Revista de Ciências Sociais — Fortaleza, v. 52, n. 2, jul./out.,2021
DOI: 10.36517/rcs.2021.2.d06
ISSN: 2318-4620

 

 

A internacionalização da Sociologia brasileira:
mapeamento das cartografias acadêmicas dos estudantes de pós-graduação

 

Camila Ferreira da Silva OrcID
Universidade Federal do Amazonas, Brasil
ferreira.camilasilva@gmail.com

Rodrigo de Macedo Lopes OrcID
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
rlopes9@gmail.com

 

Introdução

Colaboração e internacionalização têm se firmado como elementos permanentes na história de consolidação das Ciências Sociais, de modo geral, e da Sociologia, de modo mais específico, tanto no cenário nacional quanto no campo científico em escala internacional (SMELSER, 2003). Não sem contradições e lutas de dominação próprias do campo científico (BOURDIEU, 2008), a ideia de internacionalização tem estado na base da construção de conhecimento sem fronteiras geográficas em cenário de globalização e de uma sociedade em rede (CASTELLS, 1999). As dinâmicas próprias desses processos passam pelas transformações na economia do conhecimento, que, segundo Raewyn Connell (2019), a exemplo da economia material, é mundial e altamente desigual.

É desse cenário e debate que nosso tema de estudo emerge: a internacionalização de uma área do conhecimento situada histórica e geograficamente, estamos a falar da Sociologia brasileira. Sabe-se que o próprio processo de construção e consolidação de seu espaço acadêmico específico no país passa, desde a primeira metade do século XX, por trânsitos internacionais a partir da formação dos nossos quadros em universidades e centros de pesquisa no exterior — com destaque para a Europa e os Estados Unidos da América. Nessa conjuntura, “[...] os intercâmbios entre a sociologia brasileira e a desses centros se davam predominantemente ‘em mão única’, já que carecíamos de quadros, condições institucionais e apoio financeiro para nos articularmos a redes internacionais em condições equitativas” (SCALON; MISKOLCI, 2018, p. 123). A expansão e diversificação do sistema nacional de pós-graduação brasileiro no século XXI tem incidido, dentre outras frentes, sobre a necessidade de ampliação das pontes internacionais. Nesse cenário, contudo, o apelo à internacionalização tem superado paulatinamente esta perspectiva de dominação científica dos centros sobre a periferia, consolidando um diálogo mais horizontal entre os/as sociólogos/as brasileiros/as e estrangeiros/as.

Na atualidade o potencial de internacionalizar no interior do campo científico abarca diferentes frentes de atuação, dentre as quais destacamos: i) os periódicos científicos nacionais têm investido na publicação de artigos em português e em outras línguas estrangeiras, sobretudo o inglês, possibilitando uma ampliação do seu público leitor (FARIAS, 2017); ii) o esforço de publicar em periódicos internacionais amplamente reconhecidos pela comunidade científica tem marcado o cotidiano dos/as professores/as pesquisadores/as; iii) os diálogos possibilitados pelos eventos internacionais transformam-se, muitas vezes, em pontos de partida para a construção de redes de colaboração científica; iv) o acolhimento de pesquisadores/as estrangeiros/as no Brasil na condição de professores/as visitantes; v) a multiplicação, em outros países, de centros de estudos latino-americanos e brasileiros; e vi) os trânsitos formativos e profissionais que estudantes e docentes têm realizado a partir da consolidação de possibilidades de estadia em centros internacionais, como graduação sanduíche, dupla certificação, mestrado pleno e mestrado sanduíche, doutorado pleno e doutorado sanduíche, pós-doutorado, professor/a visitante, além de visitas de pesquisa.

Nossa mirada, no entanto, foca em um segmento específico para pensar os processos de internacionalização da Sociologia, pelo que elegemos como objetivo central do artigo o exercício de apreender uma das facetas da internacionalização em curso na Sociologia brasileira por meio de duas categorias analíticas, a saber: o incremento longitudinal dos bolsistas CAPES no exterior e os destinos dos discentes de doutorado pleno, doutorado sanduíche, mestrado pleno e mestrado sanduíche dos programas de pós-graduação da área. Combinamos as abordagens quantitativa e qualitativa e dividimos o estudo exploratório em três etapas principais: revisão de literatura; trabalho com os dados secundários do Sistema de Informações Georreferenciadas (GEOCAPES)1 relativos à distribuição de bolsistas da CAPES no exterior entre 1998 e 2019; e análises estatística e longitudinal dos dados.

A caracterização e análise dos trânsitos internacionais desenhados pelos mestrandos e doutorandos em Sociologia constitui nosso fio condutor do artigo, o qual promove o seguinte movimento discursivo: em um primeiro momento tratamos da internacionalização de modo mais amplo, como elemento-chave para pensarmos o sistema nacional de pós-graduação e os programas em diferentes áreas de conhecimento na esteira da avaliação da CAPES; na sequência passamos a especificar e tratar da Sociologia brasileira, e por isso a segunda seção do texto se ocupa de um breve diálogo com a literatura nacional — sem pretensões de realizar uma revisão sistemática sobre o tema — em torno das diferentes frentes de internacionalização da área; por fim, enveredamos pelo nosso objeto de estudo propriamente dito e passamos a apresentar e analisar as cartografias consolidadas pelos intercâmbios internacionais dos discentes de pós-graduação no campo da Sociologia.

