estranhamento e pelo preconceito: Fátima: “Jéfferson, olha pra mim: você e o Sandro são
apenas amigos?” (A próxima vítima, Capítulo 71, 01/06/1995).
A pergunta de Fátima não foi respondida naquele momento, pois a conversa foi
interrompida. No entanto, ela expôs a pressão social para que os jovens seguissem um padrão
heteronormativo, reforçando a ideia de que “é normal um rapaz da idade dele ter uma
namorada”. A preocupação da mãe era compartilhada por Ana (Susana Vieira), mãe de
Sandrinho, que, ao longo da trama, chegou a sugerir que o filho procurasse um médico,
tratando a homossexualidade como uma fase passageira ou uma doença.
Essa construção dramatúrgica reflete o pensamento predominante da sociedade
brasileira nos anos 1990. Embora o país já estivesse em um processo de redemocratização e
mudanças culturais, a homofobia ainda era amplamente aceita e pouco discutida. A ideia de
que a homossexualidade era um desvio a ser corrigido era comum, e a telenovela expôs essa
visão de forma crítica, ao apresentar personagens que tentavam “consertar” seus filhos.
O autor de A Próxima Vítima, Sílvio de Abreu, sabia que abordar um relacionamento
homoafetivo na televisão aberta seria um grande desafio. Em entrevista ao Memória Globo
(2008, p. 312-313), ele explicou sua estratégia para garantir a aceitação do público:
A partir do momento em que você mostra na televisão que um casal homossexual
pode ser bem aceito, a sociedade passa a olhar de uma maneira diferente ou, ao
menos, passa a discutir a possibilidade de estar errada, de estar vendo aquilo com
preconceito. Primeiro, queria mostrar que eles [Sandrinho e Jefferson] eram bons
amigos, bons filhos, bons estudantes, enfim, pessoas adoráveis. Queria que o público
gostasse deles, para depois dizer: ‘Ah, esqueci! Eles são homossexuais também’. Aí
o público já estava gostando e não tinha por que colocar o preconceito na frente.
A estratégia adotada pelo autor foi eficaz. Ao construir os personagens como figuras
queridas pelo público antes de revelar sua orientação sexual, ele conseguiu criar uma conexão
emocional com os telespectadores, reduzindo a rejeição inicial ao casal. Além disso, ele
propositalmente criou um personagem negro e homossexual, o que forçava a sociedade a lidar
com dois preconceitos simultaneamente.
Fiz uma armadilha para os preconceituosos: coloquei um negro homossexual.
Assim, eles tinham dois preconceitos com que se preocupar. O resultado foi
excelente em todos os pontos de vista. […]. Ser ou não homossexual não muda o
caráter de uma pessoa (Memória Globo, 2008, p. 312-313).
A abordagem de Sílvio de Abreu rompeu com o padrão da teledramaturgia brasileira,
que, até então, representava personagens LGBTQIA+ de maneira caricatural ou
marginalizada. Ao inserir um casal homoafetivo na narrativa central de A Próxima Vítima, a
telenovela contribuiu para a visibilidade LGBTQIA+ na mídia brasileira.