pesquisa documental, a
metodologia utilizada é de natureza qualitativa.
Os resultados permitiram identificar as
possibilidades de implantação do teletrabalho.
Nesse contexto, o teletrabalho é uma opção para
os que desempenham função ligada diretamente
ao uso de tecnologias para desenvolver suas
atividades.
Inf. Pauta
Fortaleza, CE
v. 4
n. especial
nov. 2019
ISSN 2525-3468
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-3468.ip.v4iEspecial.2019.42611.132-151
ARTIGO
Araújo; França; Cavalcante; Lima; Medeiros | Teletrabalho (telework): uma prospecção
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Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
Palavras-chave: Teletrabalho. Organização do
Trabalho. Editora Universitária UFPB.
ABSTRACT
Regarding the advancement of Information and
Communication Technologies (ICT) and the
changes that take place in society, new forms of
flexibility in labor relations have spread. Among
them, telework, in which the individual performs
the activities working from home, maintaining
the formal employment bond with the
organization, stands out. In this regard, this
article aims to investigate the viability of
implementing telework public servers of the
University Press of the Federal University of
Paraíba (EDUFPB), from the analysis of the flow
that begins with the receipt of the file sent by the
author review. To the sending to the final print
of the book, or to online publication, for ebooks.
In this documentary research, the methodology
used is qualitative in nature. The results allowed
to identify the possibilities of telework
implementation. In this context, telework is an
option for those who perform functions linked
directly to the use of technologies to develop
their activities.
Keywords: Telework. Work Organization.
University Presses - UFPB.
1 INTRODUÇÃO
Muito se fala sobre a globalização, sobre a dependência atual do homem em
relação às tecnologias digitais e sua relação com a instantaneidade, que é "um
movimento muito rápido e a um tempo muito curto" (BAUMAN, 2001, p. 134). Nesse
contexto, a fim de extrair pontos positivos acerca dos avanços nas tecnologias digitais da
informação e comunicação, podemos ter um olhar voltado para o mercado de trabalho,
em que é possível observar novos comportamentos dos profissionais, principalmente
nas funções relacionadas com a tecnologia da informação.
Alves (2018, p. 12) afirma em sua pesquisa que:
Observa-se, com as evoluções do mundo do trabalho, uma maior
conscientização do próprio trabalhador quanto ao alcance da satisfação no
trabalho, bem como da responsabilidade social por parte das organizações, a
fim de atingir os níveis de produtividade exigidos diante da globalização
Diante da sociedade da informação e do conhecimento, é necessário buscar
caminhos e soluções mais atuais. Nesse sentido, Duarte (2018, p. 199) discorre sobre a
gestão da informação e gestão do conhecimento, ao afirmar que
[…] essa busca pela atualização de conteúdos para acompanhar as tendências
emergentes de uma sociedade que se apresenta, ora como Sociedade da
Informação, do Conhecimento e da Aprendizagem, instiga a procura desse
caminho, que tem se apresentado como inatingível, considerando as limitações
e as barreiras impostas pela economia mundial
Como ponte para as soluções na sociedade da informação, temos as tecnologias digitais
da informação e comunicação, conhecidas como TICs, definidas por Castells (1999) como a
convergência de tecnologias em microeletrônica, computação (software e hardware),
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telecomunicações (radiodifusão e opto eletrônica), engenharia genética e seu conjunto de
desenvolvimentos e aplicações. Estas tecnologias vêm como auxílio para os setores públicos que
buscam melhorar a eficiência e eficácia. Além disso, são essenciais para o suporte e
acompanhamento de servidores que trabalham em regime de teletrabalho e seus gestores.
Assim, Ribeiro e Rodrigues (2004) apontam que os sistemas de informação estão disseminados
em todas as esferas de governo, proporcionando a prestação de serviços com agilidade e
eficiência.
Os livros, fonte de disseminação do conhecimento, podem ser produzidos no meio
acadêmico pelas Editoras Universitárias. Segundo a Associação Brasileira das Editoras
Universitárias (ABEU, 2019), “o produto principal das nossas associadas é o livro acadêmico-
científico, resultado de pesquisas em âmbito nacional e internacional”. A qualificação dos
gestores destas editoras pode ser comprovada em recente pesquisa realizada pela Revista de
Administração do UNIFATEA (RAF): “identificou-se que, na maioria das editoras universitárias
públicas brasileiras, existe um número significativo de gestores que possuem experiência prévia
em gestão e em organização e publicação de livros, bem como alto grau de qualificação”
(UNIFATEA, 2018, p. 146).
No estado da Paraíba, encontramos a Editora Universitária da Universidade Federal da
Paraíba (EDUFPB), que produz livros oriundos de trabalhos acadêmicos de Graduações e Pós-
Graduações, escritos no cenário da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). As propostas
enviadas pelas coordenações dos cursos são submetidas a um edital para publicação.
Posteriormente, são validadas por um conselho editorial interno. Assim, é gerado um conjunto
de arquivos brutos
i
que se tornarão livros. Estes arquivos, após correção linguística realizada
pelo servidor que ocupa a função de Revisor de Textos, são direcionados para os Técnicos em
Artes Visuais, que diagramam dentro dos padrões de um livro e desenvolvem a capa do mesmo.
Os servidores que ocupam a função de Técnicos em Artes Visuais desempenham em suas
atividades as atribuições de um Designer Gráfico. Villas-Boas (1999, p.11) define o Designer
Gráfico como “[...] a atividade profissional e a consequente área de conhecimento cujo objeto é a
elaboração de projetos para reprodução por meio gráfico de peças expressamente
comunicacionais”. Cardoso (2004, p.4) diz que “a origem mais remota da palavra está no latim
designare, verbo que abrange ambos os sentidos, o de designar e o de desenhar. Percebe-se que,
do ponto de vista etimológico, o termo já contém nas suas origens uma ambiguidade, uma tensão
dinâmica, entre o aspecto abstrato, de conceber/projetar/atribuir, e outro concreto, de
registrar/configurar/formar. Sendo assim, um designer gráfico utiliza todos esses
conhecimentos para realizar diversos trabalhos, como a diagramação de um livro.
Compreende-se que a função de Designer Gráfico/Técnico em Artes Visuais tem
como objetivo desenvolver peças gráficas, para impressão ou para uso digital, por meio
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da utilização correta de softwares específicos, fazendo uso de planejamento e
criatividade na composição da mesma. A função de Revisor de Textos também é apta
para o teletrabalho devido à sua autonomia, pois requer um computador compatível
com as configurações necessárias para execução dos softwares e acesso à Internet para
comunicação e pesquisa. Rosenfield e Alves (2011, p. 223) afirmam que “[...] atividades
profissionais que envolvem criação e inovação podem ser consideradas mais livres e
autônomas, pois também são controlados o conteúdo e os procedimentos de trabalho
por parte do próprio trabalhador”. Portanto, diante do exposto, considera-se que tais
funções são aptas para o regime de teletrabalho.
De Masi (2000. p. 212) aborda questões inerentes ao teletrabalho, mostrando
que,
Para as empresas, benefícios em termos de flexibilidade, produtividade e
criatividade; para os trabalhadores há benefícios em termos de autonomia,
condições físicas, relações familiares, boa vizinhança e acesso ao trabalho
(sobretudo para deficientes físicos, anciãos, donas de casa); para a coletividade,
benefícios em termos de redistribuição geográfica e social do trabalho,
redução do volume de trânsito, estímulos à criação de novos trabalhos,
revitalização dos bairros, redução da poluição e das despesas de manutenção
viária, eliminação das horas de pico etc.
Em busca do uso mais racional dos recursos públicos, e da economia de itens básicos,
como energia e água, algumas funções contidas no serviço público podem se modernizar, por
meio de aparatos tecnológicos e de comunicação para realização das suas tarefas diárias, sem
comprometer a produção, eficiência e o desempenho de suas atribuições.
Tomando como suporte as definições explanadas sobre o teletrabalho, é possível afirmar
que a implantação desse sistema de trabalho, com o auxílio das TICs, para os técnicos em artes
visuais e o revisor de textos da EDUFPB pode trazer vantagens, não apenas no que diz respeito à
qualidade de vida dos trabalhadores, mas, sobretudo, quanto à economia de insumos. Além
disso, traz mais eficiência e rapidez na diagramação dos livros, pois minimiza problemas atuais,
como falta de energia, instabilidade da internet e rede interna, bem como a alternância de
computadores para atender a todos os designers.
Portanto, a partir da análise do fluxo desde o recebimento do arquivo enviado pelo autor
para a revisão textual até o envio para a impressão final do livro, ou até a publicação on-line, isto
no caso dos e-books, o presente estudo tem como objetivo investigar a viabilidade da
implantação do teletrabalho para os servidores da Editora Universitária da Universidade Federal
da Paraíba (EDUFPB), a princípio para as funções responsáveis pela revisão linguística e pela
diagramação dos arquivos, identificando se estas tarefas podem ser desenvolvidas remotamente,
no domicílio dos servidores, por meio das tecnologias existentes como suporte e monitoramento
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das atividades. Com isso, busca elencar as vantagens da adoção do teletrabalho para a EDUFPB,
para os servidores destas atividades, e, posteriormente, para Universidade como um todo.
2 METODOLOGIA
Para alcançar o objetivo deste trabalho, foram adotados os seguintes procedimentos:
Revisão bibliográfica, buscando livros, artigos, teses e dissertações que versam sobre o tema;
Identificação e delimitação das atividades dos servidores que ocupam as funções de Técnico em
Artes Visuais e de Revisor de Textos; Prospecção de teletrabalho.
A partir destas observações e leituras, o presente estudo tem como objetivo
principal realizar uma prospecção de teletrabalho para a Editora Universitária da UFPB,
fazendo uso de TICs e apontando um novo esquema de trabalho, com foco na melhoria
da qualidade do trabalho e na redução dos prazos, atendendo as necessidades atuais da
EDUFPB. A coleta de dados foi complementada pelo levantamento de fontes
documentais da EDUFPB.
3 O TELETRABALHO
O teletrabalho consiste na realização das tarefas desempenhadas pelo funcionário
em local distinto da sede da empresa e em horário flexível e estabelecido pelo próprio
funcionário, estando diretamente relacionado com o uso de Tecnologia da Informação e
Comunicação (TIC), a fim de cumprir tarefas já estabelecidas pelos seus gestores. O
nome teletrabalho vem do termo "telecommuting", utilizado por Nilles, o qual define que
“Teletrabalho é todo aquele tipo de função que independe de localização geográfica.
Utiliza de ferramentas telecomunicacionais e de informação para assegurar um contato
direto entre o teletrabalhador e o empregador” (NILLES, 1997, p.35). Também podemos
observar estas características nos apontamentos de Sarsur et al. (2004, p. 4), pois ele
afirma que o teletrabalho é “uma modalidade de labor realizado pelo trabalhador
(autônomo ou empregado) em local distinto da empresa. Mudam as concepções de
espaço (desterritorialização) e de tempo (desprendido do aqui e agora)”.
No Brasil, a Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades (SOBRATT),
em seu portal web, traz a seguinte definição:
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[...] todo e qualquer trabalho realizado a distância (tele), ou seja, fora do local
tradicional de trabalho (escritório da empresa), com a utilização da tecnologia
da informação e da comunicação, ou mais especificamente, com computadores,
telefonia fixa, celular e toda tecnologia que permita trabalhar em qualquer
lugar e receber e transmitir informações, arquivos de texto, imagem ou som
relacionados à atividade laboral. (SOBRATT, 2019).
A Organização Internacional do Trabalho - O.I.T. destaca que a tecnologia
existente pode auxiliar ainda mais nesta modalidade de trabalho, mas também requer
alguns cuidados:
A expansão do uso de tecnologias digitais, como smartphones, tablets, laptops e
computadores desktop para trabalhar a distância (seja em casa ou em outros
lugares) está rapidamente transformando o modelo tradicional de trabalho.
Essa tendência pode melhorar o equilíbrio entre a vida profissional e a pessoal,
reduzir o tempo de deslocamento e aumentar a produtividade, mas também
pode resultar em horas de trabalho mais longas, maior intensidade de trabalho
e interferência no trabalho e em casa [...]
ii
Entre as inúmeras vantagens, a O.I.T. cita alguns exemplos, como:
[...] A flexibilidade de horário oferece a possibilidade aos teletrabalhadores de
encarregar-se das obrigações familiares, cumprir suas obrigações ou
programar suas reuniões sem perder um dia completo de trabalho.
O teletrabalho também permite que os empregadores economizem dinheiro
com o consumo de energia, bens imóveis ou custos de relocalização. [...] é
benéfico tanto para o empregador como para o trabalhador.
Em primeiro lugar, aumenta a satisfação pessoal do empregado: livres da
agitação diária de ter que percorrer longas distâncias, os trabalhadores podem
encontrar mais facilmente um equilíbrio entre a vida privada e o trabalho e o
tempo que perderiam parados no trânsito pode ser dedicado a trabalhar para a
empresa. Os estudos demonstram que o teletrabalho reduz a rotatividade de
pessoal, o que se traduz em economia [...]
iii
A publicação do ano 2000, que vem com apontamentos, projeções e possíveis
soluções para o desenvolvimento informacional no Brasil, Sociedade da Informação no
Brasil - Livro Verde, nos mostra uma breve definição sobre a evolução do mercado de
trabalho e o teletrabalho:
Condição para haver teletrabalho é a separação do trabalhador do ambiente
tradicional, ou seja, do local físico do escritório, o que desestrutura também o
tempo de trabalho: esses trabalhadores passam a dispor de horários flexíveis
para realização de suas tarefas. O teletrabalho constitui, também, uma nova
abordagem do trabalho por parte dos indivíduos diante da possibilidade de se
estabelecerem novos tipos de vínculos e relações de trabalho com os
empregadores. (TAKAHASHI, 2000, p. 22).
Serra traz alguns apontamentos referentes às possíveis desvantagens que podem
ser encontradas na execução do teletrabalho:
Isolamento social (quando o trabalho é feito em casa a tempo inteiro); redução
dos contactos com os colegas de trabalho e a hierarquia; [...] degradação da vida
familiar, devido à intrusão do trabalho no lar; apagamento da diferenciação
entre trabalho e lazer; maiores possibilidades de conflitos familiares no
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alojamento (quando o teletrabalho é feito); maior dificuldade de defesa dos
seus interesses laborais e profissionais (o contrato de trabalho tende a ser
individual, dificultando ou impedindo as reivindicações colectivas);
parcelarização do trabalho; aumento do trabalho a tempo parcial; controle
invisível e omnipresente pelo computador central; menos oportunidades de
promoção. (SERRA, 1996, p. 18).
De acordo com os apontamentos feitos por Serra (1996), é possível identificar
que os pontos negativos do trabalho realizado em casa estão muito mais ligados à
disciplina e organização individual do servidor em relação à gestão de tempo, ambiente,
horário, entre outros, do que propriamente ao fato da realização de sua atividade.
Dentro de uma visão otimista, Domenico De Masi (2000, p. 263) afirma:
Para as empresas há benefícios em termos de flexibilidade, produtividade e
criatividade; para os trabalhadores há benefícios em termos de autonomia,
condições físicas, relações familiares, boa vizinhança e acesso ao trabalho
(sobretudo para deficientes físicos, anciãos, donas de casa); para a coletividade,
benefícios em termos de redistribuição geográfica e social do trabalho,
redução do volume de trânsito, estímulos à criação de novos trabalhos,
revitalização dos bairros, redução da poluição e das despesas de manutenção
viária, eliminação das horas de pico etc.