A internacionalização dos programas de pós-graduação brasileiros

Se um dos pilares da ciência moderna é a validação de uma comunidade científica, ou seja, dos pares, o amplo diálogo entre pesquisadores tem ultrapassado há muito as barreiras nacionais. Mas, como tem sido construído este diálogo transnacional? Que forças atuam nessa construção? E a quem tem interessado a emergência de uma tônica na internacionalização da ciência? Estas e outras questões têm sido enfrentadas de diferentes formas por pesquisadores preocupados em desenvolver um exercício de autorreflexão sobre o campo científico no cenário contemporâneo.

A globalização das universidades não é necessariamente um fenômeno recente, posto que, de um lado, as peregrinações acadêmicas se tornaram rapidamente uma tradição ainda no século XIII — o que corrobora a compreensão de que os processos de circulação internacional se consolidaram muito antes da centralização dos discursos oficiais e das próprias políticas indutoras de internacionalização atuais — (DUBOIS; GINGRAS; ROSENTAL, 2016) e, de outro, os processos de colonização ao redor do mundo contaram com frentes de atuação das instituições universitárias no sentido da formação das elites nas colônias por muitos séculos, consolidando e naturalizando uma relação de dominação entre os saberes das metrópoles e os saberes locais (CONNELL, 2019). Esta configuração foi palco da emergência de debates cruciais, ainda no século XX, em torno das relações desiguais entre Norte e Sul global na economia do conhecimento, dentre os quais destacamos: a relação entre centro e periferia; a fuga dos cérebros; a questão da língua-mãe da ciência, o inglês, como dominação sobre as linguagens locais; a descolonização do pensamento; os currículos colonizadores; a ecologia dos saberes e as possibilidades de conhecimentos e universalismos alternativos; as teorias do Sul (SANTOS, 2009).

Todos estes debates vão esclarecendo que tratar de internacionalização é tarefa laboriosa, posto que não se pode deixar de considerar as relações assimétricas entre os diferentes países no cenário global da comunidade científica. Desde a década de 1990, autores apontam para as contradições dos processos de internacionalização da educação superior, com problematizações importantes ligadas à mercadorização deste nível de ensino e à atração de profissionais graduados para países com melhores condições de trabalho e de vida (BOURKE, 1997; TAKE; SHORAKU, 2017; WIT; DECA, 2020). No âmbito da transformação das instituições universitárias em mercados de diplomas, desenha-se uma disputa por alunos (clientes), que acaba por legitimar uma lógica concorrencial com a abertura internacional operada pela globalização — a qual é ratificada pela consolidação das avaliações externas de larga escala, que anualmente divulgam rankings das melhores universidades a nível mundial, indicando aos estudantes em que instituições deveriam “investir”.

Por outro lado, como afirma Marrara (2007), para completar a outra face desse processo contraditório, há instituições que têm explorado a tônica da internacionalização dentro de princípios acadêmicos, lançando-se às “[...] potencialidades do intercâmbio de pessoas, experiências e informações para desenvolver seus padrões internos de ensino e pesquisa e resolver problemas de interesse comum a diferentes comunidades” (MARRARA, 2007, p. 246). Nesse sentido, internacionalizar implica uma construção de um valor internacional a partir da capacidade de colaboração no sentido do desenvolvimento científico a nível supranacional, e, neste sentido, contam as atividades de formação e de pesquisa e seus impactos na comunidade científica (KOK, 2005). Nota-se que o próprio sentido de “impacto” passa a ser renegociado, exigindo-se não somente um nível local, mas uma incidência internacional das pesquisas em desenvolvimento.

No caso brasileiro em que a própria comunidade científica foi se constituindo a partir de trânsitos internacionais com o objetivo de garantir a formação de professores/as pesquisadores/as nos níveis mais altos, antes da consolidação de um sistema de pós-graduação no país, as pontes transnacionais para o desenvolvimento da ciência têm sido uma tarefa de longa duração. Contudo, se inicialmente o diálogo externo era fundamentalmente realizado em direção única — no envio de pesquisadores/as brasileiros/as em processo de formação —, o amadurecimento do campo e da comunidade científica nacional vem friccionando e modificando esta relação (RAMOS, 2018).

A internacionalização, portanto, tem se materializado por inúmeras frentes, as quais contemplam desde a publicação em periódicos estrangeiros até o estabelecimento de redes internacionais de pesquisa, passando necessariamente pelos trânsitos internacionais de nossos/as pesquisadores/as — e aqui destaca-se que estes fluxos passaram a abarcar sujeitos discentes e docentes, da graduação ao pós-doutorado, incluindo estágios e atuação como professor/a visitante. Outras frentes importantes desse processo no Brasil são as agências de fomento federais e estaduais (CAPES, CNPq e as Fundações de Amparo à Pesquisa), uma vez que os investimentos em bolsas de estudos, auxílios financeiros para participação em eventos internacionais, programas de intercâmbio e de criação de centros de pesquisa transnacionais têm garantido um contínuo processo de internacionalização de nossa comunidade científica. Além disso, ao observar os editais de apoio à internacionalização dessas agências, é possível compreender os direcionamentos das políticas do ensino superior, ciência e tecnologia no país neste quesito, uma vez que os destinos e as estratégias vão sendo previstos nestas chamadas, denotando o tipo de inserção internacional que se pretende consolidar.

