Revista Em Perspectiva, Fortaleza, v. 11, e93948, p. 1-19, 2025.
ISSN 2448-0789.
Adoecimentos e litígios trabalhistas em call
centers:
análise dos Processos Judiciais Eletrônicos na
13ª Região da Paraíba
RESUMO
Este estudo visa analisar as práticas de controle e
monitoramento em call centers, com base em uma investigação
de processos judiciais acessados via o Processo Judicial
Eletrônico do Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região.
Metodologicamente, a pesquisa emprega a análise documental
de processos judiciais, contextualizando as práticas de controle
observadas com teorias existentes sobre gestão em call centers.
O estudo considera as contribuições de Holman e Fernie (2000)
sobre a lógica de maximização da produtividade nesses espaços
e de Chalhoub (2012) sobre o uso de processos judiciais como
fontes na pesquisa histórica. Os processos estudados levantam
questões importantes sobre a privacidade, a autonomia e os
impactos psicológicos e sociais dos trabalhadores em ambientes
altamente vigiados. Os resultados apontam para uma cultura
organizacional marcada pelo controle extremo, que pode
resultar em práticas abusivas e impactos negativos na saúde
mental dos operadores.
Palavras-chave: Processos. Trabalho. Call Centers.
Illnesses and labor disputes in call centers: analysis of
electronic legal proceedings in the 13th Region of
Paraíba.
ABSTRACT
This study aims to analyze control and monitoring practices in
call centers, based on an investigation of legal proceedings
accessed via the Electronic Legal Proceedings of the Regional
Labor Court of the 13th Region. Methodologically, the
research employs documentary analysis of legal proceedings,
contextualizing the observed control practices with existing
theories on management in call centers. The study considers
the contributions of Holman and Fernie (2000) on the logic of
maximizing productivity in these spaces and of Chalhoub
(2012) on the use of legal proceedings as sources in historical
research. The processes studied raise important questions
about privacy, autonomy, and the psychological and social
impacts of workers in highly monitored environments. The
results point to an organizational culture marked by extreme
control, which can result in abusive practices and negative
impacts on the mental health of operators.
Keywords: Processes. Work. Call Center.
Gabriel de Araújo Souto
Universidade Federal de Campina
Grande, Campina Grande, PB, Brasil
gabrielldearaujo@gmail.com
www.orcid.org/0009-0000-8537-0307
Washington Marozan Pereira
de Albuquerque
Faculdade Três Marias, Campina
Grande, PB, Brasil
washingtonmarozan2014@gmail.com
www.orcid.org/0009-0009-4490-8989
ARTIGO ORIGINAL
Adoecimentos e litígios trabalhistas em
call centers
2
1 INTRODUÇÃO
Das muitas histórias com as quais nos deparamos em visitas pelos arquivos online da
Justiça do Trabalho no município de Campina Grande (Tribunal Regional do Trabalho da 13ª
Região), algumas particularmente chamaram-nos a atenção, a exemplo das informações
contidas em um auto-findo
1
que nos suscita inquietações de investigações históricas a partir
de aspectos da demissão de um atendente de Call Center
2
. Através do Processo Judicial
Eletrônico, podemos observar o grau de rigorosidade e controle no exercício das atividades do
atendente, pois o mesmo foi demitido por se ausentar de seu posto de atendimento para sanar
dúvidas com o supervisor. Ao demiti-lo, a empresa considerou que a demissão ocorria nos
limites do que a legislação definia por justa causa.
Holman e Fernie (2000) argumentam que a gestão desses espaços de call center é
baseada em uma lógica de controle que visa maximizar a produtividade e minimizar os custos
operacionais. Para isso, são utilizadas tecnologias que monitoram constantemente o
desempenho dos operadores, como softwares de gravação de chamadas e sistemas de
gerenciamento de filas de espera.
Nesse contexto, o uso do Processo Judicial Eletrônico como fonte de pesquisa que visa
evidenciar a rigorosidade e controle no atendimento em call centers é um exemplo de como
essas práticas são constantemente monitoradas e avaliadas. O fato do trabalhador ter sido
demitido por justa causa por se ausentar de seu posto de atendimento para sanar dúvidas com
supervisor demonstra a importância que é dada à presença e disponibilidade total do operador
para o atendimento ao cliente. Inconformado, o atendente questionou, entre outros elementos,
a alegação da demissão por justa causa.
O processo suscita questionamentos sobre o nível de privacidade e a autonomia dos
trabalhadores em empresas desse tipo, assim como sobre os efeitos psicológicos e sociais
decorrentes da constante vigilância, conforme discutiremos mais à frente, quando
examinaremos a gestão do trabalho em call centers e seus efeitos no bem-estar e saúde dos
trabalhadores.
1
Refere-se a processos judiciais que foram encerrados e arquivados definitivamente, sem possibilidade de
recurso ou revisão. São os processos que tiveram todas as etapas concluídas e estão prontos para serem
arquivados.
2
Para o que se segue ver Processo Judicial Eletrônico (PJE) de 0130620-03.2014.5.13.0003 com ata de
audiência no dia 13/10/2014. PJe - Consulta processual. Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região (PB). A
consulta aos arquivos foi realizada através do sistema de consulta processual do TRT-13, que disponibiliza
informações públicas sobre processos trabalhistas. É importante destacar que, para garantir a privacidade dos
envolvidos e respeitar as normas éticas de pesquisa, utilizaremos pseudônimos ao relatar os casos. As
informações acessadas são públicas, mas os nomes reais dos trabalhadores não serão divulgados neste estudo.
Gabriel de Araújo Souto; Washington Marozan Pereira de Albuquerque
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3
Conforme Chalhoub (2012), ao se referir ao uso de processos criminais na pesquisa
histórica, esta abordagem não significa partir em busca “do que realmente se passou”, o que
seria inocência demais, ou mesmo objetar de saída a utilização dos processos como fontes de
pesquisa histórica porque eles são parciais e “mentem”. Para Chalhoub, nosso trabalho como
historiador precisa estar atento ao que se repete sistematicamente: sejam versões que se
reproduzem muitas vezes, aspectos mal escondidos, contradições aparentes. Sendo assim, não
é de se ignorar as inúmeras reclamações de trabalhadores que insistem sempre no mesmo
assunto de, e onde os depoimentos coincidem em grande maioria, reportando o que
consideram ser cobranças abusivas, adoecimentos psicológicos e assédio moral. Mas não para
por aí.