As funções em que os indivíduos necessitam basicamente da utilização de
softwares para execução de suas tarefas podem ser realizadas a distância, e, assim,
trazem benefícios. Nesse contexto, uma economia de grande impacto será gerada pela
redução dos custos de serviços fixos mensais, tais como: energia elétrica, água, material
de higiene e limpeza, além da redução de custos sazonais, como: manutenção de
máquinas, material de expediente, aquisição de mesas e cadeiras para compor o
ambiente de trabalho, entre outros. Deste modo, haveria economia significativa de
verbas públicas. A eficiência também deve ser levada em conta, pois haveria mais
agilidade na resposta às demandas existentes, tendo assim um ganho de produtividade,
já que os servidores estariam mais focados e longe de distrações que ocorrem quando se
trabalha na coletividade.
Para os servidores, podemos listar inúmeras vantagens, tais como: aumento da
qualidade de vida, diminuição dos custos e do tempo de deslocamento, flexibilidade de
horário, entre outros apontados por Jardim (2004, p. 42):
[...] a) o aumento de seu tempo livre, devido à diminuição do tempo gasto com o
trajeto casa-empresa/empresa-casa; b) a flexibilidade na organização do tempo
de trabalho, que respeitará o biorritmo do trabalhador; c) a flexibilidade no
local de trabalho; d) a redução de custos com transportes e combustíveis; e) a
ampliação de seu tempo de convivência com amigos, familiares e comunidade
onde vive; f) mais oportunidades de trabalho para portadores de deficiência
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física; g) integração de portadores de imunodeficiência e enfermidades
infectocontagiosas, pessoas que habitualmente sofrem grandes discriminações
em seus locais de trabalho; h) maiores possibilidades de inclusão no mercado
de trabalho, de mulheres, de trabalhadores que precisam cuidar de filhos, de
pessoas doentes ou de pessoas que estejam sob seus cuidados [...].
Deste modo, podemos observar que o teletrabalho em funções que podem ser
realizadas a distância traz benefícios não apenas para o servidor, mas também para a
instituição. No caso da Editora Universitária da UFPB (EDUFPB), estas vantagens aqui
listadas trazem benefício para a população, visto que a boa utilização de verba pública e
a economia gerada afetarão indiretamente a comunidade acadêmica.
4 PERCEPÇÃO DO TELETRABALHO NA EDITORA UFPB: PLANO DE ARTICULAÇÃO
PARA A INSTITUIÇÃO
Conforme Bufrem (2015, p. 239), uma Editora é um sistema de relações, que se
destina a produzir certa obra, um trabalho coletivo cujo ato fundamental, a edição, é
comunicar algo que deve ser publicado”. Marques (2010. p. 333) afirma acerca de
Editoras Universitárias que, “por meio da publicação, o saber científico se torna público.
E o saber público é a essência da universidade moderna”. Esta publicação também pode
ser chamada de livro universitário, que, segundo Martins Filho e Rollemberg (2001.
p.49), “deve representar, antes de tudo, a imagem institucional, o trabalho dos
professores e pesquisadores de uma instituição, de tal forma que seu crédito ou
descrédito reflitam esta instituição”.
Cavalcante (2018 apud OLIVEIRA; LIMA, 2014) diz que, com 56 anos de atividade,
a Editora UFPB ultrapassa os mil títulos publicados, conquistando seu espaço entre as
demais editoras universitárias do país, sendo um órgão suplementar, de natureza
técnica, vinculada diretamente à Reitoria da UFPB (UNIVERSIDADE FEDERAL DA
PARAÍBA, 1979). A EDUFPB está regulamentada pela Resolução 388/1979 do
Conselho Universitário da UFPB (CONSUNI/UFPB), atendendo assim aos parâmetros
legais exigidos.
A EDUFPB trabalha com a publicação para impressão e para publicação on-line
no site da Editora, onde é possível a realização de download, categorizada por Cavalcante
e Lima (2016, p. 28) em quatro tipos, sendo eles:
a) Livros: Publicações não periódicas, de autoria individual ou coletiva;
b) Livretos: Materiais produzidos por docentes da UFPB, para uso didático nas
atividades de ensino, pesquisa e extensão;
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c) E-books: Livros em formato digital;
d) Anais de Eventos: Anais com resumos e/ou textos integrais de trabalhos
apresentados em eventos organizados pela UFPB.
Para a produção de um livro, é necessário um trabalho em conjunto de vários
servidores e várias etapas a serem cumpridas. No fluxograma 1, podemos ter uma visão
geral desses processos.
Fluxograma 1 Visão geral da editoração da EDUFPB
Fonte: Elaboração Própria, 2019.
Dentro dessa visão geral proposta no Fluxograma 1, é possível descrever melhor
algumas funções, as quais são passíveis de serem alocadas como teletrabalho, como a do
Revisor de Textos e a do Diagramador.
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O Revisor recebe o manuscrito original desenvolvido pelo(s) autor(s) para
correção linguística. Martins Filho e Rollemberg (2001, p. 85) alertam que “quando um
texto é aprovado para edição, deve-se considerar que o autor forneceu um trabalho
correto, [...] no entanto, não se pode esperar, desse mesmo texto, uma coerência
completa quanto ao uso sistemático de pontuação, acentuação, maiúsculas, minúsculas e
outros realces gráficos (grifos, negritos etc.), citações, abreviaturas, bibliografia etc.”. No
fluxograma 2, são especificadas as atividades inseridas na revisão linguística, que é o
item 9 do fluxograma geral.
Fluxograma 2 Revisão linguística
Fonte: Elaboração Própria, 2019.
Após o revisor passar por cada etapa do fluxograma 2, o livro pode ser
considerado de leitura mais concisa, como afirma Martins Filho e Rollemberg (2001, p.
87), ao descrever que a tarefa principal do revisor é facilitar a vida do leitor, dando
unidade e clareza não às ideias, mas ao livro como um todo, dando-lhe, enfim,
consistência”. Esta atividade é realizada com o uso de um computador com programa de
edição de texto, como, por exemplo, Microsoft Word, devidamente instalado, e o auxílio
da internet, para consultas sobre eventuais dúvidas, comunicação com os outros
membros da equipe e para o envio e recebimento dos arquivos. Conforme Olson
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(LEMESLE e MAROT apud SERRA, 1996, p. 15), o trabalho realizado em domicílio
precisa estar dentro de algumas especificações:
1. Limitar (simplificar) ao máximo os equipamentos (exemplo: computador e
telefone);
2. Dar ao indivíduo os meios de controlar o seu ritmo de trabalho;
3. Fazer com que os resultados da actividade sejam facilmente mensuráveis;
4. Preferir as actividades que necessitem de concentração intelectual;
5. Definir planos de trabalho, quando necessário;
6. A actividade não deve consumir demasiadas comunicações de longa
distância.
Portanto, dentro das definições expostas, o Revisor de Textos da EDUFPB pode
desempenhar sua função sem prejuízos ou atrasos a partir de sua residência.
A função de Técnico em Artes Visuais da EDUFPB é composta pelos servidores
que desempenham o papel de Designer Gráfico, mais especificamente de Diagramador.
Nesta função, suas principais atribuições estão divididas em: Diagramar o miolo do livro;
Confeccionar a capa do mesmo; gerar um arquivo final para impressão. Martins Filho e
Rollemberg (2001, p. 91) apontam que “um planejamento visual-gráfico deve fazer com
que uma dada informação se comunique de maneira mais clara e eficaz possível”, o que é
possível através de um projeto gráfico bem definido. Os fluxogramas 3, 4 e 5 expõem o
modo como cada atribuição é realizada e o conjunto dessas atribuições que compõem o
projeto gráfico.
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Fluxograma 3 Diagramação de Miolo
Fonte: Elaboração Própria, 2019.
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A diagramação do miolo (item 11, do fluxograma geral) consiste em preparar a
parte interna do livro, adequando o texto ao formato final, seja um livro impresso ou um
livro digital. Gruszynski (2018, p. 5) fala sobre a autonomia do Designer Gráfico,
mostrando que:
[...] a computação gráfica aumentou as possibilidades de manipulação das
formas e recursos gráficos, centralizando nas mãos do designer gráfico uma
série de decisões que lhe asseguram uma maior autonomia no desempenho de
suas funções. [...] Tais teorias e os objetos gráficos gerados sob sua inspiração
(muitos de modo intencional e consciente, outros tantos impulsionados pelo
contato com a produção de diferentes profissionais) têm sido caracterizados
como design pós-moderno.
A diagramação é realizada no software Adobe InDesign, em que, dentre as vastas
opções de edição voltadas para a diagramação, podemos destacar a possibilidade de
criar páginas com várias colunas com tipografia estilizada e gráficos, imagens e tabelas
avançadas (ADOBE, 2019).
A confecção da capa envolve um trabalho de pesquisa visual, como é possível
observar no fluxograma 4 (item 13, do fluxograma geral), o qual pode ser através da
internet, para concepção de um conceito que será desenvolvido. Gruszynski (2018, p. 6),
ainda comentando sobre o designer gráfico, aponta que “é uma atividade que envolve o
social, a técnica e também significações. Consiste em um processo de articulação de
signos visuais que tem como objetivo produzir uma mensagem”.
Para a concepção da capa é possível utilizar um ou mais softwares simultaneamente: o
Adobe Photoshop, programa destinado ao tratamento de imagens e desenvolvimento de
montagens, descrito no site da empresa como “o melhor software de edição de imagens e
design gráfico” (ADOBE, 2019), o Adobe Illustrator, um software padrão para gráficos
vetoriais permite criar logotipos, ícones, desenhos, tipografia e ilustrações para
impressão, Web, vídeo e dispositivos móveis” (ADOBE, 2019), além do Adobe InDesign,
que também dispõe de recursos para tal tarefa. O designer gráfico é responsável por
definir qual o melhor método e quais softwares serão utilizados para a capa que está
sendo produzida.
Ao final das etapas expostas nos fluxogramas 3 e 4, com as devidas aprovações
por parte do autor, o processo de diagramação chega à etapa de fechamento de arquivo,
o que precede o envio do arquivo para impressão final da gráfica, ou a publicação on-
line, isto no caso dos e-books.
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Fluxograma 4 Concepção da capa
Fonte: Elaboração Própria, 2019.
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Fluxograma 5 Fechamento de arquivo
Fonte: Elaboração Própria, 2019.
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O Técnico em Artes Visuais da EDUFPB, para desempenhar seu papel, precisa de
um computador com softwares específicos e de acesso à internet. É uma função que
envolve diretamente criação e inovação, em que a comunicação com os autores, os
envios e recebimentos de arquivos são realizados via e-mail. Sendo assim, também é
uma função que pode ser realizada por meio do teletrabalho.
No que tange à regulamentação do teletrabalho para estes servidores, o
Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (MP) estabeleceu, em 2018, as
orientações para a implantação do Programa de Gestão pelos órgãos públicos
integrantes do Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal, que é a INSTRUÇÃO
NORMATIVA 1, DE 31 DE AGOSTO DE 2018, publicada no Diário Oficial da União
(DOU) no dia 3 de setembro de 2018, a qual traz as seguintes informações:
A nova IN cria os procedimentos e critérios gerais para os servidores públicos
participantes do programa ficarem dispensados do controle de frequência,
conforme definido no Decreto 1.590, de 10 de agosto de 1995. A
implementação da ferramenta de gestão é facultativa à Administração Pública e
ocorrerá em função da conveniência e interesse do serviço público.
Para participar do programa, as atividades do servidor devem ser mensuráveis
e é necessário o uso de equipamentos e tecnologias que permitam a plena
execução das atribuições remotamente. Também serão avaliadas a
produtividade e os resultados das unidades com servidores envolvidos no
programa.
Entre as modalidades do Programa de Gestão estão:
- semi-presencial: o servidor blico executa suas atribuições funcionais
parcialmente fora das dependências da unidade em alguns dias por semana ou
em turnos por dia.
- teletrabalho: o servidor público executa suas atribuições funcionais
integralmente fora das dependências da unidade.
- por tarefa: o servidor público executa tarefa determinada e por prazo definido
fora ou nas dependências da unidade. Quando concluído o processo, o servidor
fica desligado do programa de gestão.
A adoção do teletrabalho em entidades públicas pode trazer inúmeras vantagens.
Mélo (2016) apud Marques, (2004); Serra, (1996); Bentley e Yoong, (2000), apontam:
a) Redução de Custos - O mais evidente impacto para a instituição se verifica na
redução de custos fixos (de energia elétrica; água; telefone; limpeza; segurança,
etc); e custos variáveis (insumos para escritório; materiais para cozinha e
higiene, etc). Acreditamos que este pico é bastante suficiente para a adoção
do Teletrabalho nas repartições públicas por que vai ao encontro dos anseios
da população no que diz respeito ao gerenciamento eficaz das verbas públicas.
b) Ganhos de Produtividade/foco no resultado - A instituição muda o seu foco
para objetivos e resultados, buscando eficiência. maior produtividade em
função da maior concentração nas tarefas a serem realizadas. A redução do
absenteísmo por doenças leves ou problemas no deslocamento (greves ou
atrasos com transportes públicos) e diminuição das faltas por problemas
pessoais ou familiares, etc, são também apontados por Kugelmass. (Kugelmass,
1996, p. 67).
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c) Aumento da Flexibilidade Organizacional Possibilita a instituição combinar
as competências do teletrabalhador com as necessidades da instituição.
d) Menor rotatividade do pessoal - O teletrabalho proporciona ao funcionário
conciliar a vida pessoal com a profissional, diminuindo os afastamentos por
problemas pessoais. Isso faz com que o quadro de funcionários seja mantido e
se economize evitando recrutamentos e treinamentos de novos funcionários.
e) Formação de equipes especializadas - A flexibilidade de horário e local de
trabalho proporciona uma sistemática aprazível e atrativa para a formação e
manutenção de equipes de especialistas nas áreas contempladas com o
teletrabalho.
f) Agilidade no atendimento das demandas - Os procedimentos são executados
com agilidade pelos colaboradores em virtude da não distração em seus
escritórios em casa.
Por meio destas informações, é notório que a EDUFPB pode adotar o teletrabalho
para seus servidores que ocupam as funções de Revisor de Textos e de Técnico em Artes
Visuais, a fim de obter vantagens para a própria EDUFPB, economia para o serviço
público, além de trazer qualidade de vida para os servidores.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No mundo globalizado, cada vez mais se buscam alternativas viáveis para
otimização de trabalho, de modo que a instituições possam ganhar em economia de
recursos e em qualidade e eficácia dos serviços desempenhados, e seus funcionários
possam ganhar qualidade de vida e diminuir o estresse do dia a dia no trajeto de sua
casa para a estação de trabalho. Nesse contexto, o teletrabalho é uma opção para aqueles
que desempenham função ligada diretamente ao uso de tecnologias e ao uso de
computadores para produção de suas atividades. No serviço público não é diferente, e a
economia abrange toda a sociedade, pois os recursos economizados com menos uso de
energia, material de escritório, consumo de internet, manutenção de computadores e
hardwares, entre outros, podem ser redirecionados para outras atividades.
As Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDICs) vêm como ponte
para que o teletrabalho possa ser realizado de forma harmoniosa, de modo que os
gestores possam acompanhar on-line junto aos servidores como está o andamento das
atribuições que lhes foram dadas, bem como estabelecer prazos e orientar os servidores
no caso de dúvidas.
A Editora Universitária da Universidade Federal da Paraíba EDUFPB, que hoje
trabalha na produção de livros acadêmicos impressos e on-line, pode fazer uso das
TDICs para realizar o acompanhamento das atividades exercidas pelos servidores que
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ocupam os cargos de Revisor de Textos e de Técnico em Artes Visuais, os quais podem
realizar suas atribuições no modelo de teletrabalho, trazendo assim melhorias para o
serviço público.