O sistema de pós-graduação brasileiro tem atravessado momentos de expansão e diversificação bastante significativos nas últimas décadas, este fenômeno tem relação direta com a expansão tanto da educação básica quanto do ensino superior com as políticas de democratização (SILVA; LOPES, 2020). Nessa conjuntura, a expansão da graduação tem desembocado necessariamente em um aumento também da pós-graduação, o qual se expressa tanto no incremento do número de programas de pós-graduação no país, quanto na diversificação destes com os programas interdisciplinares, os programas profissionais e os programas em rede. A pós-graduação, por sua vez, tem se consolidado como espaço privilegiado para as iniciativas de internacionalização que temos vislumbrado em cenário recente. Para Ramos (2018, p. 1), “nas últimas duas ou três décadas, a dimensão internacional tornou-se parte integral da educação de nível superior e da pesquisa científica, motivando a emergência da noção de internacionalização”. Na pós-graduação, de modo particular, tal noção se consolidou por meio da avaliação quadrienal realizada pela CAPES — que inclui a internacionalização como medida, por meio da quantidade de pesquisadores de instituições estrangeiras participantes nos programas, publicações em periódicos internacionais, parcerias internacionais em projetos, publicações, entre outros, para avaliar os programas de pós-graduação — e das atividades cotidianas dos programas, certamente com influências mútuas entre estas duas instâncias, uma vez que desde a década de 1970 a implantação do Sistema de Avaliação da Pós-Graduação já indicava um esforço pioneiro de internacionalização no país (MÉA; VEIGA; BOLZAN, 2019) — elemento que vem se constituindo como tarefa e como desafio para a heterogeneidade que os PPGs representam.

A avaliação em curso, relativa ao quadriênio 2017-2020, por exemplo, traz um apelo com relação à identidade dos programas de pós-graduação em torno do impacto local e/ou da internacionalização. Destaca-se que a ideia de excelência, expressa pelas notas mais altas atribuídas a um PPG, passa necessariamente pela internacionalização, uma vez que os programas com notas entre 6 e 7 têm na sua atuação a internacionalização como elemento obrigatório.

De modo generalizado, o discurso que tem se consolidado para explicar as exigências por internacionalização leva em consideração que este processo desembocaria necessariamente no fortalecimento das instituições de ensino superior e de todas as suas frentes de atuação — ensino, pesquisa, extensão e gestão —, além de promover uma inserção internacional (MÉA; VEIGA, BOLZAN, 2019). A necessidade dessa inserção internacional tem sido explicada, para além do cenário de relações globalizadas no campo científico, pela importância de efetivar o impacto intelectual, social e econômico da ciência brasileira (RAMOS, 2018), a qual tem seguidamente sido responsável por grande parte das publicações em nível mundial, mas com parca repercussão transnacional.

Nesse sentido, a própria avaliação da CAPES, que toma a internacionalização dos PPGs como elemento de análise deve ser compreendida como parte das políticas públicas de incentivo ao processo de tornar internacional aquilo que é produzido no Brasil no âmbito da ciência. A isto juntam-se, como já citamos anteriormente, as políticas de apoio às experiências internacionais de discentes e docentes, por meio de bolsas de estudos, pesquisas e aportes financeiros para eventos — que apresentam variações significativas de direcionamentos, investimentos e programas nos diferentes governos que ocuparam o Estado no século XXI no Brasil. Além disso, esta tônica é ainda expressa em documentos como o Plano Nacional de Pós-Graduação 2011-2020 (PNPG), do Ministério da Educação, e na Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação 2012-2015 e 2016-2019, do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (PAIVA; BRITO, 2019). Tais elaborações e experiências compõem os esforços que o Brasil tem realizado no sentido de compor e galgar melhor posição na economia global do conhecimento.

Conforme indicamos no início desta seção, todo este processo guarda suas contradições e, no caso brasileiro, elas incidem sobre questões históricas ligadas às desigualdades no acesso ao ensino superior e à pós-graduação; às relações assimétricas entre os programas de pós-graduação; à legitimação de áreas prioritárias — tecnologia, engenharia e matemática —, a exemplo do que ocorre em países centrais; ao lugar dos periódicos nacionais, entre outras.

A sociologia brasileira enfrentando a internacionalização

Os processos e padrões de internacionalização da Sociologia brasileira têm sido investigados a partir de diferentes frentes, tais como: os impactos das obras de pesquisadores/as brasileiros/as; a circulação dos/as docentes em níveis de pós-doutorado e na condição de professor/a visitante (DWYER, 2013); os trânsitos dos discentes da graduação ao pós-doutorado; e as publicações em língua estrangeira e em periódicos internacionais. Nesse sentido, vemos uma centralidade atribuída à questão da internacionalização nos últimos anos no âmbito da Sociologia brasileira, atendendo a uma tendência que vai muito além da área propriamente dita e que tem colocado especialmente as Ciências Humanas e Sociais em movimento de transformação e adequação ao cenário globalizado do campo científico. As evidências dessa centralidade do debate podem ser expressas no ganho de espaço que o tema tem galgado nos últimos encontros de associações como a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS), a Sociedade Brasileira de Sociologia (SBS) e a Associação Brasileira de Antropologia (ABA) — é notório o exercício autorreflexivo dos cientistas sociais para pensar a sua inserção internacional (BRAGA FILHO, 2017).