2 O CONTEXTO PARAIBANO
No final dos anos 50 e início dos anos 60, o debate em torno dos desequilíbrios
regionais no Brasil ganhou destaque, e um evento significativo ocorreu na cidade de Campina
Grande: o I Encontro dos Bispos do Nordeste. Esse encontro resultou na criação do Grupo de
Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), que, por sua vez, deu origem à
Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), marcando uma nova fase na
atuação do governo federal na região nordestina, por meio da implementação de um projeto
de incentivo à industrialização.
Na cidade de Campina Grande, esse contexto gerou grande efervescência e esperança
de que a região fosse amplamente beneficiada com o fim dos desequilíbrios regionais. Devido
à sua importância e localização estratégica, havia uma expectativa de que a cidade se tornasse
um dos principais beneficiários das medidas de desenvolvimento implementadas pela
SUDENE. Segundo Damião de Lima (2021, p. 149):
Pode-se afirmar que Campina Grande preparou-se para absorver o projeto de
industrialização proposto pela SUDENE, pois, como vimos, a cidade participou da
preparação do projeto de industrialização, desde as primeiras discussões sobre a
mudança na política oficial para a região Nordeste, e se destacava no estado.
Campina Grande é a única cidade do interior do Brasil, não capital de estado, que se
tornou sede de um órgão de liderança do processo de industrialização do país, a
Federação das Indústrias do Estado da Paraíba (FIEP).
No entanto, ao contrário do crescimento observado nos anos 1960, os anos 1970
marcaram um período de crise econômica crescente para o município. Apesar do sonho de
desenvolvimento industrial, a realidade trouxe desafios significativos. O influxo de migrantes
Adoecimentos e litígios trabalhistas em
call centers
4
para a cidade, em busca de oportunidades de trabalho na indústria, resultou em um aumento
do desemprego. As indústrias locais não conseguiam absorver grandes contingentes de mão
de obra e não geravam benefícios significativos para o comércio local. Além disso, as
empresas que conseguiram produzir para o mercado local enfrentaram dificuldades em
aproveitar as políticas governamentais, que eram excludentes e privilegiavam
predominantemente os grandes grupos econômicos do Sudeste e até mesmo do exterior.
A mudança na política tributária adotada pela ditadura militar após 1965 também
contribuiu para a crise econômica em Campina Grande. A nova abordagem passou a
favorecer uma política centralizadora, que direcionava recursos e investimentos
principalmente para as capitais, em detrimento das cidades de porte médio, como Campina
Grande.
Na década de 1980, com a abertura política no Brasil, ocorreu uma mudança no
cenário político em Campina Grande. O grupo liderado por Ronaldo Cunha Lima
3
, ex-prefeito
cassado durante o regime militar, assumiu o controle da cidade, derrotando as forças que
haviam se estabelecido no poder durante a ditadura militar. Nesse contexto, surgiu uma
grande expectativa em relação à recuperação da importância da cidade. No entanto, essa
expectativa não se concretizou.
Segundo Lima (2021), a cidade enfrenta uma situação delicada no final do século. Os
políticos da situação carecem de um projeto de desenvolvimento definido, sendo dependentes
de medidas emergenciais e favores do governo estadual e federal. Apesar do desenvolvimento
alcançado durante o auge da industrialização, constata-se que tais avanços não foram
suficientes para resolver os problemas já existentes desde o início desse processo.
Com base nisso, torna-se fundamental compreender a história local da cidade,
abrangendo o processo de industrialização e as dinâmicas políticas que emergiram após a
abertura política. Esses fatores desempenharam um papel crucial no desenvolvimento
econômico atual do município. Ao investigarmos essa história, não apenas adquirimos uma
compreensão mais profunda de como as atividades industriais moldaram a estrutura
socioeconômica da cidade, mas também das políticas de incentivos fiscais que foram
responsáveis por atrair os call centers para a cidade.
3
Ronaldo José da Cunha Lima GOMM foi um advogado, escritor e político brasileiro filiado ao Partido da
Social Democracia Brasileira. Pela Paraíba, foi governador, senador e deputado federal e estadual, ambos
durante dois mandatos. Pela cidade de Campina Grande, foi prefeito por dois mandatos e vereador. Disponível:
https://g1.globo.com/pb/paraiba/noticia/2012/07/ronaldo-cunha-lima-construiu-quase-50-anos-carreira
politica.html. Aceso em 29 de junho de 2025.
Gabriel de Araújo Souto; Washington Marozan Pereira de Albuquerque
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5
Dessa forma, ao estabelecermos esse panorama histórico, estamos preparados para
adentrar na próxima etapa de nossa análise, explorando a chegada dos call centers na cidade
de Campina Grande. Examinaremos o impacto dessas empresas no contexto local, com
especial atenção para os processos judiciais eletrônicos.
2.1 A chegada dos call centers
A cidade de Campina Grande, na Paraíba, tem uma história política marcada pela
disputa de poder entre grupos familiares. Entre eles, destacam-se os clãs Vital do Rêgo e
Cunha Lima. Essas disputas se refletem em diversas áreas da cidade, inclusive no setor
empresarial. A instalação de empresas de call center na cidade não foi exceção.
A primeira empresa, chamada AeC, chegou à cidade durante o governo de Veneziano
Vital do Rêgo, que governou a cidade entre os anos de 2005 e 2012, quando era filiado ao
PMDB. a segunda empresa, chamada Orbitall, se instalou sob o governo de Romero
Rodrigues, apoiado pelo ex-prefeito Cássio Cunha Lima (filho do ex-prefeito Ronaldo Cunha
Lima), que governou a cidade entre os anos de 2013 e 2020, quando era filiado ao PSDB.
Atualmente (2024), a prefeitura é comandada por Bruno Cunha Lima, integrante do partido
União Brasil.
Apesar das diferenças políticas entre os governos, é importante destacar que todos eles
trabalharam de forma semelhante no que diz respeito aos incentivos que favorecessem a
instalação de empresas de call center na cidade. Esse setor é um importante gerador de
empregos, e a competição entre as empresas e as cidades para atraí-los é acirrada. Nesse
sentido, a disputa política na cidade pode ter influenciado a política de incentivos fiscais e
outras medidas que visam atrair empresas desse setor para a região.
É fundamental que os incentivos fiscais sejam implementados de forma transparente,
ética e em benefício do desenvolvimento sustentável da cidade. A prioridade deve ser o
interesse público e o bem-estar da população, garantindo que as empresas cumpram suas
obrigações fiscais, trabalhistas e ambientais. No entanto, sabemos que existem vantagens
políticas nesse contexto. Um exemplo é a popularidade do político, pois a percepção de que os
mesmos estão gerando desenvolvimento econômico e oportunidades de emprego pode resultar
em apoio e votos nas eleições. A atração de empresas para uma cidade também pode resultar
em doações para as campanhas políticas.