No ano de 2018, foi regulamentado, pelo Ministério do Planejamento,
Desenvolvimento e Gestão (MP), o regime de teletrabalho para funcionários públicos
que exerçam suas atribuições com o uso de equipamentos e tecnologias, de modo que
elas possam ser desempenhadas remotamente de forma integral.
Diante do exposto, constata-se que a EDUFPB tem condições viáveis de implantar
o sistema de teletrabalho para estas funções já descritas, a fim de caminhar para o
futuro, trazendo benefícios não apenas para seus servidores, mas para o serviço público
como um todo, gerando economia dos mais variados recursos, que vão desde o material
de higienização das salas hoje utilizadas até a economia de manutenção de hardware e
ocupação de espaço físico.
Com as informações obtidas até o momento, sugere-se o desenvolvimento
de trabalhos futuros que tracem uma estratégia de implantação do teletrabalho para os
servidores citados pertencentes à EDUFPB, para que estes desenvolvam suas funções de
forma satisfatória, bem como traçar um cronograma de trabalho mensal a ser cumprido,
apontando as etapas de entrega de material.
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DA EXCLUSÃO AO ACESSO À EDUCAÇÃO: o papel da informação na inclusão da PcD
na Universidade
FROM THE EXCLUSION TO THE ACCESS TO EDUCATION: the role of information in the
inclusion of the PcD in the University
Giulianne Monteiro Pereira
1
Izabel França de Lima
2
1
Mestre em Ciência da Informação
(PPGCI/UFPB), e Bibliotecária da UEPB
E-mail: giulianne.monteiro@gmail.com
2
Doutora em Ciência da Informação pela UFMG,
Professora do PPGCI e do PPGOA/UFPB
e-mail: belbib@gmail.com
ACESSO ABERTO
Copyright: Esta obra está licenciada com uma
Licença Creative Commons Atribuição 4.0
Internacional.
Conflito de interesses: As autoras declaram
que não há conflito de interesses.
Financiamento: Não há.
Declaração de Disponibilidade dos dados:
Todos os dados relevantes estão disponíveis
neste artigo.
Recebido em: 20/09/2019.
Revisado em: 01/10/2019.
Aceito em: 10/10/2019.
Como citar este artigo:
PEREIRA, G. M.; LIMA, I. F. Da exclusão ao acesso
à educação: o papel da informação na inclusão
da PcD na universidade. Informação em Pauta,
Fortaleza, v. 4, n. especial, p. 152-175, nov. 2019.
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-
3468.ip.v4iEspecial.2019.42612.152-175.
RESUMO
Trabalho de cunho exploratório com abordagem
qualitativa, que tem como objetivo analisar,
através de memórias individuais e coletivas de
pessoas com deficiência (PcD), como se deu o
seu processo de inserção na educação básica,
bem como as principais dificuldades enfrentadas
e desafios superados por estes ao longo de sua
trajetória escolar. Como técnica para coleta dos
dados, foi utilizada a entrevista, na perspectiva
da História oral temática, em que as perguntas
feitas aos entrevistados eram relacionadas à sua
trajetória escolar-acadêmica, desde a educação
básica ao ensino superior. Apresenta conceitos e
contextualiza historicamente o direito à
educação da pessoa com deficiência no Brasil.
Concluiu-se que, apesar de todas as dificuldades
e desafios ainda existentes, o processo de
educação inclusiva tem avançado em questão de
acesso à educação no país, tanto no âmbito de
ensino de base como no ensino superior, e que a
informação detém um papel muito importante
nesse processo de inclusão.
Palavras-chave: Inclusão social. Ensino
Superior. Pessoa com deficiência. Informação.
ABSTRACT
This is an exploratory study with a qualitative
approach, which aims to analyze, through
individual and collective memories of people
with disabilities (PcD), how their insertion
process in basic education took place, as well as
the main difficulties and the challenges were
faced and overcome by them throughout their
school career. As a technique for data collection,
the interview was used from the perspective of
thematic oral history, in which the questions
asked to the interviewees were related to their
academic-academic trajectory, from basic
education to higher education. It presents
concepts and historically contextualizes the right
to education of people with disabilities in Brazil.
Inf. Pauta
Fortaleza, CE
v. 4
n. especial
nov. 2019
ISSN 2525-3468
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-3468.ip.v4iEspecial.2019.42612.152-175
ARTIGO
Pereira; Lima | Da exclusão ao acesso à educação
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Despite all the remaining difficulties and
challenges, it was concluded that the process of
inclusive education has advanced in terms of
access to education in the country, both in basic
and higher education, and that information has a
very important role in this inclusion process.
Keywords: Social inclusion. University
education. Person with disabilities. Information.
1 INTRODUÇÃO
Muito antes de o Egito florescer como um grande império no mundo antigo, as
pessoas com deficiência sentem e conhecem de perto a exclusão, uma vez que as
principais atividades produtivas eram a agricultura e o comércio, entre outras
atividades que demandavam esforço físico. Acredita-se que isso pode ter sido por muito
tempo a razão para a exclusão de muitos deficientes.
Durante o período colonial, apesar de no Brasil não existirem grandes instituições
de internação para pessoas com deficiência (PcD), usavam-se práticas isoladas de
exclusão, que se configuravam pelo confinamento pelas famílias das pessoas com
deficiência e, em caso de desordem pública, recolhidas às Santas Casas ou às prisões
(LANNA JÚNIOR, 2010).
Nesse contexto, percebe-se que a pessoa com limitações funcionais e
necessidades diferenciadas era praticamente exterminada por meio do abandono, [o que
naquela época] não representava um problema de natureza ética ou moral” (ARANHA,
2005, p. 7).
As pessoas com deficiência eram totalmente excluídas e predominava o “modelo
de rejeição social”, descrito por Sassaki (2012) como um período em que as pessoas com
deficiência eram abandonadas, excluídas da sociedade. Essa concepção foi mais presente
até a metade do Século XIX. Nesse período, a pessoa com deficiência não tinha acesso à
educação e era totalmente marginalizada.
No Brasil, havia nessa época somente os hospitais e hospícios para ‘alienados’.
Apenas no finalzinho do século XIX foram fundados o Imperial Instituto dos Meninos
Cegos’ (1854) e o ‘Imperial Instituto dos Surdos-mudos’ (1856). Durante essa época,
apenas os cegos e os surdos foram contemplados com ações educacionais. Em 1889, com
a proclamação da República, esses institutos tiveram suas nomenclaturas alteradas para
‘Instituto Nacional dos Cegos’ e ‘Instituto Benjamin Constant’, respectivamente, como
continuam até hoje.
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O processo de inclusão das pessoas com deficiência nas escolas, universidades e
outros âmbitos educacionais, no Brasil, é dividido por Sassaki (2012) em quatro etapas:
exclusão, segregação, integração e inclusão. Cada etapa possui suas características
marcantes.
Por outro lado, deve-se ressaltar que o direito à educação, no Brasil, é uma
condição estabelecida pela Constituição Federal. Atualmente, este direito tem se tornado
uma realidade, por meio das políticas públicas governamentais e institucionais, que
contemplam a garantia do direito à educação para as pessoas com deficiência, processo
este que vem sendo denominado de ‘educação inclusiva’.
Este processo vem avançando, buscando fugir do modelo de educação
compensatória, rompendo com as barreiras da chamada “educação especial”, como se
reporta o próprio Ministério da Educação, que ressalta:
Observa-se maior resistência para inclusão em escolas e instituições que ainda
se apoiam no modelo dico da deficiência, em técnicas de reeducação,
educação compensatória ou de prontidão para inclusão. O conceito de
necessidade educacional especial vem romper com essa visão reducionista de
educação especial centrada no déficit, na limitação, na impossibilidade do
sujeito de interagir, agir e aprender com os demais alunos em ambientes o
menos restritivos possíveis (BRASIL, 2006, p. 11).
Os indivíduos com alguma deficiência e que necessitam de algum artifício
especial no processo educacional podem ser chamados de pessoas com necessidade
educacional especial PNEE, ou seja, apresentam alguma dificuldade de aprendizagem
ou deficiência, seja sensorial, física, motora ou intelectual.
À luz dessa asseveração, Palhares (2012, p. 1, grifo nosso) enfatiza que:
Durante os últimos anos o nosso sistema educativo dedicou-se e dedica-se às
necessidades educativas especiais (NEE) de alunos [com] algum tipo de
deficiência ou dificuldade de aprendizagem. O conceito de NEE passou a ser
conhecido em 1978 a partir da sua formulação no ‘Relatório Warnock’,
apresentado ao parlamento do Reino Unido, pela Secretaria de Estado para a
Educação e Ciência, Secretaria do Estado para a Escócia e a Secretaria do Estado
para o País de Gales. Este relatório foi o resultado do 1.º comitê britânico
constituído para reavaliar o atendimento aos deficientes, presidido por Mary
Warnock.
Dessa forma, nos últimos anos, pôde-se presenciar uma preocupação crescente
com essa demanda da sociedade, com a criação de leis e ações direcionadas para
promoção da acessibilidade. Ocorre que, mesmo com a implementação destas ações,
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para que a inclusão dessas pessoas aconteça de fato, é preciso que sejam tão
amplamente divulgadas ou percebidas pela sociedade de uma forma geral.
Diante dos avanços tecnológicos, bem como da criação de políticas e ações
voltadas para as pessoas com deficiência, tem se percebido a real possibilidade do
ingresso dessas pessoas ao Ensino Superior no Brasil. Tal demanda, por muitos anos, foi
aparentemente esquecida, mas tem conseguido reconhecimento da Sociedade pela sua
capacidade intelectual e capacidade de interação profissional.
Nesse ínterim, pretende-se, com esse trabalho, analisar, através de memórias
individuais e coletivas, como se deu o processo de inserção de pessoas com deficiência
no ensino superior, bem como as principais dificuldades enfrentadas por estes.
2 METODOLOGIA
O presente trabalho caracteriza-se como exploratório com abordagem
qualitativa. Minayo (2010, p. 21) explica que a pesquisa qualitativa:
[...] se ocupa, nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não pode ser
quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos,
das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes. Esse conjunto de
fenômenos humanos é entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser
humano se distingue não por agir, mas por pensar sobre o que faz e por
interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com
seus semelhantes.
A pesquisa qualitativa, na perspectiva de Minayo (2010), ajuda o pesquisador a
entender melhor os fenômenos humanos, definidos como parte de uma realidade social.
Isso corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos
fenômenos que o podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis
quantificáveis.
Os sujeitos participantes dessa pesquisa, compreendidos como atores sociais, se
constituem como parte fundamental para a execução desta escrita, pois se trabalhou
com base nas memórias e experiências que esses sujeitos tiveram/estão tendo durante
sua trajetória de vida, principalmente, no tocante ao acesso ao sistema de educação
básica.
O instrumento de coleta dos dados foi a entrevista na perspectiva da História oral
temática, em que as perguntas feitas aos entrevistados eram relacionadas à trajetória
escolar-acadêmica, desde a educação básica até o ensino superior.
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Na História oral temática, de acordo com Meihy e Holanda (2011), se escolhem
perguntas que se referem a um determinado tema e mais proximidade com as
entrevistas tradicionais. No entanto, diferencia-se na apresentação de um conjunto de
procedimentos de etapas.
Conforme Meihy e Ribeiro (2011), o que caracteriza a entrevista em história oral
é a forma lógica com que os processos são organizados através de um projeto inicial. Tal
projeto funciona como um mapa de pesquisa e prevê:
1. planejamento da condução das gravações segundo indicações
previamente feitas. 2. respeito aos procedimentos do gênero escolhido e
adequado de história oral; 3. tratamento da passagem do código oral
para o escrito, no caso da elaboração de um texto final para a pesquisa
ou escritura de um livro; 4. conferência da gravação e validação; 5.
autorização para o uso; 6. arquivamento e/ou eventual análise; 7.
sempre que possível, publicação dos resultados em: catálogos,
relatórios, textos de divulgação, sites, documentários em vídeo ou
exames analíticos como dissertações ou teses. (MEIHY; RIBEIRO, 2011,
p. 13).
No cenário acadêmico, o registro da memória vem sendo um recurso de coleta de
dados bastante utilizado, mais especificamente, nas pesquisas de abordagem qualitativa.
Quando atreladas ao método da história oral, tornam-se parte fundamental do processo
de pesquisa (PEREIRA, 2016).
A metodologia utilizada para análise dos dados empíricos foi a ‘análise de
conteúdo temática’, seguindo a perspectiva de Minayo (2010), que divide essa análise
nas seguintes etapas: pré-análise, exploração do material e tratamento dos
resultados/interferência/interpretação.
Objetivando proporcionar um melhor entendimento, o Quadro 1 apresenta cada
uma das etapas definidas por Minayo (2010) e suas respectivas descrições
(processo/objetivo).
Quadro 1- Trajetória da Análise de Conteúdo Temática
ETAPA
PROCESSO
OBJETIVO
Pré-análise
Leitura compreensiva do
conjunto do material
selecionado, de forma exaustiva.
(Leitura exaustiva das
transcriações das entrevistas.)
a) Ter uma visão de conjunto; b) apreender
particularidades do conjunto do material; c)
elaborar pressupostos iniciais que servirão de
baliza para a análise e a interpretação do material;
d) escolher formas de classificação inicial; e)
determinar os conceitos teóricos que orientarão a
análise.
Exploração do
material
Análise propriamente dita.
(Definição dos eixos)
a) Distribuir trechos, frases ou fragmentos de cada
texto; b) fazer uma leitura dialogando com as
partes dos textos da análise; em cada classe; c)
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ETAPA
PROCESSO
OBJETIVO
identificar, através de inferências, os núcleos de
sentido apontados pelas partes dos textos; d)
dialogar os núcleos de sentido com os
pressupostos iniciais e se necessário realizar
outros pressupostos; e) analisar os diferentes
núcleos de sentido presentes nas várias classes do
esquema de classificação para buscar temáticas
mais amplas ou eixos em torno do quais podem
ser discutidas as diferentes partes dos textos
analisados; f) reagrupar as partes dos textos por
temas encontrados; g) elaborar uma redação por
tema, de modo a dar conta dos sentidos dos textos
e de sua articulação com os conceitos teóricos que
orientam a análise. Nessa redação podemos
entremear partes dos textos de análise com nossas
conclusões, dados de outros estudos e conceitos
teóricos.
Tratamento
dos
resultados
obtidos e
intepretações
Análise e interpretação dos
conteúdos.
(Estabeleceu-se articulação
entre os conceitos e os
referenciais teóricos da
pesquisa, respondendo aos
objetivos da pesquisa.)
Criar discussões, interpretações e analisar para
atingir o objetivo proposto.
Fonte: Elaboração própria, adaptado de Minayo (2010).
A análise dos dados foi realizada tendo por base as memórias individuais e
coletivas das pessoas com deficiências entrevistadas.
3 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA E O DIREITO À EDUCAÇÃO
No Brasil, culturalmente, se diz que muitas leis ficam apenas no papel, cabendo ao
governo, aos gestores e à sociedade colocarem em prática. O processo de inclusão não
acontece da noite para o dia, ainda se faz necessário sensibilizar, informar as pessoas e
fiscalizar para que as pessoas com deficiência possam, de fato, ter seus direitos
garantidos, desde o acesso à educação, saúde, informação, etc., e sentirem-se incluídas
na sociedade.
Nesse sentido, é preciso observar como se deu o processo de inclusão das pessoas
com deficiência nas escolas, universidades e outros âmbitos educacionais no Brasil. Tal
processo é dividido por Sassaki (2012) em quatro etapas: a exclusão, a segregação, a
integração e a inclusão.
As pessoas com deficiência eram totalmente excluídas e predominava o “modelo
de rejeição social”, descrito por Sassaki (2012) como um período em que as pessoas com
deficiência eram abandonadas, excluídas da sociedade, até metade do Século 19. Nesse
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período, a pessoa com deficiência não tinha acesso à educação e era totalmente
marginalizada.