Importa-nos, então, promover uma incursão nos processos de internacionalização que têm marcado o desenvolvimento da Sociologia brasileira, tomando como marco de ruptura a transição do século XX para o século XXI. Este marco justifica-se em função da transformação significativa nas relações internacionais que os/as sociólogos/as brasileiros/as estabeleceram com grupos, instituições, agências e pesquisadores/as internacionais: se na primeira metade do século XX a circulação dos brasileiros em outros países esteve majoritariamente atrelada à sua formação, esta relação começa a se modificar com a consolidação do sistema de pós-graduação brasileiro e com a multiplicação de programas nas áreas das Ciências Sociais, abarcando a Sociologia, a Antropologia e a Ciência Política.

Quando os programas de pós-graduação brasileiros passam a se ocupar da formação dos quadros de pesquisadores/as, os interesses para internacionalizar se complexificam, ao passo que a própria Sociologia brasileira consolida um processo de reconhecimento na América Latina e tem galgado este reconhecimento em outras regiões do globo. O século XXI, portanto, representa uma mudança paradigmática e atualmente assistimos a uma formação que se dá majoritariamente em programas nacionais. Nesse sentido, compreendendo que a tônica da internacionalização atravessa as instituições universitárias e de pesquisa de forma incontornável (NEVES; CAVALCANTI, 2018), a Sociologia passou a incorporar os elementos necessários para o jogo globalizado que está em curso no campo científico, e que no Brasil se expressa tanto na lógica cotidiana do ofício de pesquisador/a, quanto na avaliação dos programas de pós-graduação que a CAPES realiza quadrienalmente.

Até a virada do milênio, o impacto internacional da sociologia brasileira foi restrito e tendeu a prover maiores intercâmbios com nossos vizinhos latino-americanos, com exceções, como a teoria da dependência desenvolvida na década de 1960 por Fernando Henrique Cardoso em parceria com Enzo Faletto e que teve repercussão mundial (SCALON; MISKOLCI, 2018, p. 123).

Este cenário foi revelando a necessidade de construir um impacto mais alargado, que conseguisse elevar a Sociologia brasileira e garantir o reconhecimento de seus pares em diferentes regiões do globo. O Brasil, como país periférico, enfrenta desafios significativos na tentativa de superação da relação assimétrica que se estabelece entre centro e periferia na construção de redes internacionais de colaboração (MAIA; MEDEIROS, 2020), e a Sociologia, por sua vez, com o incremento numérico e qualitativo de programas de pós-graduação tem modificado as relações com os centros de produção sociológica. Scalon e Miskolci (2018) chamam atenção para o papel preponderante da expansão dos pós-doutorados e dos estágios seniores no exterior nessa transformação do lugar da Sociologia brasileira, uma vez que este tipo de inserção internacional faz avançar tanto na atualização de nossos quadros, quanto na inserção em redes internacionais de pesquisa.

Um consenso na literatura especializada diz respeito à língua como um dos principais desafios para as Ciências Sociais e, mais especificamente, para a Sociologia. A hegemonia do inglês tem produzido, em países do Sul global, movimentos duplos de estabelecimento de redes acadêmicas: de um lado temos as redes internacionais, sempre mediadas pelo inglês e determinadas pelos padrões transnacionais de produção e circulação de conhecimento e de pesquisadores/as; e, por outro, as redes locais, que guardam não somente a língua materna, mas também a preocupação com problemas e objetos caros ao debate público de determinada comunidade (BEIGEL, 2014). Nesse sentido, a internacionalização inicial da Sociologia brasileira na direção da América Latina corresponde a um movimento relativamente comum a outras áreas do conhecimento e a outros países do Sul global. Nas Ciências Sociais, de modo geral, e na Sociologia, de modo particular, a língua inglesa como ponto de partida para a internacionalização tem sido tomada como elemento de contradição e as resistências têm se dado sobretudo nas áreas de pesquisa etnográfica e com objetos mais diretamente ligados à cultura (ORTIZ, 2016).

Nesse contexto contraditório e de discussão em torno da geopolítica do conhecimento, a Sociologia brasileira

[...] ampliou expressivamente sua inserção no cenário internacional por meio do crescimento da produção em periódicos e livros internacionais, da participação em diretorias de associações internacionais da área, em conselhos e comitês editoriais de periódicos internacionais, em grupos de pesquisa e formação profissional em rede internacional, em acordos e convênios internacionais, da presença de docentes e discentes em congressos e eventos científicos, entre outros. Essa crescente troca de conhecimento se manifesta por meio de pesquisas em rede internacional, pós-doutorados, doutorados e doutorados sanduíches, notadamente em países como Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, França, Alemanha, Holanda, Espanha e Portugal; na América Latina com México, Argentina, Uruguai, Chile, Colômbia, Equador, bem como em países africanos de língua portuguesa (SCALON; MISKOLCI, 2018, p. 125).