No caso específico da AeC, é possível identificar a relação entre os incentivos fiscais
oferecidos pela administração municipal e o estabelecimento da empresa em Campina
Grande. Um exemplo marcante é a sanção da lei pelo então prefeito Veneziano Vital do Rêgo,
Adoecimentos e litígios trabalhistas em
call centers
6
que resultou na transferência de posse de um terreno público localizado no bairro do Cruzeiro
para a empresa, onde anteriormente funcionava a casa de shows Forrock. Essa transferência
de posse, acompanhada da concessão de isenção de Imposto Predial e Territorial Urbano
(IPTU) e Imposto Sobre Serviços (ISS), revela uma política de incentivos fiscais adotada pelo
poder público municipal com o intuito de atrair a empresa e estimular seu estabelecimento na
região.
4
Esse caso específico contribui para uma reflexão mais ampla sobre as relações entre o
poder público e o setor empresarial, evidenciando a importância das políticas de incentivos
fiscais como instrumentos de fomento econômico.
Como mencionamos, os call centers desempenham um papel fundamental no setor
de serviços. Essas empresas são responsáveis por fornecer suporte, atendimento ao cliente e
serviços de telemarketing para uma ampla variedade de setores, como telecomunicações,
varejo, serviços financeiros, entre outros. Observemos um panorama desse setor na Paraíba
nos últimos anos.
A Paraíba registrou um significativo crescimento de 77,3% no número de empresas do
setor de serviços atuantes no estado ao longo de um período de 10 anos. Esses dados foram
obtidos por meio da Pesquisa Anual de Serviços (Pas) de 2019, divulgada pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no segundo semestre de 2021
5
. Essa pesquisa
oferece informações relevantes sobre as principais características desse setor em todo o Brasil.
No ano de 2010, a Paraíba contava com aproximadamente 6,4 mil empresas no setor de
serviços. Entretanto, em 2019, esse número atingiu um patamar significativamente mais
elevado, alcançando a marca de 11,5 mil empresas. Tal resultado representa o pico máximo
registrado na série histórica do estado. Em comparação ao ano de 2018, quando o número de
empresas estava em torno de 10,2 mil, observou-se um aumento de 11,7%.
De acordo com os dados divulgados em dezembro de 2022 pela Pesquisa Mensal de
Serviços (PMS) do Instituto Brasileiro de Geografia (IBGE), constatamos mais um
crescimento significativo neste setor na Paraíba. No período de um ano, houve um aumento
de 12,4%, superando a média nacional. Além disso, quando comparamos os meses de outubro
de 2021 e 2022, a receita também apresentou um ganho expressivo de 21%. Esses resultados
4
Para obter mais informações sobre a doação da área para instalação da empresa, consulte: Jornal da Paraíba,
Veneziano Vital assina doação de área para instalação de empresa, publicado em 16/03/2012. Disponível:
https://jornaldaparaiba.com.br/cotidiano/vidaurbana/veneziano-vital-assina-doacao-de-area-para-instalacao-de-
empresa. Acesso em: 08 de junho de 2023.
5
Dados econômicos de empresas de serviços, divulgados em 2021. Disponível:
https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/servicos/9028-pesquisa-anual-de-servicos.html. Acesso em: 18
de julho de 2024.
Gabriel de Araújo Souto; Washington Marozan Pereira de Albuquerque
Revista Em Perspectiva, Fortaleza, v. 11, e93948, p. 1-21, 2025. ISSN 2448-0789. DOI: 10.36517/ep.v11i.93948.2025
7
indicam um desempenho acima da média do país, que registrou altas de 9,5% e 15,3%,
respectivamente, nesses mesmos períodos. Nesse contexto, é relevante destacar que a Paraíba
obteve o sétimo maior avanço no país e o terceiro maior na região nordestina. Esses
resultados superaram a média nacional, que registrou um crescimento de 8,7% no volume de
serviços e 16,4% na receita nominal. Já no primeiro semestre de 2023 a mesma pesquisa
constatou novo crescimento de 10,7% no setor de serviços no estado da Paraíba durante o mês
de março, em comparação com o mesmo período do ano anterior
6
.
Conforme dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), em parceria com os Órgãos Estaduais de Estatística, Secretarias Estaduais de
Governo e Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA)
7
, Campina Grande
apresentou um significativo aumento em seu Produto Interno Bruto (PIB) per capita ao longo
dos últimos anos. Em 2012, o PIB per capita da cidade era de R$ 16.194,64, enquanto em
2018 alcançou o valor de R$ 22.583,86. É possível atribuir parte desse aumento à chegada e à
expansão das empresas que se instalaram na cidade a partir de 2012, por meio dos diversos
incentivos governamentais.
A empresa AeC tem desempenhado um papel significativo na geração de empregos
em Campina Grande, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e
Desempregados (CAGED)
8
, no ano de 2022, a empresa foi responsável por aproximadamente
30% das vagas de empregos formais criadas na Paraíba, sendo 20% dessas vagas destinadas
exclusivamente ao município de Campina Grande. Esses números revelam o impacto
significativo da empresa na economia local e na geração de oportunidades de trabalho para a
população.
Diante dos números divulgados pelo CAGED, a representatividade da AeC na geração
de emprego e renda na Paraíba é superlativa. O mercado formal de trabalho paraibano fechou
o ano de 2022 com um saldo positivo de novos empregos formais com carteira assinada. Nos
12 meses do ano passado, segundo o CAGEG, foram geradas 191.472 admissões e 168.461
desligamentos, resultando em um saldo positivo de 23.011 novos postos de trabalho. Nas duas
6
Dados da Pesquisa Mensal de Serviços (PMS) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
divulgados em dezembro de 2022. Disponível em:
https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/comercio/9010-pesquisa-mensal-de-servicos.html. Acesso em:
12 de maio de 2025.
7
Dados obtidos em parceria com os Órgãos Estaduais de Estatística, Secretarias Estaduais de Governo e
Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA). Disponível em:
https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/contas-nacionais/9080-produto-interno-bruto-dos-
municipios.html. Acesso em: 12 de maio de 2025.
8
Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED). Disponível em:
https://www.gov.br/trabalho-e-previdencia/pt-br/assuntos/emprego-e-renda/caged. Acesso em: 12 de maio de
2025.
