Retratos da medicalização nos processos de cuidado de usuários e usuárias de um CAPSadII

Autores

DOI:

https://doi.org/10.36517/revpsiufc.14.2023.e023028

Palavras-chave:

Medicalização, medicamentalização, redução de danos, diário de campo, práticas discursivas

Resumo

A Luta Antimanicomial e a Reforma Psiquiátrica garantiram importantes avanços na assistência em saúde mental no Brasil. Contudo, diante dos retrocessos políticos aos quais o país foi exposto nos últimos anos, vemo-nos diante de práticas que coadunam com a lógica manicomial e medicalizante. Diante de tal realidade, buscamos compreender como a medicalização, enquanto fenômeno social complexo, está inscrita na vida das pessoas usuárias de um CAPSad II. Neste artigo, assumimos o objetivo de analisar o lugar que a medicamentalização, parte constituinte da medicalização, ocupa nos processos de cuidado dos usuários e usuárias desse serviço. Definimos enquanto campo-tema um CAPSad II localizado em um município do interior da Paraíba. Realizamos a observação participante e, posteriormente, feita a análise de discurso dos diários de campo produzidos durante a pesquisa. Levando em conta os processos de cuidado dos usuários e usuárias do CAPSad II, identificamos o lugar fundamental que a medicamentalização ocupa. A prescrição e o consumo de medicamentos psicofármacos possuem um lugar de destaque no serviço, tendo em vista a demanda pela “estabilidade” e a garantia da abstinência, contrariando a proposta da Redução de Danos enquanto estratégia política de cuidado.

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Biografia do Autor

Camilla de Melo Silva, Universidade Estadual da Paraíba

Mestre em Psicologia da Saúde pelo Programa de Pós Graduação em Psicologia da Saúde, da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) - com período de mobilidade acadêmica na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto (Portugal). Graduada em Psicologia pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG). Graduada em Comunicação Social pela UEPB. Atuou enquanto docente do curso de Psicologia do UNIFIP Centro Universitário, no município de Patos (PB), tendo assumido as disciplinas de Estágio Específico em Clínica, Psicologia Comunitária, dentre outras. Ministra aulas em cursos de pós-graduação do Grupo Ser Educacional. É uma das criadoras da Coletiva Olhares, grupo responsável pela realização de cursos, supervisão e intervisão clínica em psicologia. Atua enquanto psicóloga clínica, sendo orientada pelos preceitos da Abordagem Centrada na Pessoa a partir de uma perspectiva interseccional. Integra o grupo de pesquisa Psicologia da Saúde, da Universidade Estadual da Paraíba, certificado pelo CNPQ. É colaboradora do Núcleo de Pesquisa e Extensão sobre Drogas (NUD/UFCG), tendo realizado trabalhos de pesquisa e extensão no campo da Saúde Mental e política de álcool e outras drogas. Tem realizado trabalhos voltados para temáticas como: os processos de medicalização e medicamentalização da vida e dos corpos, gênero, o uso de substâncias psicoativas lícitas e/ou ilícitas, Redução de Danos, Reforma Psiquiátrica, Processos de Desinstitucionalização, Luta Antimanicomial, Saúde Mental, Saúde Pública e Políticas Públicas.

Thelma Maria Grisi Velôso, Universidade Estadual da Paraíba

Possui graduação em Psicologia pela Universidade Federal da Paraíba -UFPB, mestrado em Serviço Social pela Universidade Federal da Paraíba - UFPB e doutorado em Sociologia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP - Campus de Araraquara/SP), tendo realizado estágio na Università degli Studi di Roma "La Sapienza", Itália. É professora do Programa de Pós-graduação em Serviço Social da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) e do Programa de Pós Graduação em Psicologia da Saúde (UEPB). Tem experiência na área da Psicologia e da Sociologia Rural. Adota a perspectiva da Psicologia Social e, mais recentemente, da Psicologia Social Discursiva. Trabalha, principalmente, com as seguintes categorias: memórias, identidades, produção de sentidos, discurso. Tem pesquisas e publicações nas áreas de Saúde Mental e Reforma Psiquiátrica. Desenvolve também trabalhos de extensão universitária fundamentados na Psicologia Social Comunitária e na Educação Popular.

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Publicado

2023-11-06

Como Citar

de Melo Silva, C., & Grisi Velôso, T. M. (2023). Retratos da medicalização nos processos de cuidado de usuários e usuárias de um CAPSadII. Revista De Psicologia, 14, e023028. https://doi.org/10.36517/revpsiufc.14.2023.e023028