Este processo de internacionalização, como podemos notar, é complexo e não se encerra na experiência individual de um agente do campo científico em terras estrangeiras, ela tem, na verdade, seu ponto de partida nesta experiência, uma vez que carece sempre de ser transformada em capital acadêmico para o agente e para a sua instituição de ensino superior em forma de publicações conjuntas, projetos, grupos de pesquisa, cursos, eventos e outras tantas possíveis iniciativas pautados na colaboração internacional. Jogar o jogo, contudo, não garantiu ao Brasil, ou mesmo à Sociologia, a superação completa de sua condição periférica, e por isso os desafios continuam a se materializar para os programas de pós-graduação da área. Nesse sentido, que papel os estudantes de pós-graduação exercem na internacionalização da Sociologia? Avancemos para responder este questionamento e compreender melhor o impacto dos trânsitos desses discentes a curto e longo prazo para o campo da Sociologia.

Cartografias ou trânsitos internacionais de estudantes de pós-graduação em Sociologia

O que leva um estudante de pós-graduação almejar ver sua formação ganhar uma experiência internacional? Os parâmetros consolidados no campo científico no qual este mesmo estudante vem se formando e se conformando. As aspirações de um/a pós-graduando/a são bem ajustadas aquilo que é reconhecido como legítimo no interior da comunidade científica, o valor, por exemplo, de internacionalizar sua formação é amplamente prestigiado por seus pares [discentes e docentes]. Esta compreensão em tratar dos trânsitos configurados pelas experiências dos estudantes de mestrado e doutorado no âmbito da Sociologia nos permite vislumbrar cartografias acadêmicas como elementos cruciais para a consolidação das redes internacionais de pesquisa, uma vez que, conforme aponta Ramos (2018), as experiências internacionais têm potencial de se transformar em pontes transnacionais que tendem a se fortalecer quando estes sujeitos se tornam professores/as.

Nesse sentido, o recorte que promovemos neste artigo — tomando à análise os estudantes de pós-graduação de mestrado e doutorado — nos revela não somente um retrato do atual deslocamento dos discentes da pós-graduação em Sociologia ao redor do mundo, ao passo que acaba por nos possibilitar vislumbrar os principais países que notadamente deverão compor o rol de redes internacionais de pesquisa no futuro, não muito distante, do espaço acadêmico da Sociologia brasileira. Os estudantes de hoje, ao internacionalizarem sua formação e carreira, representam as esperanças de um campo científico na transformação de seu capital acadêmico, que foi internacionalizado, em iniciativas transnacionais quando da ocupação das posições de professores/as pesquisadores/as. Aqui reside o principal motivo para estudar especificamente as trajetórias de internacionalização desses agentes do campo científico.

Vale a pena destacar que esta frente de circulação dos discentes da pós-graduação constitui um dos elementos dos atuais processos de internacionalização da Sociologia brasileira e, dado o debate que empreendemos anteriormente sobre as relações contraditórias entre centro e periferia neste cenário mundializado do ensino superior, as cartografias internacionais que estes estudantes desenham nos falam sobre as estratégias que o país e a área estão a legitimar na atualidade no sentido de sua inserção na ciência global.

Para iniciar a caracterização das cartografias internacionais dos estudantes da pós-graduação em Sociologia, observemos os números relativos à atribuição de bolsas para a realização de mestrado pleno, mestrado sanduíche, doutorado pleno e doutorado sanduíche.2

Gráfico 1: Distribuição de bolsas CAPES no exterior a discentes da pós-graduação na área de Sociologia — 1998-2019
Fonte: Elaboração própria, a partir de GeoCAPES (2020).

Entre 1998 e 2019 temos uma taxa de crescimento significativa na concessão desse tipo de bolsa, saltando de 37 para 96 no total, o que representa um incremento na casa dos 159% e nos fala de um avanço importante no aporte de recurso público na formação nos mais altos níveis de escolarização no interior das Ciências Humanas e da Sociologia. Algumas questões chamam nossa atenção no Gráfico 1, a primeira diz respeito à estagnação que se observa nos primeiros anos aqui representados, posto que entre 1998 e 2006 a atribuição dessas bolsas fica em um patamar muito próximo, passando de 37 a 56 bolsas em um ritmo bastante lento nesses oito anos, chegando a uma taxa de crescimento de tímidos 51%. A segunda questão que nos chama atenção diz respeito exatamente ao movimento oposto, ao período de maior crescimento no número de bolsas, nota-se que o período entre 2012 e 2015 é aquele em que temos as mais elevadas taxas, em números absolutos observamos: 111 bolsas em 2012, 137 em 2013, 152 em 2014 e 166 bolsas em 2015 — o que nos permite afirmar que é no governo de Dilma Rousseff que a Sociologia experimenta seu pico na concessão de bolsas internacionais, via CAPES, para os estudantes de mestrado e doutorado. Ramos (2018) resgata o posicionamento da presidenta Dilma Rousseff sobre a internacionalização e nos auxilia a compreender este aporte que reverberou na Sociologia e em outras tantas áreas do conhecimento:

[...] a presidente Dilma Rousseff afirmou, em abril de 2011, que o governo federal pretendia conceder 75 mil bolsas de estudos no exterior até 2014 — número que poderia atingir 101 mil com financiamento privado adicional. A presidente alegou na ocasião que o Brasil precisava de trabalhadores qualificados para assegurar o próximo ciclo de desenvolvimento como justificativa para o vultoso aporte prestes a ser empenhado (RAMOS, 2018, p. 3).