Adoecimentos e litígios trabalhistas em
call centers
8
cidades em que atua no estado, João Pessoa e Campina Grande, a empresa gerou 6.936 novas
vagas em 2022, ou seja, 30% do total de toda a Paraíba. O setor de serviços, no qual a AeC se
encaixa, apresentou maior saldo positivo com 11.910 novos postos de trabalho formais,
seguido do comércio (4.607), indústria (3.658), construção (2.692) e, por último, agropecuária
(144). Significa dizer que a AeC foi responsável por 58% do total de vagas criadas na Paraíba
no setor de serviços, sendo 38,32% em Campina Grande e 19,90% em João Pessoa
9
.
Campina Grande registrou uma população de 419.379 habitantes no Censo de 2022, o
que representa um aumento de 9% em relação a 2010. A densidade demográfica na cidade era
de 708,82 habitantes por quilômetro quadrado. Em comparação com outros municípios da
Paraíba, Campina Grande ocupava a e 4ª posições entre 223 cidades. No contexto nacional,
estava classificada na 55ª e 135ª posições entre 5.570 municípios. O salário médio mensal dos
trabalhadores formais era de 1,9 salários mínimos. A população ocupada era de 133.705
pessoas, representando 31,88% da população total. Além disso, 39,5% da população tinha um
rendimento nominal mensal per capita de até meio salário mínimo
10
.
Essas informações são relevantes para compreender o contexto econômico e social da
Paraíba e da cidade de Campina Grande, fornecendo subsídios para análises históricas mais
aprofundadas sobre o desenvolvimento regional. Ao considerar esses dados, é possível
investigar os fatores impulsionadores desse crescimento, as políticas públicas envolvidas e os
impactos nas condições de trabalho, na distribuição de renda e no bem-estar da população.
A investigação dos fatores impulsionadores do crescimento do setor de serviços em
Campina Grande e a análise das políticas públicas envolvidas proporcionarão uma
compreensão mais abrangente dos impactos desse desenvolvimento nas condições de
trabalho. Ao conectar essas informações iniciais com os dados sobre a geração de empregos
formais pela empresa AeC em Campina Grande, podemos estabelecer uma abordagem sólida
e embasada para a investigação histórica proposta neste trabalho.
Nesse sentido, é relevante explorar alguns processos trabalhistas envolvendo essas
empresas na cidade. Esses processos oferecem informações valiosas sobre as relações de
trabalho, os direitos dos trabalhadores e as dinâmicas laborais nas centrais de call center em
Campina Grande. Ao analisar esses casos, poderemos compreender melhor os desafios
enfrentados pelos trabalhadores e as possíveis violações dos direitos trabalhistas. Essa análise
9
Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED). Disponível em:
https://www.gov.br/trabalho-e-previdencia/pt-br/assuntos/emprego-e-renda/caged. Acesso em: 12 de maio de
2025.
10
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Disponível em:
https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/pb/campina-grande.html. Acesso em: 12 de maio de 2025.
Gabriel de Araújo Souto; Washington Marozan Pereira de Albuquerque
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dos processos trabalhistas também contribui para uma perspectiva histórica mais abrangente,
uma vez que permite identificar tendências, padrões e transformações nas relações de trabalho
ao longo do tempo. Através dessa investigação, poderemos examinar as implicações desses
processos para o contexto socioeconômico da cidade e para o bem-estar dos trabalhadores.
Vejamos a seguir.
3 REFLEXOS DA DITADURA: SAÚDE, TRABALHO E PREVIDÊNCIA
Durante o período da ditadura militar, a questão dos acidentes e doenças do trabalho
ganhou uma crescente relevância. O que antes era considerado um simples efeito colateral do
desenvolvimento econômico passou a ser visto como um problema político e social que exigia
a atenção do regime para manter sua legitimidade, que estava cada vez mais em teste. A
incapacidade para o trabalho tornou-se um grave problema de saúde pública, atingindo
proporções que repercutiram em diversos setores da sociedade. Era fundamental que o
governo tomasse medidas para evitar que essa questão se tornasse um sério problema político,
escapando ao controle da ditadura.
A crescente conscientização sobre a importância de lidar com os problemas
relacionados aos acidentes e doenças do trabalho se deu tanto pela necessidade de garantir a
produtividade econômica do país quanto pela pressão da opinião pública e de organizações de
trabalhadores que buscavam a proteção dos direitos trabalhistas. O reconhecimento desses
problemas como uma questão de saúde pública trouxe à tona a necessidade de políticas e
medidas governamentais para lidar com a prevenção de acidentes e doenças relacionadas ao
trabalho. Além disso, a discussão em torno das condições de trabalho e da exploração laboral
tornou-se mais intensa, levando a debates sobre reformas trabalhistas e proteção social.
No entanto, como aponta Ana Beatriz Ribeiro Barros Silva (2016), as intenções por
trás das discussões não tinham objetivo de colocar os interessados na segurança do trabalho
como protagonistas de um processo que levasse à construção de condições dignas de trabalho:
Ao invés disso, foi implantada uma legislação acidentária que retirava ainda mais a
responsabilidade pela incapacidade para o trabalho das costas do capital e a
transferia para o Estado. A política de prevenção de acidentes, estimulada pelo
governo, foi direcionada à culpabilização de suas vítimas os trabalhadores ao
passo que o risco do trabalho foi “socializado” através da Previdência Social. Ainda,
as estatísticas de acidentes foram subestimadas e manipuladas com vistas a criar a
impressão de que o governo estava empenhado em diminuir os índices de
incapacidade para o trabalho. E finalmente, para os infortunados que cometessem
um “ato inseguro” e se acidentassem, apesar de todos os esforços em prol do
prevencionismo, o governo, do alto de sua benevolência, ainda cuidava de sua saúde
debilitada e concedia “benefícios” e “auxílios” previdenciários, muito abaixo do já
Adoecimentos e litígios trabalhistas em
call centers
10
parco salário que os trabalhadores recebiam quando gozavam de sua “plena saúde”
(Silva, 2016, p. 241-242).
Na esteira das reflexões sobre os períodos ditatoriais, Silva (2016) aponta que, assim
como na ditadura estadonovista de Vargas (1930 a 1945), na ditadura militar (1964 a 1985) é
possível traçar paralelos notáveis quanto à implementação da legislação social em um
contexto marcado pela precária ou nula vigência dos direitos civis e políticos.
Podemos destacar que a dinâmica autoritária dessas ditaduras, tanto a de Vargas como
a militar, caracterizou-se pela supressão de garantias democráticas fundamentais, cerceando a
participação política e restringindo as liberdades individuais. Nesse contexto, os direitos civis
e políticos dos cidadãos foram enfraquecidos ou completamente anulados, deixando espaço
para a imposição de políticas governamentais sem o devido respaldo democrático.