No Brasil, nessa época, os espaços disponíveis eram apenas os hospitais e
hospícios para “alienados”. Apenas no finalzinho do século XIX foram fundados o
Imperial Instituto dos Meninos cegos (1854) e o Imperial Instituto dos Surdos-mudos
(1856). Durante essa época, apenas os cegos e os surdos foram contemplados com ações
para educação. Em 1889, com a proclamação da república, esses institutos tiveram sua
nomenclatura alterada para Instituto Nacional dos Cegos e Instituto Benjamin Constant,
respectivamente, como continuam até hoje.
A partir do ano de 1910, pessoas com deficiências diferentes da cegueira ou
surdez viviam por caridade e conveniência. Confinavam-se as pessoas com deficiência
em hospitais e instituições terminais, onde eram prestados serviços de abrigo,
alimentação, vestuário, recreação. Essa etapa é denominada como segregação ou modelo
assistencialista (SASSAKI, 2012).
Nessa mesma época foi instalado o primeiro espaço destinado apenas às crianças
com deficiência, o Pavilhão Escola Bourneville. Contudo, até a primeira parte do Século
XX, o Estado não havia promovido tantas ações voltadas às pessoas com deficiência.
Diante da falta de novas ações, iniciativas do Estado, a sociedade civil criou
organizações voltadas para as áreas de educação e saúde, por exemplo: Sociedades
Pestalozzi, Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) e Centros de
reabilitação. (LANNA JÚNIOR, 2010)
A terceira etapa ficou conhecida como integração, iniciada por volta de 1940,
quando foram surgindo alguns “serviços públicos e particulares de reabilitação física e
profissional. Sob a inspiração da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948),
algumas pessoas tiveram a rara oportunidade de receber tais serviços.” (SASSAKI, 2012,
p.3).
Com relação à educação, existiam o Instituto Benjamin Constant e o Instituto
dos Surdos-mudos, que em 1957 passou a ser chamado de Instituto Nacional de
Educação de Surdos (INES), atendendo ainda às necessidades de apenas duas
deficiências.
Entre as décadas de 40 e 50 começaram a surgir outras organizações voltadas
para as pessoas com deficiência, de iniciativa da sociedade civil, e se destinavam a outros
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tipos de deficiência, “com formas de trabalho diferenciadas, por não se restringirem à
educação e atuarem também na saúde.” (LANNA JÚNIOR, 2010, p. 23).
A etapa da integração foi o período que surgiram as associações de pessoas com
deficiência, devidamente apresentada no capítulo 02 dessa escrita, que eram
estritamente voltadas para sobrevivência dos próprios membros, como também o
surgimento do modelo médico da deficiência.
Nessa época, em 1946, surge a Fundação para o Livro do Cego no Brasil,
atualmente denominada Fundação Dorina Nowill para cegos, que tem o objetivo de
possibilitar a educação aos cegos e ampliar o acesso à leitura. Em 1950, acontece um fato
marcante para a época: “o Conselho Nacional de Educação autorizou que estudantes
cegos ingressassem nas faculdades de filosofias.” (LANNA JÚNIOR, 2010).
A quarta etapa, a tão esperada inclusão, se inicia com mais força em 1990, através
de todas as lutas no decorrer dos anos pelos movimentos das pessoas com deficiência,
aqueles movimentos que começaram a surgir em 1979. O maior impacto foi a bandeira
da reabilitação, vista na etapa da integração, e o outro foi o conceito de equiparação de
oportunidades. (SASSAKI, 2012).
Sobre inclusão, Canziani fala que
a inclusão é um paradigma que estabelece que as políticas, programas,
serviços sociais e a própria comunidade devem planificar-se ou adaptar-
se para garantir o desenvolvimento de todas as pessoas, respeitando e
aceitando as diferenças de cada cidadão. (CANZIANI, 2010 apud LANNA
JÚNIOR, 2010, p. 353)
Desde antes de 1990, vêm sendo pensadas, debatidas e criadas ideias e formas
para que a pessoa com deficiência possa exercer de fato o seu direito de acesso à
educação. Em 1978, se falava em garantia à educação especial gratuita, através da
emenda nº 12 de 1978. (LANNA JÚNIOR, 2010)
Os avanços continuam, a luta pelo exercício efetivo do direito à educação
também. No entanto, em pleno ano de 2019, vive-se ainda na perspectiva e na
expectativa da inclusão, na ideia de equiparação de oportunidades e direitos.
4 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA NA UNIVERSIDADE
A educação inclusiva engloba as universidades, não apenas o ensino primário,
fundamental e médio.
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O direito de todos à educação de (forma igualitária) foi proclamada pela primeira
vez pela Declaração dos Direitos Humanos, no ano de 1948 (BRASIL, 1989), sendo
retomada na Constituição Brasileira do ano de 1988 (BRASIL, 1988).
A Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1990), ou constituição cidadã, sinaliza
ainda a implementação da educação inclusiva. Em seu artigo 208, III, a carta Magna
prescreve que [...] “o dever do estado com a educação será efetivado mediante a garantia
de atendimento educacional especializado [às pessoas com deficiência],
preferencialmente na rede regular de ensino, o que não exclui a responsabilidade do
Estado das mesmas obrigações no ensino superior.”
Em 2003, através da portaria nº. 3284, o MEC assegura às pessoas com
deficiência o direito de acessibilidade a todos os níveis de educação.
De acordo com dados divulgados pelo Portal Brasil (2015), a quantidade de
matrículas de pessoas com deficiência na educação superior aumentou, e quintuplicou
entre o período de 2003 e 2014, quando os estudantes com deficiência passaram de
3.705 (três mil setecentos e cinco) no começo do período para 19.812 (dezenove mil
oitocentos e doze) em 2015.
Outro dado que registrou aumento foi o número de Instituições de Ensino
Superior que atendem alunos com deficiência. Esse dado duplicou no mesmo período,
cujo número passou de 1.180 (mil, cento e oitenta) no fim do século passado para 2.378
(dois mil, trezentos e setenta e oito) em 2010. Na época, 1.948 informam disponibilizar
uma estrutura de acessibilidade para os estudantes.
Dessa forma, já é possível observar uma crescente demanda de pessoas com
deficiência/necessidades especiais nas universidades brasileiras, em especial, com as
políticas de cotas atualmente adotadas pelas Instituições Públicas de Ensino Superior
(IPES). Contudo, percebe-se que essas políticas e ações, ditas inclusivas, aparentemente
ainda não são o suficiente para assegurar a consolidação e execução de todos os direitos
garantidos e previstos a pessoa com deficiência (PcD).
Acredita-se que esse aumento expressivo deva-se a toda a luta por leis e normas
punitivas que foram criadas para gestores de escolas ou autoridades que recusarem a
matrícula de um aluno com deficiência na escola regular.
É preciso entender a inclusão não apenas como a viabilização do acesso à
educação no ensino superior, nem como a simples presença do aluno com deficiência em
sala de aula, mas também como a viabilização de acesso a todos os serviços e setores
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oferecidos pela IES, como dado a todo e qualquer discente, independendo de condição
especial.
Defende-se a ideia de que, mais que políticas e ações voltadas para inclusão
dessas pessoas no ensino superior, é necessária uma forma de garantir a sua
permanência nesses espaços, proporcionando-lhes a autonomia, os serviços e recursos
necessários para o seu suporte educacional, bem como a conclusão do curso.
Dentre os serviços para inclusão e permanência desses alunos no âmbito do
Ensino Superior, vale destacar o serviço informacional que a Biblioteca Universitária
(BU) pode e deve exercer na vida acadêmica não apenas desses usuários com
deficiência, mas de todos os usuários, como suporte para a sua formação, oferecendo
subsídios informacionais.
5 OS PRIMEIROS PASSOS PARA EDUCAÇÃO
Foram analisadas experiências de como se deu a trajetória, bem como os desafios
na educação de nível fundamental e médio por parte dos entrevistados. Percebe-se que,
ao longo de todo percurso histórico, a pessoa com deficiência lutou e enfrentou muitas
dificuldades para que o aceso à educação, em qualquer nível, fosse assegurado por meio
de vários instrumentos legais e normativos.
Figura 1 Mapa conceitual O ingresso na Educação básica
Fonte: Dados da pesquisa, 2016.
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Ressalta-se que o direito à educação é assegurado mais de 50 anos, através da
Lei n 4.024 de 1961, que formalizava as Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDBEN). Aquela lei garantia o ‘direito dos excepcionais’ à educação, no sistema geral de
ensino. Entretanto, verificou-se, através de muitas narrativas, que uma lacuna muito
grande entre o que determina a LDBEN e as práticas educacionais desenvolvidas em
pleno século XXI, ferindo inclusive os arts. (inciso IV), 206 e 208, da própria
Constituição Federal, que falam sobre a promoção do bem de todos, sem qualquer forma
de discriminação, além da igualdade de condições de acesso e permanência nas escolas,
bem como a oferta de atendimento educacional especializado na rede regular de ensino,
dentre outros instrumentos que assegurariam esse acesso à educação.
Faz-se extremamente presente nos discursos a inexistência de serviços de
educação acessível, muito menos inclusivo, nas cidades de origem de alguns
entrevistados, sendo necessária a migração para a Capital do Estado em busca de
serviços especializados, sendo por vezes precisa a utilização do sistema de internato.
após o acesso aos serviços especializados no atendimento à respectiva deficiência,
percebe-se que a PcD inicia sua trajetória acadêmica, conseguindo inserir-se no sistema
de ensino, seja ele público ou privado. Esta situação pode ser evidenciada através das
narrativas a seguir.
Eu vim para João Pessoa pra poder estudar, porque na minha cidade não tem
estrutura nem nada assim, nem nada perto para que que eu pudesse ir. Então eu
vim pra para estudar. Estudei, fiquei interna durante muito tempo, agora eu
não lembro quanto tempo, acho que uns 10, 12 anos, no mínimo uns 12 anos no
Instituto dos Cegos [Paraíba], onde eu tive meu primeiro contato com a escola,
onde tive minha alfabetização em braile, e fiquei até a quarta série na
instituição. [...] Depois que eu saí do instituto, na quarta série, eu fui para a escola
regular, eu estudei todo meu fundamental e médio, todo na escola regular, em
escola pública. (Fabrícia)
[...] eu estudei sempre como ouvinte depois de ter perdido a visão, no colégio lá do
interior, em Bananeiras. Então como eu não ia ter condições de dar continuidade
aos estudos por decorrência dos professores não serem preparados para me
assistirem dentro de sala de aula, eu acabei que através da prefeita, na época em
2008, Marta Ramalho, a prefeita da cidade de Bananeiras, conseguiu uma vaga
para mim no Instituto dos Cegos [Paraíba]. Então eu sde lá [Bananeiras] e vim,
ingressei ainda aqui no meio, ou seja, no terceiro bimestre, eu concluí o oitavo,
nono ano do Ensino Fundamental. O Primeiro ano do Ensino médio concluí em
2010 e no mesmo ano eu concluí o ensino médio através de supletivo. (Robson)
Contudo, encontrar uma escola na Capital que fosse “inclusiva” ou pelo menos
“acessível” também não era fácil.
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Seguindo o pensamento de Canziani, a escola inclusiva deve trabalhar na
dimensão da educação para todos, levando em consideração as características e
necessidades individuais de cada aluno (CANZIANI, 2010 apud LANNA JÚNIOR, 2010).
Através de algumas narrativas, pode-se perceber que, ao ter acesso à educação,
alguns se deparavam com muitas barreiras que dificultavam esse acesso pleno,
destacando a questão da acessibilidade arquitetônica e atitudinal.
No ensino fundamental e no ensino médio, eu nunca tive intérprete, acessibilidade
não existia. A Escola se dizia inclusiva e não tinha acessibilidade, acessibilidade
zero. O professor via que eu era deficiente, surda, mas o professor, ele não
entendia como lidar com um surdo, não tinha nenhum tipo de conhecimento,
então aí muitas vezes quando eu escrevia diferente do português o professor
corrigia e colocava uma nota baixa, então eu tive que me esforçar muito.
Estudava muito, eu nunca fui reprovada, eu sempre passava, mas era um esforço
grande, muito esforço para conseguir aprovação. (Hozana)
No ensino fundamental, eu estudei numa escola do primeiro à quarta série, eu
estudei em uma escola que era tudo no térreo, não tive grandes dificuldades não.
Do quinto ao oitavo ano e o ensino médio, eu tive que mudar de escola e no
meu bairro a gente encontrou uma escola que tinha acessibilidade. [...].
(Rafael) [...] se o povo não está preparado hoje, imagine 20 anos atrás. (Paulo)
Destaca-se ainda que, em ambos os casos, seja na situação dos que tiveram que
sair de suas cidades, ou dos que conseguiram de alguma forma adentrar numa rede de
ensino desde cedo, demandava muito esforço próprio do aluno para que ele continuasse
e concluísse o processo de educação de base.
Para facilitar a vida dessas pessoas, a escola poderia se adequar ou ter se
adequado aos padrões de acessibilidade normatizados pela Associação Brasileira de
Normas Técnicas (NBR 9050), que tem como objetivo promover a acessibilidade
arquitetônica (ABNT, 2015).
Quanto à acessibilidade atitudinal, que envolve o comportamento das pessoas
envolvidas nesse processo de inclusão, cabe apenas depender do bom senso e da
conscientização de cada indivíduo envolvido.
Percebe-se ainda que os alunos oriundos de cidades do interior do estado
conseguiram obter acesso a qualquer tipo de estudo ou educação após serem
encaminhados aos serviços especializados em atendimento à sua deficiência. Desta
forma, verifica-se que o Instituto dos Cegos, na capital João Pessoa, desempenhou um
papel importante na orientação pedagógica e no processo de ensino de base, permitindo
aos que procuraram pelo serviço que pudessem finalmente trilhar suas histórias
acadêmicas.
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Ficou perceptível a sede pela educação, quando desde crianças queriam efetivar
seus direitos, até mesmo sem saber quais eram. São memórias que relatam o desejo por
estudar, por querer frequentar uma escola e se efetivar cidadão, como toda pessoa tem
direito.
Desde pequeno que eu queria estudar, via meu irmão indo pro colégio particular,
e ficava com vontade de ir também, que na época, o povo não tinha a
mentalidade que tem hoje, que evoluiu um pouco, não muito, mas evoluiu. Então
minha mãe ficava com medo de me colocar num colégio normal e eu não
acompanhar, e eu sabia que eu podia acompanhar, só que ela [mãe] por receio,
não me colocou, e desde pequeno que eu sempre queria ir para o colégio regular.
Que se chama, normal. [...] Me perguntavam: - “Menino, o que é que tu mais quer?
eu falava “eu quero estudar.” (Paulo)
[...] na época a Presidente do Instituto e não sei como souberam que eu existia
no Sertão, até hoje eu não sei disso por que ela infelizmente ela já faleceu, mas na
época, foi ela e um Senhor que era advogado. Eles foram lá no carro e foram falar,
conversaram com minha mãe, mas por ela eu não vinha, - “não, não vai” e eu
chorei, esperneei, quis por que quis vir. Eu tinha muita vontade de estudar, na
época que eu morava no Sertão eu ia pra escola com o pessoal, pela vontade
mesmo. (Fabrícia)
Além da dificuldade em encontrar uma escola acessível e inclusiva, existia o
receio e a preocupação de alguns pais, acabando por “privar” seus filhos de terem acesso
à educação. Alguns deles só vieram ter acesso à escola quando adolescentes ou adultos.