A ideia de desenvolvimento social atrelado à ciência e à envergadura internacional desta está, pois, na esteira do investimento público no intercâmbio dos estudantes de pós-graduação, o que corrobora o pensamento de Neves e Cavalcanti (2018), ao afirmarem que a universidade, os Estados e as sociedades não escapam à lógica da globalização como forma de organização do mundo na atualidade. A internacionalização vai, portanto, assumindo significados e modos de operacionalização heterogêneos em cada contexto nacional, com práticas hegemônicas e contra hegemônicas (DUBOIS; GINGRAS; ROSENTAL, 2016), porém, a mobilidade de estudantes tem assumido um papel importante, funcionando como uma das principais estratégias adotadas ao redor do mundo — em que pesem aqui as limitações da mobilidade estudantil no sentido da democratização e alcance real no universo de discentes (RAMOS, 2018).

Na Sociologia, bem como em outras áreas do conhecimento, as bolsas para os estudantes de pós-graduação têm representado grande esforço das agências de fomento e dos PPGs e, por sua vez, apresentam potencial para o estabelecimento de parcerias internacionais entre a universidade de origem e a instituição de acolhimento no exterior. Nesse sentido, observemos que tipo de bolsas predominaram nos últimos vinte anos para os pós-graduandos em Sociologia:

Gráfico 2: Detalhamento da distribuição de bolsas CAPES no exterior a discentes da pós-graduação na área de Sociologia — 1998-2019
Fonte: Elaboração própria, a partir de GeoCAPES (2020).

Evidencia-se, a partir do Gráfico 2, que no caso dos estudantes de pós-graduação em Sociologia o maior incentivo esteve, nas últimas duas décadas, atrelado às bolsas de doutorado tanto na modalidade pleno quanto na modalidade sanduíche, em detrimento ao segmento do mestrado. Enquanto as bolsas de mestrado revelam-se irrisórias numericamente, estas décadas expressam variação significativa na concessão de bolsas a doutorandos/as: se juntarmos as duas modalidades, entre 1998 e 2019, foram concedidas 1.697 bolsas de doutorado pleno e sanduíche para estudantes da área de Sociologia — a proporção entre as modalidades é de 78% para o doutorado sanduíche contra 22% para o doutorado pleno.

Estes números expressam a estratégia nacional de, no caso dos discentes, investir massivamente naqueles que já estão mais maduros na pós-graduação e que, exatamente por esta maturidade intelectual e acadêmica, possuem maiores chances de galgar e consolidar parcerias acadêmicas no país de acolhimento. Além disso, no que se refere à predominância de bolsas de doutorado na modalidade sanduíche, podemos inferir que este quadro tem relação com o alcance numérico que se consegue atingir com esta categoria, uma vez que uma bolsa para o doutorado sanduíche implica um tempo mais curto e, por isso, a possibilidade de incluir um número maior de estudantes.

Ademais, correlacionando os dados dos Gráficos 1 e 2, observamos que a flutuação no número de bolsas ao longo dos anos se faz sentir especialmente no doutorado pleno e sanduíche: enquanto as bolsas de doutorado pleno sofrem um decréscimo acentuado nos anos analisados, passando de 21 bolsas em 1998 para 5 bolsas em 2019 — note-se que a partir de 2016 a variação nesta modalidade segue somente o sentido do decréscimo, é um período marcado pelo governo Temer e pelo primeiro ano do governo Bolsonaro —; as bolsas de doutorado sanduíche experimentam declínio a partir de 2016 e, apesar de 2019 representar um salto significativo com relação a 1998, o pico no número dessas bolsas se deu entre 2011 e 2015.

Além dessas análises numéricas em torno da concessão de bolsas internacionais aos estudantes de pós-graduação da área de Sociologia, interessa-nos avançar na leitura das cartografias que as suas mobilidades implicaram. Isso porque estes trânsitos constituem-se marcos importantes para pensarmos a inserção internacional da Sociologia brasileira e as possibilidades de estabelecimento de redes de colaboração por meio dos estudantes, que em breve podem vir a ocupar as posições de professores/as e pesquisadores/as nas instituições de ensino superior do país.

O Quadro 1, abaixo, traz uma sistematização das regiões nas quais os pós-graduandos da Sociologia realizam suas experiências internacionais. Chamamos atenção para o esquema de cores, que aponta nos tons mais fortes aquelas regiões com maior expressividade numérica.