Nesse cenário desfavorável à plena cidadania, a legislação social assumiu um papel
ambíguo, pois, embora tenha sido apresentada como uma suposta resposta às demandas por
justiça e igualdade, muitas vezes serviu como ferramenta de controle social. Ações voltadas
para a promoção de políticas de bem-estar social, como a criação de leis trabalhistas, por
exemplo, acabaram por coexistir com a perpetuação de um sistema opressor e desigual. Por
um lado, houve a tentativa de aplacar os anseios populares e mitigar as tensões sociais por
meio de medidas aparentemente progressistas. Por outro, tais ações também serviram aos
interesses dos governos autoritários, consolidando seu poder e controlando a sociedade,
sobretudo as classes trabalhadoras.
Durante e após o período da ditadura militar, o Brasil passou por importantes
transformações em seu sistema previdenciário e políticas sociais. Ao analisar esse cenário,
podemos identificar marcos significativos que moldaram a proteção social no país. São eles:
1966: Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) foi criado através da unificação do
sistema previdenciário; 1967: o INPS tomou o seguro de acidentes de trabalho das empresas
privadas; Governo Médici (1969 a 1974): criação do PIS/Pasep e do Programa Nacional de
Alimentação (Pronan); 1971: O Fundo de Assistência Rural (Funrural) foi criado, estendendo
a Previdência para o trabalhador rural; 1972: as empregadas domésticas foram incluídas na
Previdência; 1973: os trabalhadores autônomos foram incluídos na Previdência; 1974: o
Ministério da Previdência e Assistência Social foi criado, a partir do desmembramento do
Ministério do Trabalho e Previdência Social; 1990: o início do Sistema Único de Saúde (SUS)
remonta à promulgação da Constituição Federal de 1988, também conhecida como
Constituição Cidadã. Foi a partir dessa constituição que o SUS foi concebido como um dos
principais pilares da política pública de saúde no Brasil.
Gabriel de Araújo Souto; Washington Marozan Pereira de Albuquerque
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11
Devemos destacar que, desde os primórdios da preocupação com o trabalhador, as
questões envolvendo a previdência e saúde do trabalhador no Brasil foram tratadas como
ferramentas de controle sobre eles. Durante o período em questão, a saúde pública sofreu um
acentuado processo de sucateamento, enquanto os serviços de saúde eram privatizados,
resultando em um cenário preocupante e desfavorável para a população trabalhadora.
Segundo Silva (2016, p. 250), “[...] temos assim o direito à assistência médica como um
direito contratual, compulsório e contributivo, destinado a uma parcela pequena da
população. De modo geral, podemos afirmar que, no capitalismo, a legislação social é um
mecanismo para regulamentar e generalizar as formas de exploração do trabalho, coibindo a
depredação total da força de trabalho. Compartilho da concepção de que as políticas sociais
são criadas como forma de manter a hegemonia das classes dominantes, tornando a
exploração capitalista mais palatável e menos evidente (Silva, 2016, p. 244-245).
Não podemos deixar de enfatizar o caráter ideológico por trás das políticas do Estado,
conforme bem deixou claro a autora acima. E falando sobre ideologia, não podemos deixar de
destacar a filósofa brasileira Marilena Chauí. Para Chauí (2001), a ideologia não é apenas
uma distorção da realidade, mas também uma forma de dominação, pois cria uma visão de
mundo que naturaliza e justifica as hierarquias e injustiças sociais, mantendo assim o status
quo. Nesse sentido, ela acredita que a ideologia atua como um instrumento de controle social,
moldando as percepções e comportamentos das pessoas de acordo com os interesses das
classes dominantes.
3.1 Adoecimentos causados pelo trabalho: processos judiciais eletrônicos do Tribunal
Regional do Trabalho da 13ª Região (PB)
Ao iniciarmos a introdução deste trabalho com a utilização de um desses processos,
buscamos municiar o leitor, de maneira preambular, com uma das fontes basilares que
adotamos para a construção deste trabalho. O objetivo foi proporcionar uma coerência sólida
e às múltiplas questões que serão discutidas ao longo do trabalho, por meio das análises que
se seguem.
A Justiça do Trabalho é uma instituição fundamental no contexto histórico das
relações de trabalho. Ela desempenha um papel central na proteção dos direitos trabalhistas,
na resolução de conflitos entre empregadores e empregados e na promoção de condições de
trabalho consideradas minimamente justas. No campo da historiografia, a Justiça do Trabalho
é frequentemente explorada como uma fonte de pesquisa valiosa para compreender as
transformações nas relações de trabalho ao longo do tempo. Os registros judiciais e as
Adoecimentos e litígios trabalhistas em
call centers
12
decisões proferidas pelos tribunais trabalhistas oferecem compreensão sobre as demandas, os
conflitos e as lutas dos trabalhadores por melhores condições de trabalho, salários justos,
direitos sociais e proteção legal. Os estudos históricos que utilizam a Justiça do Trabalho
como fonte de pesquisa permitem analisar as mudanças nas legislações trabalhistas, as
estratégias dos empregadores e dos trabalhadores, as formas de organização sindical e as
transformações nas relações de poder no ambiente de trabalho. Além disso, essas pesquisas
podem revelar aspectos sociais, econômicos e culturais das diferentes épocas e contextos em
que ocorreram os conflitos trabalhistas.
No entanto, é importante destacar que a utilização da Justiça do Trabalho como fonte
histórica requer uma abordagem crítica. É necessário considerar os contextos específicos em
que os processos foram instaurados, bem como as limitações presentes em alguns registros
judiciais.
Devemos destacar que o processo de digitalização desses processos culminou na maior
preservação dessas fontes, permitindo um acesso mais amplo a informações detalhadas sobre
as demandas, as reivindicações, os argumentos e as estratégias utilizadas pelos trabalhadores e
pelos empregadores. Isso possibilitou que pesquisadores pudessem se debruçar com maior
facilidade sobre diversos aspectos relevantes como as condições de trabalho, os salários, as
jornadas laborais, as formas de exploração e as violações dos direitos trabalhistas em
diferentes períodos históricos.