Então ela tinha receio de me traumatizar, que eu nunca tive medo, porque eu
sempre quis estudar. [...] quando eu fiz 21 anos, quando ela não tinha mais como
impedir, aí ela disse: - “Pronto, você é de maior, você faz se você quiser” que
até hoje eu sempre brigo com ela assim, por que ela sempre tem muito receio de
eu não acompanhar as coisas. (Paulo)
Eu comecei a estudar com 2 anos, então quando eu perdi a audição minha mãe,
me tirou da escola. E ela começou a me ensinar a oralizar, eu não conhecia nada
da Cultura Surda. Minha mãe começou a me ensinar a oralizar, eu precisei
ficar treinando assistindo novelas, assistindo à televisão, mas é muito difícil.
(Hozana)
Quando se cruzam e se comparam essas narrativas com as informações
referenciais e históricas da pessoa com deficiência, percebe-se que o passado de
complicações não ficou tão no passado, afinal.
Uma vez que o conceito e o processo de educação especial e educação inclusiva já
existem há pelo menos 30 anos, reflete-se sobre as dificuldades dessas pessoas em
efetivarem o seu direito de acesso à educação, seja na disponibilização de escolas
inclusivas que estejam realmente preparadas para receber o aluno com deficiência, seja
no aspecto de acessibilidade arquitetônica, seja de aspecto da atitude das pessoas ou
qualquer outra barreira que impeça a inclusão desse aluno naquele meio.
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O acesso à educação nesse momento é relatado como o primeiro grande divisor
de águas na escolha e no início de suas carreiras acadêmicas. Percebe-se ainda que os
recursos tecnológicos desses locais são poucos, ou quase nunca citados.
Deve-se ressaltar que a educão inclusiva é um ponto fundamental para que a
criança comece, desde cedo, uma experiência de convivência com toda diversidade que
existe no social, quando essa pessoa estará muito mais instrumentalizada para a convivência,
para se relacionar com o próximo e para uma vio de mundo mais ampla (LANNA NIOR,
2010).
o aspecto humano é o mais presente em todas as respostas. O incentivo
emanado pelos colaboradores do Instituto dos Cegos é muito presente nas memórias,
tornando o empenho coletivo das pessoas que prestam o serviço um novo ator nas
narrativas. Um ator sem braços, sem rosto, sem cor, mas com alma. Ou seja, a oferta do
serviço em si imprime uma vasta gama de novas possibilidades aos tomadores do
serviço, mas a postura, o empenho e a dedicação no processo, não apenas de
acessibilidade, principalmente, no processo inclusivo, é o que mais fortemente marca as
histórias e memórias na busca pelo acesso à educação e informação.
A narrativa da entrevistada Hozana, em específico, chama atenção, pois, dos
sujeitos entrevistados, foi quem indicou a mais elevada idade para ter início ao acesso ao
processo de educação escolar, sendo aos 18 anos de idade. A deficiência auditiva,
sequela de outra enfermidade, a caxumba, também conhecida como papeira, em terna
infância, mais exatamente, aos 03 (três) anos de idade, exigiu, além do empenho em
aprender a Língua Brasileira de Sinais, LIBRAS, também aprender o idioma português,
requerendo, assim, um processo de alfabetização bilíngue. Um aspecto peculiar fora o
empenho adicional na aprendizagem do processo de oralização, ou seja, da comunicação
verbal, mesmo sem possuir memória auditiva relevante.
Com base nas memórias coletivas dos sujeitos, percebe-se que o esforço para eles
terem acesso à educação partiu de cada pessoa, mesmo sabendo que vários
instrumentos legais ‘garantem’ esse acesso desde a educação de base. Fica evidente que
eles efetivaram esse direito devido ao esforço de cada um, tendo que muitas vezes
deixar seu lar para buscar seus direitos.
As histórias de empenho individual ilustram os relatos nesta pesquisa e
imprimem elevado nível emocional, perspectiva de esperança quanto à inclusão social e
de um futuro melhor.
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Observa-se que muita coisa melhorou no tocante ao acesso à educação. De certa
forma, uma atenção voltada para a educação inclusiva, porém, fazem-se necessários
mais investimentos não apenas em escolas de grande porte, em municípios com mais de
60 mil habitantes, como foi dito por Lanna Júnior (2010): é preciso investir em todas as
escolas, para que a pessoa com deficiência não precise sair de sua cidade para ter acesso
à educação.
6 O INGRESSO NO ENSINO SUPERIOR
O caminho trilhado para se ter acesso à educação de base, bem como ao Ensino
Superior, não foi algo tão simples ou fácil. Através das narrativas, observa-se que alguns
tiveram dificuldades em ingressar a Universidade, por conta dos desafios no ensino de
base, sendo necessário o desprendimento de muito esforço para ingressar à
Universidade.
Figura 2 Mapa conceitual O ingresso no Ensino Superior
Fonte: Dados da pesquisa, 2016.
O direito de acesso ao ensino superior também não é algo recente, já que a
própria Constituição Federal prevê esse direito, asseverando que é dever do Estado
garantir a educação às pessoas com deficiência na rede regular, tendo as mesmas
obrigações quanto ao Ensino superior (BRASIL, 1990).
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No decorrer do tempo, outros documentos surgem com a finalidade assegurar
esse direito, como é o caso da Portaria nº 3.284, de 07 de novembro de 2003, do
Ministério da Educação (MEC), do Decreto 5.626/2005, bem como a Lei 13.146, de 06 de
julho de 2015, que fala:
Art. 27. A educação constitui direito da pessoa com deficiência,
assegurado sistema educacional inclusivo em todos os níveis e
aprendizado ao longo de toda a vida, de forma a alcançar o máximo
desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades físicas,
sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses
e necessidades de aprendizagem.
Art. 28. Incumbe ao poder público assegurar, criar, desenvolver,
implementar, incentivar, acompanhar e avaliar: [...] XIII - acesso à
educação superior e à educação profissional e tecnológica em igualdade
de oportunidades e condições com as demais pessoas;(BRASIL, 2015, p.
4)
O ingresso no ensino superior é, sem sombra de dúvidas, um marco na história de
qualquer estudante. Enfrentar a concorrência pela vaga tão desejada, a ansiedade, a
novidade de estar iniciando, o que provavelmente será sua carreira profissional, é
natural.
A partir de algumas narrativas, podemos visualizar esses sentimentos que se
afloraram quanto ao recebimento da notícia de ingresso na Universidade. Podemos
perceber que todos compartilham de sentimentos bem parecidos. Destacamos a
surpresa, felicidade, satisfação e ansiedade pelo ingresso na UFPB.
Quando soube que havia sido aprovado no curso que queria, a sensação foi de
satisfação, mas de bastante ansiedade também. (Rafael)
Quando soube que havia passado, eu não acreditei não, que eu tinha passado. Não
tinha caído a ficha, [...] eu fiquei meio sem acreditar, não estava confiante de
passar não, então fiquei feliz. (Kelly)
Quando soube que havia passado, eu fiquei sem acreditar, a priori em 17 de
Fevereiro de 2012, eu fiquei sem acreditar que teria passado no vestibular logo
para um curso super concorrido desse. (Robson)
Quando eu soube que passei no vestibular Eu me senti um pouco feliz [...]eu me
senti feliz porque Deus me deu a oportunidade pra estudar, pra conhecer um novo
mundo, porque o nível superior é diferente, as pessoas são diferentes, você pode se
aprofundar, é diferente! Então eu me sinto feliz, privilegiada. (Hozana)
Entretanto, para chegar até a Universidade, foi uma caminhada muito longa.
Devido à condição do ensino de base ou por algum outro motivo, alguns precisaram
complementar sua formação com cursinhos, percebendo-se ainda o esforço
empreendido para alcançar o êxito.
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[...] eu fiz um vestibular para história e não consegui passar exatamente por não
ter visto nada de assunto referente ao segundo e terceiro ano do médio. Em 2011,
ingressei no cursinho, no Anglo fiz um ano de preparativo, me preparei bem, aí fiz
o vestibular e passei para Direito e ingressei aqui, graças a Deus. (Robson)
Então eu tentei 3 vezes o vestibular e não conseguia, na terceira vez foi que eu
passei. Tentei 3, aí na terceira foi que eu consegui passar, mas antes eu estudei 3
anos numa escola particular, para aprender português. Quando eu terminei o
ensino dio eu tinha 18 anos, mas para estudar para o vestibular, eu comecei a
trabalhar numa fábrica e consegui juntar um dinheiro e comecei a pagar uma
escola particular. (Hozana)
Terminei em 2011, aí fiquei tentando e quando saiu o resultado em 2014 fui
aprovada na lista de espera, na segunda lista de espera. (Kelly)
Outros encontraram menos dificuldades para ingressar na Universidade. Alguns
passaram direto após terem terminado o Ensino médio ou técnico, como podemos
observar nas narrativas abaixo:
Mas eu estava meio que preparado para entrar na UFPB, até porque eu entrei
no IF para me preparar para vir para aqui, então eu sinto que eu tive uma boa
base pra não ficar muito nervoso na hora de vir para aqui. E interessante é que eu
fiquei mais nervoso para ir para o IF do que pra vir para UFPB. (Paulo)
Então, eu nunca fiz cursinho, na verdade eu acho que nem estudei direito pro
vestibular, muita coisa que eu fiz na prova, foi por conta da escola, por conta das
coisas da escola. Eu tive muita sorte por ter estudado, por ter levado um pouco a
sério. Porque tem muita gente que não leva muito a sério o ensino médio e acaba
precisando fazer cursinho. [...] aquilo não era suficiente, estar na sala de
aula não era suficiente, então, foi muito por conta disso que eu consegui êxito no
vestibular. (Fabrícia)
Na época, não fiz nenhum cursinho, apenas o Ensino médio mesmo. (Rafael)
Atualmente, a UFPB utiliza vários sistemas de reserva de vagas, conhecidos como
cotas, incluindo as cotas para pessoas que declaram possuir alguma deficiência, através
da Res. 46/2010.
Percebeu-se que a política de cotas tem facilitado o ingresso na UFPB, quando
apenas 02 dos entrevistados não precisaram utilizar a política de cotas.
Entrei no curso de Hotelaria, no período 2015.2, mas por causa da greve só entrei
em 2016.1, com previsão para o término em 2021. Utilizei a política de cotas
tanto para deficiente como para Escola Pública. (Kelly)
Entrei na UFPB em 2012.1, foi o meu segundo vestibular, mas o primeiro ingresso
na Universidade, estou no oitavo período do curso de direito com previsão para
concluir em 2017. Entrei na Universidade através das cotas. (Robson)
Em 2015, entrei na UFPB [Universidade Federal da Paraíba], utilizando a política
de cotas para pessoas com deficiência, mas poderia ter utilizado também cota
para escola pública. (Paulo)
[...] eu fiz o ENEM [Exame Nacional do Ensino Médio] de novo, porque eu perdi
muita disciplina, 3 anos que eu estava perdendo disciplinas, então eu fiz de novo o
ENEM, aí eu passei pelo sistema de cotas. (Hozana)
Interessante perceber ainda que nem todos os entrevistados utilizaram as
políticas de cotas oferecidas para pessoas com deficiência. Inclusive os que poderiam
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utilizar mais de um critério cotista, por serem deficientes e/ou por serem oriundos de
escolas da rede pública. A partir das narrativas, podemos perceber ainda que a forma de
entrada na Universidade se difere entre os colaboradores. Alguns adentraram pelo
antigo vestibular, por meio do Processo Seletivo Seriado (PSS), ou pelo Exame Nacional
do Ensino Médio (ENEM).
Na época ainda era vestibular [PSS], não foi nem ENEM, eu nunca fiz ENEM na
minha vida. Eu entrei na UFPB direto, sem precisar utilizar as cotas, mas eu teria
a possibilidade de entrar com duas cotas, tanto a de deficiente como a de escola
pública, mas eu entrei direto. (Fabrícia)
Eu estudo aqui, no curso de Direito da UFPB, desde 2010 e não utilizei nenhuma
política de cotas, na época ainda era o antigo PSS [Processo Seletivo Seriado].
(Rafael)
Todavia, outro fator que se considera muito importante para o ingresso dessas
pessoas no Ensino superior é o apoio, acompanhamento que as famílias deram ao longo
de sua jornada até a universidade.
Eu sempre recebi muito apoio para estudar, de todas as partes que me
acompanham [...](Paulo)
Desde criança, sempre recebi um incentivo dos meus familiares para estudar,
para entrar na Universidade. (Rafael)
Eu recebi apoio para estudar e ir para a Universidade, da minha família, muito do
Instituto [dos cegos], do pessoal da instituição, eles sempre me deram muito
apoio, porque no vestibular você fazia prova do primeiro e do segundo e se não
passasse você não fazia do terceiro. (Fabrícia)
Eu recebi muito apoio do pessoal do Instituto dos Cegos [Paraíba], sempre ficava
em cima de mim pra eu fazer a prova, pra eu nunca desistir de estudar, também
recebi apoio da minha mãe e do meu esposo. (Kelly)
Eu recebi apoio para estudar, para entrar na universidade, da minha família,
recebi apoio da minha mãe. Ela me dava muita força, dizia: - “vai Hozana, se
esforce!” Ela sempre me dava muito incentivo. (Hozana)
[...]eu considero esse desempenho meu desde o início do curso até hoje aqui dentro
da UFPB à minha força de vontade e à energia positiva da minha família [...]
(Robson)
Destaca-se ainda o papel do Instituto dos Cegos da Paraíba que, ao longo da vida
de alguns deles, se tornou uma peça fundamental nesse processo de ingresso ao ensino
superior.
Quando questionados a respeito de ser o primeiro ingresso em um curso de nível
superior, é praticamente unânime a resposta afirmativa, porém, em um dos casos,
mesmo a resposta sendo positiva, não fora o primeiro ingresso da pessoa enquanto
discente no ambiente universitário.
Em um caso em especial, a aluna ingressou através do extinto vestibular no curso
de Ciência da Computação. Contudo, na época, não chegou a seu conhecimento nenhum
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recurso ou serviço que permitisse ou que ao menos colaborasse com sua permanência
na Universidade. Ela se deparou com vários obstáculos no processo de comunicação, em
especial, relativos ao corpo docente, pois foi vitimada do preconceito e da ignorância de
um professor, que, ao descobrir que se tratava de uma deficiente auditiva, questionou
sua presença em sala de aula de um curso superior. Após este episódio, ela praticamente
abandonou o curso por não conseguir compreender as aulas, por não conseguir ter
acesso aos materiais informacionais necessários para o estudo, e por não obter notas
que permitissem sua aprovação nas disciplinas, muito menos qualquer avanço no curso
escolhido.
Após ter informações de que a universidade oferecia o serviço de intérprete,
ela decidiu prestar prova do ENEM para um novo ingresso no mesmo curso, com o
objetivo de dar continuidade ao curso e com a esperança de que, com o auxílio de
intérpretes, pudesse ter um histórico sem registro de reprovações ou notas baixas,
refletindo o seu esforço na busca por educação e conhecimentos específicos da área
escolhida.
Eu entrei aqui [UFPB] a primeira vez, em 2011, mas não tinha intérprete, nenhum
intérprete. Passei três anos aqui dentro e não tinha intérprete, zero, ninguém.
Acabei sendo reprovada nas disciplinas por que as disciplinas são muito difíceis.
[...]Então, vi em um edital que tinha chegado intérprete na Universidade, então
eu fiz o ENEM [Exame Nacional do Ensino Médio] de novo [...] (Hozana)
Após reflexão, utilizamos essa informação da aluna para comparar a melhoria nas
condições de acessibilidade na UFPB entre 2011, ano em que ela entrou pela primeira
vez, e 2013, ano da sua nova entrada. Essas melhorias poderão ser visualizadas de forma
mais clara no eixo “Pontos para inclusão”.