Quadro 1: Cartografias da distribuição de bolsas CAPES no exterior a discentes da pós-graduação na área de Sociologia — 1998-2019

Ano

Europa

América Anglo-Saxônica

América Latina

África

Ásia

1998

22

15

1999

23

10

2000

32

7

1

2001

32

6

1

2002

36

6

1

2003

38

14

2004

42

14

2

2005

43

12

1

2006

37

17

2

2007

50

12

3

2008

55

10

1

2009

64

11

8

2010

67

7

3

2011

74

7

3

2012

92

13

4

2

2013

111

20

3

1

2

2014

122

20

8

2

2015

125

28

10

3

2016

54

13

3

1

2017

69

19

11

2018

46

22

7

2

1

2019

58

27

9

1

1

Fonte: Elaboração própria, a partir de GeoCAPES (2020).

As bolsas internacionais CAPES destinadas aos mestrandos e doutorandos da área de Sociologia, seja para a realização de mestrado ou doutorado pleno ou sanduíche, desenham uma cartografia predominantemente europeia com relação aos destinos desses discentes. Nos mais de vinte anos analisados a prevalência dos países europeus é bastante acentuada frente à América do Norte, América Latina, África e Ásia, necessariamente nesta ordem. Analisemos essa configuração a partir do detalhamento de que países aparecem com mais recorrência nesse período.

De modo tímido temos alguns países da África e da Ásia como destinos dos pós-graduandos da Sociologia: i) enquanto o primeiro continente passa a figurar a partir de 2002 com Costa do Marfim, a Ásia somente aparece como destino dos estudantes a partir de 2012, com China e Índia, o que revela trânsito mais recente com esta região; ii) entre 2013 e 2019 a presença de países africanos se intensifica, e temos figurando Angola, Moçambique, África do Sul e Zimbábue; iii) juntos, África e Ásia perfazem 1% do total de bolsas concedidas no período analisado.

A América Latina, por sua vez, aparece como uma região interessante para o caso da Sociologia brasileira, uma vez que os seus primeiros movimentos de internacionalização incidiram exatamente sobre esta região ainda no século XX (SCALON; MISKOLCI, 2018). Os trânsitos dos discentes pela América Latina figuram a partir dos anos 2000 e, paulatinamente vão se consolidando nesses países. Os destaques vão para países como Argentina, México, Chile, Costa Rica, Venezuela, Uruguai e Cuba. Outro aspecto que chama atenção é o incremento de bolsas com destino a países latino-americanos a partir de 2009, com destaque para o ano de 2017 como aquele com o maior número de bolsas para a América Latina. A região foi destino, portanto, para aproximadamente 5% dos bolsistas analisados.

Já a América Anglo-Saxônica aparece com relativa pujança, em segundo lugar no quesito recorrência, representando 18% do total de bolsas destinadas aos pós-graduandos brasileiros da área de Sociologia. A hegemonia dos Estados Unidos se destaca, mas é possível notar também trânsitos destinados ao Canadá. A forte presença da América do Norte– juntamente com outros países de língua inglesa da Europa — é indício de como as gerações mais novas que estão atualmente no mestrado e no doutorado tomam a questão do inglês como língua principal da ciência em nível internacional. Estes trânsitos por países de língua inglesa podem representar um futuro de mais fácil circulação em eventos, centros e em periódicos e editoras internacionais para a Sociologia brasileira.

A Europa, por sua vez, aparece com expressivos 76% das bolsas em questão, e os países que aqui figuram são: França, Portugal, Espanha, países que compõem o Reino Unido, Alemanha, Itália, Holanda, República Tcheca, Suécia, Bélgica, Suíça, Rússia e Finlândia. França aparece, sem muita surpresa, como o principal destino dos estudantes de pós-graduação em Sociologia. A novidade, no entanto, reside na diversificação dos destinos europeus, sobretudo nos últimos anos, e vemos países com pouca tradição no estabelecimento de pontes com a Sociologia brasileira, a exemplo da Finlândia e da República Tcheca, o que pode nos indicar parcerias interessantes para o futuro próximo da área.

Sabe-se que durante as primeiras décadas de criação dos programas de pós-graduação em Ciências Sociais e em Sociologia, grande parte dos quadros teve sua formação no exterior, sobretudo em países europeus e nos Estados Unidos, o que se explicava exatamente pela concentração da produção sociológica mundial e, como era de se esperar, pelo prestígio logrado por tais países no cenário da Sociologia ao redor do mundo (SCALON; MISKOLCI, 2018). O que as bolsas internacionais para os discentes de pós-graduação nos revelam nos últimos vinte anos sobre esta questão, afinal? Revelam as continuidades e rupturas na geopolítica do conhecimento em pleno século XXI. A Europa, mesmo em cenário de redução percentual de bolsas nos últimos anos, continua figurando, para a Sociologia brasileira, como principal polo de atração de pesquisadores/as em formação a nível de mestrado e doutorado. E, nesse cenário, a França mantém sua posição central na Sociologia internacional, transmutando-se em centro de produção e difusão de conhecimento e ainda de formação de discentes estrangeiros.

O incremento dos trânsitos com a América Latina pode ainda representar um reavivamento das relações com os países vizinhos no sentido da colaboração acadêmica e científica para a Sociologia brasileira. E, no âmbito da África e da Ásia, ainda que tímidos, os trânsitos para países desses continentes podem apontar movimentos importantes relativos aos estudos afro-brasileiros e às relações com o Oriente para a Sociologia dos trópicos. A circulação discente nessas regiões pode ser um indicativo de estratégias e dinâmicas contra hegemônicas nesse processo (KEIM, 2011).