A trajetória da transição para o processo sem papel no Tribunal Regional do Trabalho
da 13ª Região (TRT-13), correspondente ao estado da Paraíba, teve início em 2004, com a
bem-sucedida implementação do Suap - Sistema Único de Administração de Processos. Esse
sistema representou um avanço significativo, uma vez que substituiu quatro sistemas
separados que eram utilizados de forma não integrada para o acompanhamento dos processos
das Varas do interior, da capital, da sede do TRT-13 e dos protocolos administrativos. A partir
de 2007, foram implementadas uma série de etapas que culminaram na adoção do Processo
Eletrônico, que é atualmente utilizado em 11 Varas do Trabalho.
No seguinte processo de XXXXX-19.2022.5.13.0009 da Vara do Trabalho de
Campina Grande
11
, temos o caso envolvendo uma empresa de call center da cidade. Segue o
conteúdo:
11
Os nomes das pessoas envolvidas nos processos mencionados foram identificados apenas por numeração
parcial para preservar sua privacidade e confidencialidade. Disponível em:
https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-13/1652525979/inteiro-teor-1652525980. Acesso em: 17 de abril
de 2023.
Gabriel de Araújo Souto; Washington Marozan Pereira de Albuquerque
Revista Em Perspectiva, Fortaleza, v. 11, e93948, p. 1-21, 2025. ISSN 2448-0789. DOI: 10.36517/ep.v11i.93948.2025
13
A reclamante alega que começou a trabalhar para a reclamada em 10/05/2021, no
entanto, sua CTPS somente foi assinada em 09/08/2021, referindo-se esse interregno
a período de treinamento, que, no entanto, não foi considerado como período de
trabalho, nem percebeu pagamento de salário. Assim, requer o reconhecimento de
vínculo do período e o pagamento dos consectários legais (TRT 13ª Região -
Turma - ROT- XXXXX-85.2020.5.13.0008, Redator (a): Desembargador (a)
Eduardo Sérgio de Almeida, Julgamento: 18/05/2021, Publicação: DJe 30/05/2021).
A pessoa reclamante se refere ao período em que essas empresas selecionam o
trabalhador e o submetem a um treinamento prévio que, em muitos casos, pode durar até um
mês sem qualquer tipo de remuneração. Nesse sentido, destaca-se que o treinamento não
garante a contratação do trabalhador, o que acaba por gerar um risco para ele, que pode acabar
perdendo tempo e investindo recursos próprios sem a garantia de uma oportunidade efetiva no
final do processo. Segue mais detalhes do processo:
Existindo prova apta a confirmar as assertivas do trabalhador no sentido de que o
interstício durante o qual a reclamada alega participação do autor em "processo
seletivo" é, na verdade, período de treinamento, estando o trabalhador, em tal lapso
de tempo, à disposição do empregador, nos termos previstos no artigo da CLT,
reconhece-se tal período como tempo de serviço para todos os efeitos legais (TRT
13ª Região - Turma - ROT- XXXXX-85.2020.5.13.0008, Redator (a):
Desembargador (a) Eduardo Sérgio de Almeida, Julgamento: 18/05/2021,
Publicação: DJe 30/05/2021).
A mesma conseguiu ser indenizada, pois foi reconhecido que o pacto laboral teve
início em 10/05/2021 devidas as seguintes parcelas em relação ao período: salário de
10/05/2021 a 08/08/2021; 13º proporcional, férias com 1/3 e FGTS com 40%. Para fins de
cálculos das parcelas deve ser considerada a remuneração mensal da autora de R$1.212,00,
conforme indicado na exordial e não impugnado pela reclamada.
No entanto, a pessoa reclamante não alegou somente a questão do treinamento não
pago, mas também alegou problemas psicológicos adquiridos em virtude do trabalho
realizado, e, portanto, solicitou indenização por danos morais. Segue trecho:
Reclamante alega, em síntese, que devido as pressões e desacatos de clientes em
ligações, bem como as pressões que vem sofrendo pela supervisora está com crise de
ansiedade e transtorno depressivo, inclusive, fazendo acompanhamento no CAPS,
conforme documentos comprobatórios anexos. Explica que vem sendo perseguida
pela reclamada, e por tal motivo adquiriu transtorno de ansiedade, o que lhe causa
grande constrangimento e dor na alma (TRT 13ª Região - Turma - ROT-
XXXXX-85.2020.5.13.0008, Redator (a): Desembargador (a) Eduardo Sérgio de
Almeida, Julgamento: 18/05/2021, Publicação: DJe 30/05/2021).
Nesse caso, a perita negou a reclamação. Portanto, a responsabilidade subjetiva
caberia a indenização se estiverem presentes o dano (acidente ou doença), o nexo de
causalidade do evento com o trabalho e a culpa do empregador. Assim, concluiu a perita:
Adoecimentos e litígios trabalhistas em
call centers
14
Diante do exposto até o momento, com história descrita existem indícios de
transtorno ansioso, foram analisados documentos médicos na qual em tabela acima
observa-se que foram apresentados vários CIDs no qual nenhum está relacionado a
transtorno ansioso e ausência de temporalidade necessária para nexo de causalidade
sendo observado apenas 1 atestado com dois dias de afastamento, visto que o mesmo
não apresenta carimbo do médico assinante e nem identificação através da
assinatura. Não existiu tratamento medicamentoso e psicoterápico, nem
acompanhamento adequado por parte da reclamante. Concluímos que não existe
nexo causal e concausal entre o trabalho e o desenvolvimento do transtorno mental.
(TRT 13ª Região - 1ª Turma - ROT- XXXXX-85.2020.5.13.0008, Redator (a):
Desembargador (a) Eduardo Sérgio de Almeida, Julgamento: 18/05/2021,
Publicação: DJe 30/05/2021).
A pessoa reclamante conseguiu ganhar a causa referente ao período de treinamento
sem remuneração, porém é importante destacar que outras reclamações foram feitas e não
tiveram a mesma sorte. Dentre elas, merecem destaque os problemas psicológicos e as
perseguições internas, que são reclamações frequentes entre os trabalhadores de call centers.
Essas questões se tornam ainda mais preocupantes quando consideramos o impacto
que podem ter na saúde e no bem-estar dos trabalhadores. Os problemas psicológicos, como
ansiedade, estresse e depressão, são consequências diretas das condições de trabalho
desgastantes, com pressão constante por resultados e falta de apoio emocional. as
perseguições internas podem ser ainda mais perigosas, afetando a autoestima e a segurança do
trabalhador, além de gerar um ambiente de trabalho tóxico e insalubre.
Na ação trabalhista (Rito Sumaríssimo) XXXXX-94. 2020.5.13.0024
12
da Vara
do Trabalho de Campina Grande, o reclamante foi demitido por justa causa e alega que não
foi devida, exigindo também pagamento pelo período de treinamento não remunerado, além
de indenização por danos morais. No entanto, o mesmo teve apenas caso ganho referente ao
pagamento do período de treinamento.