Observa-se que, no tocante à disponibilização de ofertas de vagas às pessoas com
deficiência, a UFPB tem facilitado que essas pessoas possam de fato exercer o direito de
acesso ao Ensino Superior, principalmente à luz da Lei 13.146 Art. 28, inciso XIII,
mencionado no início da discussão. Todavia, faz-se necessário observar se a instituição
tem oferecido subsídios para que, esse aluno, além de ingressar, possa permanecer e
concluir o seu curso, aspecto que iremos abordar mais à frente.
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7 O PAPEL DA INFORMAÇÃO
Pinheiro (2013) considera que o acesso à leitura é um direito inserido no
conjunto dos direitos assegurados pela Constituição Federal (1988), pois a leitura
como um meio de apropriação da informação.
Figura 3 O papel da informação na inclusão e permanência da PcD na Universidade
Fonte: Dados da pesquisa, 2016.
Primeiramente, sobre esse acesso, captamos nas narrativas como é o gosto e o
relacionamento com a leitura desde a primeira idade.
Quando eu era pequeno, meus 9 ou 10 anos, mesmo sem saber ler muito, eu via
muito jornal com meu avô, lia gibi, mesmo sem saber ler muito, mas eu lia. Então,
minha mãe lia pra mim também, muito. [...] E eu gosto muito de ler, não tanto
impresso, prefiro digital ou por vídeo, porque pra mim fica melhor, mas quando
leio, além dos livros do curso, eu gosto de ler livros espíritas. (Paulo)
[...] gosto de ler, além de livros da área do direito, eu gosto de ler revistas
semanais, é, livros de não ficção, leio desde criança. (Rafael)
[...] eu já gostei muito, na época do ensino médio, nossa! eu lia muito, muito
mesmo. Não coisas da escola, coisa de fora mesmo, adorava livros e tudo. Hoje em
dia eu, não consigo mais, eu leio tanto aqui pra psicologia que quando eu
tenho tempo, a última coisa que eu quero fazer é ler. [...]Eu adorava ler quando
criança, adolescente ... e eu agradeço muito à isso, por que sempre li muito em
braille. Hoje, eu fico revoltada com os meninos que são deficientes visuais que
estão no ensino médio, o povo quer saber de computador. Eu falo a eles: -
“Vocês vão ficar tudo burro na ortografia minha gente”. (Fabrícia)
Meu gosto pela leitura é razoável, mas quando leio, gosto mais de ler poesias,
comédias românticas, esses tipos de livros, geralmente leio mais no notebook que
em Braille. Eu já gostei de ler mais, esse desinteresse veio mais depois que eu perdi
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a visão, eu gostava muito de ler, mas depois que eu perdi a visão, sei lá, perdi tipo
aquele interesse. (Kelly)
Eu sempre gostei de ler, antes de perder a visão eu aprendi a ler, eu gostava de ler,
forçando o restante de visão que eu tinha. Quando eu perdi a visão, eu sempre
pedia para os colegas lerem para mim, eu sempre gostei de leitura, essas coisas
assim [...] o braile passou a ser “entre aspas” uma segunda leitura na minha vida
porque imagina só o que é você pegar uma apostila de 39 páginas e ao ser
convertida em braile e se transformar em 174? Então imagina livros? Seriam um
absurdo. Aí eu utilizo mesmo o computador. Leio muito, gosto de ler muito, escuto
muito vídeo aula, gosto muito mesmo de estudar. (Robson)
Eu gosto muito de ler, eu gosto de ler coisas sobre matemática álgebra, sobre a
Índia, a história da Índia, também do Egito porque foi onde a matemática surgiu
então é uma coisa que me emociona, eu gosto. Esse meu gosto pela leitura vem
desde a infância, que por exemplo, por eu ser surda, era tudo diferente pra
mim. Eu lembro que eu procurava um livro mais fácil, que tivesse uma palavra
mais fácil, o português mais acessível, mas quando eu pegava um livro era
muito formal, o português era muito formal, a ficava difícil pra mim. (Hozana)
Através dessas memórias, muitos demonstram o gosto pela leitura desde criança,
mesmo com todas as limitações.
No entanto, percebe-se que alguns perderam um pouco o gosto pela leitura, com
destaque para o caso de Kelly, em função da perda da visão. Também o caso de
Fabrícia, que, pelo esgotamento de leitura, devido à estrutura curricular de seu curso, foi
perdendo um pouco do prazer por essa atividade já na vida acadêmica. Enquanto isso,
outros revelam que permanecem gostando muito de ler.
Muitos deles consideram que esse gosto e o acesso à leitura foram muito
importantes para entrar na Universidade e para permanecer nela. Podemos visualizar
isso, mais uma vez, recorrendo-se à leitura das narrativas abaixo:
[...] Então é por isso que um pouco da capacidade que eu tenho hoje, apesar deu
não ler muito hoje, é muito pelo fato de eu ter tido isso na infância. [...] Eu
considero que o acesso à leitura, o acesso à informação, é um fator importante
que me ajudou a entrar na Universidade e para eu concluir também. (Paulo)
[...] eu acho que a leitura foi muito importante, tanto para eu entrar na
Universidade como para me manter nela. [...]foi muito importante, pra eu
conseguir chegar aqui, pra eu conseguir ter um bom desempenho tanto nas
questões acadêmicas mesmo, na questão da escrita. Eu percebo que tem algumas
pessoas aqui que não foram alfabetizadas em braile, mas que foram alfabetizadas
tarde, não tiveram muito acesso à leitura em braile e eles sentem bastante
dificuldade, quando vão fazer as correções aqui no NEDESP a gente vê que a
questão da ortografia pesa muito pra quem não conseguiu ter esse acesso.
(Fabrícia)
Eu acho esse acesso à leitura, à informação bastante importante, você querendo
ou não, você vai precisar bastante da leitura, tanto que a leitura envolve também
escrita. Você lendo bastante, vai aprender a escrever bem, melhorar a questão da
ortografia, essas coisas. Então eu acredito que foi importante esse acesso à
leitura, esse acesso à informação para estar aqui na Universidade hoje e também
que a informação me auxiliará para eu concluir meu curso. (Kelly)
O acesso à leitura, esse acesso à informação que eu tive durante toda a minha
vida, facilitou a minha entrada na Universidade e também a quase conclusão dele.
Facilitou principalmente a minha força de vontade, através da leitura ela faz
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para quem gosta, ela faz com que você viaje no mundo, na situação da realidade,
porque a leitura ela mostra a situação real [...] (Robson)
Esse meu gosto pela leitura me impulsionou muito para chegar aaqui, entrar
na Universidade e estar cursando. Porque quando você lê, facilita muito a sua
vida, porque você aprende contextos. A leitura tem aquela informação, traz
informações principais para sua vida, porque através dessas informações, você
consegue evoluir, você consegue se desenvolver. Então se você não tem acesso à
informação, se você não tem leitura… No início não tinha informação [...] depois
que eu soube dos meus direitos... Porque antes eu ficava parada parecia que nada
acontecia, nada era resolvido, porque eu não tinha por exemplo, eu não conseguia
expressar a minha angústia, então eu ficava muito parada [...]agora que eu estou
sabendo os meus direitos, agora eu luto e também porque antes eu não era
política agora sou, agora sou política. (Hozana)
Em tese de doutorado, Pinheiro (2013) trabalha como a leitura é vista e qual o
papel da leitura na vida de crianças em situação de risco. Mesmo os sujeitos sendo
outros, utilizamos o pressuposto da Organização Mundial da Saúde, citado por Pinheiro
(2013, p. 62), que diz que a leitura, “compreendida como forma de apropriação de
informação, pode ampliar o conhecimento e melhorar a qualidade de vida, visto que a
informação adequada auxilia na solução dos problemas que emergem no cotidiano [...].”
Logo, percebe-se que a informação desempenhou papel muito importante
durante toda a trajetória acadêmica desses estudantes, o apenas no âmbito da
Universidade, mas desde a sua formação básica no ensino fundamental e médio.
Com um papel facilitador e transformador, a informação possibilita que essas
pessoas, em situação muitas vezes de marginalização, possam lutar por seus direitos e
conseguir uma condição de vida melhor.
Corroborando com o nosso entendimento, Pinheiro (2013, p. 163) afirma que “a
transformação humana a partir da leitura é crença que a muitos parece fundada em
constatações concretas.”
A informação tem possibilitado que essas pessoas tenham acesso a seus direitos e
que exijam o exercício pleno de tais direitos frente às entidades competentes, pondo em
prática o processo de inclusão na sociedade em que vive. O sujeito que tem acesso à
informação se torna mais crítico e exigente quanto à efetivação de seus direitos.
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir da exploração e do aprofundamento teórico, foi possível observar que as
pessoas com deficiência foram, historicamente, tratadas de forma marginalizada. Por
muitas vezes, foram suprimidas do convívio social, quando em alguns momentos foram
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tidas como alienadas, retardadas, deixando evidente uma total exclusão e negação de
direitos elementares para um ser humano. Foram tempos de extremo preconceito e
discriminação.
Mas, será que esse preconceito teve fim? Certamente, não. Todavia, percebe-se
que já se conseguiu evoluir, pelo menos um pouco. Atualmente, podem-se observar
pessoas com deficiência envolvidas na política, na luta pela efetivação de seus direitos,
na educação, na saúde, entre outras esferas.
A cada dia, a PcD tem conseguido não ser inserida, mas inserir-se no meio em que
vive. Percebe-se que essa inclusão tem que partir também do sujeito: ele precisa sentir-
se incluído. Não basta apenas serem oferecidos recursos tecnológicos ou
disponibilizados meios para que eles possam participar da sociedade. Na realidade, a
inclusão precisa ser de dentro pra fora e de fora pra dentro.
Observou-se, então, uma vasta quantidade de instrumentos legais e normativos
que devem garantir os direitos dessa parcela da sociedade, que muitas vezes esses
direitos ficam apenas no papel. Vale ressaltar a importância que a família possui nesse
processo de inclusão escolar, social, cultural das pessoas com deficiência.
Acredita-se que o processo de educação inclusiva seja resultado dos instrumentos
legais que vêm sendo criados para assegurar o direito de acesso à educação em qualquer
nível. Percebe-se, por fim, que o acesso à informação foi de suma importância para que
os entrevistados pudessem tornar-se sujeitos críticos e exigentes quanto à efetivação
dos seus direitos. Logo, observou-se que a informação possui tanto o papel de facilitador
na geração do conhecimento, como o de transformador, pois pode melhorar as
condições de vida, além de trazer a perspectiva de um futuro melhor.
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LIDERANÇA DO EDUCADOR E EMPODERAMENTO DO EDUCANDO COMO
INSTRUMENTALIZAÇÃO NO CONSTRUTO ÉTICO-MORAL-SOCIAL SOB A ÓTICA FREIRIANA
EDUCATOR LEADERSHIP AND EDUCATING EMPOWERMENT AS
INSTRUMENTALIZATION IN THE ETHICAL-MORAL-SOCIAL CONSTRUCT UNDER THE FREIRIAN
PERSPECTIVE
Eduardo Martins de Arruda
1
Hugo Medeiros Souto
2
Wilson Honorato Aragão
3
1.
Mestre Profissional em Gestão nas Organizações
Aprendentes (PPGOA/UFPB)
E-mail: eduardo.arruda73@gmail.com
2.
Mestrando Profissional em Gestão nas
Organizações Aprendentes (PPGOA/UFPB)
E-mail: hugomsouto@gmail.com
3.
Doutor em Educação (PPGE/UFRN), Professor
do PPGOA/UFPB
E-mail: wilsonaragao@hotmail.com
ACESSO ABERTO
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Licença Creative Commons Atribuição 4.0
Internacional.
Conflito de interesses: A autora declara que
não há conflito de interesses.
Financiamento: Não há.
Declaração de Disponibilidade dos dados:
Todos os dados relevantes estão disponíveis
neste artigo.
Recebido em: 20/09/2019.
Revisado em: 01/10/2019.
Aceito em: 10/10/2019.
Como citar este artigo:
ARRUDA, Eduardo Martins de; SOUTO, Hugo
Medeiros; ARAGÃO, Wilson Honorato. Liderança
do educador e empoderamento do educando
como instrumentalização no constructo ético-
moral-social sob a ótica freiriana. Informação
em Pauta, Fortaleza, v. 4, n. especial, p. 176-191,
nov. 2019. DOI:
https://doi.org/10.32810/2525-
3468.ip.v4iEspecial.2019.42613.176-191.
RESUMO
Liderança e empoderamento são temas
amplamente discutidos em contextos
organizacionais. Porém, quando se parte para
aplicação desses conceitos no contexto
pedagógico, mais precisamente nas relações
educador-educando, relevam-se campos ainda
incipientes, carentes de estudos e pesquisas
científicas. Pensando na importância dos temas
na pedagogia e apoiado na vida e obra de Paulo
Freire, este estudo tem como objetivo
compreender as relações interpessoais
presentes em meios educacionais e como podem
ser aperfeiçoadas e inspiradas por princípios
presentes em seu legado, como amor ao
próximo, justiça, liberdade, humildade,
pensamento crítico e ética. Para tanto, utilizou-
se como método a revisão teórica de conceitos
como liderança, empoderamento, educação e
pedagogia com base no estudo da obra freiriana.
Pudemos compreender que a escola não mais se
configura como único ou sequer como o local
principal onde ocorrem as manifestações de
ensino-aprendizagem. Consequentemente, o
papel de educador não mais se concentra no
professor de sala de aula. Da análise mais
apurada das relações de liderança e
empoderamento entre educador e educando, se
obteve como resultado que a responsabilidade
na construção de uma sociedade mais humanista
e igualitária compete a cada indivíduo que se
encontra no papel de educador, viabilizando aos
educandos o desenvolvimento de uma leitura de
Inf. Pauta
Fortaleza, CE
v. 4
n. especial
nov. 2019
ISSN 2525-3468
DOI: https://doi.org/10.32810/2525-3468.ip.v4iEspecial.2019.42613.176-191
ARTIGO
Arruda; Souto; Aragão | Liderança do educador e empoderamento do educando
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Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 4, n. especial, nov. 2019 | ISSN 2525-3468
mundo crítica e instrumentalizada, baseada em
princípios freirianos e da consciência da própria
realidade, tornando-o capaz de transformá-la.
Palavras-chave: Educação. Liderança.
Empoderamento. Práxis freiriana.
ABSTRACT
Leadership and empowerment are themes
widely discussed in organizational contexts.
However, when it comes to the application of
these concepts in the pedagogical context, more
precisely in educator-educating relations, they
are revealed as still incipient fields, lacking in
studies and scientific research. Thinking about
the importance of these themes in pedagogy and
supported by the life and work of Paulo Freire,
this study aims to understand the interpersonal
relationships present in educational
environments and how they can be improved
and inspired by principles present in his legacy,
such as love, justice, freedom, humility, critical
thinking and ethics. For that, the theoretical
revision of concepts such as leadership,
empowerment, education and pedagogy based
on the study of the Freirian work was used as
method. We can understand that the school no
longer configures itself as the sole or even the
main place where the manifestations of
teaching-learning take place. Consequently, the
role of educator no longer focuses on the
classroom teacher. Learning can take many
forms, often as an unconscious process, in which
the responsibility of educating lies in all who
transmit knowledge and interact with those who
receive it. From the closer analysis of leadership
and empowerment relations between educator
and educator, the result was that responsibility
for the construction of a more humanistic and
egalitarian society rests with each individual
who is in the role of educator, enabling the
students to develop a critical and instrumental
world reading, based on Freirian principles and
the awareness of reality itself, making it capable
of transforming it.
Keywords: Education. Leadership.
Empowerment. Freirean praxis.