Considerações Finais

Pensar os processos de internacionalização de um grupo de programas de pós-graduação — que representam determinada área do conhecimento — implica compreender o caráter dialógico que está na base da construção do conhecimento científico a partir da Modernidade, de um lado, e as implicações dos processos de expansão e diversificação da pós-graduação brasileira nas últimas décadas, de outro. A Sociologia foi tomada à análise neste artigo com vistas a compreender uma das expressões de sua internacionalização, a circulação internacional dos discentes de pós-graduação, movimento que corrobora o entendimento de que as gerações mais jovens que se encontram em formação no interior do campo científico vão cotidianamente internalizando os valores consolidados na comunidade científica em questão. Desse modo, podemos afirmar que a internacionalização se constitui atualmente num desses valores, não de modo restrito à Sociologia, ao contrário, ela encontra-se centralmente recolocada de modo geral para a pós-graduação brasileira.

Os últimos vinte anos, tempo sobre o qual nos debruçamos no âmbito de nosso objeto de estudo, implicaram transformações profundas no ensino superior e na pós-graduação brasileira, dentre as quais destaca-se a internacionalização compreendida concomitantemente como um valor, como uma tarefa e como uma moeda para a inserção no mercado global do ensino superior e da pesquisa e produção de conhecimento — integrando competição e colaboração como facetas de um mesmo processo. A Sociologia, por sua vez, apesar de não figurar dentre as áreas prioritárias eleitas nessas últimas décadas, também vem experimentando movimentos de internacionalização, inclusive por meio de seus estudantes de mestrado e doutorado. Se a Sociologia brasileira tem trânsitos internacionais, ainda que de mão única, na gênese do seu processo de constituição enquanto espaço acadêmico específico no século XX, a sua consolidação e seu patamar atual lhe permitiram uma reconfiguração no âmbito das relações internacionais.

Em geral, a análise das duas categorias aqui escrutinadas — incremento na concessão de bolsas e destinos dos estudantes — revelou, portanto, que as flutuações no número de bolsas concedidas para mestrado e doutorado pleno e sanduíche seguem os movimentos mais amplos da tônica dada à internacionalização das experiências dos discentes de pós-graduação e da sucessão de diferentes governos no Estado nacional. E, especificamente no que tange às cartografias representadas pelos países de acolhimento dos bolsistas, temos que as relações entre centro e periferia no âmbito da Sociologia brasileira apresentaram mais continuidades do que rupturas, mas apresentaram também descontinuidades importantes e que nos falam de um porvir.

Referências

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Agradecimento

Agradecemos à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo apoio à pesquisa base para este artigo.


  1. geocapes.capes.gov.br.↩︎

  2. Destacamos que optamos por não incluir no recorte as bolsas de pós-doutorado, uma vez que estas abarcam muitos/as docentes do ensino superior.↩︎

Resumo:
O artigo se ocupa do tema da internacionalização no cenário da pós-graduação brasileira, ao passo que toma à análise a área da Sociologia por meio dos fluxos de intercâmbio acadêmico desenhados pelos estudantes de mestrado e doutorado. O objetivo central do texto consiste em apreender a internacionalização em curso na Sociologia brasileira por meio de duas categorias analíticas, a saber: o incremento longitudinal dos bolsistas CAPES no exterior e os destinos dos discentes de doutorado pleno, doutorado sanduíche, mestrado pleno e mestrado sanduíche dos programas de pós-graduação da área. A partir de uma Sociologia Compreensiva de perspectiva bourdieusiana, combinamos as abordagens quantitativa e qualitativa e as etapas de revisão de literatura, de trabalho com dados secundários do Sistema de Informações Georreferenciadas da CAPES e de análises estatística e longitudinal dos dados. O estudo demonstrou movimentos importantes no sentido de uma consolidação da experiência internacional dos estudantes de pós-graduação como elemento crucial para o estabelecimento de: redes internacionais de pesquisa, divulgação das investigações desenvolvidas no Brasil, circulação em diferentes continentes e o reconhecimento da Sociologia brasileira no campo científico global.

Palavras-chave:
Sociologia; internacionalização; estudantes; pós-graduação.

 

Abstract:
The article deals with the theme of internationalization in the Brazilian postgraduate scenario, while analyzing the area of Sociology through the academic exchange flows designed by master and doctoral students. The main objective of the text is to apprehend one of the angles of internationalization underway in Brazilian Sociology through two analytical categories, namely: the longitudinal increase of CAPES scholarships abroad and the destinations of students with a full doctorate, sandwich doctorate, full master and sandwich master from the graduate programs in the area. For this, we combine quantitative and qualitative approaches and stages of literature review, working with secondary data from the CAPES Georeferenced Information System and statistical and longitudinal analysis of the data. The study demonstrated important movements towards the consolidation of the international experience of graduate students as a crucial element for the establishment of: international research networks, dissemination of research carried out in Brazil, circulation in different continents and the recognition of Brazilian Sociology in the global scientific field.

Keywords:
Sociology; internationalization; students; posgraduate studies.

 

Recebido para publicação em 22/03/2021
Aceito em 15/05/2021