Em relação à demissão por justa causa, foi realizada análise comportamental e
chamadas atendidas pelo colaborador, como consta na ação. Os argumentos utilizados para a
demissão foram: ligações omitidas/abandonadas; chamadas em que colaboradora orienta
cliente a aguardar e sai da posição de atendimento para conversar com colegas de trabalho;
média diária de uma hora e dois minutos de pausa particular. O relatório da empresa faz
questão de destacar também que “o colaborador recebeu três medidas disciplinares por
omissão/negligência em atendimento, contudo, persiste em cometer o mesmo desvio. Sendo
assim, percebemos que apesar de receber feedbacks, orientações e medidas, o colaborador não
mudou postura”.
12
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-13/1641035970/inteiro-teor-1641035971.
Acesso em: 19 de abril de 2023.
Gabriel de Araújo Souto; Washington Marozan Pereira de Albuquerque
Revista Em Perspectiva, Fortaleza, v. 11, e93948, p. 1-21, 2025. ISSN 2448-0789. DOI: 10.36517/ep.v11i.93948.2025
15
O relatório da empresa foi impugnado, alegando o reclamante:
Ocorre, excelência, que devido à alteração no atendimento reclamante não teve
nenhum apoio da supervisão e não sabendo de todas as informações teve que buscar
ajuda, tendo que se deslocar do seu posto de atendimento para tirar dúvidas com
alguns colegas, haja vista que no treinamento não falava sobre
modificações/alterações de atendimentos, sendo essas alterações repassadas através
de uma simples informação (TRT 13ª Região - ROT- XXXXX-94.
2020.5.13.0024).
Mesmo com a impugnação do relatório, a demissão por justa causa foi considerada
correta perante a lei, uma vez que o reclamante não apresentou justificativas para suas
ausências, pausas e medidas disciplinares. Em relação aos danos morais, o pedido foi
rejeitado, pois o reclamante não apresentou argumentos que justificassem as punições
recebidas da empresa, alegando somente que as faltas que resultaram nas medidas punitivas
previstas pela empresa estavam respaldadas por atestados médicos.
Portanto, segue a decisória final da ação:
Diante do exposto, rejeito a preliminar de inépcia da inicial, concedo benefícios da
gratuidade da justiça e julgo procedente em parte a sua reclamação em face da
empresa, para condená-la ao pagamento dos títulos deferidos na presente decisão
(salário no período de treinamento com repercussão e férias acrescidas do textos
constitucional 13º salário e FGTS além de honorários de sucumbência estes em
favor do advogado reclamante), acrescidos de atualização monetária e juros de mora
consoante o cálculo anexo após o trânsito em julgado da sentença tudo de acordo
com a motivação acima (TRT 13ª Região - ROT- nº XXXXX-94. 2020.5.13.0024).
Na gina de jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região,
encontramos o teor de outra decisão judicial específica da mesma empresa na Vara do
Trabalho de Campina Grande. O processo XXXXX-60.2018.5.13.0024
13
refere a acidente
de trabalho, onde a reclamante alega ter desenvolvido síndrome do pânico, LER (Lesão por
Esforço Repetitivo) e perda auditiva, em razão do seu trabalho para reclamada.
As reclamações relacionadas a problemas psicológicos e perseguições internas são
muito comuns. Sendo assim, essa repetição nos traz um alerta importante quanto a saúde
mental desses trabalhadores, pois não são meras repetições sistemáticas. Essas constatações
evidenciam a precariedade do setor e o desgaste psicológico decorrente do trabalho nesse
setor.
A atual morfologia do mundo do trabalho a qual tanto viemos falando, fortemente
influenciada pela lógica neoliberal, tem gerado consequências negativas e degradantes para a
classe trabalhadora em todo o mundo. Além disso, desestrutura as ocupações através de
13
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-13/1314389282/inteiro-teor-1314389381.
Acesso em: 19 de abril de 2023.
Adoecimentos e litígios trabalhistas em
call centers
16
empregos formais e avança no setor da informalidade e do trabalho intermitente, utilizando
formas de trabalho como terceirização, uberização, teletrabalho, home office, cybertariado,
contrato zero hora e feminização do labor. Também exclui trabalhadores idosos, considerados
“inúteis” para os interesses do capital, e avança no setor do trabalho a domicílio (Antunes;
Braga, 2009; Antunes, 2020).
No meu trabalho de conclusão de curso em História (2021), um depoimento de grande
relevância e natureza denunciante destaca-se. Trata-se do relato de Derek (nome fictício),
funcionário de uma das empresas de call center sediadas em Campina Grande:
[...] Na pausa você pisca o olho e tem que voltar a trabalhar. Os nossos punhos
começam a doer de nos mantermos na mesma posição. A coluna também. O
ambiente é repleto de luz, uma luminosidade agressiva todo santo dia. Chegamos na
empresa felizes... e ao pisarmos na entrada nosso humor muda, ficamos, até o fim do
expediente, cada vez mais irritados/as! Começamos e ficar de bom humor
novamente quando vai dando a hora se sairmos. [...] Eis o resumo: 6h20min
sentado/a, mexendo muitas vezes freneticamente em um computador, apenas suas
mãos e seus olhos se movimentam enquanto seu corpo está paralisado e
provavelmente numa posição incorreta... Metas a serem cumpridas, pressão da
cadeia da hierarquia da empresa e quando seu setor faz algo produtivo é bloquear
uma conta, contestar compras desconhecidas, abrir demandas para os setores
internos (Souto, 2021, p. 36-37).
O depoimento em questão trouxe à tona problemas graves e recorrentes, pelos quais
podemos observar a complexidade e a gravidade do tema abordado na pesquisa a partir dos
processos que foram citados, por exemplo. O relato corrobora com a importância de se
estudar e buscar soluções para questões como essa, que afetam diretamente a vida e a saúde
dos trabalhadores envolvidos.