1 INTRODUÇÃO
Com as mudanças culturais ocorridas na sociedade nos últimos 50 anos,
impulsionadas muitas vezes pelos avanços das tecnologias da informação, novos
padrões de comportamentos surgem e novas formas de enxergar e vivenciar o mundo
são construídas em várias dimensões da vida humana. Espera-se que avanços
tecnológicos atuem em prol da difusão de conhecimentos, no esclarecimento das
pessoas, e as ajudem principalmente a entender seu papel no mundo, de ser humano, um
ser naturalmente social.
Entretanto, a tecnologia é apenas um dos fatores que podem viabilizar a
construção de uma vida melhor, mais humana, mais prática, através da sua facilidade em
aproximar pessoas, derrubando barreiras de tempo e espaço. Wilson (2011) demonstra,
através de índices e de casos sucedidos em alguns países, que “a educação é fundamental
e central para se criar um mundo melhor para todos, no qual as pessoas podem ter uma
vida longa e saudável, acesso à educação e um nível de vida apropriado”. Se mostra
então como o ingrediente principal uma sociedade mais cidadã e humanitária a boa
formação do indivíduo, que atravessa os limites da escola e se torna um compromisso de
todos.
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A educação ainda não é vista como prioridade para muitos governos, pois carrega
em si a semente da libertação. Segundo Paulo Freire, a educação carrega em si o
potencial de libertar o oprimido do seu opressor. Nesse sentido,
Freire avança por meio de uma visão antropológica inovadora, ao valorizar a
subjetividade, o papel da conscientização, a problematização de consciência
crítica nas relações de poder e interesses de classe, a interação do sujeito na
realidade social e o sentido da educação e da transformação cultural (ZITKOSKI,
2010, p. 19).
Desenvolvendo essa ideia, fica evidente que a educação dentro da práxis freiriana
representa o empoderamento das classes menos favorecidas, de grupos minoritários e
de tantas outras vozes amordaçadas que, à medida que tomam consciência de sua
própria realidade e das verdadeiras causas dos problemas que os assolam, tornam-se
capazes de não mais aceitá-las como imutáveis ou como algo natural. Tornando-se
sujeitos da sua própria história, instrumentalizados de conhecimento e sabedoria, são
capazes de libertar tantos outros indivíduos, como a si próprio, concretizando uma
sociedade mais ética e moral, justa e igualitária, baseada em princípios universais e,
antes de tudo, humanos. Compartilhando com esse pensamento, Zitkoski afirma:
O conceito de educação em Freire implica entender o ser humano não apenas
como razão, estrutura lógica e consciência. Sua concepção antropológica
converge para uma visão dinâmica da existência humana, ao valorizar, de forma
equilibrada, todas as dimensões de nossa vida: corpo, mente, coração,
sentimento, emoções, sentido, intelecto, razão, consciência, entre outros
(ZITKOSKI, 2010, p. 22).
Configura-se como objetivo principal deste trabalho entender e compreender
como são tecidas as interações pedagógicas entre aqueles que ensinam e os que
aprendem, sob uma ótica freiriana, sendo ela pressuposto para questionamentos, tais
quais: como construir uma sociedade baseada em princípios éticos, morais e sociais?
Como o educando pode se tornar um agente da mudança? Como o educador e o
educando podem colaborar na construção do saber?
Com este intuito, o tema liderança se faz presente neste trabalho sob um novo
olhar, um ponto de vista diferente do costumeiramente utilizado no meio organizacional
ou na Administração. Temos aqui a liderança como uma forma de assunção da própria
responsabilidade, perante o mundo enquanto ser humano, principalmente do que o
representa no papel de educador perante os educandos, perante o mundo e a si mesmo.
É, de fato, a retomada de um velho conceito imbuído sob uma ótica social.
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Jacobs (1970, p. 232) diz que “a liderança é tida como uma interação entre
pessoas em que uma apresenta informações de um tipo e de tal forma que o outro se
convence de que seus resultados [...] serão melhorados se ele se comporta da maneira
sugerida ou desejada. Chiavenato (2000, p. 315) enfatiza que "a liderança é a capacidade
de influenciar as pessoas a fazerem aquilo que devem fazer". Desse modo, fica evidente
que liderar no contexto pedagógico não pode ser sinônimo de autoritarismo, imposição
de hierarquia pelo educador aos educandos ou algo que remeta ao ensino militar. Pelo
contrário, liderança nesse contexto é libertar a mente do educando, instrumentalizando
o modo pensar. Portanto, implica disseminar valores e princípios nas mentes daqueles
que anseiam por conhecimento e ser a luz que guia o desenvolvimento do conhecimento
e da razão.
Para concretização deste estudo, foi feita uma análise documental de momentos
da vida e obra do mestre e patrono da educação brasileira, Paulo Freire, tais como livros,
entrevistas, discursos e conversas informais concedidas à mídia. Metodologicamente,
este trabalho está configurado como uma pesquisa exploratória amparada por revisão
bibliográfica de algumas das principais obras de Paulo Freire, de obras de outros autores
que o referenciam, além de outras obras de temas diversos que interagem com o objeto
deste estudo.
A propósito de uma melhor compreensão do conteúdo, o artigo tem seu
desenvolvimento divido em três partes: liderança sob o viés freireano; empoderamento
do educando: um olhar freiriano; e (c) utopia x realidade: um olhar sobre a práxis
freiriana.
2 LIDERANÇA SOB O VIÉS FREIRIANO
Para melhor compreensão das relações dialéticas freirianas no contexto
pedagógico, será introduzida uma explanação sobre liderança e seus principais
pressupostos, buscando principalmente desmitificar a liderança como dominação. Sob a
ótica da práxis freiriana, liderar é ser consciente da sua responsabilidade perante o
mundo, é agir coerentemente na construção de um mundo melhor, influenciando
positivamente as pessoas sem, no entanto, deixar de aprender com os que
aparentemente nada têm a ensinar. Nesse sentido, a liderança pedagógica é para Freire
uma via de mão dupla, não apenas um monólogo do conhecimento, pois, enquanto o
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professor ensina, também aprende, assim como os educandos ensinam enquanto
aprendem.
O educador é um líder a partir do momento que tem consciência do seu papel em
conduzir o processo de ensino-aprendizagem, em ser um facilitador perante os
educandos na construção da tecitura da rede do conhecimento. Nesse sentido, a seguir
serão mais bem trabalhadas as características da liderança em termos acadêmicos sem,
contudo, deixar de fazer ponderações ao legado de Freire.
2.1 Conceitos e tipos de liderança
Em qualquer livro, site ou obra especializada que se abre sobre o assunto, tem-se
que o ato de liderar es relacionado à capacidade de influenciar e conduzir pessoas,
grupos ou equipes no alcance de determinados objetivos. Apesar de liderança estar
muitas vezes ligada ao conceito de poder ou dominação, neste artigo, a liderança estará
mais ligada à capacidade de sugerir e intuir pessoas na mudança em prol de construto
ético-social-moral do indivíduo. Tradicionalmente, encontramos na literatura uma
divisão de liderança em três tipos: autocrática, democrática e liberal.
A primeira remete ao autoritarismo, representando muitas vezes a liderança com
base na posição ocupada e no poder de coerção. Pode ser bem-vinda em situações ou
organizações que exigem respostas imediatas, controle pleno ou que envolvem pouca
reflexão. No entanto, se surge por defeito de liderança, por pessoas desprovidas de trato
com outras pessoas, gerará atritos que tendem a sugar muita energia por parte do líder e
desgaste físico e psicológico dos liderados. Nessa condição, sua manutenção pode se
tornar insustentável e não produzir resultados esperados. Em estudo sobre o bem-estar
pessoal nas organizações, Dessen (2010) pôde correlacionar maiores veis de
satisfação com uma menor percepção da autocracia em seus superiores.
Democrática é a liderança baseada na capacidade dialógica intrínseca no ser
humano enquanto ser social. Ela está pautada na comunicação e seu objetivo maior é dar
voz a todos que participam do processo, motivando-os e desenvolvendo suas
capacidades internas. Nesse tipo de liderança, toda e qualquer opinião é respeitada e
levada ao debate para que tenham as mesmas oportunidades de análise. Preconceitos e
restrições devem ser desestimulados no grupo em que esse tipo de liderança é
trabalhado.
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A última, liberal, também chamada de laissez-faire, é a liderança marcada pela
menor intervenção do líder perante seus liderados. Ou seja, as decisões são tomadas
majoritariamente pelos liderados sem ou com pouca participação ou influência do líder,
que atua mais como um facilitador. Depende de certa maturidade e concisão da equipe e
se mostra mais pertinente em equipes de alto domínio cnico para desenvolver tarefas
complexas.
Fazendo uma inferência sobre o legado de Freire, é notável implícito e
explicitamente o posicionamento pela adoção da liderança democrática no contexto
pedagógico. Ou seja, nas relações entre educando e educador, este, consciente do seu
papel e de suas responsabilidades perante o mundo, deve motivar e cultivar o espírito
participativo e colaborador entre os educandos. Indo mais além, o educador deve
fomentar e ajudar a desenvolver habilidades no educando para que, juntos, construam
uma teia do conhecimento que não seria possível caso fosse construída somente pelo
educador. Não seria tão rica, complexa e aplicável. Desse modo, sob a ótica freiriana, a
liderança no contexto pedagógico acontece por meio de decisões e ações conjuntas e em
tempo real entre ambas as partes.
Por outro lado, a práxis freiriana se opõe ao conceito de liderança autocrática ou
autoritária, não no contexto pedagógico, mas na vida como um todo, evidente no
momento em que tece uma crítica ao que ele convencionou como “educação bancária”.
Ou seja, o professor, em seu papel soberano e inquestionável, deveria transmitir
conhecimentos para os alunos. Estes, enquanto receptores, deveriam apenas receber
esses "depósitos" de informações, tal como uma conta bancária recebe depósitos de
dinheiro. Nesse modelo de educação tradicional e ainda muito arraigado na academia,
aos alunos não cabe analisar ou questionar a validade dessas informações junto ao
professor.
Paulo Freire preferia não utilizar os termos professor e aluno, justamente pela
etimologia desses dois termos que corrobora com esse sentido de liderança autoritária,
pautada no poder e dominação de um lado e na anulação e passividade do outro.
Acreditava numa relação de conhecimento como uma via de mão dupla.
Por fim, na liderança liberal, um relaxamento demasiado por parte do líder
perante os seus liderados, algo que, de maneira geral, não condiz com o encontrado na
obra de Freire, que reforça a responsabilidade dos indivíduos perante o mundo e os
demais indivíduos que estão a sua volta. Desse modo, o educador não pode fugir da sua
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responsabilidade, enquanto formador pedagógico comprometido com o
desenvolvimento e formação de seres humanos, a ponto de figurar como um mero
participante-convidado.
Para Freire, a liderança no processo ensino-aprendizagem também deve ser
democrática no sentido de o educando ter relativa liberdade de escolher quais assuntos
deverão ser estudados, respeitando os eixos básicos para cada nível de ensino, além de
poder sugerir como os temas podem ser mais bem trabalhados em sala de aula.
2.2 Aspectos da liderança no contexto pedagógico
Em meio aos desafios enfrentados, o educador, enquanto líder pedagógico,
precisa se reinventar a todo instante, buscar suas motivações e preferências e trazer
todos esses seus sentimentos de engajamento e "descoberta de mundos" para os
educandos. É preciso fazer com que os educandos se sintam parte do processo e não
sejam apenas meros expectadores. Nesse aspecto, muitos educadores e, mais
especificamente, professores perguntam se possuem as competências necessárias para a
sala de aula atual.
Na educação, o conceito de competência se afirma mais com o aprimoramento de
múltiplas capacidades. De certo modo, esse pensamento remete ao conceito de
inteligências múltiplas proposto por Gardner (1996), em que todo ser humano possui
várias inteligências em diversas áreas, porém algumas se sobressaem em relação a
outras, por diversos fatores, enquanto outras ainda permanecem adormecidas ou nunca
se manifestaram de maneira significativa para determinado indivíduo.
Chiavenato (2000) explana que competência está baseada na soma e interação de
três fatores cruciais: (a) conhecimento: ter a informação, buscar sempre aprender,
aprimorar-se sempre; (b) habilidade: aplicar com o conhecimento adquirido, enxergar
novas possibilidades para as informações adquiridas; (c) atitude: ser proativo, tornar em
ato prático o conhecimento processado e as habilidades desenvolvidas.
Freire acredita numa liderança pedagógica baseada no amor e no poder
transformador da educação na vida das pessoas, libertando-as das amarras e mordaças
sociais que as impedem de enxergar ou as faz enxergar parcialmente a opressão
sistemática que as assolam. Assim, tornam-se solitárias e incapazes de vencer as forças
dominantes.
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Entre as várias maneiras de contextualizar liderança, a abordagem que mais se
aproxima da práxis freiriana é a liderança por princípios de Stephen Covey. Nesse
sentido, a liderança, para Covey (1998), é perene e salutar quando está atrelada a
princípios humanos e éticos, como justiça, igualdade social, solidariedade, integridade,
honestidade, confiança, entre outros. Também aponta que a insatisfação pode ser o
elemento-chave para mudanças na vida pessoal e para gerar comportamentos pessoais
baseados em princípios éticos e morais que conduzem a melhores relações humanas.
Neste contexto, os princípios são como máximas universais e podem ser
aplicados em qualquer situação, em qualquer tempo ou lugar, tais como a bondade e o
agir de boa-fé. Vale ressaltar que não se confundem com valores, que são mais
superficiais e ligados à cultura ou a uma época. Ou seja, os valores mudam com o tempo;
os princípios, dificilmente.
Fazendo um paralelo da abordagem de liderança de Covey (1998) com o
pensamento freiriano, pode-se esperar que o educador deverá exercer sua liderança por
meio do desenvolvimento e do estímulo a um sistema de valores que estejam pautados
em princípios da vida humana. Porém, isso requer coragem e humildade por parte dos
líderes para aprender e crescer continuamente. No contexto pedagógico, o professor
deve sempre estar atento, observando, ouvindo, percebendo necessidades e dúvidas dos
educandos, ao mesmo tempo em que deve buscar constantemente novos conhecimentos
e novas formas de aprender.
Corroborando o pensamento freiriano, Covey (1998) elenca algumas
características que tais líderes devem possuir, tais como:
Quadro 1 Características que os líderes devem possuir
Aprendizado permanente: como já exposto neste trabalho, o aprimoramento, ter em mente que as
habilidades estão sempre em expansão, basta encontrar uma razão que o guie.
A vida como uma missão: encontrar na vida um sentido maior e não apenas a mera consequência do
acaso;
Irradiar energia positiva.
Ser otimista, alegre e espirituoso frente as adversidades;
Acreditar na humanidade, na capacidade humana de agir para o bem comum;
Possuir uma vida social equilibrada, cultivar as verdadeiras amizades e se relacionar amistosamente
com o meio circundante;
Sentir-se feliz com o sucesso das outras pessoas;
Ser catalisadores de mudanças, ser proativos;
Exercitam sua mente por meio da leitura, da solução criativa de problemas, etc.
Fonte: Adaptado de Covey (1998, grifo nosso).
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Líderes em ambiente pedagógico podem ainda seguir dois vieses de atuação no
meio: como facilitador e como mentor. No primeiro caso, podemos citar o educador que
promove a interação entre a turma, que estimula a colaboração entre os educandos e a
dissolução de qualquer conflito ou preconceito que surja. o educador sob o viés de
mentor vai além, atuando como uma espécie de padrinho educacional do educando.
Nesse sentido, o educador sob a faceta de mentor se preocupa e age de modo a
compreender as necessidades individuais de seus educandos, apoiando-os e
aconselhando-os de forma que cada um que possa escrever sua própria história de
maneira mais assertiva e mais alinhada à sua identidade e anseios pessoais.