No caso a seguir, a reclamante teve mais “sorte” na ação contra assédio moral, TRT-
13 - RO: XXXXX20195130001 XXXXX-24.2019.5.13.0001, Data de Julgamento:
15/06/2021, 2ª Turma, Data de Publicação: 21/06/2021
14
. Segue a ementa:
Comprovado que o autor foi vítima de assédio moral decorrente de condutas
persecutórias da reclamada, ante as exigências direcionadas exclusivamente ao
autor, ainda mais considerando diante da ciência de que este se encontrava em
tratamento psiquiátrico, mantém-se a condenação da reclamada ao pagamento da
indenização por assédio moral. Recurso provido em parte, apenas para excluir a
condenação da reclamada na multa por embargos protelatórios. Comprovado que o
ambiente laboral atuou como um gatilho para o adoecimento do trabalhador, ante o
nexo de causalidade entre o assédio por ele sofrido e o seu quadro depressivo,
configura-se a doença ocupacional. Em vista disso, reforma-se a sentença para
deferir as indenizações por danos moral e material, sendo esta última destinada a
arcar com as despesas do tratamento médico-psicológico do autor. Recurso provido
em parte.
14
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-13/1237615851. Acesso em: 20 de abril de
2023.
Gabriel de Araújo Souto; Washington Marozan Pereira de Albuquerque
Revista Em Perspectiva, Fortaleza, v. 11, e93948, p. 1-21, 2025. ISSN 2448-0789. DOI: 10.36517/ep.v11i.93948.2025
17
Como podemos observar, nem todas as ações trabalhistas de cunho de adoecimento
e/ou assédio moral resultam em ação ganha. A reclamante citada acima conseguiu provar que
seu adoecimento estava intrinsecamente relacionado ao processo laboral e condutas abusivas.
No entanto, muitas dificuldades em se provar em processo que você adoeceu por
conta do trabalho. O artigo "O nexo causal entre o trabalho e o adoecimento: perspectivas e
desafios para a saúde do trabalhador", de Lima e Soares (2014), publicado na Revista
Brasileira de Saúde Ocupacional, aborda a questão do nexo causal entre o trabalho e o
adoecimento, destacando as perspectivas e desafios enfrentados na área da saúde do
trabalhador. Algumas razões ao qual podemos destacar a dificuldade em se comprovar o
adoecimento é que, em muitos casos, as doenças relacionadas ao trabalho se desenvolvem ao
longo do tempo, tornando difícil identificar a causa específica do problema. Além disso,
algumas doenças podem ser resultado da exposição a múltiplos fatores, incluindo fatores
relacionados ao trabalho e fatores externos, o que torna difícil determinar a contribuição de
cada um para o desenvolvimento da doença.
Outro fator que dificulta a comprovação de que uma doença foi causada pelo trabalho
é que muitas empresas não registram adequadamente as condições de trabalho e não realizam
avaliações de risco de forma adequada. Isso significa que não registros confiáveis para
demonstrar que os trabalhadores estavam expostos a riscos específicos no local de trabalho, o
que torna mais difícil fazer uma conexão direta entre o trabalho e a doença.
3 CONCLUSÃO
Ao longo deste estudo, foi possível explorar, por meio de processos judiciais, as
práticas de controle e monitoramento em ambientes de call center, evidenciando como essas
práticas impactam diretamente a vida dos trabalhadores. A introdução do uso de documentos
judiciais como fontes de pesquisa histórica não apenas fortalece a análise das condições de
trabalho, mas também permite uma compreensão mais aprofundada das dinâmicas de poder e
vigilância no contexto laboral contemporâneo.
A Justiça do Trabalho, como evidenciado, desempenha um papel crucial na proteção
dos direitos trabalhistas e na documentação dos conflitos entre empregadores e empregados.
A digitalização desses processos facilitou o acesso a informações detalhadas, permitindo que
pesquisadores investiguem com mais profundidade as condições laborais, as violações de
direitos e as consequências dessas práticas para a saúde dos trabalhadores.
Adoecimentos e litígios trabalhistas em
call centers
18
Os casos analisados demonstram que, embora algumas reivindicações tenham sido
atendidas, muitas outras, especialmente relacionadas a questões de saúde mental e assédio
moral, ainda enfrentam grandes desafios para serem reconhecidas e reparadas judicialmente.
As dificuldades em provar o nexo causal entre o trabalho e o adoecimento destacam a
complexidade do tema e a necessidade de abordagens mais rigorosas e abrangentes na defesa
dos direitos dos trabalhadores.
Concluímos que, embora a justiça laboral ofereça um espaço para a contestação e
reparação de abusos, ainda um longo caminho a percorrer para garantir que todos os
aspectos da saúde e bem-estar dos trabalhadores sejam devidamente considerados e
protegidos. Este estudo reafirma a importância de se continuar investigando e denunciando
práticas laborais abusivas, com o objetivo de promover ambientes de trabalho mais justos e
saudáveis.
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Gabriel de Araújo Souto; Washington Marozan Pereira de Albuquerque
Revista Em Perspectiva, Fortaleza, v. 11, e93948, p. 1-21, 2025. ISSN 2448-0789. DOI: 10.36517/ep.v11i.93948.2025
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Informações Adicionais
Biografia
profissional
Gabriel de Araújo Souto é Licenciado e Mestre em História. Washington
Marozan Pereira de Albuquerque é advogado especialista em Direito
Trabalhista e Previdenciário.
Endereço para
correspondência
Comunicação via email gabrielldearaujo@gmail.com
Contribuição
de autoria
Análise formal: Albuquerque, Washington Marozan Pereira de; Souto, Gabriel
de Araújo.
Conceituação: Albuquerque, Washington Marozan Pereira de; Souto, Gabriel de
Araújo.
Curadoria de dados: Albuquerque, Washington Marozan Pereira de; Souto,
Gabriel de Araújo.
Escrita Primeira Redação: Albuquerque, Washington Marozan Pereira de;
Souto, Gabriel de Araújo.
Escrita Revisão e Edição: Albuquerque, Washington Marozan Pereira de;
Souto, Gabriel de Araújo.
Investigação: Albuquerque, Washington Marozan Pereira de; Souto, Gabriel de
Araújo.
Conflito de
interesse
Nenhum conflito de interesse foi declarado.
Preprint
O artigo não é um preprint.
Disponibilidade
de dados de
pesquisa e
outros
materiais
Os conteúdos subjacentes ao artigo estão nele contidos.
As fontes de pesquisa estão disponíveis nos acervos: Autos-findos do Tribunal
Regional do Trabalho da 13ª Região (PB); Cadastro Geral de Empregados e
Desempregados (CAGED); Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE).
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Copyright © 2025, ALBUQUERQUE, Washington Marozan Pereira de; Souto,
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Este é um artigo distribuído em Acesso Aberto sob os termos da Creative
Commons Atribuição 4.0 Internacional (Licença CC BY).
Histórico
editorial
Data de Submissão: 14/08/2024
Data de modificação: 25/05/2025
Data de aprovação: 10/06/2025