Outro aspecto relacionado ao tema trata da questão atual do ensino a distância
(EaD) e relações entre professor e aluno nesse meio. Felizmente, o EaD não é
nenhuma novidade e o Brasil tem avançado bastante na área de infraestrutura e
produção de conteúdos educacionais a distância.
Nesse sentido, quando corretamente implementado, tem como uma das
características a democratização do conhecimento. De toda forma, o EaD possui
características que podem dialogar com os princípios freirianos, tais como a flexibilidade
na relação tempo-espaço nos estudos, uso de abordagens pedagógicas alternativas
mediadas por tecnologia, como jogos, fóruns, trabalhos colaborativos e redes sociais,
entre outras.
Um conceito levantado por Freire, ao contrário dos que muitos pensam, é que o
papel de educador nem sempre está somente na figura formal do professor. Por
exemplo, se pensarmos no contexto escolar, são educadores: o porteiro, o diretor, a
moça da limpeza e vários outros atores. Todos nós somos educadores quando temos
algo a contribuir na construção de um mundo mais cidadão. Diante dessa realidade, a
liderança também é situacional ou contingencial. Ou seja, os líderes se comportam de
acordo com as circunstâncias do momento e podem se adequar às mais variadas
necessidades.
3 EMPODERAMENTO DO EDUCANDO: UM OLHAR FREIRIANO
Empoderar, de maneira simplista, é prover alguém ou a si mesmo de poder. É
passar de uma situação mais restritiva para outra mais favorecida, no sentido de se
sentir mais autônomo ou capaz de influenciar e mudar pessoas e o curso das coisas.
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Equivocadamente, quando se pensa em empoderamento do educando, num
primeiro momento, se pensa no estudo como um meio de salvação para pessoas pobres
e menos favorecidas. Tem-se que o estudo é uma das maneiras de superar a pobreza
material, enquanto fenômeno individual, e ter uma vida melhor financeiramente para si
e seus familiares. De algum modo, as pessoas que estudam adequadamente m mais
chances de superar as dificuldades financeiras por estarem mais bem capacitadas para
melhores oportunidades. Porém, talvez o erro esteja na simplicidade deste pensamento,
sendo o empoderamento por meio da educação algo bem mais complexo e que abrange
várias dimensões do ser humano, sendo a melhora nas condições econômicas apenas
uma das facetas desse fenômeno. Freire, em sua obra Pedagogia da Esperança”,
corrobora com esse pensamento de sentido mais holístico e filosófico sobre
empoderamento por meio da educação: “Hoje, mais do que em outras épocas, devemos
cultivar uma educação da esperança enquanto empoderamento dos sujeitos históricos
desafiados a superarmos as situações limites que nos desumanizam a todos” (1994, p.
11).
Sob um viés político, para Freire, o empoderamento dos educandos representa
também a libertação do indivíduo em relação às amarras político-sociais: “A função
central da educação de teor reconstrutivo político é a de desfazer a condição de massa
de manobra, como bem queria Paulo Freire“ (DEMO, 2001, p. 320).
Nesse aspecto, sob uma ótica freiriana, fica evidenciado que empoderar os
educandos de bons sentimentos, de noções de respeito e cidadania, construir relações
éticas e morais, ensinar a trabalharem as dificuldades, motivar e ajudar os educandos a
entenderem o seu papel na comunidade, na sociedade e no mundo é mais que um dever
do educador: é comprometimento com uma missão, um ofício de amor ao próximo.
Freire (1969), na sua obra “Educação como prática de liberdade”, enxerga um
viés essencialmente social na questão do empoderamento. Enfatiza sua convicção de que
se trata também de um processo concretizado por meio das interações sociais, através
da problematização da realidade, dos esforços comuns para encontrar soluções e para
alcançar a consciência, que vai sendo construída coletivamente. Isso possibilita uma
união pelo combate à dominação e à opressão político-econômica-social.
Ainda enfatizando o aspecto social e moral do empoderamento na visão freiriana,
vale destacar que:
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Mesmo quando você se sente, individualmente, mais livre, se esse sentimento
não é um sentimento social, se você não é capaz de usar sua liberdade recente
para ajudar os outros a se libertarem através da transformação da sociedade,
então você só está exercitando uma atitude individualista no sentido de
empowerment ou da liberdade (FREIRE, 1986, p. 135).
Nas relações dialógicas entre educadores e educandos, o empoderamento destes
por meio dos educadores acontece no dia a dia através da libertação do pensamento, do
exercício crítico da mente e da autonomia, do incentivo à criatividade e à liberdade de
expressão. Ou seja, o educador deve planejar suas atividades letivas baseadas no
comprometimento que lhe é próprio, de formar seres humanos para a vida e para o
enfrentamento dos problemas pertinentes à sua realidade, não meramente para uma
profissão ou para conclusão de estudos de base. Contudo, o problema parece ser muito
mais político e ideológico do que uma questão de falta de iniciativa individual de cada
educador. Poucos professores, mesmo que sejam fiéis aos ideais de educação
libertadora, conseguem encontrar um ambiente propício para exercitar uma pedagogia
libertadora dentro das escolas, faculdades e universidades, pois muita resistência de
forças políticas.
Um dos principais dilemas encontrados em Freire é o conflito interior existente
na saída da condição de oprimido:
Os oprimidos, que introjetam a "sombra" dos opressores e seguem suas partes,
temem a liberdade, na medida em que esta, implicando a expulsão desta
sombra, exigiria deles que preenchessem o vazio pela expulsão com outro
"conteúdo" - o de sua autonomia (Freire, 1993, p. 34).
O empoderamento por parte do educando está intrinsecamente ligado ao tema da
dialogicidade como um dos fatores para a conquista da autonomia e do verdadeiro
sentimento de empoderamento. Nesse sentido, sabe-se que a dialogicidade é a base para
uma vida menos dificultosa e embaraçosa, pois muitos problemas encontrados no dia a
dia surgem da falta de uma comunicação adequada. Mesmo onde ela aparentemente
existe, carece de diálogo.
Freire atribui ao diálogo um caráter fenomenológico e o configura como um
componente construtor da história:
O diálogo fenomeniza e historiza a essencial intersubjetividade humana; ele é
relacional e, nela, ninguém tem iniciativa absoluta. Os dialogantes "admiram"
um mesmo mundo; afastam-se dele e com ele coincidem; nele põem e opõem-se
[...]. O diálogo não é produto histórico, é a própria história. (Fiori apud Freire,
1993, p. 16).
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Desse modo, as relações entre educando e educador não podem jamais se
restringir a um monólogo em que o professor passa horas replicando conceitos em sala
de aula e os alunos se dão por satisfeito a não discordarem ou não contribuírem
expressando o que pensam a respeito, através da construção de um diálogo. uma
corrente majoritária na pedagogia moderna que diz que a educação deve sempre estar
permeada pela dialogicidade encontrada em Freire, nas suas relações de aprendizagem
aluno-professor. Contudo, uma ênfase no legado freiriano da importância da
dialogicidade como instrumento da dialética que conduz a mudança transformadora:
“Minha perspectiva é dialética e fenomenológica. Eu acredito que daqui temos um olhar
para vencermos esse relacionamento oposto entre teoria e práxis: superando o que o
deve ser feito num nível idealista” (FREIRE apud TORRES, 1998, p. 82).
Empoderar sujeitos que vivenciam o papel de aprendizes não é sobrepor uma
ideologia sobre as demais por força de um discurso, mas possibilitar a vazão aos vários
discursos existentes e vivenciar sua própria sucumbência perante o pensamento crítico
e liberto dos educandos, então capazes de discernir o que é verdade e o que é engodo. É
em plenitude acreditar no ser humano, na sua libertação e na força do diálogo. Nesse
sentido, em “Pedagogia do Oprimido”, Freire diz que "a conquista implícita do diálogo é
a do mundo pelos sujeitos dialógicos, não a de um pelo outro, conquista do mundo pela
libertação dos homens. Não há diálogo, porém, se não há um profundo amor ao mundo e
aos homens” (FREIRE, 1987, p. 79).
4 UTOPIA X REALIDADE: UM OLHAR SOBRE A PRÁXIS FREIRIANA
A práxis freiriana é aproximação da teoria humanista com a prática
transformadora. Uma das principais preocupações de Freire era que suas palavras não
se tornassem utopia, que seu discurso não fosse idealista. Freire (1997), em “Pedagogia
da Autonomia”, evidencia essa natureza humanista, sempre em construção, sempre
trazendo seus ideais para o campo prático: Gosto de ser gente porque, inacabado, sei
que sou um ser condicionado, mas consciente do inacabamento, sei que posso ir mais
além dele. Esta é a diferença profunda entre o ser determinado e o ser conciliador e o ser
condicionado” (FREIRE, 1997, p. 59). Em uma de suas mais emblemáticas obras,
“Pedagogia do Oprimido”, Freire retoma a importância de avançar a teoria para o campo
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prático: "Não denúncia verdadeira sem compromisso de transformação, nem este
sem ação" (FREIRE, 1987, p.78).
Nessa mesma obra, Freire traz o sentido de coletividade, afinidade, à medida que,
enquanto seres oprimidos, padecem das mesmas mazelas sociais e encontram forças
entre si através do processo de conscientização: "Aos esfarrapados do mundo e aos que
nele se descobrem e, assim descobrindo-se, com eles sofrem, mas, sobretudo, com eles
lutam" (1993, p.23).
Nesse aspecto, Freire sempre procurou tratar os temas sob um viés mais
universal, abstraindo-os de quaisquer convicções partidárias ou inclinações pessoais.
Pensou no ser humano de modo holístico, pensou amar ao próximo em primeiro lugar, e
sugeriu para resolução dos problemas a utilização do diálogo como a principal
ferramenta. Esse sentimento de humanidade fica evidenciado em sua postura contrária
à antropologia tradicional, que ele sugere ser simplista e que acentua o individualismo:
Visão antropológica tradicional sugere uma dicotomia inexistente homens-
mundo. Homens simplesmente no mundo e não com o mundo e com os outros.
Homens espectadores e não recriadores do mundo. Concebe a sua consciência
como algo especializado neles e não aos homens como "corpos conscientes".
(Freire, 1993, p. 63).
Corroborando com essa ideia, Zitkoski diz que A educação para Freire deve ser
trabalhada intencionalmente para humanizar o mundo por meio de uma formação
cultural e da práxis transformadora de todos os cidadãos, autênticos sujeitos de sua
história, construída pela participação coletiva e democrática” (ZITKOSKI, 2010, p. 24).
A esse caráter dialético, ou seja, “dialética como fazedora de realidade e não como
reflexo” (Freire, 1994), entre outros fatores, atribui-se a atemporalidade da sua obra e a
aceitação e repercussão do seu legado no meio internacional, inclusive em países
considerados de primeiro mundo.
Muitos atribuem a ele a invenção do método revolucionário para alfabetização de
jovens e adultos, tendo como caso mais famoso a experiência na cidade de Angicos, no
Rio Grande do Norte. Porém, ele sempre ressaltava que não criou nenhum método ou
fórmula do conhecimento, que suas atitudes e decisões estavam apenas pautadas em
princípios universais e atemporais, e quem os cultivasse seria capaz de bons feitos em
qualquer época e em qualquer circunstância. Alguns princípios encontrados imbuídos na
obra freiriana são: amor, afetividade, respeito, dignidade, ética, solidariedade, entre
outros.
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Desse modo, as relações interpessoais entre educadores e educandos no contexto
pedagógico devem ser pautadas por tais princípios, assim como pelo respeito mútuo e
pela construção do conhecimento, de forma colaborativa, em via de mão dupla, através
de uma liderança democrática por parte de educadores. Estes, ao se solidarizarem com
os educandos enquanto seres aprendentes e humanos, libertam também a si próprios,
libertando seus educandos da ignorância e das amarras do pensamento.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A educação nacional está em crise, sendo causa e efeito de um fenômeno
sistêmico. Falta estrutura adequada na rede pública. Falta, em toda rede nacional de
ensino, valorização e reconhecimento dos profissionais de educação. Faltam, de maneira
geral, investimentos na educação e em outras áreas pelos governantes. Falta uma
ideologia a ser perseguida nos ambientes formais de educação. Falta também a
consciência em toda sociedade de que o ato de educar não começa e nem termina no
ambiente escolar, acadêmico ou similar; pois educar não é mera transmissão de
conhecimento, mas acontece a todo o momento e em todos os ambientes. Falta uma
educação que prepare para a vida em sociedade, baseada em noções de cidadania, de
respeito ao próximo e às diferenças, que desenvolva potencialidades e capacidades do
ser humano, que trabalhe o aspecto social e político inerente a todos os indivíduos. Fica
a certeza de que faltam muitas outras coisas na educação brasileira, ainda que não
caibam no escopo deste trabalho.
Com o intuito de preencher essas e outras lacunas encontradas na educação, foi
realizada uma análise das relações interpessoais sobre aspectos pedagógicos entre
educador e educando. Constatou-se, como um caminho para superar a crise na educação,
a formação de uma educação fundamentada na práxis freiriana. Ou seja, o indivíduo, a
partir do momento que toma consciência de sua realidade e entende o que a sustenta,
torna-se capaz de transformar a sua realidade e a da coletividade circundante.
Desse modo, Paulo Freire aponta a educação problematizadora como o meio para
que venha a se concretizar o verdadeiro aprendizado, aquele que agrega valor e o torna
mais eficaz. Não restringe a educação como mera replicação de conceitos ou a exposição
de conteúdos vagos e pontuais, sem fazer as devidas e pertinentes ligações entre si. Para
Paulo Freire o conhecimento é sistêmico, é uma rede, onde cada pessoa apreende algo
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sempre relacionando com a sua visão de mundo. No seu legado, há sempre a constatação
que o indivíduo se educa socialmente e não sozinho ou através unicamente do professor,
corroborando com a ideia de que educar é algo muito maior do que simplesmente
assimilar informações. É vivenciar aquele conhecimento recebido, e é também construir
uma sociedade mais ética, moral e socialmente mais justa, por meio das interações e
relações construídas socialmente.
Para a melhor compreensão do enfoque dado neste trabalho, alguns conceitos
como liderança e empoderamento foram retomados sob um olhar pedagógico. Dessa
forma, constatou-se a liderança do indivíduo no papel de educador se pela
consciência do seu papel e da capacidade de conscientizar e influenciar positivamente
no desenvolvimento intelectual do educando, por meio da estimulação do raciocínio
crítico e problematizador.
Por outro lado, o empoderamento por parte do educando acontece quando ele,
consciente da realidade e das causas por trás dela, torna-se um agente transformador,
empoderado pelo sentimento de mudança e de luta por condições mais igualitárias para
todos. Nesse sentido, Gadotti (1995) nos alerta que ser professor exige um componente
ético essencial: compromisso com a emancipação das pessoas.
Pudemos definir neste artigo o termo empoderamento como a representação da
busca por maior autonomia por parte do educando através do conhecimento. Neste
sentido, Paulo Freire ainda alerta que educar é um ato político e frequentemente
permeado por relações de poder, havendo opressores e oprimidos.
Por fim, o pensamento freiriano não se limita ao contexto pedagógico. Abordar
um assunto sob a luz dos ideais de Freire é falar de princípios filosóficos universais e,
antes de tudo, humanos, como amor, afetuosidade, honestidade, dignidade, cidadania,
ética e tantos outros. Desse modo, pensar na educação sob a ótica freiriana é
essencialmente acreditar no ser humano e na construção de um mundo melhor, através
do amor a si e a todos, contribuindo assim para a construção de uma sociedade menos
autodestrutiva e egoísta.
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